Capítulo 111
997palavras
2023-07-18 00:02
Ponto de vista de Xavier:
Não saberia dizer quanto tempo dormimos, mas em algum momento durante o meu sono tranquilo, senti mais do que ouvi o choro angustiado da minha companheira. Em seguida, ela passou a se mover inquieta até começar a se debater de verdade. Imediatamente, eu despertei, preocupado com ela e o bebê em seu ventre. Então, rolei seu corpo na cama para que ela pudesse sentir o colchão sob si, mas essa pareceu a coisa errada a se fazer, pois só a fez se debater ainda mais.
Sentando-me na cama, eu a levantei gentilmente em meus braços enquanto descansava minhas costas na cabeceira. Ao respirar fundo, fechei meus olhos e comecei a emitir ondas calmantes, permitindo que elas tomassem conta de mim e de minha companheira. Então, soltei o ar e mergulhei em sua mente. Tive que me esforçar para lembrar de que isso era apenas um pesadelo horrível.
Era verdade o que diziam sobre o medo ser o seu pior inimigo. Com uma única mordida, ele podia pegar o que mais nos apavorava e transformá-lo em algo muito pior a ponto de não sabermos mais diferenciar o pesadelo da realidade.
Minha pobre companheira revivia em seu sono todo o tormento que passou nas mãos de Armand em uma espécie de ciclo sem fim. O canalha havia mesmo feito um estrago na cabeça dela, mas o que mais me incomodou foi a forma como cada cena mudava de uma para a outra, tornando-se mais violenta e sombria.
Eu podia sentir a escuridão querendo se infiltrar em seu inconsciente, praticamente salivando no abismo obscuro que havia dentro da minha companheira e de seus pensamentos. Não era sua culpa ter tido que suportar tanta dor ainda tão jovem e sem seu consentimento.
Quando achei que já tinha visto todo tipo de feiura que poderia haver em sua mente, a situação foi ficando cada vez pior, mais sangrenta. Ignorando tudo isso para mais tarde, comecei a procurar pela minha companheira. Pensei ter lutado as piores guerras e visto as coisas mais abomináveis possíveis, mas nada se comparava a caminhar pelas memórias e pesadelos de Inara.
Precisei controlar minhas emoções, inclusive a raiva, conforme eu literalmente afundava em seu medo e desespero. Em certo ponto, também fiquei desesperado porque já não aguentava mais aquilo. Sua agonia era minha, portanto, doía muito saber que não estive lá para protegê-la de todo esse mal. Eu teria a resgatado em um piscar de olhos se soubesse.
Chamei pelo seu nome várias vezes enquanto caminhava pelos corredores que compunham sua mente consciente e inconsciente, mas sem sucesso. Alguns minutos se passaram e nada de eu encontrá-la, mesmo depois de canalizar o vínculo que compartilhávamos.
Em vez de me levar direto a ela, o vínculo se dividiu em diferentes direções, três para ser exato. Eu tinha uma ideia do motivo, afinal, meus outros eus correram para a superfície novamente. De imediato, senti meus olhos começarem a girar da mesma forma de quando encontramos nossas companheiras pela primeira vez perto do vulcão. Então, usei toda a minha força de vontade para contê-los antes que perdêssemos o controle e causássemos um estrago irreparável.
Por fim, escolhi seguir a primeira e menor corda. O suspiro de alívio que saiu dos meus pulmões me deixou quase ofegante quando a porta se abriu, revelando um rosto o qual senti muita falta. No meio da sala estava Moira com suas tatuagens cintilando em um vermelho tão vivo que parecia lava.
Seus olhos brilhavam em um vermelho intenso igual a nenhum outro que já tinha visto antes. E isso não era pouca coisa, considerando que a maior parte da minha família possuía olhos dessa cor. No entanto, o que partiu meu coração foi ver as lágrimas escorrendo pelo seu belo rosto misterioso.
Ao me aproximar dela, coloquei meus braços ao seu redor enquanto a consolava baixinho.
"Está tudo bem. Estou aqui agora. Acabou", sussurrei em seu ouvido.
"Você... você... você veio mesmo", ela disse entre soluços.
"Mas é claro... Eu sempre virei."
"Eu... eu... eu tentei."
"Eu sei e está tudo bem... Nós vamos superar isso. Agora, venha. Vamos encontrar as outras."
Eu desfiz nosso enlace e, após enxugar todas as suas lágrimas, depositei um beijo rápido em sua cabeça antes de puxá-la atrás de mim e sair pela porta, que desapareceu assim que passamos por ela.
O som dos gritos de Inara em seu corpo físico, debatendo-se, ainda podia ser ouvido e sentido enquanto seguíamos a segunda corda. Desta vez, a porta já estava aberta. Então, ouvimos o berro de um dragão furioso ecoando à nossa volta.
"Zya..." Moira sussurrou.
Com cuidado, entramos pela porta e nos deparamos com um campo cercado de montanhas rochosas, porém, a grama em volta estava completamente carbonizada. Zya em toda sua fúria estava no topo de uma das montanhas, gritando com raiva enquanto espalhava suas chamas por todo o lugar.
Por mais que tentássemos chamá-la, não conseguimos obter sua atenção. Era como se nossas vozes entrassem por um ouvido dela e saísse pelo outro. E não era como se ela não tivesse nos avistado. Senti seu olhar sobre nós no momento em que entramos. Além disso, eu sou um desgraçado alto demais para passar despercebido em uma sala, portanto, não havia dúvida de que ela tinha nos visto.
"Há algo errado", Moira afirmou antes de caminhar até onde Zya estava empoleirada.
Sem ter tempo de questioná-la mais sobre isso, eu apenas a segui conforme mantinha meus olhos fixos em Zya, que nos observava com cautela, avaliando nossas intenções.
Estávamos a poucos metros de onde ela estava quando ela soltou um guincho tão alto que quase me fez querer me encolher. Argh! Meus tímpanos sensíveis pareciam estar prestes a sangrar, mas eu sabia reconhecer um aviso quando ouvia um.
Moira parecia ter percebido o mesmo que eu, pois, assim que ouviu aquilo, ela parou no meio do caminho. Depois de me lançar um olhar rápido por cima do ombro, ela se virou para Zya.