Capítulo 18
2218palavras
2023-04-18 11:38
Caminhamos em direção ao complexo, onde a lua podia ser vista em seu ponto mais alto. Foi então que a cerimônia começou.
Quando a música parou, minha mãe começou disparar ordens sobre como devíamos nos sentar.
Eu e meu companheiro seguimos até a frente. Assim que tirei meu manto, sentei-me no chão gentilmente e observei o homem ao meu lado repetir meus movimentos.
Kiara e Matthews se sentaram à nossa direita com Jeremiah e Stephanie à esquerda.
Os demais casais acasalados foram preenchendo os espaços vazios, assim como seus filhos, até formarem um círculo ao nosso redor. Esse processo continuou até que todo terreno estivesse coberto.
Minha mãe fez o discurso tradicional e depois contou a todos o que estava prestes a acontecer.
Então, uma faca foi entregue ao meu companheiro, que fez um corte em ambas as mãos antes de entregá-la para mim.
Como era o costume, também cortei minhas palmas e passei a faca adiante. Em seguida, juntei minha mão esquerda à dele e a direita à de Kiara. O processo se repetiu dessa forma até chegar no último lobisomem.
Era possível sentir o novo vínculo se formando através das nossas mãos unidas pelo sangue. Eu podia ouvir os gemidos dos membros da alcateia conforme a conexão se tornava mais intensa.
Seus gemidos logo se transformaram em gritos. Eu sabia exatamente o que estava acontecendo porque já passei por isso milhares de vezes na minha alcateia de nascença.
Seus antigos laços estavam se desfazendo e se reconstruindo novamente. Este era um vínculo de sangue, portanto, quebrá-lo era como uma sentença de morte para si próprio.
Uma vez que a gritaria acalmou, minha mãe começou a entoar uma canção, então, as vozes de todos os meus ancestrais surgiram.
Eu podia ouvir a voz do meu pai ecoar sobre as demais vozes.
Tanto eu quanto todos os meus parentes de sangue, podíamos ouvir exatamente o que nossos ancestrais diziam e, por mais que estivessem abençoando nossa união, nem todos estavam felizes com ela.
Para o restante da alcateia, tudo o que se ouviu foram rugidos, murmúrios e relâmpagos.
Eu e Kiara sentamos eretas quando nossos pais desceram para a Terra. Não conseguimos conter as lágrimas que começaram a rolar pelos nossos rostos no instante em que os vimos.
A vinda deles para a Terra fez com que alguns membros da minha alcateia choramingassem. Embora não pudessem vê-los, podiam sentir sua forte presença.
Minha mãe fungou quando meu pai a envolveu com sua presença. Ao mesmo tempo, o pai de Kiara foi diretamente até sua filha e seu companheiro.
Depois de dar um beijo suave na testa de sua filha e enxugar as lágrimas dela, ele se virou para Matthews.
Ele murmurou um feitiço e não demorou muito para Matthews soltar um suspiro de surpresa ao conseguir ver o mesmo que nós.
Ele soluçou quando seus olhos encontraram as íris negras do pai de sua companheira.
"Bem-vindo à família, filho. Cuide bem da minha filha ou então..." O pai de minha prima o ameaçou antes de deixar um de seus dedos correr sobre o ombro de Matthews.
Imediatamente, o brasão de nossa família começou a se desenhar sobre a sua pele. Não fiquei surpresa ao ouvi-lo gritar de dor, porém, esta era uma demonstração clara que ele havia conseguido a aprovação do pai de Kiara e de toda nossa família.
Meu companheiro também teria recebido a aprovação da minha família se fosse uma pessoa melhor, mas agora não adiantava mais chorar pelo leite derramado. Ele simplesmente havia perdido sua única chance.
Apesar de saber que a dor não era algo necessário, nossa família sempre foi muito sádica. Sinceramente, sadismo era o nosso nome do meio.
Nós não conseguíamos evitar. Antes de sair, meu tio se virou para mim e me deu um sorriso triste antes de beijar minha testa e desaparecer.
Ao me virar para o meu pai, encontrei-o já parado à minha frente com um sorriso melancólico no rosto.
Eu sorri de volta para ele. Eu teria lhe dado um abraço se não arriscasse quebrar o vínculo que ainda estava se formando.
Novas lágrimas brotaram em meus olhos enquanto observava os dele também lacrimejarem. Meu pai raramente chorava. Talvez eu fosse mesmo a filhinha do papai ou apenas a favorita entre meus irmãos.
"Papai", eu disse com a voz trêmula.
"Minha joia... Perdão. Sinto muito por não poder evitar a dor que te fizeram passar e a que está prestes a sofrer."
"Não precisa pedir perdão. Isso não é sua culpa."
"Eu sei, mas gostaria que houvesse algo que eu pudesse fazer. Você não merece passar por isso."
"Eu sei, pai, mas este é o meu destino e não há nada que você ou eu possamos fazer."
"É isso que me dói mais. Seja forte, meu bem, e saiba que estou apenas a uma ligação de distância."
"Eu sei... Eu te amo, papai."
"Eu também te amo, minha pequena Khione."
"Não sou mais pequena, papai."
"Infelizmente, eu sei disso, mas para mim, você sempre será a minha garotinha. Agora, preciso ir. Vejo você em breve."
"Cuide-se, papai."
"Você também, Khione, e seja forte. Lembre-se de quem você realmente é."
Com essas últimas palavras, meu pai se foi mais uma vez, dando início a próxima etapa da cerimônia.
A lua estava brilhando ainda mais forte do que antes. Dava para sentir a luz penetrar os poros de nossas peles, promovendo uma sensação de relaxamento e prazer.
Eu podia ouvir vários suspiros de alívio e gemidos de prazer até minha mãe decidir que já havia sido o suficiente e encerrar a cerimônia.
Senti o momento exato em que a tatuagem do ritual começou a se desenhar no meu pulso. Ao olhar para ela, meu coração se partiu com o que vi.
O certo deveria ser dois lobos entrelaçados a ponto de não dar para saber onde um começava e o outro terminava, mas na minha tatuagem os lobos se encontravam de costas um para o outro.
Enquanto o brasão da minha família podia ser visto em cima de um dos lobos, o emblema da alcateia estava sobre o outro lobo, que acreditei pertencer ao meu companheiro. Entre eles, havia uma chama ardente e um raio no topo.
Isso era desastroso.
Essa separação não deveria existir, pois devíamos ser uma só carne.
Juntos.
No entanto, meu companheiro teve a ideia genial de arruinar tudo.
Quando ouvi os comentários animados e admirados dos membros da alcateia, só pude rir amargamente.
Eles não faziam a menor ideia da abominação que carregavam em seus pulsos, e tudo graças ao seu alfa.
Mas era melhor desse jeito. Ninguém sabia o significado desta tatuagem, exceto minha família e eu, e ia continuar assim por mais algum tempo.
Por enquanto, iria apenas deixá-los desfrutar da primeira tatuagem sem dor de suas vidas.
Sentindo Kiara apertar minha mão, apertei a dela de volta porque agora o acordo estava selado. Seria assim até que a morte nos separasse.
Permaneci sentada em silêncio, ignorando a algazarra que meu companheiro fazia sobre a tatuagem em seu pulso enquanto eu ouvia entorpecida minha mãe encerrar a cerimônia.
Assim que ela disse suas últimas palavras, levantei-me e fui direto para o lado dela, já que não queria ficar perto do meu companheiro.
Ou iria acabar o matando.
Kiara se juntou a nós logo em seguida. Ao mostrar para a minha mãe a tatuagem no meu pulso, ela não comentou nada e apenas me abraçou conforme sussurrava palavras de conforto em nossa língua nativa. Mais uma vez, não pude conter as lágrimas que rolaram pelo meu rosto.
Podia sentir uma parte de mim morrendo por dentro e, por mais que tentasse me controlar, não consegui. De repente, senti um frio repentino, que se seguiu por um enorme vazio.
Chamei minha loba e ela ainda lá, tal como um outro lado que possuía. Então, por que sentia esse vazio?
Pensando nisto, tentei uma abordagem diferente. Pensei na minha família e, embora ainda os amasse, o sentimento não era tão avassalador como sempre foi. Estava lá, mas de uma forma mais amena.
Em seguida, arrisquei pensar no meu companheiro e me surpreendi ao perceber que não sentia nada, apesar do vínculo ainda existir.
Estava vivo e forte, mas não conseguia sentir nada. Nenhuma emoção surgiu, nem mesmo raiva.
Só então as peças começaram a se encaixar, embora eu não quisesse aceitar. Se eu seguisse esse caminho novamente, não seria um perigo só para mim, mas para todo ao meu redor.
Entretanto, não havia nada que eu pudesse fazer. Ao concentrar meus pensamentos nos membros da alcateia através do vínculo que agora compartilhávamos, mesmo sentindo o quanto me respeitavam e me amavam, isso não fez nada por mim.
Não havia nenhum sentimento de orgulho ou satisfação. Nada. Tudo o que sentia em relação a eles era um senso de responsabilidade e só.
Meus joelhos vacilaram quando percebi o que estava acontecendo, mas antes que pudesse cair no chão, minha mãe me amparou e me pegou em seus braços.
Eu escutei meu companheiro dizer algo, mas não pareceu fazer sentido. Na verdade, eu não conseguia entender nada do que ele ou qualquer um estava dizendo.
Tudo aconteceu muito rápido. Quando dei por mim outra vez, estava sendo colocada sobre algo macio, que deduzi ser uma cama. Então, parei de lutar comigo mesma e permiti a escuridão me envolver conforme cedia ao cansaço.
Ponto de vista de Alfa River:
Sentei-me ao lado da minha companheira enquanto a observava dormir. Kiara e sua mãe estavam tão agitadas que precisaram sair para correr e se acalmar.
Quando perguntei o que tinha acontecido com Chaos, a única resposta que obtive foi que havia sido estresse, mas pelo jeito que Kiara e Celeste agiam, não parecia ser só isso.
Segurei a mão da minha companheira apenas para soltá-la imediatamente. Ela estava tão fria quanto gelo. Diante disso, gritei pelo médico, que rapidamente chegou para examiná-la.
Em seguida, deixei o quarto para dar espaço ao médico para que ele pudesse fazer seu trabalho adequadamente.
Matthews estava chegando enquanto eu andava de um lado para o outro em frente a porta. No entanto, ele não me dirigiu o olhar.
Eu continuei o encarando, mas ele ainda se recusou a me dar atenção. Embora eu tivesse persistido, mais tarde desejei não ter feito isso, pois o olhar que recebi dele foi de puro desgosto e ódio, fazendo-me recuar em choque.
Eu estava prestes a perguntar o que estava acontecendo quando Tricia surgiu e correu para os meus braços.
"Ela esta bem?" Ela perguntou de forma neutra.
"É muita cara de pau sua vir até aqui perguntar isso, Tricia! Logo você que ajuda o companheiro dela a traí-la e fazê-la de boba. Mesmo sabendo que ela está doente, você não tem a decência de mostrar ao menos um pouco de respeito a ela. Chaos está atrás desta porta enquanto você está aqui fora se esfregando no companheiro dela e fingindo estar preocupada. Eu tenho nojo de vocês dois e espero que estejam prontos para o que está por vir", Matthews cuspiu antes de abrir a porta e entrar no quarto.
Eu podia ouvi-lo trancando a porta atrás dele. Imediatamente, soube que ele não me deixaria entrar mesmo que eu implorasse.
Ao me virar para Tricia, percebi que ela me encarava de um jeito estranho. Só então me lembrei que ela não estava na cerimônia da minha companheira.
"Onde você estava? Não te vi durante ou depois da cerimônia."
"Não estava com vontade de participar, então, saí e fiquei em campo neutro até acabar."
"Como é que é? Você tem noção do que fez? Você simplesmente a recusou como sua luna e a desrespeitou da pior maneira possível. O que estava pensando, Tricia?"
"O quê? Você não achou que eu me submeteria a ela, achou? Eu simplesmente não consigo fazer isso."
"Você ao menos sabe o que aconteceria se ela ou outra pessoa descobrisse?"
"O que poderia acontecer? Além do mais, ela não vai saber de nada. Ela é completamente alheia a tudo que acontece à sua volta. Tenho certeza de que ela não notou a minha falta, assim como não percebeu o relacionamento que tenho com você."
"Você está brincando com fogo, Tricia Bennett. Não sei o que deu em você."
"Não foi nada. Eu só acordei para a realidade e me dei conta de que não posso ficar de braços cruzados e aceitar ser sua amante pro resto da vida. Eu quero você e tudo o que vem com isso, inclusive o título."
"Você enlouqueceu? Será que não percebeu que a última etapa da cerimônia aconteceu horas atrás? Ela é minha companheira!"
"E eu sou completamente apaixonada por você. Antes você não se importava com sua companheira e pouco se importava se ela aparecesse em sua vida, então, não venha com isso agora.
"Você já está enterrado demais nessa história para parar. Apenas reze para que sua companheira nunca descubra nada. Agora, se me dá licença, preciso ajudar os outros pacientes."
Em seguida, observei Tricia se virar e ir embora sem reação. Ainda estava sob efeito de choque por conta dos últimos acontecimentos. 
Primeiro, minha companheira passou mal, depois Kiara e Celeste me deram uma desculpa qualquer e meu beta me tratou de forma fria. Por último, Tricia parecia ter enlouquecido. O que aconteceria a seguir?