Capítulo 33
1471palavras
2023-05-01 00:02
O dia da lua minguante...
Ponto de vista de Alfa River:
O dia que tanto esperei finalmente chegou. As últimas três semanas não foram nada fáceis. Primeiro, tentei procurar por pistas, mas não encontrei nenhuma, e quando finalmente me deparei com algo, vi-me em um beco sem saída.
Por mais que eu quisesse desistir, não podia. Eu havia feito uma promessa e estava decidido a cumpri-la.
Nas últimas semanas, Kaeden esteve tão quieto, que eu nem mesmo o ouvi gemer ou rosnar baixinho.
Minha imaginação também andava muito fértil, pois podia jurar que sentia algo se movendo pela casa.
Estranhamente, aquela presença me causava arrepios por todo corpo. Por um instante, desejei poder falar com alguém a respeito disso, mas reprimi esse pensamento.
Estavam todos pisando em ovos ao meu redor desde que descobriram que meu lobo e eu estávamos por um fio de perder o controle.
Eu não precisava que eles achassem que eu estava louco agora também e me internassem na ala psiquiátrica.
O volume de trabalho sempre crescente da alcateia era o que ocupava a maior parte do meu tempo. Só agora entendi que antes o trabalho parecia mais fácil porque Chaos dividia a carga comigo.
Na verdade, percebi que era ela quem fazia a maior parte do trabalho, deixando-me com bem pouco para fazer. Eram pequenas coisas como essa que me fizeram perceber o quão estúpido e egoísta eu tinha sido.
Se pudesse voltar no tempo, faria tudo diferente sem um pingo de dúvida ou hesitação.
Mas a pior parte dessas duas semanas ficaram a cargo de minha mãe e Tricia. Essas duas mulheres vinham agindo de forma muito estranha, o que me levantou algumas suspeitas.
Antigamente, elas se sentavam juntas e conversavam por horas, mas agora passavam a maior parte do tempo discutindo e trocando insultos, além de rosnados. Isso quando não ignoravam completamente a presença uma da outra, embora estivessem na mesma sala.
Apesar de muitos de nós agirmos como se estivéssemos alheios a situação, na verdade, estávamos de olho em tudo como falcões, Kiara mais do que qualquer outra pessoa.
Eu queria tanto que Tricia entendesse o recado e me deixasse em paz.
Sim, nós tivemos algo no passado, mas acabou e não voltará a acontecer de novo. Não a desejo mais hoje do que no em que a expulsei da minha casa. Só queria que ela entendesse isso também e parasse de tentar se enfiar na minha cama a cada brecha que encontrava.
O mais engraçado foi ouvi-la questionar sobre sua posição de luna.
Dava para imaginar? Sua posição de luna?
Minha mãe e eu rimos disso por horas a fio. Aquela garota estava se perdendo em seus próprios delírios.
Durante as últimas semanas, também percebi uma mudança muito grande em Kiara e não fiquei nem um pouco confortável com isso.
Ela andava sempre com uma carranca no rosto e só sorria quando Matthews estava por perto. Mesmo assim, não chegava a ser um sorriso radiante e sim apenas um leve erguer de lábios.
Evitei dar minha opinião por dois motivos. Um, ela não havia sido solicitada e, dois, seu companheiro não parecia incomodado com isso.
Ultimamente, Kiara parecia com tanta raiva e inquieta que ela passava horas correndo pelo território da alcateia ou socando um saco de pancadas para ficar mais calma.
Por causa dela, consertamos a academia mais vezes nas últimas semanas do que havíamos feito em anos. No entanto, eu nem sequer podia reclamar, pois ela pagou por todos os danos. Só não conseguia entender porque ela não ligou para o seu tio vir consertar.
Assim que amanheceu, saí de casa para fazer minha caminhada habitual, já que meu lobo não me deixava mais mudar de forma. E andar pela floresta sempre foi algo que acalmava a nós dois.
Entretanto, mal havia saído e já precisei parar no meio do caminho com o que vi.
Seres com olhos vermelhos brilhantes e pretos de obsidiana se movimentavam em torno do campo vazio, arrumando tudo para hoje à noite. Tal visão me deixou com os nervos à flor da pele.
Como não havia tantos deles no funeral, acreditei que a lua minguante devia ser mais importante para eles do que pensava.
Fiquei de pé ali, pensando em como perguntá-los sobre o que estavam fazendo em minhas terras sem meu consentimento quando Kiara se aproximou. Ver um rosto familiar me acalmou um pouco.
"River", ela me cumprimentou friamente. Ela nunca me chamava de alfa.
"Kiara", respondi no mesmo tom.
"Peço desculpas por não ter te avisado antes que meu povo estaria aqui. Já era tarde quando me lembrei disso e você já tinha ido dormir, então, resolvi esperar amanhecer."
"Sem problemas, mas não é um pouco cedo para começar os preparativos?"
"Não. Eles já esperaram três longas semanas e, para as pessoas do meu reino, isso é tempo demais.
"Além disso, certos preparativos só podem ser feitos à primeira luz da manhã. O restante pode ser providenciado normalmente com o avançar do dia até o sol se pôr, que é quando a verdadeira diversão começa."
"Tá. Os membros da alcateia ficarão curiosos. Eles vão poder participar do que quer que esteja acontecendo?"
"Claro que sim. Antes de todos acordarem, serão montadas barracas, vendendo comidas exóticas, joias, armas, roupas e muitas outras coisas além do que eles podem imaginar.
"Avise a todos quando acordarem para aproveitarem ao máximo o dia e diga que meu povo não quer o dinheiro deles, mas eles fazem trocas de mercadorias."
"Vou avisá-los. Bom, agora, eu já vou indo."
"Está bem." Ao ouvir isso, passei por ela e segui em direção à floresta.
Assim que fui envolvido pela calmaria da natureza, um suspiro de contentamento deixou os meus lábios enquanto escutava os passarinhos cantarem.
Conforme as árvores acordavam, os animais corriam atrás de seu café da manhã sem nenhuma preocupação com o mundo.
Gostaria que minha vida fosse tão fácil e simples pelo menos uma vez. Todavia, esse era um sonho impossível.
Quanto mais eu adentrava a floresta, mais calmo ficava. Eu podia sentir meus músculos tensos relaxarem a cada passo que eu dava.
Quando foi que a vida ficou tão difícil?
Estava tudo bem em um segundo, mas de uma hora para a outra, as coisas ficaram feias. Muitas pessoas haviam sido feridas nos últimos meses e não podia deixar de sentir que eu tinha uma boa parcela de culpa nisso.
Em minha busca egoísta, machuquei tantas pessoas e ultrapassei todos os limites com a minha companheira. Agora, eu estava pagando o preço.
A imensa culpa e solidão que eu sentia não melhoravam. Pelo contrário, elas só pioravam com o passar dos dias.
Em certos momentos, eu queria acabar com tudo, mas quando olhava à minha volta e via todo mundo que eu machucaria com isso, desistia.
A verdade era que eu só queria uma morte fácil para escapar do tormento que se tornou minha vida.
Minha vida parecia vazia e sem propósito. Eu não estava mais vivendo, apenas existindo. Essa era a parte mais triste e patética da minha situação.
Ao me sentar sobre uma pedra, fechei os olhos e esvaziei minha mente, permitindo-me mergulhar na paz e serenidade temporária da floresta.
Eu ainda estava em meditando quando ouvi um farfalhar de folhas e senti a presença de algo que não consegui identificar.
Virando-me rapidamente, gritei em choque ao me deparar com uma fênix em chamas, que voava sem tirar os olhos de mim.
Até hoje, sempre achei que elas eram apenas um mito, uma criatura extinta. No entanto, algo nos olhos dela me chamaram a atenção.
Havia algo familiar neles, mas não consegui apontar onde eu poderia ter visto algo semelhante.
Em seguida, a fênix voou para mais perto de mim. Em um ato reflexo, eu dei um passo para trás e assisti hipnotizado conforme ela abria suas asas que queimavam mais ardentemente do que qualquer chama que já tinha visto antes. Ainda assim, a floresta à sua volta continuava intacta.
Suas chamas acariciavam o espaço como se estivessem conversando com ele.
Num piscar de olhos, a fênix estava pairando bem na minha frente. Tropecei para trás em choque, apenas para bater em uma maldita árvore.
Podia jurar que vi um lampejo de diversão em seus olhos, mas talvez tenha sido só minha imaginação. Afinal, como isso seria possível?
Só a Deusa saberia dizer por quanto tempo nós nos entreolhamos antes de eu estender uma mão trêmula para tocar em suas asas.
Mais uma vez, fiquei em choque quando minha mão atravessou o seu corpo não sólido.
Embora parecesse que estivesse tocando em lava quente, não me queimei. Contudo, o formigamento que percorreu o meu corpo deixou minha mente ainda mais confusa do que já estava.
O que di*bos estava acontecendo?
Meu dia mal tinha começado e eu já havia me assustado para uma vida inteira.