Capítulo 11
2153palavras
2023-03-26 10:00
Antônio
"Que porra do caralho eu fiz ontem à noite?"
A dor em minha cabeça consumia toda a minha razão, eu já nem me lembrava que não me permitia falar palavrões, mas nesse momento somente eles exaltariam tudo que eu estava sentindo. A dor alucinante me fazia gemer cada vez que me mexia, meu equilíbrio parecia estar fora de foco. Eu realmente não conseguia definir onde mais doía.
Me sentei na cama esperando que tudo se acalmasse, que eu finalmente tivesse um minuto para colocar tudo nos eixos, mas as toneladas que pesavam sobre minha cabeça pareciam me deixar ainda mais irritado. Fui tateando até o banheiro com os olhos semiabertos, esperando não tropeçar em nada para não piorar minha situação.
Abri a torneira e joguei a água gelada em meu rosto para tentar despertar, mas pequenas fisgadas me fizeram parar. Me voltei para a banheira e a enchi com água gelada, somente assim eu curaria a ressaca que estava me matando.
— Merda de água gelada — meu queixo batia sem parar assim que entrei, mas eu sabia que logo estaria melhor, meu corpo todo doía, contudo, tentei não me importar. A verdade é que eu queria saber o que eu tinha feito na noite anterior.
Sai de lá depois de meia hora, ainda com a cabeça latejando, porém, uma boa parte do meu corpo já recuperada. Olhei para o que Rose tinha deixado sobre a pequena mesa, que agora já deveria estar frio. Me vesti com uma calça de linho e uma camisa do mesmo material, eu não teria condições para ir até a fábrica hoje.
—André — gemi começando a me lembrar do motivo de ter bebido tanto no dia anterior. Mas será que era somente por conta dele? Tudo estava uma bagunça e André foi o estopim para eu buscar um escape do qual eu nunca tinha sido adepto.
Sai do quarto e bati no quarto de meu filho, onde imaginei que Rose estivesse.
— Bom dia, senhor — ela falou baixo e agradeci mentalmente por isso.
— Bom dia — minha garganta estava seca, o gosto ruim não me abandonou nem quando eu escovei os dentes. A encarei lembrando o quanto ela povoou minha mente na última noite, mas tudo era desconexo demais e eu não tinha ideia do que era verdadeiro ou ilusão. — Teria como esquentar as coisas que levou até meu quarto? Precisei de um banho frio — minha expressão estava fechada, tenho certeza.
— Claro, senhor — me aproximei do meu filho que estava sentado no chão com ela brincando com uma pequena bola. — Senhor? — voltei meu olhar para ela. — O que aconteceu com seu rosto?
—Meu rosto? O que quer dizer? — me preocupei e voltei para meu quarto parando na frente do espelho e me espantando com a quantidade de arranhões que o cobriam. Agora eu entendia de onde vinha as pequenas agulhadas que eu estava sentindo. Tirei a camisa e vi que elas continuavam pelo meu peito.
— Que merda aconteceu ontem? — Meus olhos se encontraram com o dela entrando no quarto para pegar a bandeja.
— Sinto muito — ela abaixou a cabeça imediatamente e eu me vesti rápido.
— Foi Sérgio que me trouxe para casa ontem? — me virei chegando mais perto dela. — Pode olhar para mim, Rose — ela demorou um minuto, mas fez o que eu pedi, tendo as bochechas tão vermelhas. Aquilo com certeza chamou minha atenção.
— Sim, senhor.
— Sozinho? — olhei desconfiado, eu sabia que Sérgio era pequeno e talvez precisasse de ajuda para me carregar.
— Eu o ajudei a terminar de subir as escadas.
— Você? — o olhar de desafio estava lá novamente.
— Fiz isso por meu pai algumas vezes, digamos que tenho alguma experiência — ao mesmo tempo que sua voz era cortante, seu olhar transparecia uma lembrança sombria.
— Eu nem sei como me desculpar — falei indo em direção a cama. — Se puder chamá-lo, por favor.
— Claro — ela saiu levando a bandeja e me soltei na cama pousando ambas as mãos no rosto tentando não pensar no que eu possa ter falado ou feito.
"Ela não me tratou diferente quando entrei no quarto, não reclamou de nada, talvez eu não tenha falado nenhuma asneira perto dela."
— Senhor Antônio, posso entrar? — Sérgio bateu à porta e me sentei autorizando a entrada. Eu não queria que ninguém mais me visse naquele estado.
— Entre!
— Rose disse que queria me ver. — fiz que sim e pedi para que ele se aproximasse.
— Sérgio, poderia me contar o que eu fiz ontem, não me lembro de nada.
— Não sei se sou a melhor pessoa, senhor.
— Então quem seria? — eu estava ficando cada vez mais assustado.
— A dama que levou para o hotel, senhor. Ela é quem saberá dizer o que foi feito ontem, eu fiquei apenas no carro.
— Dama? Que dama? A mesma que me desfigurou? — bufei e me levantei irritado. — Onde eu a conheci?
— No bar da Gisele — bufei de novo, foi uma péssima decisão.
— A atendente — lembrei no mesmo momento. — Que Deus me proteja das merdas que fiz ontem para acabar da forma que estou.
—Eu realmente não sei o que aconteceu ontem, senhor, mas se quiser posso ir até lá conversar com a moça e te trazer alguma informação — Sérgio parecia abatido.
— Que horas chegamos, Sérgio?
— Ás 4h, senhor Antônio.
— QUATRO HORAS DA MANHÃ? — é, eu me fodi muito bem fodido.
— Sim.
— Vá para casa Sério. Descanse hoje. Amanhã nós descobrimos minhas peripécias de uma noite. — Eu vi que ele segurou o riso.
Ele se despediu e saiu do quarto, aguardei por alguns minutos até que Rose voltou com a sopa e o café. Ela os pousou na mesa e perguntou se eu precisava de mais alguma coisa.
— Nós conversamos ontem, quando eu cheguei?
— Um pouco — ela fez um semblante pensativo.
— E o que eu te disse? — me aproximei dela, pegando a xícara de café.
— Do que se lembra? — bufei.
— Acho que eu não estaria perguntando se lembrasse. — Sua postura irritada foi como uma avalanche para o meu mal comportamento.
— Então que se vire em lembrar, não estou aqui para ser sua babá e sim do Otávio — cruzou os braços. Ela me levaria a loucura, tenho certeza.
— Me desculpe — essa palavra estava sendo muito usada por mim ultimamente — Só estou puto por não saber o que fiz. Eu nunca passei por coisa semelhante. — Ela me olhou desconfiada.
— Tem certeza de que não é alcoólatra?
— Desde que me casei, eu larguei as noitadas que compartilhava com meus amigos. Há muito tempo não passava por algo assim, então posso te garantir que meu vício não é bebido. — Ela me olhou surpresa — E desde que nos conhecemos, quantas vezes você me viu assim?
— Se está dizendo — ela deu de ombros e se encaminhou para a porta.
— Não vai me falar sobre o que conversamos?
— Sobre sua promessa. — Minha promessa. — Você queria saber uma forma de quebrá-la.
— Mas eu não vou quebrá-la. — Meu conflito interno se tornou palavras, isso nunca mais poderia acontecer.
— Pois bem, foi o que me disse ontem, se não acredita não posso fazer nada.
— Eu acredito, eu só não entendo por que falaria isso, ainda mais para você.
— Eu não iria contar sobre isso com ninguém.
— Eu sei que não, é que... — o que era? Por que eu não queria falar sobre Margareth com ela? Eu nunca me preocupei com isso.
— Vou deixá-lo descansar, qualquer coisa pode me chamar.
—Obrigado, Rose.
— Vou levar Otávio até o jardim um pouco, mas em alguns minutos estaremos de volta.
— Não se preocupe. Não pretendo sair desse quarto assim — apontei meu rosto.
Rose
Eu não entendia nada sobre relacionamentos, mas sabia que algumas mulheres que não se importavam com a fama que recebiam, compartilhavam de intimidades com os homens em troca de status e dinheiro. Eu só entendia o pouco que Emma compartilhava comigo e a marca de batom no abdômen de Antônio me deixou ao mesmo tempo irritada e curiosa.
As marcas de unhas pelo corpo também me faziam ter dúvidas de que foi realmente bom para algum dos dois. Talvez ele tenha falado algo que a tenha deixado brava. Não sei, a única coisa que eu sabia é que o ver de novo sem camisa me causou um frio no estomago, algo que eu nunca tinha sentido antes. Uma vontade de ficar olhando sem ser recriminada.
"Larga de ser desmiolada". Já estava sentada a vinte minutos no jardim. Otávio brincava com as flores e folhas, as colocando em um baldinho que eu trouxe. A cada dia ele descobria coisas novas e as trazia para que eu as descobrisse com ele. Eu amava aquela criança, como se ela fosse minha.
— Meu lindinho achou mais uma coisa para brincar? — falei quando ele me trouxe um pedacinho de galho com três folhas penduradas.
— Ahhh.. uhhh — suas falas em vogais me faziam rir, porque ele sempre ficava muito bravo quando eu não entendia o que ele dizia e aumentava ainda mais o seu discurso.
— Senhorita? — Me virei olhando para Luana. — O filho do duque está na sala a sua espera.
— Minha? — Já não bastaram as rosas? — O que ele quer? — Meu Deus, se Antônio ouvisse a voz dele, seria um caos.
— Não sei, senhorita. Janice pediu para chamá-la. — Me levantei a contragosto.
— Olhe ele para mim por um instante. — Ela confirmou e fui até a sala limpando minhas mãos na saia.
Eu simplesmente não entendia como ele poderia ter visto algo em mim, com tantas pretendentes que poderia ter a sua disposição. Eu nem queria conhecer ninguém, na verdade.
— Senhor Vasconcelos? — Falei assim que entrei na sala.
— Senhorita Vieira, como vai? — E lá estava mais um buquê de rosas, menor que o outro, mas ainda era um lindo buquê.
— Vou bem — peguei o buquê — Obrigada, por favor sente-se. — Ele concordou e se sentou no sofá a minha frente e me sentei na poltrona.
— Não obtive nenhuma notícia sua nos últimos dias e quis vir vê-la para saber como está.
— Estava esperando notícias minhas? — Me surpreendi com a informação.
— Claro que sim. Qual seria o louco que não gostaria de receber notícias de uma dama tão bela? — Fiquei vermelha, tenho certeza.
— Eu nem sei o que dizer, mas vou bem, senhor. — Ele fez uma careta.
— Não me chame de senhor, quero ser seu amigo e amigos são chamados pelo nome. — sorri por seu comentário.
— Tudo bem, Arthur, vou tentar te chamar pelo primeiro nome, mas saiba que não será algo fácil para mim.
— Mas tente, não quero que me veja como o dono da casa. E falando nisso, ele está aqui? — Não gostei do jeito que ele falou de Antônio, mesmo sabendo da rixa dos dois.
— Sim, está trabalhando em casa.
— Hum, isso é incomum para o sr. Campos, ele está com algum problema?
— Nenhum. — fui seca, para ele entender que eu não seria seu acesso a vida de Antônio — E sinto muito, mas eu estou trabalhando agora, não vou poder ficar conversando com o senhor. Fico grata pela lembrança e pelas flores. — Me levantei e ele fez o mesmo percebendo que acabará de meter os pés pelas mãos.
— Sinto muito se a ofendi, eu não tenho interesse nenhum em seu patrão, nem sei por que perguntei — me encaminhei para a porta com ele me seguindo.
— Eu entendo, mas não posso mesmo me demorar. — Abri a porta esperando que ele passasse.
— Tudo bem, mas podemos sair para tomar um sorvete qualquer dia desses?
— Não sei, irei pensar. Não está somente de passagem?
— Vou ficar mais que o esperado, algo me cativou. — Eu não queria entender o que ele estava dizendo.
— Vou pensar — disse novamente para seus olhos pidões.
— Estou hospedado no Hotel Green Park — o mais famoso da cidade — Mande um mensageiro com sua resposta. — Confirmei com a cabeça e o vi se despedir.
Fechei a porta levando o buquê até a cozinha e o deixando lá esquecido. Eu não sabia o que pensar, nem no que fazer. Só sabia que eu podia tentar me desiludir e conhecer outra pessoa ou continuar vivendo no meu pequeno mundo ilusório, onde no fim tudo ficaria bem, contudo apenas fantasiado em minha cabeça.