Capítulo 12
964palavras
2023-04-02 02:09
Rose
Não ouvi a voz de Antônio em momento algum durante o dia, levei seu almoço e café da tarde, mas ele continuava tentando descobrir algo em sua memória. Sua irritação era palpável e seus bufares ouvidos do corredor.
Dei um banho em Otávio após o jantar e o coloquei para dormir antes de buscar o jantar de Antônio. Os olhares das meninas eram confidentes, todos prometendo não contar o que estava acontecendo com o patrão.

— Não e não. Não adianta perguntar, eu não vou falar o que aconteceu, porque nem eu sei. Vão cuidar da vida de vocês. — Durante o dia procurei algum tipo de pomada para ajudar a suavizar as marcas em seu rosto, mas não encontrei, mandei um recado para o doutor Daniel, mas não falei que era para o Antônio e ele me receitou babosa para acalmar a pele e cicatrizar. Ainda bem que a tínhamos no jardim e assim que todos se recolheram eu fui até lá buscar e subi as escadas correndo.
— Senhor, posso entrar?
— Entre, Rose — a planta estava em um prato e ele olhou com curiosidade assim que passei pela porta. Ele estava sentado na poltrona ao lado da cama, lendo um livro do qual eu não sabia sobre o que era.
— Conversei com o doutor Daniel, e ele me disse que babosa é ótima para situações como esta — apontei com o prato para seu rosto.
— Falou para ele o que aconteceu? — seu olhar me acusou.
— Não, disse que Otávio tinha se arranhado durante o sono — ele confirmou com a cabeça.

— E como se usa isso? — fui até seu banheiro e peguei uma toalha de rosto.
— Ele me disse para usar um pano limpo para aplicar, sem esfregar o local, somente tanto leves batidas — eu demonstrei em meu braço como fazer e ele ficou me encarando sério.
— Isso ajudará a sumir, até amanhã?
— Acredito que não, mas irá cicatrizar mais rápido e melhorar a aparência.

— Está patético, não está? — eu tentei segurar a risada, mas não consegui.
— Parece que brigou com um gato — ri ainda mais — Uma gata no caso — ele começou a rir comigo.
— Nem em minha fase de solteiro eu sofri tal atentado — ele ria comigo e eu enchi o pano com a planta e indiquei que ele pegasse.
— Prefiro que você aplique, tenho medo de acabar piorando a situação.
— Tem certeza? — mas quem não tinha era eu. Meu coração disparou no peito e tenho certeza de que ele poderia ouvir.
— Claro — ele fechou os olhos e ficou aguardando que eu fizesse o que disse. Me aproximei mesmo minha mente dizendo que eu deveria sair correndo de onde estava. — Tentarei não machucar ainda mais.
— Acha que consegue fazer pior que isso? — seus olhos se abriram quando eu estava próxima ao seu rosto. Eu não sei quanto tempo ficamos nos encarando até que ele fechou seus olhos novamente.
Suavemente passei o pano por sua testa, deixando uma camada fina da planta, passei por seu nariz avançando pelas maçãs do rosto. Eu nunca tinha percebido a quantidade de sardas que ele tinha, eram tão pequenas que de longe não poderiam ser vistas, mas de perto completavam todo o charme que ele possuía. Minha respiração estava entrecortada por conseguir perceber todos os detalhes dele, a barba cobria um pedaço das bochechas e todo queixo e a parte superior da boca e eu a apreciava enquanto seu dono permanecia com os olhos fechados.
— Sua pele por baixo da barba está ferida? — falei em um sussurro, não reconhecendo minha própria voz.
— Não — a dele estava grossa e rouca, como eu nunca tinha ouvido antes.
Voltei a me concentrar somente na pele exposta, tentando evitar a todo custo decorar cada pedacinho dele.
— Acho que acabei — falei me afastando e indo em direção ao banheiro para recuperar minha sanidade.
— Quanto tempo tenho que ficar com essa gosma no rosto? — ele falou alto para eu ouvir.
— Dez minutos — lavei minhas mãos e passei uma delas ainda úmida pela minha nuca para acalmar meus ânimos.
— Tudo isso? — sua voz indignada me fez rir.
— Pare de reclamar — voltei para o quarto secando minha mão em uma toalha limpa. — Para um investigador, o senhor foi enganado direitinho — ele estreitou os olhos.
— Eu nem tenho como me defender — disse por fim depois de pensar — Essa mulher abusou da minha boa vontade, disso eu tenho certeza.
— Bom, pelo que podemos ver, o senhor deve ter feito algo bem grave — mordi o lábio para não rir.
— Isso seria uma novidade para mim — ele se levantou e foi até o espelho ver como tinha ficado — Acho que dos meus irmãos, eu sou o mais respeitoso. — Ele se virou para mim com o rosto brilhando com a gosma da babosa.
— Acho melhor não ficar se mexendo muito, pode começar a escorrer — ele travou.
— Pode pegar uma toalha para mim? — de vagar voltou a poltrona e se sentou nela. — Se amanhã minha pele não estiver igual à do Otávio, pode demitir o dr. Daniel — gargalhei com o seu comentário, como a muito tempo eu não fazia.
— Pobre homem. Ele é médico não realizador de milagres — passei a toalha a ele e nossos dedos se resvalaram, me transmitindo leves choques.
— Ele já teve que cobrir o rosto todo com essa meleca? — eu ri novamente sem saber o que responder. Quando ia comentar alguma coisa, ouvi Otávio chorar e sai correndo do quarto de Antônio.