Capítulo 14
2066palavras
2023-04-17 15:33
Chegou o dia da cerimônia para selar a união entre Alfa River e Chaos. Dizer que a alcateia estava feliz seria um eufemismo. As pessoas estavam em êxtase, pois este era um evento único na vida de um alfa. As bençãos recebidas neste dia costumavam impactar o resto de suas vidas.
De bom humor, Alfa River não pôde deixar de comemorar à sua maneira. Ele passou a maior parte do dia com os amigos e membros de alto escalão de sua alcateia na sala de conferências enquanto se divertiam e relembravam os velhos tempos.
Chaos, por sua vez, trancou-se no quarto, tentando evitar a todos o máximo que pôde. Já Kiara ficou com Hefesto, que havia começado a construir a nova casa da jovem luna.
Um sorriso apareceu no rosto de Chaos quando se lembrou da ligação que recebeu de Hefesto assim que ele partiu.
Ele lhe dissera: "Princesa, sinto muito por aquele idiota ser seu companheiro. Nem sei porque seu pai ainda não fez nada a respeito. Sinceramente, não entendo como você aguenta ser traída dessa forma. Fiquei apenas alguns minutos na presença dele, mas cada palavra e sorriso que ele dava, aumentou minha vontade de socá-lo. Então, lembrei que você tem planos muito mais cruéis do que os meus para ele. Agora, só me resta ter paciência e esperar quando a hora dele chegar."
Chaos não pôde deixar de rir. Embora seu tio não gostasse de violência, ele concordou e até aceitou participar de seu plano, o que mostrava o quanto ela significava para ele. Hefesto era um homem de poucas palavras e não demonstrava muitos sentimentos, portanto, momentos raros como este deviam ser valorizados.
Entretanto, ao se lembrar do que testemunhou na noite anterior, o sorriso de Chaos rapidamente desapareceu. Ela tinha ouvido a conversa entre seu companheiro e o pai dele, e ficou feliz que pelo menos uma pessoa via o quão absurdo era o que Alfa River e sua amante estavam fazendo.
Seu coração já gelado endureceu ainda mais quando ela viu o descaso de seu companheiro diante a situação. Ela não pediu por aquele laço que os unia, muito menos para ser tratada como lixo.
O que ele estava fazendo com ela era errado em muitos níveis. Ele feriu sua integridade ao não dar a ela o devido valor, além de fazê-la de boba com sua mentira premeditada. Isto era uma total falta de respeito com a posição que ela ocupava na alcateia. Era um abuso tanto emocional quanto psicológico da parte dele.
Embora ela sempre tivesse tido total controle sobre suas emoções, quando ouviu toda aquela asneira saindo da boca de seu companheiro, ela não conseguiu conter as lágrimas que escorreram tão dolorosamente pelo seu rosto.
Sua loba, Havoc, choramingava, inquieta, desde ontem. A dor de ser rejeitada pelo próprio companheiro estava fazendo com que ela definhasse. Apesar de Kaeden ter tentado contatá-la algumas vezes, ela simplesmente o bloqueou.
Chaos havia se decidido, assim como sua loba. Elas fariam seu companheiro pagar muito caro por aquela afronta e era melhor ele se preparar para o que viria.
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Ponto de vista de Chaos:
Ao cair da noite, senti como se milhares de aranhas se rastejassem pelo meu corpo, tanto por dentro quanto por fora. Mais cedo, minha mãe me ligou para confirmar se eu queria mesmo seguir em frente com a cerimônia e, quando respondi que sim, ela me disse algumas palavras de incentivo antes de recomendar que eu a ligasse caso algo desse errado.
Através do tio Hefesto, ela me mandou um vestido, o qual eu amei, embora não estivesse nem um pouco animada para esta noite. O tecido era branco rendado, de algodão. A sensação na pele era divina.
Com mangas que iam até os pulsos, o decote frontal do vestido fornecia uma visão espetacular da curva dos meus seios enquanto o tecido se moldava ao meu corpo, valorizando minhas curvas, além de deixar à mostra as tatuagens nas minhas costas e pescoço.
Dos meus quadris, duas fendas longas exibiam minhas pernas. Eu estava mesmo vestida para matar. Minha mãe realmente se superou.
Sentada de frente para o espelho, tentei acalmar meus nervos agitados. Assim que acabei de passar um batom vermelho e um pouco de rímel nos cílios, Kiara entrou no quarto com um leve sorriso no rosto.
Ela usava um vestido bege semi-transparente, que também tinha duas fendas, uma de cada lado. Embora o tecido agarrasse bem seus seios, ele era mais soltinho do que o meu, fluindo até seus pés. Por fim, observei que seus cabelos estavam modelados em cachos soltos.
Diferente do meu, seu vestido não tinha mangas, deixando à mostras as tatuagens em seus braços, inclusive algumas era iguais as minhas. Quando ela se virou para trancar a porta, consegui ver a parte de trás da sua roupa.
Suas costas estavam nuas até a cintura, onde o tecido voltava a cobri-la. A fênix negra circulando o brasão da nossa família se encontrava exposta, ocupando quase toda a pele à mostra. Eu sabia que minha prima se orgulhava de exibi-la, assim como eu sempre que tinha a oportunidade. Podíamos não pertencer a uma família normal, mas o mais importante era que apoiávamos uns aos outros.
Sorri de volta para ela e peguei o pente, apenas para tê-lo arrancado de minhas mãos. Então, Kiara se posicionou atrás de mim e começou a operar um milagre no meu cabelo.
"Tem certeza que quer fazer isso, Khione?" Kiara me perguntou após um momento de silêncio. Ela havia usado meu primeiro nome para que eu soubesse o quão sério ela falava.
"Sim, Kiara. Não estou fazendo isso pelo meu companheiro, mas pela alcateia. Depois de hoje, ela será minha responsabilidade também. Não posso simplesmente dar as costas e ir embora", murmurei.
"Pode contar com meu apoio, minha amiga. Quando chegar a hora, apenas sorria e finja que está tudo bem. Tenho certeza que vai acabar antes que perceba."
"Creio que sim. Só não sei como vou reagir quando chegar o momento de acasalar. Acho que não vou aguentar."
"Eu sei, mas tenho certeza que o vínculo entre vocês tornará as coisas mais fáceis. Acredite em mim, quando entrarem no clima, todo o resto desaparecerá."
"Claro que acredito! Pude ouvir você e Matthew praticando ontem à noite. Pareciam dois coelhos e você, especialmente, não calou a droga da boca."
"Chaos!!"
"Ah, Kiara, pelo menos uma de nós está feliz e se divertindo. Mesmo que eu fingisse não notar nada, a marca dele está no seu pescoço para todo mundo ver. Não pense que eu não percebi o quanto você gosta de exibi-la."
"Cala a boca! Você vai ter sua própria marca para exibir antes que o dia acabe, fique tranquila. E farei questão lembrá-la disso sempre que puder."
"Argh! Você é impossível!"
"É por isso que você me ama, Khione."
"Claro, sua psicopata!"
"Tá, já chega... Terminei o seu cabelo e posso sentir Matt me chamando. Vamos descer e começar o espetáculo."
"Nossa, agora ele é Matt? Achei que você só o chamasse assim durante as atividades noturnas... 'Ah, Matt! Isso... Sim... é bem aí, querido'. É sério, Kiara?"
"Cala a boca e vamos!" Ela retrucou, corando de vergonha.
De mãos dadas, descemos as escadas e fomos até o campo de treinamento, que agora parecia mais uma recepção de casamento. Um altar havia sido montado no centro enquanto várias cadeiras o cercavam em forma de círculo.
Entre os assentos, havia um corredor que dava direto no altar. Depois de respirar fundo, olhei para Kiara uma última vez e meneei a cabeça.
Entendendo minha deixa, ela caminhou até o altar, onde seu companheiro aguardava ao lado do meu. Esperei ela chegar na metade do caminho para segui-la.
Só então me permiti prestar atenção à minha volta. Ouvi murmúrios de admiração, felicidade e confusão conforme me dirigia até o altar. A maioria das pessoas se perguntava quem era Kiara e porque nós duas tínhamos tatuagens espalhadas por todo corpo.
Os mais atentos chegaram a apontar que algumas de nossas tatuagens eram iguais. Foi ao som de todos esses comentários que cheguei até a escadinha improvisada e subi no altar.
Meu adorável companheiro — sim, estava sendo sarcástica — tinha um sorriso radiante no rosto. Com o peito nu, ele vestia apenas uma calça jeans justa, que era tão baixa que podia ver o v de seus quadris.
Quando subi ao altar e parei diante dele, deixei um pequeno sorriso aparecer em meus lábios. Ele provavelmente confundiu minha reação com nervosismo, pois ele me puxou para os seus braços antes de beijar minha testa.
Em seguida, ele sussurrou no meu ouvido: "Fique calma, amor. Estarei aqui durante toda a cerimônia, assim como Kiara e Matthews."
Sem querer dizer nada que pudesse me arrepender, fechei os olhos e assenti. Mantive meu rosto enterrado no peito de meu companheiro durante todo o discurso até que a cerimônia de verdade começou.
Eu levantei meu rosto apenas para perceber que Kiara e Matthew não estavam mais conosco no altar, mas em assentos bem à nossa frente ao lado de Felecia, que sorria de orelha a orelha. Não pude deixar de rir baixinho quando vi Kiara levantar uma sobrancelha sugestivamente.
Então, revirei os olhos para ela antes de me virar para Gregory, que me encarava com um olhar de pena. Embora eu soubesse o porquê, agora não era hora nem lugar para jogar tudo no ventilador. Sorri levemente para ele enquanto meu companheiro me guiava para uma pequena mesa na frente de seu pai.
Em cima da mesa havia uma tigela de barro e uma faca. Eu sabia o que estava para acontecer, pois tinha lido sobre como funcionavam esses tipos de cerimônia em diversas culturas.
O ritual variava de alcateia para alcateia, portanto, minha mãe fez questão de que eu estudasse o assunto. No entanto, como eu vinha de uma alcateia com uma cultura diferente da desta, isso precisou ser respeitado. Sendo assim, a cerimônia foi iniciada em nome dos meus ancestrais.
Este foi o meio-termo encontrado para satisfazer ambas alcateias. Como meu companheiro era o macho alfa, iríamos aderir à forma como eles se acasalavam aqui hoje. Já na lua cheia de amanhã, as coisas seriam feitas ao meu modo.
Respirando fundo, estendi minha mão direita sobre a tigela de barro e, com um aceno de cabeça, sinalizei que estava pronta. Então, Gregory pegou a faca e, em um piscar de olhos, ele já havia cortado minha palma. Precisei conter um tremor, pois a faca era banhada a prata para evitar que a ferida cicatrizasse depressa.
Com dor, fechei a palma da mão, deixando meu sangue escorrer para dentro da tigela. Observei enquanto Gregory repetia o procedimento em seu filho. Depois que seu sangue também escorreu para a tigela, o pai de meu companheiro pegou nossas mãos e pressionou uma ferida contra a outra.
Ao sentir nossos sangues se fundirem, seguramos com força um ao outro para não cairmos de joelhos. Havoc choramingou tristemente ao notar o vínculo com nosso companheiro se fortalecer, agarrando-se a nós como um parasita.
Era doloroso saber que isso não significava nada para Alfa River. Piscando os olhos para afastar as lágrimas, assisti o sangue escorrer de nossas mãos unidas sobre a tigela.
Então, uma luz branca piscou sobre ela antes de ouvirmos um chiado. Observamos em silêncio conforme nosso sangue fervia dentro da tigela de barro. Quanto mais ele queimava, mais conseguíamos sentir um aroma refrescante. Era a combinação de nossos cheiros misturados.
Mantivemos nossas mãos unidas até nossos cortes cicatrizarem e o sangue evaporar da tigela de barro, envolvendo nossos punhos ainda cerrados.
Ele acariciou nossa pele antes de penetrar nela, então, deslizou pelos nossos braços até chegar nos ombros, circulando onde marcaríamos um ao outro, na junção entre nossos pescoços e ombros. Por fim, o sangue passou por nossos peitos e retornou para onde tudo começou ao redor de nossas mãos.
Tomando uma forma diferente, ele se acoplou à nossa pele. Eu e meu companheiro nos inclinamos para ver mais de perto. Enquanto eu assistia a tudo, hipnotizada, ele sorria radiante para a imagem de dois lobos uivando sob a lua que se formou.
Eu sabia o motivo da sua satisfação. A Deusa da lua havia aprovado nossa união. Em seguida, Gregory pegou nossas mãos e as levantou para mostrar o resto da alcateia que fomos aceitos. Imediatamente, todos ficaram de pé e começaram a aplaudir.