Capítulo 13
1597palavras
2023-08-02 03:12
Theodora
Eu gostaria de poder dizer que as duas semanas seguintes passaram voando, mas não seria verdade. Se arrastaram como velhas raquíticas.
Minha rotina voltou ao normal. Depois do escândalo na mansão dos Servantes, Kaique disse a todos que terminamos e assim eu fiquei fora de campo. De qualquer forma, o Toninho fechou negócio com o Octávio e agora eles eram vistos constantemente na companhia um do outro.

Tudo normal, tudo como o esperado, exceto por uma coisa: eu não parava de pensar em Robert!
Nós nos vimos em duas ocasiões apenas: na Festa Beneficente e no aniversário de Cristian, sempre acreditei que se precisava de muito mais tempo para cultivar sentimentos fortes por alguém e com Robert Servantes foi diferente.
Toda vez que o telefone tocava eu olhava ansiosa esperando que fosse ele e logo lembrava que eu não tinha lhe dado meu número, então eu ria do ridículo da minha situação.
Estar no trabalho com a cabeça repleta de recordações tumultuadas não ajudava.
Enia, minha chefe, chegou na minha mesa, trazendo mais serviço do que o normal:
— Você está ensinando todo seu serviço direitinho para a Flávia? Você sai de férias em poucos dias e ela precisa saber tudo para te cobrir.

— Pode ficar tranquila porque a Flávia tem aprendido tudo muito depressa.
— Que bom. A Flávia é exemplar — sorriu por um momento. — Bem, quero entregar esse fechamento até o final da semana. — Me deixou uma pasta grossa de documentos.
Respirei fundo. Era bom ter bastante serviço para pensar menos na minha vida amorosa grau zero.
Quando o expediente terminou fui diretamente para o estúdio de dança. Assim que eu troquei corri para o Kaique que já me esperava. O professor ainda ia demorar um tempo para começar a aula de merengue e então nós dois sentamos no chão para nos alongar enquanto conversávamos.

— Como estão os negócios lá na escola do seu pai?
— Aí amiga, tudo perfeito. Estamos ainda no período de homologação lá com o Grupo RCS, mas tudo indica que no próximo mês nossa prestação de serviço vai começar a rodar. Vai ser muita aula online porque eles tem Hipermercados no país todo. Então estou na correria montando um espaço para as filmagens com os professores.
— Que maravilha. — Uma pergunta ficou pairando na minha cabeça e eu relutei bastante antes de questionar — Por acaso o Robert perguntou de mim?
Kaique me lançou uma expressão desaprovadora. Eu sabia qual era a opinião dele, mas naquele momento ele era a única pessoa que poderia me dar notícias sobre a família Servantes.
— Você deveria parar de pensar nele. Acabou sendo um fiasco a nossa tramoia.
— Só estou curiosa.
— Logo que tive oportunidade eu disse que nós terminamos e não dei mais brecha para o assunto. — Kaique parou de alongar as pernas para falar comigo seriamente — Parece que aquele homem mexeu demais com você, chuchuzinha, só que para ele, provavelmente, foi só mais um dia, mais uma mulher. Ouvi dizer que ele é um devasso!
— Eu não posso acreditar nisso. Ele foi muito cavalheiro comigo.
— Você teve sorte, parece que não tem uma mulher gostosa nessa cidade que ele não tenha comido — ele falou com certo exagero. — Parece que agora está num relacionamento sério e tentando se aquietar, mas amiga, o lobo não consegue ficar muito tempo longe do galinheiro.
— Eu não sei o que fazer para tirar o Robert da cabeça!
— Querida, conforme os dias passarem tudo isso some. Você vai sair de férias semana que vem? Faça uma viagem, conheça um bonitão, se permita viver.
— Falando em férias, você me prometeu duas semanas na casa de praia de vocês.
— Prometi? Caramba, eu havia me esquecido. — A surpresa dele parecia sincera. — Eu realmente falei que você poderia usar, né?
— Sim, e tô contando com isso para não ficar minhas férias inteira trancafiada na minha casa.
— A Lisa vai com você?
— Não. Ela está procurando emprego e tem umas entrevistas nos próximos dias. E prefiro ir sozinha, sabe? É muito raro ter um momento só para mim.
— Bem, promessa é promessa. Vou deixar tudo certo para você ir para nossa casa. O único problema é que não avisei meu pai… ele tem certo ciúmes daquela casa.
— Acha que ele não vai gostar?
— Na verdade, ele nem vai saber. E nem precisa porque ninguém vai estar lá e ele não vai usar agora.
— Ah Kaique, é melhor acertar com seu pai!
— Você quer ir ou não, perua? — O professor chegou na sala e deu por encerrado o assunto — A aula vai começar. Depois te passo a senha da portaria lá da casa na praia.
Parece que tudo que envolvia meu amigo Kaique era meio bagunçado e naquela altura do campeonato eu já deveria estar acostumada.
A aula que se seguiu foi uma delícia. Eu precisava muito tirar as preocupações da mente e dançar era perfeito para mudar meu humor, me deixar leve e alegre. Quando terminou, estávamos todos rindo.
— Miga, eu já vou indo, tenho um encontro hoje — Kaique disse apressado, juntando suas coisas sem me dar chance de questionar qualquer coisa.
Peguei minhas coisas, tomei um banho e ia saindo quando fui chamada:
— Você está de parabéns, Tessy. — Jefferson, o professor de dança me elogiou — Você não apenas aprende rápido como também tem movimentos muito graciosos.
— Verdade? Fico feliz em saber.
— Estou pensando em me inscrever num campeonato de dança e pensei em convidar você para ser meu par.
— Eu? — Fiquei feliz. Eu admirava o trabalho de Jefferson e saber que ele achava que eu estava num patamar tão alto me fez ganhar o dia.
— Não é certeza ainda! — Ele adiantou
— Aí, seria um máximo!
— Então sei que posso contar com você — ele sorriu. — Bem, não quero te prender aqui porque parece que vai chover.
— Caramba, é verdade. — Vi o tempo nebuloso lá fora — Até a próxima aula, professor.
Nós despedimos.
Quando alcancei a calçada algumas gotas de chuva já caiam.
— Tessy!
Olhei para o lado e vi Ector vindo em minha direção com um grande guarda—chuva.
— Oi, você por aqui...
— Sim, estava na casa de um colega e lembrei que você poderia estar no estúdio de dança. — Ector se aproximou, dividindo o guarda-chuva comigo. Ele com certeza lembrava que eu não faltava um dia sequer às aulas, inclusive chegou a ter ciúmes do professor — Vem, eu te acompanho.
Eu ia negar, mas as gotas começaram a cair cada vez mais pesadas. Eu costumava carregar uma sombrinha na bolsa, mas ontem havia retirado por achar que não choveria nos próximos dias.
— Está começando a esfriar também. — Me peguei falando sobre o tempo, pois não tinha assunto melhor.
— Você sempre foi friorenta — ele riu. — Lembra quando fomos em Poços de Caldas e você não levou o agasalho? Nem era inverno e você ficou agarrada no meu braço o tempo todo, tremendo feito um picolé.
— Há! Eu me lembro sim.
— E mesmo assim foi um dos nossos melhores passeios. Você ficou do meu lado o tempo todo, como um ursinho.
— Pois é. Bem, isso ficou no passado.
— Será?
Eu percebi que estava segurando o braço dele e então larguei na mesma hora. Ele riu por eu notar a semelhança da situação.
— Acho que isso é muito atraente em você, Tessy, parece vulnerável, dá vontade de colocar num potinho e proteger de tudo.
— Posso parecer vulnerável, mas não sou — reclamei.
Apesar de irritada com a observação dele, Ector não estava totalmente errado. Eu vinha de um bom lar onde sempre pude contar com meus pais. Éramos pobres, mas não cheguei à vida adulta com dificuldades. E na escola sempre pude contar com Lisa. Ela era minha protetora e sempre se lançava à minha frente quando alguém queria brigar comigo. Em quantas outras situações eu dependia que me socorresse? Naquele dia com o Ferraz, eu poderia ter feito mais? Teria conseguido me defender melhor se fosse como minha irmã?
— Não fique chateada. Você é encantadora desse jeitinho. Senti falta disso, dessa sua expressão tão doce.
— Já estou perto de casa. — Eu me afastei — Obrigado, Ector.
— Quer ir ao cinema amanhã? — ele gritou, enquanto eu corria para o portão de casa.
— Tenho compromisso, desculpa.
Entrei em casa sem olhar para trás e já encontrei minha mãe na cozinha, sorrindo:
— Boa noite, mãe.
— Boa noite, Tessy. Aquele ali era o Ector?
— Sim, era — eu disse, pronta para escapar para meu quarto.
— Por que não o chamou para entrar? Acabei de fazer chá e sei que ele gosta.
— Por favor, mãe, não alimente ideias sobre nós, ok?
— Eu não ia criar, mas vi vocês juntos chegando aqui em casa, o que quer que eu pense?
— Não pense nada. — Fui até ela e beijei o rosto arredondado — Você fez janta? Tô sentindo cheiro de frango.
— Fiz sim, todo mundo já comeu, falta apenas você.
Depois de comer fui para o meu quarto e me joguei na cama. O celular tocou e eu vi a mensagem de Kaique: "Miga, tudo certo com a casa na praia! É só chegar e dar seu nome na portaria."
Sorri. Faria de tudo para aproveitar bem meu descanso em Ubatuba.