Capítulo 125
2684palavras
2023-02-07 09:39
Infelizmente o exame de DNA deu negativo. Heitor não mentiu: ele não poderia mesmo ser o pai do nosso raio de sol, por mais que esperássemos que pudesse ter dado um mínimo erro que fosse na vasectomia dele.
E peguei-me pensando que Maria Lua era um milagre em nossas vidas, já que a chance de eu engravidar era remota, embora não impossível, mesmo com a cirurgia e Heitor havia tirado de si mesmo a possibilidade de ser pai. Ela seria tudo teríamos ao final de tudo.
No dia seguinte, nos reunimos com três advogados na North B. Allan Casanova fez questão de estar presente. A questão é que não fiquei mais tranquila após falar com eles. Por mais que a família Casanova fosse das mais tradicionais e conhecidas do país, não seria fácil.

Anya e Breno não tinham nenhuma denúncia contra eles registrada em lugar algum. Foi a palavra de Salma contra a deles. Os diários não foram encontrados, então creio que Daniel realmente tenha colocado fora ou posto fogo em tudo. Nada do que minha amiga havia contado sobre os abusos e delitos cometidos pela família foi devidamente denunciado por ela. Se eu duvidava da palavra dela? Claro que não. Infelizmente o que ela fez foi fugir daquela vida em vez de pedir ajuda.
E eu era a pessoa que menos poderia julgar, afinal, sequer fugi da vida horrível que tive ao lado do meu ex namorado tóxico. Me livrei de tudo somente quando ele morreu e não sei como estaria se Jardel ainda estivesse vivo. Teria tido forças um dia para dar um basta? Jamais pensei em denunciá-lo também. A coragem insana que eu tinha hoje era graças à covarde que eu fui um dia.
E além de tudo, eu tinha duas passagens pela Polícia. Mesmo Heitor retirando a queixa contra mim, quando risquei o Maserati, o registro permaneceu. E depois ainda teve o episódio de discutir com o Policial e a prática de ato libidinoso em público.
E havia também o registro contra Heitor Casanova, dirigindo moto sem habilitação, sem documento, tentativa de suborno, dentre as demais.
Segundo os advogados, isso não era sério. Mas confrontando com a “ficha limpa” dos avós, sendo que a mãe de Salma era parente de sangue, ficávamos em desvantagem.
Ou seja, estávamos fodidos.

A segunda certidão falsa havia sido jogada fora e não mencionamos, pois ninguém saberia. A primeira, em nome de Sebastian, os advogados nos orientaram a convencer meu irmão a dizer que achava que era o pai da criança, inclusive fazendo um exame de DNA para provar que não era, tornando tudo mais crível. Isso somente depois do pedido de guarda de Maria Lua por parte de Anya e Breno. Pois enquanto eles não fizessem isso, não poderíamos partir para o pedido de adoção, o que nos deixaria em maus lençóis, confirmando que havia a certeza de que Sebastian não era o pai e o registro foi feito de má fé. Ou seja, fingiríamos que Sebastian e Salma se relacionaram e ele registrou pensando que era pai. E claro que também fingiríamos surpresa quando os avós entrassem na justiça e o DNA desse negativo. O que tínhamos a nosso favor? Eles não sabiam que Sebastian não era o pai. Ao menos por enquanto.
Duas semanas depois e eu ainda estava exausta e com mil pensamentos na cabeça. Pensei em dormir no quarto de Heitor naquela noite, mas acabei adormecendo no meu.
Na manhã seguinte, levantei cedo e ainda um pouco atordoada com tudo que estava acontecendo. Uma nova empregada fora contratada e Nicolete já havia pedido uma cozinheira com experiência.
Era oito da manhã quando a campainha tocou. Eu estava preparando o leite de Maria Lua, que já tinha acordado e estava com Nicolete no quarto.

A empregada atendeu e qual não foi minha surpresa quando me dirigia para o quarto da pequena e encontrei Cindy entrando pela porta, a passos firmes e seguros, usando um scarpin vermelho altíssimo, o que a deixava no mínimo uns 30 centímetros mais de altura do que eu.
Ela pareceu ficar tão impressionada com a minha presença quanto eu com a dela.
- O que você faz aqui? – Perguntei.
- Eu ia mesmo lhe fazer esta pergunta. – Ela sorriu sarcasticamente.
- Posso responder: eu moro aqui. – Olhei nos olhos dela.
Cindy me encarou por um tempo e depois começou a gargalhar, com a boca coberta por um batom vermelho de cobertura perfeita e brilhante.
- Não sei do que você está rindo. – Falei seriamente.
- Mulher, você é hilária.
Eu poderia discutir. E sim, ela estava em desvantagem naquele momento. Mas, Deus, o que aquela mulher ainda fazia ali? Só faltava ela ter a digital gravada, o que por sorte ainda não tinha acontecido. Quanto tempo eu teria que aguentar aquilo? O que faltava para Heitor demiti-la, afastando-a de vez das nossas vidas?
Enquanto eu pensava no que fazer, vi Heitor descendo as escadas sem pressa. Quando os olhos deles encontraram a loira do pau do meio, percebi que ele ficou completamente atordoado e encarou-me.
Cruzei os braços, com a mamadeira numa das mãos. Eu estava vestindo um conjunto de moletom e estava descalça. Meus cabelos nem tinham sido penteados, somente os enrolei num coque, prendendo no alto da cabeça com o os próprios fios.
Eu nunca me achei uma mulher feia, mas olhar para a loira com cabelos até a bunda, pele de porcelana, maquiagem refeita pela quinquagésima vez e vestido justo de couro com saltos àquela hora da manhã fez minha autoestima ficar debaixo do salto agulha dela.
- O que... Você está fazendo aqui? – Heitor perguntou a ela.
- O que estou fazendo aqui? Vindo da Babilônia. Aliás, você é o dono daquela porra. Quando vai aparecer por lá?
Olhei para ela e depois para ele. Quanta intimidade! Não que eu não tivesse, mas aquilo doeu em mim.
- Acho que precisamos conversar. – Heitor disse a ela.
- Não tenho nada para conversar com você, Heitor. – Ela afirmou.
- Você sabe que temos.
- Eu... Vou subir. – Falei, confusa e ao mesmo tempo querendo saber a reação que ele teria.
- Não, Bárbara, você fica.
Ok, senti firmeza. Claro que nem era para ela estar ali naquele momento. Mas já que estava, que ele deixasse bem claro a relação que tínhamos e dissesse de uma vez que estávamos... Praticamente morando juntos.
- Eu creio que... – Ele começou.
- Você não crê nada – Cindy cortou a fala dele – Eu tenho um contrato na Babilônia e a duração dele é de dez anos, caso não lembre, Heitor. O rompimento dele lhe dará uma grande dor de cabeça. Além da multa contratual, você terá que pagar meu salário integral vitalício.
Olhei para Heitor. Ele realmente tinha assinado aquilo?
- Eu assinei isso? – ele arqueou a sobrancelha – Juro que não lembro desta cláusula.
- Então é hora de rever o contrato que assinou, querido – ironizou – Sei de todos os meus direitos.
- E deveres? – perguntei – Sabe também seus deveres?
- Claro que sei, Bárbara. São eles... Rebolar minha linda bunda para lá e para cá... – ela rebolou – E chamar a atenção de todos com minha beleza e sensualidade no poste de pole dance. Eu sou a melhor no que faço e todos sabem disto. O público lota a Babilônia somente para ver o meu show. Você acha que é por causa do ambiente ou o DJ? – ela riu – Isso tem em qualquer casa noturna. Mas Cindy Connor, querida... Hum, isso só na Babilônia. Já contou a ela que eu dormi com Jon?
Balancei a cabeça, confusa, tentando não pensar que poderia ser “o meu Jon”.
Ela sorriu divertidamente:
- Pelo visto Heitor não contou. Não contou sobre o contrato, não contou sobre eu ter dormido com o seu ídolo, não contou sobre a proposta de sociedade que ele me fez para que eu não fosse embora... Contou sobre nossos planos para o futuro? Casar, morar em outro país, abrir uma casa noturna nos Estados Unidos, maior e mais conhecia que a Babilônia. Ei, já contou das nossas viagens durante as madrugadas, no seu jatinho particular, transando até chegarmos ao destino?
Respirei fundo, fazendo o ar preencher meus pulmões por completo. Descruzei os braços e disse:
- Passado – fui até o lado de Heitor e entreguei a mamadeira na mão dele, que segurou, olhando-a – Contratos podem ser rompidos. Famosos dormem com vagabundas de luxo para se satisfazerem. A proposta da sociedade não está mais de pé. Ou seja, pode ir embora. Sobre os planos para o futuro... Bem, o plano do futuro de Heitor está nas mãos dele neste momento: criar uma filha e ser um homem de família. Ele não é mais o homem que você conheceu. Hoje ele é muito mais o CEO da North B. do que o bêbado que mal sabia o que acontecia na Babilônia. As viagens... Bem, ficarão nos seus sonhos, pois não acontecerão novamente. Agora, se nos dá licença, precisamos alimentar nossa filha que acordou faminta.
- Filha? – Ela olhou para Heitor.
- Você realmente não gosta de contar as coisas, amor! – sorri, batendo no peito dele levemente com o dorso da mão – Ainda não falou a ela que você é papai?
- Eu sou papai. – Ele disse, um sorriso forçado no rosto.
- Isso é brincadeira de mau gosto? – Ela o olhou.
- Não. – Ele respondeu firmemente.
Ela virou as costas e tentou abrir a porta, sendo que fechadura não funcionava manualmente. Sorri internamente, indo até o sensor e colocando o dedo, desbloqueando a porta:
- Tenha um bom dia, “loira do pau do meio”. Seus dias de estrela do pole dance estão prestes a acabar. Muita coisa mudou desde que entrei na vida do seu chefe. Dentre elas, ele não é mais chupado... Ele chupa. – Pisquei e fechei a porta na cara dela.
Passei furiosa por Heitor, que disse:
- Eu não sei o que ela fazia aqui.
- Já deveria ter acabado com esta porra. – Reclamei, voltando e agarrando a mamadeira da mão dele.
- Estou tentando... Agora mais este contrato. Preciso reler.
- Não precisa – eu disse subindo as escadas – Pague a quebra do contrato e ponto final – estava no topo da escadaria quando disse – E trate de trocar o jatinho, caso queira que eu entre nele um dia, porque não sento de jeito nenhum numa poltrona que você tenha transado com ela.
- Ei, desclassificada, olhe se tenho caro de que faço isso – ele abriu os braços – Sou só um pai de família indo para o trabalho. Não mereço um beijo antes de partir? – um sorriso no canto dos lábios já me derreteu.
- Quando ela sumir definitivamente da sua vida, seja pessoal ou profissional, vai ganhar o beijo.
- Vai fazer greve de beijo? – Ele perguntou.
- Bem, só antes de ir para o trabalho. Liberado à noite.
- Venha para o meu quarto. Não provisoriamente... Permanentemente.
- Então tome seu lugar, Heitor... De pai, de companheiro... Eu preciso disso. Escolhi ser a mãe dela... Sei que você não escolheu ser o pai, mas eu gostaria muito que fizesse este papel. Amo você... E sabe que não poderemos gerar um filho de sangue. Maria Lua é o que temos... É parte de nós.
- Me dê um tempo, Bárbara! Preciso digerir isso tudo.
- Não demore, por favor... Isso serve para a loira do pau do meio também.
Um mês se passou e não houve nenhuma mudança nas nossas vidas, a não ser Maria Lua, que continuava a crescer como uma abóbora.
Anya e Breno não nos procuraram.
Sebastian e Milena compraram um apartamento no mesmo prédio de Heitor, deixando o meu antigo edifício sem elevador.
Heitor não ficou tão bravo como eu imaginava. No fundo, acho que ele até começava a se acostumar com a presença de Sebastian. Quanto a meu irmão: ele só queria ficar perto de mim. Recuperar o tempo perdido era tudo que desejávamos. Se Heitor admitia que começava a gostar um pouquinho do meu irmão? Óbvio que não.
Naquela noite eu tomei um banho demorado, como já conseguia fazer nos últimos tempos, visto que sempre tinha Nicolete ou Ben para ficarem com Maria Lua.
Ben, por sua vez, apesar de ter sido espezinhado por Tony, não parecia nada triste. Pelo contrário, o olhar dele era brilhante e eu sabia que quando aquilo acontecia ele estava de caso com alguém. Ou apaixonado pela milionésima vez.
Eu só não entendi o motivo de ele não ter me contato. O fato é que ficava pouco tempo em casa. De dia, na North B. À noite, por aí, especialmente entre a Babilônia, que agora ele entrava e saía a hora que tinha vontade, e o Hazard.
Eu não saía há um bom tempo. Estava trabalhando na decoração do quarto de Maria Lua, que acompanhei de perto, inclusive dando ideias, e me ocupando com a questão das grades de segurança e outros itens pela casa.
Mandy nos visitava todos os finais de semana e Allan geralmente vinha duas a três vezes por semana. A maioria delas, sem a presença de Celine. O que de fato acontecia é que tanto um quanto o outro, estavam completamente afeiçoados a Maria Lua, certamente sentindo por ela o amor de neta.
Assim que acabei meu banho, fui até o quarto de Maria Lua, ver como ela estava. Quando abri a porta, a cena que vi me deixou imóvel. Lá estava Heitor, sentado confortavelmente na poltrona, com ela em seu colo, mamando...
- Porra, você toma isso muito rápido. Por isso não para de crescer! Quero ver onde você vai parar.
Percebi que ela parou de sorver o leite, abrindo um sorrisão para ele. Senti meu peito se encher de alegria e amor. Enfim, parecia que o laço começava a se atar entre os dois. E eu sabia que assim que aquilo acontecesse de fato, seria eterno. Ele não precisava ter um DNA para provar a paternidade. Ele precisava sentir que era o pai, tanto quanto eu sentia que era a mãe, mesmo ela não tendo nascido de dentro de mim.
- Eu queria entender porque você não toma isto até o fim... Acha que as últimas gotas podem engordá-la? Sinto dizer, o estrago já está feito. Eu vi Nicolete trocar você ontem... E tem dobras nas suas pernas... Isso mesmo, “dobras”!
Ela deu um gritinho, extasiada com a conversa dele.
- Eu sei que você me entende... Embora ninguém acredite. Eu li que isso pode acontecer sim... Pode não entender exatamente o que eu quis dizer, mas já sabe quem sou. Já me identifica. Então... Quem eu sou? – Ele esperou por uma resposta, que não veio. Tudo que ela fez foi ficar olhando para ele, sem piscar.
- Tio Heitor? – Perguntei, abrindo completamente a porta e indo em direção a eles.
- Tudo, menos tio. – Ele sorriu.
- Onde está Nicolete?
- Ela está... Não sei. – Ele deu de ombros.
- Você que quis dar a mamadeira?
- Sim. – Confessou.
Sentei no braço da poltrona e abracei-o. Assim que me viu, os olhos verdes dela me encararam e as pernas chutaram o ar com força, sorrindo.
- Oi, raio de sol. Mamãe chegou!
- Você acha que “eles” ainda podem aparecer? – Heitor virou o rosto na minha direção, seriamente.
- Eu gostaria de pensar que não. Mas tenho certeza de que sim. O dinheiro deve estar acabando.
- Eu... Me pego pensando no que fizeram com a sua amiga... E não me passa pela cabeça vê-la junto deles.
- Nem na minha.
Maria Lua pegou o dedo de Heitor e colocou-o na boca. Ele tentou retirar, mas logo desistiu.
- Caralho, você não vai acreditar! – Ele quase gritou, me empurrando sem querer de onde eu estava sentada.
- Heitor, o que houve?
- Está nascendo um dente... Eu tenho certeza... Sinto um dente aqui.