Capítulo 55
1507palavras
2023-05-23 00:02
Ponto de vista de Xavier:
Sentei-me diante do lago reluzente com Magnus ao meu lado. Por mais belo e encantador que este corpo de água fosse, ele era mais perigoso do que aparentava. Um único mergulho poderia remover suas memórias daquele dia até gradualmente você perder todas as outras e se tornar uma folha em branco.
Ouvi histórias sobre curandeiros que costumavam usar aquelas águas em soldados de guerra que desejavam um recomeço e prisioneiros que queriam se consertar e também começar uma nova vida. Embora essa informação nunca tivesse sido confirmada, eu sabia que era melhor não duvidar. Afinal, o lago também havia sido estrategicamente colocado ao redor do palácio do rei a fim de pegar pessoas desavisadas, já que a verdadeira natureza daquelas águas era desconhecida para muitos.
Olhando fixamente para o lago, cada um de nós estava perdido em seus próprios pensamentos. Os acontecimentos desta manhã foram bastante agitados. Era difícil não se pegar pensando sobre eles. Na maioria das vezes, as pessoas só se importavam em fazer o que era melhor para elas, sem pensar em como sua escolha afetaria os outros ao seu redor. Normalmente, elas faziam isso de qualquer maneira, ignorando as consequências porque já haviam conseguido o que queriam e estavam felizes demais para se importar com qualquer outra coisa.
O caso de lorde Kallan era um exemplo clássico disso, mas de algum jeito, as pessoas se compadeciam dele, o que era compreensível. Afinal, ele só queria um filho, um herdeiro, e ele o quis por tanto tempo que acabou cruzando todos os limites para isso. O amor de um pai por seus filhos era algo tão poderoso que eles estavam dispostos a fazer tudo e qualquer coisa por sua prole. Foi isso o que Kallan fez. Era uma pena que tantas pessoas tivessem saído machucadas dessa história.
Não era nenhuma surpresa que esse ocorrido me lembrasse da minha própria mãe. Jamais poderia esquecer o quanto suas escolhas me afetaram. Em meio a sua fúria ensandecida e sede de vingança, ela perdeu mais do que havia barganhado. Eu queria acreditar que ela estava se afundando em sua própria culpa e, por isso, fechou-se para o mundo. No entanto, por mais que quisesse fingir que suas ações não me incomodavam, não conseguia. Doía saber que aquele vínculo que tínhamos quando eu era criança havia enfraquecido.
Conforme fui crescendo, comecei a analisar as atitudes dela e a cada ano que passava, minha raiva aumentava por conta do que aconteceu, mas também pelo que poderia ter sido. Apesar de ter perdido uma parte do meu irmão gêmeo, não o perdi completamente. Eu sempre teria um pedacinho dele comigo e esse era o meu único consolo. Era estranho como às vezes ainda conseguia senti-lo aqui e ali. Na maior parte do tempo, parecia que ele estava ao alcance de uma mão, mas o fato de nunca conseguir tocá-lo me frustrava. Inclusive, esse era um dos motivos que me levaram a sair de casa. Precisava de ajuda para descobrir mais sobre mim mesmo e estava certo de que encontraria as respostas que buscava.
Ainda assim, doía precisar fugir da minha família para poder viver minha própria vida. Não seria ruim ter o apoio deles para variar um pouco, mas não havia outro jeito. Nem sempre se podia ter aquilo que queríamos. Entretanto, eu sempre acreditei que independente do que o destino nos reserve, era possível traçar o nosso próprio caminho. Podia ser difícil, afinal, o destino iria resistir de forma impiedosa, mas quando a vontade era grande podíamos ser mais fortes do que ele, principalmente se nos dedicássemos a isso.
Ao sentir um toque suave no meu ombro, voltei ao momento presente e me virei para ver Magnus com um olhar de quem me conhecia muito bem.
"O quê?"
"Eu conheço esse olhar. Não vá por esse caminho agora. Estamos aqui para ter uma aventura e é isso o que vamos fazer. Deixe suas preocupações em casa e se divirta um pouco. Acho que fizemos uma boa ação hoje, portanto, estamos livres para explorar o restante deste reino."
"Por explorar, você quer dizer encontrar as mulheres certas para você."
"Ah! Você me conhece bem meu amigo..."
"Bom, você terá uma bela surpresa. Há todos os tipos de mulheres aqui. Sua mente frágil explodiria se tentasse imaginá-las."
"Pode mandar a melhor que eles têm então!"
Nós dois caímos na gargalhada enquanto nos levantávamos e abríamos caminho para a cidade, onde sempre havia algum tipo de celebração acontecendo.
A caminhada foi bem curta e, pela primeira vez, nenhum ser parou para olhar, sussurrar ou apontar para mim. Por mais que eu me destacasse entre eles, ninguém se importava ou ao menos não demonstrava isso, o que foi bastante revigorante por si só.
Começamos a nos aventurar pelas barracas de comida, ou melhor, eu comecei por lá, pois assim que me virei para perguntar a Magnus se ele gostaria de experimentar algum dos alimentos expostos, descobri que ele já havia me deixado. Pelo visto, tínhamos definições diferentes do que era comida. Após dar uma olhada rápida à minha volta, eu o encontrei com um grupo de ninfas, dando-lhe de comer na boca. Pelo olhar de felicidade em seu rosto, era seguro dizer que ele estava se divertindo muito.
Com uma pequena risada, balancei a cabeça e voltei a comer à vontade. Então, passei o restante da noite curtindo a festa conforme afastava algumas mulheres ousadas. As ninfas eram conhecidas por sua abordagem mais direta para conseguir os homens que queriam levar para a cama. Para a minha sorte — sim, estava sendo sarcástico —, elas não paravam de vir até mim, não importasse quantas vezes eu as rejeitasse. Nada era capaz de detê-las.
Embora soubesse que elas não tinham problemas em compartilhar a si mesmas e seus homens, nunca esperei receber propostas tão ousadas.
"Você deve ser novo aqui..." Uma delas me cumprimentou com um leve sorriso.
"Na verdade não, mas estou apenas de passagem", respondi, sorrindo de volta para ela.
"Meu nome é Naima. O seu?"
"Xavier."
"Você tem o físico de um gigante. Posso apostar que é algum tipo guerreiro... Certo ou errado?"
"Certo", confirmei com uma breve risada.
"Está decidido então. Eu quero bebês que se pareçam com você e que tenham um corpo igual ao seu para que possam se tornar grandes guerreiros. E se minha intuição estiver correta, eles terão grandes poderes também. Não estou procurando por um compromisso sério, apenas uma transa rápida. Não precisamos nos ver nunca mais."
"O quê? Espere, mas nós acabamos de nos conhecer. Na verdade, mal nos conhecemos..."
"Eu sei e isso só tornas as coisas mais fáceis. Pense nisso como uma noite de sexo casual. Um homem como você com certeza tem suas necessidades e deve precisar atendê-las com mais frequência do que a maioria."
"Por mais lisonjeado que eu esteja com o seu convite, eu não faço sexo casual. Além disso, tenho mais controle sobre as minhas necessidades do que a maioria dos homens, portanto, com todo o respeito, vou recusar o seu convite."
"Por quê? Por acaso, você tem algum fetiche específico? Bom, isso é fácil de se resolver. Minhas irmãs podem cuidar dessa questão", Naima argumentou. Sem me dar a chance de responder, ela chamou duas mulheres muito parecidas consigo mesma, que vieram para cima de mim antes que pudesse recusá-las.
"Oi, bonitão", elas cantarolaram.
"Oi, senhoritas... Antes que possam me fazer qualquer proposta escandalosa, eu não estou interessado. Sério, eu só vim aqui para relaxar e aproveitar as festividades."
"Acontece que nossa irmã está interessada em você e ela geralmente consegue o que quer. De um jeito ou de outro."
Deixando escapar uma risada, fiz meus olhos rodopiarem e brilharem. Ao vê-las ofegarem, soube que elas haviam entendido o recado. Ótimo. "É uma pena que eu também sempre consiga o que quero. Eu sei que acham que sabem brigar, mas vocês não viram o quão violento eu posso ser. Não recomendo que nenhuma de vocês me provoquem."
Ouvi um resmungo atrás de mim e, ao me virar, vi Naima batendo os pés com um beicinho adorável. "É por isso que eu quero você! Minha intuição nunca falha. Vamos, é só uma rapidinha!"
"Sinto muito, mas já pertenço a outra pessoa e, mesmo que eu quisesse, você não poderia ter um filho meu", expliquei com um sorriso triste antes de me virar e ir embora.
Não sabia dizer o quão longe eu fui, mas antes que me desse conta, a praça e as luzes da cidade já haviam ficado para trás há muito tempo. Parecia que eu havia caminhado até algum tipo de caverna. Conforme entrei nela, fiquei surpreso ao descobrir que o seu interior era muito maior do que eu imaginava.
A caverna estava limpa e tinha alguns suprimentos em um canto. Pelo cheiro, ninguém ia lá há algum tempo. Ao que parecia, eu tinha encontrado um lugar para passar a noite. Decido a voltar à cidade só pela manhã para buscar Magnus, preparei uma cama improvisada e tentei dormir um pouco.