Capítulo 38
1374palavras
2023-02-06 06:37
- Cristina.
Ela olhou para a sua direita e viu Tânia perto dela. Franziu a testa. Estavam na hora do intervalo, mas não havia nenhum motivo para...
- Sei que vocês foram amantes – disparou Tânia antes que Cristina tivesse tempo de dizer um olá.
- Ahn? – fez, tentando se fazer de desentendida.
- Não seja sonsa – disse ela, abaixando a voz até a altura de um sussurro - Você sabe muito bem que estou falando de James e você. Ele me disse.
Cristina olhou para um lado, depois para o outro. Ninguém podia ouvi-las. Encarou Tânia e pôs as mãos nos quadris.
- E daí? Você também deve saber que não estamos mais juntos.
- Você era casada – comentou ela com nojo.
Cristina suspirou. Odiava aquelas vacas bitoladas.
- Sou, no presente. Mas nem sempre. Quando comecei a transar com James, eu era legalmente solteira.
Tânia arregalou os olhos. Cristina pôs a mão sobre a boca com um sorriso cínico.
- Oh, desculpe. Ofendi sua sensibilidade com o verbo transar? Bem, é o que adultos fazem. E posso garantir que nós fizemos muito.
- Prostituta – cuspiu ela – Ele só te usou por um tempo. Quando cansou, se livrou de você.
Cristina sorriu.
- Essa é a sua interpretação ou foi o que James disse? Não é verdade de qualquer forma, amor. Ficamos juntos por muito tempo. Anos, na verdade. Morei no apartamento dele, e quase fui sua esposa. E, sendo sincera, não creio que ele realmente tenha se cansado de mim.
Não espero seria a expressão mais correta nesse caso, pensou Cristina distraidamente, enquanto sustentava o olhar furioso de Tânia.
- Fique longe dele – sibilou ela, desconcertada – Ou então...
- O quê? Me mata? Ah, Tânia. Se está tão insegura assim, acho que devia te dar umas dicas. Dicas libidinosas, se me entende. Aposto que o conhece menos na cama do que eu. Se quiser, posso falar do que ele gosta. De garota para garota.
- Fique longe dele – repetiu ela, à beira das lágrimas, e se virou para ir embora.
Cristina sacudiu a cabeça em desaprovação, mas sorria. Ela tinha sido má. Tânia podia não ser mais uma garotinha virgem, mas obviamente tinha sua moral. E princípios. Aquela merda toda.
Foi quando, subitamente, Cristina sentiu que estava de volta.
-
Teresa estava nervosa. Andava nervosa há um tempo. Cristina tentou descobrir o que estava acontecendo. Olga também.
Mas, no final, foi Miguel que resolveu o enigma.
- O que foi? – perguntou Maurício, aborrecido por aquela invasão ao seu apartamento às 10 da noite, quando ele entrou pela porta após espancar a campainha – Alguém morreu, por acaso?
- Não. Mas é algo...
E nesse ponto ele se interrompeu frente à visão de Cristina de camisola.
- Algo o quê? – indagou Maurício, agora já irritado.
Miguel sacudiu a cabeça e desviou o olhar dela.
- Importante – concluiu, mas Cristina já fora jogada para o mundo das lembranças. Para não sorrir para Miguel na frente de Maurício de uma forma que não poderia realmente explicar, sentou-se no sofá e ligou a televisão para se distrair enquanto os irmãos conversavam em um canto da sala.
- O quê? – perguntou Maurício em voz alta alguns minutos depois, incrédulo.
Cristina acordou do seu devaneio meio assustada.
- O que foi? Estava distraída.
Maurício se sentou no sofá, ainda chocado, e nada disse a princípio. Miguel já se fora.
- Eles vão mesmo se separar – disse seu marido finalmente, quando Miguel bateu a porta, já parecendo um pouco melhor.
- Quem? – perguntou ela e, então, tomada de efêmera esperança – Miguel e Olga?
- Não – disse ele e, enquanto Cristina desanimava – Em que mundo você estava? São meus pais.
Cristina foi tomada de surpresa por meio segundo. Depois, tentou racionalizar a situação.
- Bem, Maurício, seus pais não pareciam estar muito bem, não é mesmo? Ele quase nunca voltava para casa.
- É que... Cristina, você não percebeu? Por que você acha que quase nunca vê o meu pai?
- Por que ele trabalha muito? – tentou, e se achou estúpida quando ele a encarou com pura pena.
- Não, querida – disse ele com paciência – É por que eles vivem separados há quase vinte anos.
Ela arregalou os olhos.
- Poxa, eu... nem imaginava.
Maurício deu de ombros.
- É. Na verdade, foi ele quem pediu o divórcio. Para se casar de novo.
- Mas por que depois de tanto tempo?
- É isso que eu não entendo. Ele viver separado dela, sim, porque meu pai nunca quis casar, na verdade. Foi só porque mamãe engravidou.
Cristina franziu a testa diante dessa informação. Seria Teresa a primeira das golpistas que atacariam a família? E mais: com aquela informação, ela entendia perfeitamente porque Miguel se casara com Olga. Tinha sido o exemplo paterno. O psicológico era mesmo foda.
- E desde então eles vivem separados?
- Ah, não. Lembro dele conosco nos primeiros dez anos. Depois eles... – hesitou e completou duramente – Mamãe é difícil, você sabe.
- Com quem ele vai se casar?
- Não sei. Miguel disse que ele vai nos apresentar num jantar um dia desses. Você não ouviu nada?
Não, ela não ouvira. Andara pensando em coisas muito mais divertidas.
-
Os dias de história no Colégio das Irmãs eram terça e quinta-feira. Assim sendo, ela encontrava James em dois dias da semana sem nem armar para isso.
Infelizmente, os dias de biologia eram os mesmos, e, sempre que Cristina poderia falar com ele, lá estava Tânia cercando-o como um polvo grudento.
Mas não naquele dia. Naquela linda manhã, a turma na qual a prof. Vasconcelos daria aula estava no pátio. Naquela maravilhosa manhã, a nerdzinha-não-mais-tão-virgem estava gripada e derrubada na cama. Naquela abençoada manhã, James estava tão livre quanto um passarinho fora da gaiola.
E Cristina foi desfrutar disso. Chegou com passinhos de seda perto das costas dele. Ele estava procurando algo dentro de seu armário.
- Olá – sussurrou bem perto do ouvido dele.
James levou um susto e se virou.
- Olá, Cristina.
- E sua noiva?
- Doente – disse ele concisamente, voltando o olhar para o armário.
- De quê?
- Gripe. Depois daquela conversa baixa, está preocupada com ela? – e acrescentou depois de uma pausa – Sim, ela me contou.
- Eu só fui honesta.
- Se tivesse mais tempo, você ia contar a ela todo o nosso histórico sexual.
Cristina agarrou o braço dele e o fez olhar para ela.
- Aposto que ela aprenderia muitas coisas novas – sussurrou, com o rosto bem perto do dele, sozinhos naquele cômodo que era quase um labirinto de armários.
James se afastou.
- Não tente isso de novo.
- Por quê? Não ia conseguir resistir?
Ele riu de uma forma um tanto debochada. O sorriso de Cristina murchou.
- Cristina, eu terminei com você para não voltar. Não te quero mais. Se quiser salvar seu orgulho e não ser tão patética, não tente me beijar de novo.
- Não é por que brigamos que você parou de me desejar por um minuto que seja. Pode disfarçar o quanto quiser, mas eu sei e você sabe que ainda me quer.
Eles ainda se encararam por uns bons segundos. Então ele desviou o olhar.
- Vou me casar, Cristina – disse ele, batendo a porta do armário de forma um tanto conclusiva - Não preciso mais de você na minha vida.
- Não é uma questão de precisar. Realmente, Tânia seria uma esposa muito boa. Muito servil. Aposto que sua mãe gosta dela. Mas a perspectiva de ter só ela pelo resto da sua vida não é um pouco deprimente?
Ele ergueu o olhar.
- Como quiser pensar – disse, cansado – De qualquer forma, vou casar com ela. E não há nada que você possa fazer.
- Não? Até parece que não me conhece, James.
Ele não respondeu nada. Só passou por ela e saiu dali. Sozinha e frustrada no labirinto de armários, Cristina se sentiu mais determinada ainda.
Se James não era dela, não seria de mais ninguém. Principalmente da otária da Tânia Vasconcelos. Ia destruir aquela bosta de casamento.