Capítulo 35
1121palavras
2023-01-31 05:03
- Cristina.
Ela entreabriu os olhos e viu o rosto de James acima do dela, ao mesmo tempo em que sentia uma dor excruciante no ombro esquerdo.
- James – sussurrou ela, sentindo a garganta seca – Eu morri?
Ele sorriu.
- Sei que sou belo como um anjo, mas não. Se lembra do ditado que diz que vaso ruim não quebra? Você está no hospital.
Cristina abriu os olhos por completo. A luz matutina invadia o quarto pintado de azul clarinho. Bem a frente dela, um quadro da Virgem Maria estava pendurado na parede, olhando-a com a típica bondade.
Então, com um solavanco de choque, ela percebeu. Sua barriga estava lisa. Sem o inchaço de 13 quilos. Sem bebê.
- Oh, meu Deus – quis gritar, mas tudo o que saiu foi um sussurro fraco.
- O que foi? – perguntou James, voltando ao seu campo de visão.
- Meu bebê – choramingou ela – Morreu, não foi?
James fez uma careta.
- Se metendo num tiroteio, você quase fez isso mesmo. Mas não, ela está bem. Maurício foi buscá-la quando viu que você estava acordando.
Cristina ergueu as sobrancelhas.
- Maurício, é? Amigos agora?
- Não. É só que passar metade da noite em claro esperando você acordar deixa as pessoas mais civilizadas.
- Você ficou acordado? – perguntou ela, um pouco comovida.
- Fiquei – confirmou ele, como se aquilo não fosse nada – Até ser óbvio que você continuaria até a manhã seguinte.
- Mas como foi que aconteceu? – insistiu ela, ansiosa.
James se sentou no sofá antes de responder. Parecia exausto.
- Foi seu cunhado que viu, quando chegou logo depois com o filho. Quando percebeu o que tinha acontecido, correu escada abaixo para avisar o seu marido. Isso depois de escorregar no seu líquido amniótico. E no sangue, claro.
- E o bebê?
- Os médicos não tiveram escolha nenhuma, Cristina. Você já estava em trabalho de parto. Enquanto uns tiravam a bala do seu braço, outros tiravam a garota.
Ela assentiu.
- E a Olga?
James negou com a cabeça.
- Ela sequer chegou a desmaiar. A bala atravessou o braço. Tiveram tempo de fazer o curativo antes que a bolsa dela estourasse. O garoto dela se chama Gregori.
- E a minha? Como vocês...
- Estávamos esperando você – disse Maurício, que entrara sem ser ouvido por nenhum dos dois. Carregava um embrulho nos braços.
Cristina se aprumou na cama.
- Mas não tem que fazer o registro? – perguntou enquanto Maurício vinha até ela e colocava o bebê no seu colo.
- Calma, ela só nasceu há menos de um dia.
O bebê era tão pequeno que, por um segundo, Cristina ficou com medo de quebrar só encostando. Depois, relaxou. Sua filha era um neném rosadinho de cabelos muito pretos. Dormia a sono solto.
Os três ficaram só olhando por algum tempo, admirados. Bebês tinham mesmo esse poder, aparentemente. Foi Maurício que quebrou o silêncio.
- E o nome, Cristina? – perguntou ele, inclinando-se melhor para ver a menina – Não quero que ela fique muito tempo sem isso, mesmo sem registro oficial. Nesse tempo na incubadora, as enfermeiras a chamavam só de Medeiros. Um pouco deprimente, acho.
Cristina sorriu, embalando sua menina. Então, ela abriu os olhos e a encarou preguiçosamente. Tinha olhos de um castanho claro que poderia muito bem escurecer no futuro. Foi quando um nome apareceu na mente dela, tão súbito quanto inesperado.
- Isabella – disse baixinho – Minha linda Isabella.
Maurício e James se entreolharam.
- Por que Isabella? – perguntou Maurício – Não estava na lista de nomes que fizemos. Você falou que gostava bastante de Catarina.
- E gosto. Mas ela é Isabella.
- Ela vai ser o que quisermos – opinou James – Pelo menos no nome. E se for minha filha, eu quero Anne.
Cristina se inflou de indignação. No seu colo, o bebê fechou os olhos novamente.
- Não vou dar a minha filha o nome da sua gata! – esbravejou.
- Cristina, fala baixo – pediu Maurício.
James deu de ombros.
- É um nome bonito.
Cristina balançou a cabeça com firmeza.
- Isabella – decretou em definitivo, e ninguém mais contestou.
-
- Por quê, Cristina?
Ela desviou o olhar de Isabella, que dormia no berço depois de mamar no peito de sua mãe pela primeira vez, e olhou para Maurício, finalmente acordado. Estavam no meio da tarde e, mais ou menos na hora do almoço, ele desmaiara no sofá de tanto sono. Não fora apenas James, que saíra pouco depois de terem determinado o nome da menina, que estava exausto.
- Por que...
- Você brincou de tiroteio com Olga. Vocês tiveram uma sorte imensa de não acabarem em dois caixões.
Cristina mudou o foco de seu olhar para a parede.
- Queria matá-la – confessou sem o menor arrependimento – Devia ter atirado uma segunda vez na cabeça. Viva, ela vai nos destruir.
- Por que você diz isso? – perguntou Maurício, levantando-se do sofá e indo até o lado dela.
- Ela descobriu sobre James. Tinha certeza que era filha dele. Estava indo dizer isso para a sua mãe.
Maurício pegou na mão dela e a apertou, fazendo-a emudecer.
- Não me importo mais com as raivas da minha mãe – declarou ele – Sou um adulto. Posso muito bem cuidar da minha vida. Então, se Olga contar, o que não acredito que vá mais fazer, nós simplesmente não vamos ligar, certo?
Cristina assentiu em silêncio.
- Maurício – recomeçou, hesitante – E se for mesmo do James?
Ele a encarou sem entender.
- Já falamos sobre...
- Você vai mesmo criar a filha de outro homem? – interrompeu ela, angustiada - Sabendo disso sem a menor sombra de dúvida?
Maurício assentiu com firmeza.
- Sim. O que você achou que eu faria, jogaria vocês duas para fora quando visse o resultado?
A cara dela confirmou. Maurício a abraçou.
- Minha querida, quem anda te falando essas coisas? Eu nunca faria isso com vocês. Amo Isabella desde que a vi pela primeira vez. Genética não importa. Teremos uma família juntos. Estaremos bem. E... falando nisso, tenho uma coisa para você.
Cristina se endireitou na cama.
- Tem? – indagou com um leve sorriso.
Ele assentiu enquanto enfiava a mão no bolso. Um instante depois, retirava dele um cordão de prata com um pequeno diamante.
E foi assim que Cristina recuperou seu precioso depois de tanto tempo.
- Acho que isso é seu – sussurrou Maurício em seu ouvido depois de ajeitar o fecho no pescoço dela.
Cristina só sorriu, com a visão embaçada pelas lágrimas e sem nada a dizer.
Agora as coisas ficariam bem.