Capítulo 34
1626palavras
2023-01-28 05:16
Maurício tentava não deixar espaço para James invadir ainda mais a vida de casados deles, mas não podia ignorar uma reunião de trabalho à qual simplesmente não poderia faltar. E bem no dia da última consulta de Cristina antes do parto.
James, claro, estava disponível para levá-la. E foi assim que, em 01 de setembro de 2016, ele levou a grávida Cristina para a sua obstetra. Não como o pai, claro. Durante as duas horas em que havia estado sentado na sala de espera da médica, ele foi o primo de Cristina. Eles até se pareciam mesmo.
Foi tudo bem na consulta. A menina estava bem e prontinha para nascer, na posição certa. Apenas uma questão de esperar a bolsa estourar.
Foi só quando Cristina e James chegaram no prédio que os problemas começaram.
- Me ajuda – pediu ela quando ele já tinha saído do carro – Não consigo me levantar com essa massa na minha frente.
James deu a volta no carro e a ajudou. Cristina pôs o braço nos ombros dele, dando uma olhada de relance no relógio. Pela hora, Maurício já estava no apartamento.
- Achei que conseguisse andar sozinha – observou ele enquanto percorriam o estacionamento.
- Naquela época, eu não tinha 13 quilos acrescentados no meu abdômen bem definido.
Ele riu e concedeu o ponto. Da forma dele.
- 13? Foram no mínimo 20.
Cristina parou de andar.
- O quê?
- Você está só protegendo seu orgulho.
- Só ganhei 13! – protestou ela.
- Se te consola, pense que está proporcional.
Cristina quase quis agredi-lo. Mas a proximidade com James a lembrara de forma substancial de como o homem de como desejava aquele homem. Afinal, ela estava grávida, não morta.
Então, subitamente, tudo degringolou de vez.
Primeiro foi o carro. Veio rápido para perto deles, raspando uma lateral da parede com sua lataria preta de forma perigosa demais para estar sendo dirigida por alguém muito prudente. Essa forma de direção já seria determinante para definir quem era. Mas o próprio carro também não permitia engano. Era de Miguel, e estava rápido demais. Cristina sequer teve tempo de correr para algum lugar e sumir de vista, como James fez.
Porém, diferentemente do que esperava, não foi Miguel quem saiu, mas sim Olga.
- Cristina – cumprimentou ela.
- Olga.
As duas mulheres, ambas com quase nove meses de gravidez, ficaram uma de cada lado do carro, se encarando e medindo sua força.
- O que faz aqui? – perguntou Olga depois de um tempinho, casualmente, abrindo a porta de trás no carro e pegando sua bolsa roxa abominável.
Cristina relanceou os olhos para a esquerda, onde anteriormente estava James. Ele desaparecera mesmo.
- Vim pegar um documento para Maurício – improvisou.
- Não, não veio – replicou ela, batendo a porta do carro.
- Não?
Olga ergueu os olhos de forma muito tranquila.
- Esse carro – começou, indicando a belezinha com a cabeça – Já o vi aqui outras vezes quando saía. Mas ele não é de Maurício. O dele não é sequer dessa cor. Alguém anda visitando vocês, alguém seguro o suficiente para ter um carro que parece de mulher.
- Meu carro não parece de mulher – protestou uma voz atrás do carro, e no segundo depois James se levantou – Foi do meu pai, para a sua informação.
Olga sorriu capciosa e lhe lançou um olhar duvidoso. Cristina começou a entrar em pânico.
- Uma bastardinha – concluiu ela.
- Você não sabe de nada para falar isso – afirmou Cristina, nervosa.
- Sei o suficiente para saber que Teresa vai achar. Acho bom que esteja preparada, porque ela vai tornar sua vida um inferno na Terra.
E foi embora com sua barriga inchada.
Cristina se virou para James, irritada, mas, antes que pudesse dizer qualquer coisa, teve uma ideia. Era arriscada, verdade. Aliás, mais do que arriscada, era suicida. Homicida, para ser mais precisa. Mas ela tinha que jogar alto agora. Coisas preciosas estavam em jogo. Não podia deixar que o conhecimento sobre a origem duvidosa do seu bebê fosse até a cobertura.
- Vá embora – disse ela para James, fazendo um gesto de dispensa.
- O que você va...
- Vá embora – repetiu Cristina, serena. Nem parecia que estava armando um assassinato.
-
Cristina já decidira que, se Olga não abrisse aquela maldita porta, ela a faria ceder. De um jeito ou de outro.
Mas acabou não sendo necessário usar a força bruta.
- Cristina – disse ela assim que abriu a porta, num tom de não-tão-agradável-surpresa – O que quer?
- Resolver um problema – respondeu Cristina entredentes e saiu entrando, empurrando Olga para passar.
- Certo. Espere, vou trocar de roupa.
- Vá.
Olga sumiu para o quarto, e Cristina, mal acreditando na sua sorte, começou sua busca. Pela falta de ruídos no apartamento, Miguel e Yuri não estavam lá. Nem nenhuma empregada.
Quase peguei a pistola da gaveta da mesinha e desci, disse-lhe Miguel na sua mente. Havia três móveis na sala que tinham gavetas, mas Cristina, conhecendo seu cunhado, foi primeiro na mesinha de centro perto do sofá, onde Miguel possivelmente estava quando vira James pelo circuito interno. Ela pegou um paninho que enfeitava a mesinha e agarrou o puxador.
E lá estava. Era, sem dúvidas, uma bela arma. Não era lá uma Magnun, do tipo que fazia um estrago considerável no seu adversário, mas um tiro na cabeça sempre matava alguém, independente da arma.
Cristina ouviu a porta bater lá dentro. Seu braço deu um giro e escondeu a arma, enrolada pelo paninho, um segundo antes de Olga aparecer, agora com um vestidinho leve.
- Pronto – anunciou, parando a uns dois metros de distância - Pode falar.
Cristina respirou fundo.
- Vai fazer o quê agora com o que sabe?
Olga deu de ombros.
- Não sei. Depende se você se comportar – recitou, sorrindo maldosamente.
Cristina demorou uns segundos para lembrar-se de onde conhecia aquela frase.
- Olga, isso já tem, o quê, uns...
- Seis anos. Quase sete.
- Não significa mais nada.
Já não significava na época, na verdade. Elas tinham sido umas estúpidas, como quaisquer garotas de 18 anos. Teresa teria ficado puta se descobrisse que eles faziam aquilo no leito sagrado dela, mas e daí? Novidade não seria.
Olga balançou a cabeça de um lado para o outro. Pelo visto, significava.
- É bom fazer você provar do seu veneno. Quem sabe, a garota sendo filha do outro, você acabe sendo mais feliz longe daqui. Graças a mim.
Cristina franziu a testa.
- Obviamente você não sabe do que fala.
- Talvez você não seja feliz com ele, realmente. Talvez precise viver nesse caos amoroso para ter alguma satisfação. De qualquer forma, é um favor. Dinheiro não traz felicidade. Ser uma golpista não leva a nada.
Cristina riu.
- Olha quem está falando! Você, que engravida cada vez que percebe que Miguel está se afastando. Você também é uma golpista, Olga, só que não é tão boa quanto eu.
- Você é quem diz – disse ela, despreocupada – De qualquer forma, o fato de estar grávida de uma bastardinha vai te tirar daqui em dois tempos. Teresa vai te odiar, e é isso que importa nessa família.
Cristina balançou a cabeça e segurou melhor a arma nas suas costas. É, pelo visto não tinha jeito. Haveria sangue.
- É sua decisão final? Vai mesmo subir e contar?
- Sim.
Cristina apontou a arma para ela. Os olhos de Olga se esbugalharam e ela ficou pálida como a morte enquanto recuava alguns passos.
- Então será a sua última decisão – sussurrou ela enquanto engatilhava a arma.
- Espera – pediu Olga com um início agradável de pânico na voz, recuando mais alguns passos na direção de uma pequena cômoda – Sou sua cunhada. Uma parenta. Você vai realmente atirar em mim?
- Afinidade não gera afinidade – disse Cristina, apontando melhor a arma – Miguel, como meu cunhado, é meu parente. Você é apenas a concunhada. Sem vínculos familiares. Não é minha parente. Posso, e vou, atirar em você sem culpa.
Olga recuou mais um pouco, as duas mãos na barriga. Agora estava quase grudada no móvel.
- Vai matar meu filho só por algo que leu num site estúpido da internet?
- Seu filho pode ser salvo – tranquilizou-a Cristina – E não é um site estúpido. É a Wikipédia.
E atirou. Olga tentou desviar, mas o tiro a pegou no braço esquerdo e ela e sua barriga desabaram sobre a pequena cômoda, derrubando-a e espalhando tudo dentro da gavetinha pelo chão.
Cristina abaixou a arma e se aproximou. Olga parecia desmaiada, mas ainda respirava. Ergueu a arma de novo para terminar o serviço, mas parou e abaixou o braço quando focou o olhar na barriga dela. Agora, o bebê ainda vivia. Com outro tiro, especialmente se acertasse na cabeça, isso não era de forma nenhuma garantido.
E ela hesitou. Fizera tantas coisas para acabar com Olga. Tomara tantos cuidados para que ninguém a ligasse ao crime – sem digitais em nenhum lugar do apartamento, e, como subira de escada, sem registro que ela estivera ali naquele dia. E a arma seria descartada. E na hora decisiva... hesitava.
Foi quando Olga abriu os olhos. Antes que Cristina pudesse processar sua surpresa, ela já tinha erguido outra arma e disparado.
O tiro atingiu seu ombro esquerdo. Cristina gritou e caiu de joelhos no chão, pensando em como diabos aquilo acontecera.
Como se soubesse o que ela tinha na cabeça, Olga riu.
- Ou você achava que Miguel só tinha uma arma? – perguntou, zombeteira.
Foi a última coisa que Cristina ouviu antes de desmaiar pela dor e pelo choque.