Capítulo 16
1650palavras
2023-08-02 03:14
Robert
Era tudo surreal demais para ser mera coincidência. Passei dias lutando contra a ideia de descobrir o endereço de Theodora e a sequestrar para uma ilha deserta, agora lá estava eu, sozinho com a mulher que invadia meus sonhos.
Cheguei à Ubatuba na segunda-feira de manhã e fui direto para o escritório do Hipermercado. Depois de uma longa discussão com o sindicato onde apresentei a escola que faria o curso profissionalizante dos funcionários, terminamos parcialmente satisfeitos de ambos os lados. Por enquanto o fogo estava apagado e eu podia esquecer aquele assunto por um tempo.

Então joguei no GPS o endereço que Toninho me indicou e dirigi até o condomínio que ficava numa das praias mais nobres da cidade. Eu confesso que fui poucas vezes às praias de Ubatuba, nas raras vezes em que estive ali acabei estendendo a viagem até o Rio de Janeiro e ficando em um apartamento em Arraial do Cabo. Infelizmente o apartamento não estava disponível e eu decidi dar uma chance para aquela cidade charmosa.
Meus planos para os próximos dias incluíam dormir, assistir TV e qualquer coisa que não precisasse pensar, pois eu só queria poupar meu cérebro de todo o estresse que eu vinha sentindo nos últimos tempos. Eu precisava de uma assistente com urgência. Apesar de ter apenas trinta e cinco anos, percebi alguns fios brancos nascendo na minha cabeça, o que acendeu meu alerta, junto com as constantes dores de cabeça e a queimação do estômago. Eu realmente precisava me aquietar por alguns dias.
Cheguei a casa do Toninho e era uma residência de aparência muito agradável, bem perto do mar. Digitei a senha da porta e entrei já estranhando a música que tocava bem alta. Andei lentamente até a sala e percebi uma mulher dançando, com sua roupa de ginástica moldando as pernas longas e esguias, os braços bem torneados e cabelos crespos que lhe davam um poder difícil de descrever. Então ela virou-se para mim, ainda com os olhos fechados e eu pude perceber que era Theodora. Foi como levar um soco no estômago.
Não consegui fazer outra coisa além de ficar observando o movimento gracioso dos seus quadris, os pés delicados deslizando no piso enquanto ela tinha um sorriso no rosto. Fiquei enfeitiçado, era com certeza uma ninfa enviada ali para tirar minha paz de espírito. Será que eu estava com tanta dor de cabeça que já estava imaginando coisas?
Então a música parou, ela se inclinou como se estivesse diante de uma plateia e eu só pude aplaudir. Se o intuito era me agradar, o objetivo havia sido atingido com sucesso. Então ela me viu e pareceu surpresa. Não lhe dei tempo de pensar em muita coisa e a beijei. Precisava urgentemente sentir o gosto dela. Era algo muito próximo à saudade o que eu sentia naquele momento, minha boca sentia saudade dela.
E agora, um tempo depois, eu estava no quarto da casa de praia, deitado na cama e pensando nessa inusitada recepção enquanto fitava o teto branco. Meu estômago não doeu depois da refeição, o que era uma feliz novidade! Talvez eu devesse comer melhor porque estava abusando dos fast foods.

Adormeci e só acordei quando já era noite, olhei o celular e vi que já eram duas horas da manhã.
Caramba, eu praticamente desmaiei por horas!
A casa estava silenciosa e eu me levantei com o corpo estranhamente pesado. Além da fome percebi que me sentia quente e extremamente cansado, tirei a camisa molhada de suor e senti um breve calafrio. Caminhei pelo corredor, tateando o interruptor até acender uma luz na cozinha. Abri a geladeira e acabei derrubando uma panela, o que fez um barulho tremendo. Voltei para a geladeira e achei uma garrafa de suco natural de laranja e um bolo que devorei com grandes mordidas.
Escuto passos vindos do corredor e suponho que o barulho tenha acordado Theodora. Ela chega carregando um cabo de vassoura como se fosse uma espada, pronta para enfrentar alguém com aquilo. A visão era engraçada, pois jamais ela renderia um bandido daquele jeito.

— Fique tranquila Tessy, sou apenas eu.
Ela me viu e ao invés de ficar tranquila, pareceu mais tensa ainda. Ela estava com o cabelo preso num coque e usava uma camiseta gigante de algodão que parecia confortável, mas não era nada sexy. Foi aí que eu percebi que ela olhava atentamente para meu peitoral, pois eu estava sem camisa. Eu ri e ela ficou envergonhada por ser flagrada.
— Eu acordei com um barulho e fiquei preocupada — ela disse, desviando o olhar para o chão, se mantendo ainda distante, próxima a porta. — Sua dor de cabeça melhorou?
— Só piorou.
— Você está com os olhos pequenos, me deixe ver uma coisa. — Se aproximou de mim e colocou a mão na minha testa — Eita, você está ardendo em febre! Você estava gripado ou algo assim? — Theodora ficou visivelmente preocupada — Você não deveria estar sem camiseta!
— Vou melhorar depois que dormir mais.
— Espere um pouco aqui! — ordenou e saiu em disparada pelo corredor, voltando rapidamente com um remédio na mão. — É paracetamol, acho que vai te ajudar. Que horas são? É bom tomar de oito em oito horas… ou algo assim.
— Ok, doutora. — Peguei o remédio e tomei com o suco. Me senti fraco novamente e levei a mão à testa — Acho que é melhor eu ir me deitar ou vou desmaiar aqui na sua frente.
— Pelo amor de Deus, não! Venha, eu te ajudo. — Me abraçou pela cintura e eu passei o braço por cima do ombro dela. Ela era alta, mas magra e fiquei com medo de derrubá-la com meu peso, por isso me mantive o mais firme possível.
Chegamos ao meu quarto e ela procurou uma camisa na minha bolsa e me entregou. Então eu me ajeitei melhor na cama e logo estava apagado.
Acordei com uma forte luz do sol em meu rosto. Já era de manhã e o dia estava claro e livre de nuvens.
Eu estava coberto com um lençol fino até a altura do queixo, uma toalhinha molhada descansava sobre minha testa e meus chinelos foram retirados dos meus pés. Me sentei na cama e percebi a manta amarrotada sobre a poltrona que ficava em frente a mim. Pelo jeito tive uma enfermeira que me vigiou a noite toda. Passei a mão pela testa e percebi que estava fresco novamente. Me sentia melhor.
Tomei um banho rápido e me vesti informalmente com uma bermuda e camisa regata, uma vez que eu havia dispensado os ternos da minha mala. Quando cheguei à cozinha, o cheiro de café subiu pelas minhas narinas: Theodora estava no fogão fazendo pão na chapa e assim que me viu ela sorriu. Aquele sorriso me conquistou.
Theodora estava muito diferente das outras ocasiões que a encontrei. Não estava com a aparência sexualizada, dispensou a maquiagem bem feita e os vestidos que destacavam as curvas suaves, muito pelo contrário, estava com um blusinha de alça e shorts jeans que pareciam confortáveis. O short, em especial, me dava uma visão privilegiada das belas coxas. Os cabelos volumosos emolduravam o rosto de maneira adorável e parecia uma princesa.
Até então eu a enxergava como uma mulher sexy que mexia com meus hormônios só de encostar em mim, mas agora eu estava conhecendo o lado dela mais íntimo e acolhedor, uma Theodora terna o suficiente para passar a noite ao lado da cama de uma pessoa doente. Fazia tempo que alguém cuidava de mim e percebi que sentia falta daquilo.
— Coma antes de tomar o remédio. Você parece bem, mas é bom tomar mais um comprimido. — Ela colocou uma xícara de café à minha frente e um prato de plástico com pão na chapa. Era tudo muito simples, mas ao mesmo tempo bem acolhedor.
Comi tudo, o pão na chapa estava muito gostoso e perguntei se havia mais um. Ela pareceu feliz por eu estar repetindo e logo providenciou mais pães. Se sentou comigo à mesa e comemos juntos.
— Robert, eu estive pensando — ela indagou, devagar. — Não é melhor ficar aqui? Quer dizer, pelo menos até se recuperar totalmente? No hotel você vai estar sozinho e além do mais vai só comer porcaria.
— É, eu mudei de ideia, vou ficar mais um pouco aqui — eu disse, servindo um pouco mais do café e me divertindo com a expressão surpresa dela. Com certeza tinha preparado uma porção de argumentos para me convencer a ficar, porém não precisei usar mais nenhum.
O que seria correto? Ou prudente? O que um homem inteligente e sabedor de suas obrigações faria no meu lugar? Iria embora logo após o café e ficaria bem longe da mulher objeto de sua tentação, mas eu não poderia ignorar que o destino, por algum motivo, fez nosso reencontro acontecer ali, naquele lugar longe de todos.
E eu estava me sentindo tão bem. Era como se um aspirador tivesse sugado minha indisposição e me deixado em boas condições novamente. Será que esse era o poder que a presença de Theodora causava em mim?
Eu estava tentando fazer tudo muito corretamente, sendo o homem direito que nunca fui e porque tive que decidir ser decente, justamente quando conheci a Theodora? Por que não deixar para pensar depois nessa história de homem fiel? Aliás, eu não estava sendo fiel a mim mesmo ou aos meus sentidos.
— Você tem noção que minha presença aqui muda totalmente a perspectiva das coisas? Que traz certos riscos para nós dois, Tessy?
— Sim — ela respondeu com firmeza. Parecia já ter pensado muito no assunto — Há algumas coisas que não posso evitar, eu não posso evitar isso que rola entre nós, Robert. Não posso evitar e não quero.
Engoli em seco, enquanto me perdia no sorriso de Theodora.