Capítulo 107
2302palavras
2023-02-06 11:43
Fiquei pensativa. Não, eu não estava nem estive grávida. Eu não pari Maria Lua. Mas fui a primeira pessoa que a pegou no colo, que lhe deu tudo que eu tinha e não tinha e que enfrentava um duro danado a cada dia, tentando ser a melhor mãe do mundo para ela. Se alguém ousasse dizer que aquela criança não era minha, eu seria capaz de dar umas boas bofetadas.
- Não... Claro que não. – Respondi.
- Impossível. – Heitor falou.
- Impossível não é. – Olhei nos olhos de Heitor.
Claro que não era impossível. Nem lembro se chegamos a transar de camisinha depois da primeira vez. Ele sabia que eu tomava anticoncepcionais sem dar intervalo em função da endometriose, mas também não era tão íntimo da minha vida a ponto de saber se eu não esquecia alguns dias ou algo do tipo.
- Isso me dá esperanças. – Allan disse, me olhando de forma terna.
Peguei a mão dele novamente e disse:
- Realmente preciso ir. Mas assim que você sair daqui, prometo lhe fazer uma visita. E não será breve, pois eu acho que precisamos conversar um pouco.
- Precisamos? – ele sorriu despreocupadamente. – Sua presença na minha casa sempre será um prazer.
- Um prazer para ele, no caso. – Celine virou-se na minha direção, com o corpo escorado ao parapeito da janela.
Heitor retirou minha mão da de Allan novamente e disse:
- Bárbara precisa me levar em casa, pai. Já é tarde. Se precisar de alguma coisa, só ligar.
- Siga com suas preocupações profissionais na North B., meu filho. Nada é mais importante que isso.
- Você é mais importante que isso – Eu disse seriamente – Desde quando trabalho vem em primeiro lugar?
- Falou a mulher que trabalha em casa, no conforto do seu lar... Como babá – Celine se meteu novamente – Ou você não trabalha?
- Me defina “trabalho”, sograsta. Pode ser levando em conta o seu, se preferir.
Ela foi pega de surpresa. Percebi que procurava uma resposta rápida, não conseguindo, enquanto Heitor e Allan olhavam em sua direção.
- Eu... Eu... Organizo aquela mansão gigantesca. Se não fosse por mim, nada funcionaria naquele lugar. – Disse.
- Seu trabalho é dar ordens. Eu não sei se isso conta. Mas sim, cuidar de um bebê de quatro meses requer uma imensa responsabilidade. Ela precisa de mim para sobreviver e isso seguirá até poder tomar as próprias decisões e tornar-se independente e autônoma para fazer por si mesma o que hoje eu faço. Creio que “ser mãe” é a tarefa mais importante e o trabalho menos remunerado, mas mais precioso da vida.
- Celine, acho que poderia providenciar um jantar quando papai sair do hospital – Heitor disse – Quero levar Bárbara para apresentá-la oficialmente como minha namorada. E pode ser na mansão, já que o espaço é maior. Eu gostaria de convidar algumas pessoas do meu convívio e amigos mais próximos.
“Minha namorada”? Olhei na direção dele, nossas mãos ainda entrelaçadas. Meu coração simplesmente parou naquele momento e foi como se o mundo inteiro tivesse no “pause” e só existisse nós dois. Vi os lábios dele seguirem se mexendo, enquanto ele falava, mas eu não conseguia escutar nada.
Quando a boca dele voltou a fechar-se, eu disse:
- Vamos embora?
Ele me encarou, os cabelos ainda desgrenhados. Estava mais para sóbrio do que para bêbado. Na verdade, creio que a bebedeira já havia sido curada com os comprimidos e o banho gelado. Ou então eu poderia acordar no dia seguinte, que neste caso era o seguinte do seguinte, visto que o dia já estava nascendo, e tudo ser um sonho. Ou tinha a hipótese de ele não lembrar de absolutamente nada do que havia dito, especialmente o mais importante: que éramos namorados.
- Vamos. – Ele concordou.
Dei um beijo no rosto de Allan e quando me afastei, mirei no verde dos seus olhos, pensando na minha mãe e quantas vezes ela tinha entrado naquela fortaleza e o que ele escondia ali dentro. O que você sabe sobre ela, Allan? O quanto ela o amou a ponto de deixar a família e todo conforto por você? Há um motivo para você tê-la traído da forma como fez? Mas se ela não o amasse, não teria aceitado você de volta, mesmo sendo a amante. E onde Francesco Perrone, meu progenitor, entra nisto tudo?
- Promete a visita antes do jantar? – Allan pediu em forma de pergunta.
- Sim. – Sorri.
Mal sabia ele que era a chave para tantas das minhas perguntas e angústias sobre o passado. Imaginei se eu não devia odiá-lo, já que traiu a minha mãe. Mas julguei o filho dele antes de saber a verdade e me afastei dele sendo a pessoa mais injusta do mundo. Então Allan tinha direito de defesa, antes eu passar minha simpatia por ele à asco.
Antes de sair, fui até Celine, que permanecia recostada à janela, evitando o contato mais próximo comigo. Ah, eu adorava cobras bem-criadas. E no reino da Ironilândia, eu era a rainha.
Abracei-a com força, deixando-a completamente sem ação. Deitei a cabeça no ombro dela e disse, alisando suas costas:
- Sei o quanto se sente incomodada enquanto mãe por tudo que houve entre Heitor e Milena. Mas assim como você reergueu sua vida ao lado de Allan, eu também quero fazer isso com Heitor. Quero muito ser sua amiga, “sograsta”. E isso é de coração, acredite.
Sentia o coração dela batendo forte e uma leve tremedeira nos ombros. Quando a soltei, não precisei olhar para saber que os Casanova, pai e filho, estavam esperando ansiosamente pela resposta dela.
Acho que para ela pareceu uma eternidade engolir o ódio e orgulho e ter que apertar minha mão e falar:
- Acho que podemos ser amigas, Bárbara... Talvez grandes amigas. Me desculpe, mas sim, amo minha filha e por isso tenho estas atitudes possessivas algumas vezes. Pelo visto me entende, não é mesmo?
- Claro que sim.
Enquanto eu saía, me peguei pensando no que ela faria com relação a Maria Lua e sua certeza de que era minha filha com Heitor. Por que ainda não havia contado?
A estas alturas, eu não tinha mais medo de ele saber, embora preferisse eu mesma fazer isso. Aliás, eu já havia sido a primeira a lhe dar a notícia, que infelizmente ele não acreditou. Ou será que não “aceitou”? Seria Heitor capaz de rejeitar o nosso raio de sol? Se isso acontecesse, eu ficaria destruída e certamente não conseguiria me reerguer nunca mais.
Ela já tinha a morte da mãe biológica para digerir e mesmo que tivesse sido quando nasceu, eu sabia exatamente o quanto aquilo doía, independente de qual momento da vida fosse.
Agora, ser rejeitada pelo pai... Isso não havia digestão. E eu sabia por experiência própria.
Quando entramos no elevador e a porta se fechou, Heitor empurrou-me em direção a parede metalizada e fria:
- De costas. – Ordenou.
Virei-me imediatamente enquanto ele retirou meus cabelos da nuca, beijando a tatuagem que parecia ser seu fetiche e eu já sabia o quanto aquilo o enlouquecia.
- O que quer aí, namorado?
- Quero tudo, Bárbara... Tudo que você tem para me dar.
- Você merece uma coisa... Que ainda não fiz.
- Sim, eu mereço. E ainda tem uma para me dar, que ainda não deu.
Senti sua língua na minha pele, exatamente no lugar mais sensível do meu corpo, que era onde tinha a tatuagem do meu ídolo de adolescência. Meu corpo estremeceu ao toque e a pele arrepiou-se instantaneamente.
Sua ereção foi imediata. E sim, eu queria transar com ele no elevador, mesmo sabendo que tinha que chegar em casa em no máximo trinta minutos.
- Me fode aqui, Heitor! – Implorei, com a voz baixa, sentindo sua mão alcançar minha intimidade sob a calça larga que eu havia pego emprestada dele.
Mas o som do andar solicitado bipou e a porta se abriu, pegando-nos de surpresa. Se tinha alguém esperando para subir? Eu poderia dizer que não, mas éramos Heitor e Babi, então claro que havia duas enfermeiras aguardando com uma senhora de cadeira de rodas sendo conduzida por elas.
Creio que tenhamos ficado imóveis alguns segundos antes de ele retirar a mão de dentro da minha calça e tentarmos nos recompor.
Minhas bochechas certamente estavam tão vermelhas quanto uma maçã madura. Mas engoli a vergonha e me dirigi para fora do elevador, enquanto Heitor andava atrás de mim, segurando meus ombros.
- Eu conheço ele... É o CEO da North B. – disse uma delas enquanto entravam no elevador. – Ele não namorava com a dançarina?
Ok, pode ter sido um balde de água fria na minha cabeça. Quando chegamos ao Maserati, me dirigi ao banco do motorista, mas ele me impediu:
- Eu vou dirigir.
- Mas você bebeu.
- Não deve mais ter nenhuma gota de álcool no meu sangue. São seis horas da manhã.
- Você estava completamente bêbado. – Lembrei.
- Eu já disse que você me cura.
- Isso não existe... E sabe disto.
Ele levantou meu queixo:
- Pode dirigir o Maserati sempre que quiser, eu juro. Mas eu vou levá-la em casa.
- Se a polícia nos pegar de novo, talvez eu não consiga mais sair da cadeia. Será minha terceira vez. – Adverti.
- Bárbara, só há uma possibilidade de você ficar presa. E é nas minhas algemas, que estão sempre preparadas para impedi-la de partir.
- Eu não quero partir, Heitor. – Confessei.
- Então não parta... Nunca mais.
Levei as mãos à nuca dele, enquanto nossos olhos se encaravam. Ficamos assim por um tempo, eu recostada na porta e ele na minha frente, sem mover-se.
- Eu amo você. – Ele disse, com a voz tão nítida que chegou a impactar dentro da minha cabeça.
- Amo você, namorado. – Sorri.
- Eu nunca mencionei a palavra amor para nenhuma mulher até hoje, Bárbara. E achei que jamais sentiria esta porra. Eu amava minha vida... Até você chegar e virar tudo de cabeça para baixo.
- Tentei de todas as formas não sentir nada por você... Ou melhor, o ódio me bastava – sorri novamente, relembrando – Mas não sei exatamente em que momento ele se transformou em amor. Fiquei tão receosa de admitir isso... E tentei fugir de todas as formas deste “sentimento profundo” que tomava conta de mim.
- Sou um homem que literalmente já fez tudo na vida... Não deixei nada para trás, acredite. Eu estou preparado para ficar com você.
- E se você deixou algo para trás... E não se deu conta?
- Não deixei. Tenho certeza disso. Fiz tudo que eu queria. E até o que eu não queria, que era assumir a North B.
- Eu acompanhei seu crescimento na North B. E todos os veículos de comunicação tem falado muito bem da sua administração.
Ele tocou meus lábios:
- Obrigado por ter aparecido no meu apartamento e tirado aquelas mulheres de lá.
Meu telefone tocou. Era Ben. Atendi já dizendo:
- Estou indo.
- Preciso que venha logo, Babi. Eu consegui passagem e tenho hora marcada, porra.
- Preciso ir para casa, Heitor – falei – Menos de meia hora e estarei aí, Ben.
Ouvi o gritinho de Maria Lua ao fundo. Nossa, nem bem o dia havia amanhecido e ela já estava acordada. Literalmente, o raio de sol... O primeiro da manhã.
Entramos no carro e Heitor pôs Bon Jovi a tocar. Sorri, o encarando:
- Isso me agrada muito.
- Por que acha que botei a tocar esta porra? – Ele sorriu.
- Esta porra nada. É Bon Jovi.
Fiquei ali, ao lado dele, incerta de falar ou não sobre Maria Lua. Como contar a um homem que ele era pai enquanto ele dirigia um carro e eu tinha tempo cronometrado para chegar em casa?
Deus, não seria fácil. Não era só sobre a menina, mas também a forma como ele havia sido usado por Salma, que planejou aquilo muito por muito tempo.
E eu sabia que sim, havia a possibilidade de ele achar que eu estava envolvida de alguma forma com aquele plano macabro e sem noção dela. Por mais que eu tentasse me defender, só o diário poderia me inocentar, assim como a Ben.
- Ben vai procurar Tony – falei – Viajará hoje.
- Ele volta?
- Claro, tem o emprego dos sonhos esperando por ele – sorri – Só espero que ele volte com o amor da vida dele a tiracolo.
- Eu gosto muito de Ben.
- Ah, que fofo! – Toquei a perna dele carinhosamente.
- Mais para cima, Bárbara... – Ele puxou minha mão de encontro ao seu pau, sob a calça.
- Porra, Heitor, você não vale nada.
- Eu nunca disse que valia.
- Não quero começar algo que não possamos terminar.
- Quem disse que não podemos terminar?
- Eu digo. Não há tempo suficiente.
- Vai me chupar por mais de vinte minutos? – Arqueou a sobrancelha, pensativo.
Comecei a rir:
- Eu não disse que faria isso.
- O que faria, então?
- Preciso mesmo explicar? – Não contive o riso novamente – Mas eu prometo que quando isso acontecer, posso levar mais de vinte minutos, se assim for seu desejo.
- Não é o seu?
- É... Já me peguei pensando nisso algumas vezes – confessei. – E... Quero muito fazer.
- Tudo que é muito planejado não dá certo.
- Eu sei... Ah, se sei. Por isso mesmo não estou planejando chupá-lo, senhor Casanova. Quando acontecer, simplesmente acontecerá.
- Vinte minutos e eu terei gozado duas vezes. – Me olhou de relance.
- Posso engolir até três... Garanto.
- Caralho, você quer me matar, é isso?