Ponto de vista de Alfa River:
Fiquei ao lado do carro, observando minha companheira sair do seu campo de treinamento. Ela parecia incrivelmente deliciosa e perigosa. Era como se eu estivesse diante de uma deusa.
Os rapazes realmente não estavam brincando sobre os trajes e as armas de alta tecnologia. Kiara tinha algumas acopladas nela, sem falar que ela também parecia um espetáculo de tão incrível.
Claro que eu jamais diria isso a ela, que era arrogante demais para o seu próprio bem. Não seria eu que iria alimentar o seu ego.
Quanto a Chaos, não consegui olhar para ela por muito tempo, pois isso me fazia lembrar de tudo o que eu havia arruinado.
Sinceramente, não sabia o que fazer para corrigir meus erros, mas tinha certeza de que faria de tudo que fosse mortalmente possível para pelo menos compensar a dor que lhe causei e ainda estou.
Ao contornar o carro, abri a porta traseira para ela e, depois que ela se acomodou, voltei para o outro lado, onde me sentei.
A viagem de carro foi bastante silenciosa, embora não tão tensa, ao que eu fui enormemente grato. Nenhum de nós falou nada.
No entanto, o vínculo era algo totalmente diferente. Eu podia senti-lo vibrar e acordar como se antes ele estivesse apenas hibernando.
Pela primeira vez em dias, pude ouvir Kaeden latir alegremente no fundo da minha mente. Quando o perguntei o motivo, ele me disse que estava conversando com Havoc e que eles entraram em um consenso diante a tudo o que havia acontecido.
Deixei ele ter seu merecido momento de privacidade. Afinal, ele não deveria ter que sofrer pelos meus erros.
Foi apenas porque eu insisti muito que ele passou a tolerar e até a gostar de Tricia, portanto, se eu não podia ter Chaos, isso não significava que meu lobo não devesse ficar com Havoc.
Estava feliz que Havoc havia decidido dar mais uma chance a ele. Sabia que eu já era uma causa perdida e demoraria um bom tempo para eu cair nas boas graças de Chaos e sua loba novamente.
Deixando-me levar por esses pensamentos, em pouco tempo, eu já estava cochilando. Por mais que Kiara tivesse me curado, sabia que não havia sido completamente.
Eu ainda sentia muita dor e também percebi que tinha marcas de chicote nas minhas costas, um presente do meu sogro para mim.
Isso explicava os pesadelos terríveis que vinha tendo. Eu condenei a mim mesmo e, embora nunca fosse admitir isso em voz alta, estava morrendo de medo.
Estava aterrorizado com o que o futuro me reservava, sem falar no que podia acontecer comigo e minha companheira.
No entanto, havia uma pergunta que me tirava o sono todas as noites. Será que algum dia seríamos capazes de ser como deveríamos ter sido?
Dois companheiros felizes?
Às vezes, tinha um pouco de esperança, mas, então, eu me lembrava da expressão no rosto de Chaos quando esteve na minha sala de conferências e qualquer esperança desaparecia.
**********
De repente, acordei com uma leve sacudida e, pela sensação de formigamento na minha pele, sabia que havia sido minha companheira.
Quando abri os olhos, o carro já estava vazio. Então, olhei à minha volta apenas para perceber que havíamos chegado ao local que aconteceria a conferência dos alfas.
Endireitando meu terno de três peças, saí do carro e caminhei em direção à minha companheira que estava no telefone em frente ao veículo.
Pelo que pude entender, ela conversava com o seu tio. Ao me aproximar, estendi meu braço, o qual ela agarrou sem dizer uma palavra.
Juntos, caminhamos até a entrada com Matthews e Kiara a um passo atrás de nós. No momento em que entramos no prédio, meus ouvidos foram invadidos pela conversa alta dos alfas, seus betas e lunas, o que começou a me provocar uma horrível dor de cabeça.
No entanto, assim perceberam nossa chegada, a conversa alta deu uma diminuída conforme todos os olhares se voltaram descaradamente para nós. Isso me deu nos nervos.
Antes que eu pudesse abrir a boca para trocar gentilezas desnecessárias, um deles falou:
"Nossa, que filé! Eu não me importaria de tê-la se contorcendo debaixo de mim de prazer."
Mal ele havia terminado de falar quando um som sibilante cortou o ar. Olhei em volta rapidamente e não fiquei surpreso ao ver Lionel, o alfa da alcateia Lua Vermelha, com uma adaga muito familiar cravada em seu ombro esquerdo.
Isso não me surpreendia em nada, pois aquele idiota não era só desrespeitoso. Ele também era desleal e cheirava muito mal.
Ao analisar minha companheira, percebi que uma das muitas adagas que ela tinha acopladas em seu traje estava faltando. Eu permaneci em silêncio.
Sem dizer uma palavra ou perder a compostura, ela caminhou calmamente em direção às mesas vazias e eu logo estava atrás dela para lhe puxar uma cadeira.
"Quem diabos jogou essa faca?" Lionel rosnou de raiva.
"Fui eu", Chaos respondeu calmamente ao encará-lo com um de seus olhares fulminantes.
"Sua v*dia de merda! Quem você pensa que é? Você faz ideia de quem eu sou?" Ele cuspiu.
Um grunhido raivoso escapou da minha garganta, mas antes que pudesse me mover, Kiara já estava na frente dele.
Um som alto ecoou por toda sala quando sua mão estalou no rosto dele. O tapa foi tão forte que a cabeça de Lionel chegou a virar para o outro lado. Foi como se ele tivesse levado uma chicotada.
Novamente, ele gritou e todos nós vimos quando outra adaga voou pelo ar, perfurando seu ombro direito.
"Insulte-me mais uma vez e juro por todos os deuses que vou cortar sua língua e decorar o resto do seu corpo com mil adagas antes que você possa piscar os olhos", Chaos avisou em um tom monótono.
O alfa ferido se encolheu diante a ameaça dela. Chaos, por sua vez, não pôde deixar de sorrir ao ver um vislumbre de medo passar por seus olhos antes de desaparecer.
Na verdade, todos nós vimos isso. Por vários motivos, continuei quieto, mas estava surpreso que ninguém tivesse ido ao socorro de Lionel, nem mesmo seu próprio beta. Sem dúvida, deviam estar todos de saco cheio das besteiras dele.
Com um suspiro exasperado, Lionel levantou a mão para tirar uma das adagas apenas para recuar com outro grito.
Nunca pensei que ele fosse o tipo de pessoa que gritasse tanto, mas as aparências podiam enganar. Diverti-me ao assistir ele ofegar pela dor intensa que atravessava o seu corpo enquanto estudava as adagas.
Não fazia ideia do que ele tinha visto, mas seus olhos se arregalaram de repente antes de se voltarem para os irmãos mais velhos de Chaos, que tinham acabado de chegar. Eles se revezaram para beijar a bochecha e a testa dela.
Então, seguraram meu ombro em um gesto que, para quem estava de fora, poderia parecer inofensivo, mas não foi o caso. Eles deslocaram meu ombro e o encaixaram de volta enquanto tudo o que me restava a fazer era sofrer calado.
"Quem é você, mocinha?" Perguntou o alfa mais velho entre nós, Calder da alcateia Poeira Estrelar, que assistia toda a cena com um olhar preocupado.
O sorriso sinistro que apareceu nos lábios de Chaos fez um arrepio indesejado correr pela minha espinha. E pela forma como os demais na sala se mexeram desconfortavelmente em seus assentos, tive certeza de que eles sentiam o mesmo.
Claro, com exceção de Kiara e os irmãos de Chaos, que riam como se estivessem assistindo a um espetáculo de comédia. Eles não eram capazes de entender a nossa angústia.
"Estou surpresa que vocês ainda não tenham descoberto, mas já que insistem tanto que eu me apresente, eu sou a Alfa Chaos da alcatéia River de Prata e filha da Alfa Celeste Chaos da alcateia Chaos da Meia-noite", ela respondeu friamente.
"Alfa? Filha de Celeste? River, por favor, explique isto", Nigel, o alfa da alcateia Lua Azul, exigiu em um tom ameno.
Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, fui interrompido outra vez. Será que eles não percebiam que a pergunta havia sido feita para mim?
"Ela realmente é filha da nossa mãe e nossa irmãzinha. Além do mais, ela usa esse título, pois tem sangue de alfa correndo em suas veias, o que lhe dá todo o direito de reivindicá-lo, embora já tenha acasalado com Alfa River", Lucien esclareceu.
"E desde quando Alfa Celeste tem uma filha? Por que nunca fomos informados disso?" Nicholai, alfa da alcateia Chama Flamejante, indagou.
"Eu não sabia que minha mãe deveria relatar toda vez que tr*nsa, engravida ou dá à luz.
"A maioria de vocês nesta mesa zombou quando ela foi nomeada alfa após a morte do nosso pai só porque ela é uma mulher.
"Vocês não deram a mínima para nossa mãe até que ela os derrubou de seu pedestal. Então, por favor, diga-me por que ela contaria a vocês que teve uma filha?
"Uma mulher, assim como ela. Para que vocês pudessem destruí-la antes mesmo que ela aprendesse a distinguir o certo do errado? De jeito nenhum", Luke concluiu, calmo até demais.
"Alguns aqui podem não se importar com sua família, Luke, mas não é o meu caso, nem do meu companheiro. Você sabe que Celeste é uma grande amiga minha", Simona, companheira de Nicholai, respondeu.
"Nós sabemos, Simona, mas você entendeu o que queremos dizer", Lucien disse suavemente.
"Durante anos… não ficamos sabendo de nada. Ouvimos rumores, o nome dela e só, mas nunca vimos uma fotografia sequer. E depois de tanto tempo, quando a vejo pessoalmente, nem faço ideia de quem ela seja", murmurou Nadia, companheira de Calder, com lágrimas nos olhos.
Pude ver o olhar da minha companheira suavizar um pouco diante disso. Então, com um suspiro, arrisquei e apertei o joelho dela por baixo da mesa.
Para a minha surpresa, ela apertou minha mão de volta. Pela primeira vez, senti que ela havia aberto o canal de comunicação através do nosso vínculo. Precisei morder meu lábio inferior para me impedir de ofegar.
"Toque em mim de novo e cortarei seus dedos", ela avisou, virando-se para me encarar.
Eu estava feliz demais para me importar com sua rejeição escancarada.
Ignorando-a, dei-lhe um sorriso leve antes de me esticar para deixar um beijo em sua testa.
"Sinto muito, querida", respondi suavemente antes de fechar eu mesmo o canal de comunicação.
Talvez fosse melhor assim.