Começou a chover logo depois que Marina estacionou o carro na frente da casa. Ela estava com as roupas encharcadas assim que colocou os pés na casa, o que não impediu de Valentina correr e lhe oferecer um abraço.
Ela observou a criança atentamente, olhando cada arranhão exposto, na sua pele tão macia e logo depois começou a chorar.
— Graças a Deus! você está viva – ela ergueu os olhos e sorriu, uma mudança surpreendente no seu rosto – já que está bem, pode voltar a assistir o seu desenho preferido, enquanto converso com a sua mãe.

Valentina soltou uma risada e olhando para ela pela última vez, saiu, voltando para a sala.
Marina levantou-se, porém, ainda mais angustiada de quando havia entrado na casa minutos antes, olhou para Ashley e começou a falar:
— Eu disse a ela para tomar cuidado – a intensidade da chuva aumentou lá fora – quantas vezes alertei para ficar atenta. Céus, imaginar que Valentina poderia ter sofrido algo pior.
— A culpa não foi da babá – Ashley a olhava calmamente – está tudo bem, agora. Tudo não passou de um grande susto.
Mas Marina acreditava que Ashley estava sendo bondosa demais, colocando panos quentes em cima da grave situação.
— Quem foi o irresponsável que a atropelou? – Indagou enquanto as suas bochechas ficavam vermelhas de raiva – posso até imaginar colocando minhas mãos em cima desse…

Ela parou de falar quando viu a expressão contrariada no rosto de Ashley. Estreitou os olhos, pensativa, enquanto esperava Ashley contar o que havia realmente acontecido.
— Foi o Oliver quem atropelou a Valentina
Marina se encolheu com o susto que levou, estava amuada. Balançava a cabeça, com a boca aberta, como se tentasse aceitar o que acabará de ouvir.
— Parece loucura, eu sei – disse, acrescentando, porque percebeu que Marina estava sem reação – então nos encontramos no hospital e quando ele soube que eu era a mãe da Valentina, não tive outra escolha a não ser contar toda a verdade.

— Você não está falando sério, está? – Falou finalmente, mas ainda sem acreditar na calma que Ashley contava o que havia acontecido – como é possível o Oliver ter atropelado a Valentina?
A pergunta não fez sentido para Ashley, como se Marina traçasse uma linha imaginaria a qual só existia em sua mente. Como seria possível Oliver estar no mesmo lugar que Valentina naquele dia, ela não fazia ideia, mas não há verdade que possa ser encoberta para sempre. Desde o dia em que ela voltou para Las Vegas que tudo parecia possível quando o assunto era ela e Oliver.
— Ele estava perambulando pela cidade atrás de mim – confessou com um brilho diferente no olhar – estava zangado porque eu saí para almoçar com o Alfonso e acabou encontrando Valentina.
— Você saiu para almoçar com o Alfonso?
Os acontecimentos daquele dia pareciam acelerados demais para Marina.
— Isso não é importante – Ashley pareceu impaciente – o Oliver a levou para o hospital, pagou a conta médica e quando eu cheguei lá sem ter ideia de que havia sido ele o responsável por toda essa tragédia, nos encontramos.
— E você muito esperta, contou logo a verdade para ele – ela soltou um sorriso.
— O que queria que eu fizesse?
— Eu estou sendo irônica, Ashley – revirou os olhos – apesar de achar uma idiotice contar que Valentina é filha dele.
Ashley colocou um dos dedos nos lábios, fazendo um sinal para que ela se calasse. Ashley temia que Valentina escutasse aquela conversa.
— Eu não quero que a Valentina saiba disso – se aproximou dela, sussurrando.
— Ele não vai reconhecê-la como filha, não é mesmo?
O rosto de Ashley ficou sombrio quando escutou a pergunta. Um trovão rompeu o silêncio que se formou entre elas e logo um clarão iluminou o céu acinzentado e escuro. As ruas se enchiam com os pingos de chuva e o vento varria as folhas secas do chão. Ashley observou por alguns segundos o temporal e sentiu como se ele fizesse parte dela, devastando e inundando todo o seu coração.
— Ele não acredita que estou falando a verdade – Ashley sentia-se arrasada em dizer isso – me acusou de ter engravidado de um homem qualquer e jogar para ele uma responsabilidade que não o pertencia.
— Que cafajeste! – Disse, espantada.
— Contudo, eu não me importo – declarou, porém, o seu peito se encheu de angústia – eu prefiro que ele não a reconheça. Oliver não teria nada de bom para acrescentar a vida de Valentina.
Uma expressão de dúvida surgiu no rosto de Marina, como se ela acreditasse que Ashley estava sendo ingênua demais ou negando a própria realidade.
— Não arranque de Valentina o direito de conhecer o pai – ela viu a surpresa estampada no rosto de Ashley.
— Conhecer alguém que não aceita ela como filha? – Elas se entreolharam, constrangidas demais – o que está falando é uma grande bobagem.
— O fato dele duvidar da paternidade, não significa que ele não a queira por perto – Marina hesitou por um momento quando percebeu a expressão sombria que se formava no rosto de Ashley. Era claro que ela não aceitaria aquela sugestão - eu no lugar dele também duvidaria.
— Está me ofendendo – se afastou da mulher, suspirando pesadamente.
— Não foi a minha intenção - Marina pensou com cuidado as palavras que diria em seguida as mastigou devagar, antes de continuar – Você é uma mulher linda, é claro que o Oliver pensaria que você se relacionou com outra pessoa.
- Não foi exatamente essas palavras que ele usou para me dizer isso – cheia de ressentimento, Ashley olhou com desprezo para a melhor amiga, sabendo que se não encerrasse aquele assunto imediatamente, o que terminaria seria aquela amizade – eu não vou tentar entender por que você está defendendo o Oliver, mas eu faria qualquer coisa para não permitir que ele fizesse Valentina sofrer.
— Ou talvez porque tem medo de que ele se aproxime de você novamente.
Ashley encarou Marina com uma expressão contrariada e um sorriso de incredulidade se formou no seu rosto.
— Agora está dizendo bobagens.
— Sabe que não estou, – se aproximou dela novamente – eu sei que o Oliver não te proporcionou o casamento dos sonhos, mas as pessoas mudam. Considere isso antes de tomar qualquer decisão. Não é mais só a sua vida, mas a da Valentina também.
Quando ouviu o comentário de Marina, não conseguiu dizer mais nada. Observou a mulher sair da cozinha, deixando-as sós com os próprios pensamentos. Embora Marina tivesse uma visão distorcida de quem Oliver era, as palavras proferidas atingiram em cheio o seu coração. No seu íntimo, ela temia que ele voltasse para a sua vida e fizesse tudo novamente. Ashley não suportaria que Valentina sofresse nas mãos dele como um dia ela havia sofrido. Por outro lado, Ashley sabia que Marina poderia ter razão. Oliver não parecia ser o mesmo de três anos atrás. Havia algo diferente nele, algo que Ashley não saberia decifrar se realmente era uma mudança ou só mais um jogo dele para manipulá-la.
Após ficar quase uma hora pensando sobre aquilo, mal percebeu que o temporal lá fora havia se acalmado. O tempo passava tão rápido que Ashley se assustou quando olhou as horas no relógio. O celular vibrou sobre a mesa e quando verificou, um sorriso brincou nos seus lábios. Alfonso perguntava como estava Valentina. Mas o sorriso desapareceu quando ela se lembrou que ele ainda não sabia de toda a verdade. Alfonso continuaria disposto a conquistá-la quando soubesse que Valentina era filha de Oliver?
No entanto, Ashley reagiu rápido e respondeu à mensagem sem criar grandes expectativas. Talvez Oliver estivesse certo quando dizia que ela era uma grande mentirosa.
Voltou para sala envolvida em um turbilhão de sentimentos, quando viu Valentina dormindo. Envolveu a menina nos seus braços e a levou para o quarto. Naquela noite, Ashley dormiu abraçada com a menina, enquanto olhava cheios de lágrimas os machucados expostos na sua pele. Soltou um longo suspiro, fechando os olhos e tentando dormir.
No dia seguinte, quando chegou na empresa e viu que Oliver ainda não havia chegado, sentiu o seu coração congelar quando Val lhe entregou um envelope.
— O que é isso? – Tudo o que ela presumia que aquilo seria sua carta de demissão.
— Oliver avisou que não virá a empresa hoje e mandou eu entregar isso a você – Val especificava – infelizmente eu não sei do que se trata.
Ashley a encarou com o rosto pálido. Depois desviou o olhar para o envelope que segurava. Quando Val se afastou, ela o abriu com as mãos tremulas, acreditando que enfartaria.
Era um simples bilhete escrito à mão pelo próprio Oliver.
“Hoje mesmo o adiantamento que me solicitou estará disponível na sua conta bancária, com um valor extra. Compre um presente para Valentina e diga que foi o Oliver que enviou”.
Um sorriso escancarado surgiu nos seus lábios. Ela voltou a guardar o bilhete no envelope sem acreditar que aquilo estava acontecendo.