Capítulo 61
2125palavras
2023-02-06 11:18
- E da outra não era? – ele perguntou, ironicamente. – Sente-se. – falou seriamente.
Ok, não era um caso de vida ou morte, em que eu precisava me demitir e sair correndo, embora sim, eu tivesse um pouco de pressa. Precisava voltar ainda aquele dia pra cidade onde vivi boa parte da minha vida.
Olhei para Sebastian. Nos conhecíamos há pouco tempo, mas tivemos certa ligação desde o primeiro momento que nos vimos. Ali, de frente para ele, cheguei a lembrar de quando estava naquela mesma cadeira, pedindo emprego, dois meses atrás. O olhar interessado dele e o pedido de sinceridade durante a entrevista.
Eu ainda não tinha certeza se realmente estava na Perrone pela minha capacidade intelectual ou para servir de vingança contra Heitor Casanova. Também tentava entender o motivo pelo qual Sebastian tentava me manter ali a qualquer custo, mesmo eu tendo pedido adiantamento no segundo dia de trabalho, estar envolvida, ou melhor, “ter estado” envolvida com o homem que ele odiava, ter me metido na vida pessoal dele e ainda lhe dado uma bofetada, seguido de outra pelo meu melhor amigo.
- Minha avó teve um infarto. Ela está hospitalizada.
- A mãe da sua mãe? Isso?
- Você já sabe que não sei sobre a família do meu progenitor. Minha árvore genealógica é cortada do lado paterno, ou seja, falta uns galhos. Então é claro que é a minha avó por parte de mãe, uma Novaes, no caso.
- Qual o estado de saúde dela?
- Não corre risco de vida. Mas também não há previsão de alta. Ela mora sozinha, num sítio, retirado da cidadezinha de onde vive. Não posso deixá-la sozinha, por mais lúcida que ela seja, entende? Com relação à família sanguínea, só temos uma à outra.
- Você não tem certeza do que está dizendo, Bárbara. Talvez você tenha parentes pelo lado paterno... Irmãos, sobrinhos, tios, tias... Nunca pensou nisso? Nunca teve curiosidade em saber suas origens?
- Não. Minhas origens são os Novaes. – falei firmemente.
Ele suspirou:
- Pretende largar tudo e ir morar com a sua avó, então? Há possibilidade de emprego por lá, na sua área?
- Não. Mas não posso me importar com isso no momento.
- Por que não a traz para cá? Na capital de Noriah Norte há muito mais recursos médicos e você sabe disto. Ela é saudável? Ou já tem alguma doença pré-existente? Qual a idade dela?
- Ela tem 67 anos, mas se você olhar para ela não vai acreditar. Ela é linda e bem conservada. Coordena um sítio sozinha, cria animais, planta algumas coisas...
- Para consumo próprio?
- Não. Ela chama de sítio, mas está mais para fazenda. Ela vende os produtos que produz. Tem vários empregados e... Uma vida financeiramente estável.
- E você é a única herdeira?
- Sim.
- E por que veio parar aqui, implorando por um emprego? Por que divide um apartamento pequeno com amigos? Por que...
- O dinheiro é dela, não é meu. – Cortei o assunto.
- É seu. – Ele estreitou os olhos. – Você é a herdeira única. Poderia até mesmo dirigir o negócio e deve saber disto.
- Não quero trabalhar com isso. Quando ela morrer vou vender.
- Você não é uma pobre moça atrás de emprego.
- Sim, eu sou. Nunca fui de tirar proveito das pessoas. Minha mãe me ensinou a ser assim. Vez ou outra aceitei o pagamento de um aluguel por parte de Mandy... E até um celular. Ela também me ofereceu as joias da minha mãe, caso eu quisesse vender, porque sabia que dinheiro vivo eu não aceitaria. A herança é minha “quando” ela morrer. Antes disso, eu sou a mulher que divide o apartamento pequeno com os melhores amigos que alguém pode ter... E procuro o emprego dos meus sonhos, que confesso que encontrei aqui, Sebastian. Sou grata pela oportunidade que você me deu.
- Está brincando! Isso não é uma despedida. Eu não vou lhe dar sua demissão.
Eu ri:
- Você não tem escolha.
- Lhe dou o tempo que precisar. Quando voltar, seu emprego estará aqui, esperando por você.
Levantei e andei vagarosamente, enquanto dava a volta na mesa dele. Sentei sobre ela e fiquei quase em cima dele. O encarei no fundo de seus olhos azuis e não consegui identificar absolutamente nada neles.
- O que você me esconde, Sebastian? O que realmente quer de mim?
- Confia em mim? – ele pegou minhas mãos carinhosamente.
- Não. – Fui sincera. – Eu mal conheço você. Por que a insistência na minha pessoa?
- Você poderia ser a criança que minha mãe abortou.
- E eu não estaria pedindo emprego na sua porta, porque teria o que... Dez, quinze anos?
- Preciso de alguém de confiança na Perrone.
- Tony é o que? Eu sei que vocês são amigos.
- Você é sincera... Simples assim. Eu confio e acredito em você. Não só na sua capacidade de criação e expansão da empresa através do marketing e da propaganda, mas também que jamais você irá me trair. Ou me deixar. Porque você sabe ser grata, é inteligente, dedicada...
- E desvairada? – eu ri.
- Um pouco louquinha. – Confessou. – Acho que com esta parte eu ainda estou me acostumando.
Sem pensar muito, instintivamente, o abracei, ainda sentada sobre a mesa. Ele deitou a cabeça sobre as minhas pernas e alisei seus cabelos lisos, bem cortados.
- Eu tenho saudades de casa. – Ele disse, sem levantar. – É difícil ficar aqui... Sabendo que a minha vida inteira está lá.
- Eu entendo. Saudade é uma coisa horrível de sentir. Mas pense que você pode ir lá quando quiser e matar este sentimento. Eu não posso... Minha mãe já se foi. Só me restam lembranças.
- Eu sinto saudade do meu pai.
- Ele parecia ser um bom homem.
- Teve seus defeitos, como qualquer pessoa tem. Mas era um homem do bem.
- Eu quero que você seja muito feliz, Sebastian. Não sei explicar, mas gosto de você.
- Também gosto de você. – Ele levantou a cabeça, olhando nos meus olhos. – Com todo respeito.
Começamos a rir.
- Eu não posso deixar você na mão, agora que começamos a investir nos rótulos. Não acho justo ficar ligada à empresa e não poder prestar o atendimento que a Perrone necessita. Não é certo.
- É justo, acredite. Você precisa de um tempo e eu preciso de você aqui.
Levantei da mesa e fui para o fundo da sala, olhando o vidro que me deixava ver toda a North B., se eu levantasse a cabeça para cima. Lá no topo, havia um certo CEO, que eu tinha vontade de esfolar vivo... E depois enchê-lo de beijos... E sentir a língua dele na minha... Tanto na minha boca quanto na minha vagina.
- Você não tem ideia do quanto eu ouvi de “Eu preciso de você” nas últimas semanas. – falei, sem olhá-lo. E não sei o motivo, porque eu continuo sendo Bárbara Novaes... Ou simplesmente Babi. Fico a imaginar o que mudou entre mim e as pessoas novas que me cercam. – Olhei para Sebastian. – Eu não posso ser salvação para ninguém... Mal sei salvar a mim mesma.
Sebastian veio até mim e abraçou-me:
- Eu não acho que você vá aguentar ficar longe, Babi. A sua vida inteira está aqui. E ali. – ele apontou para a North B.
Suspirei, resignada. Eu não iria contar a ele sobre o acontecido entre mim, Heitor e Cindy, porque certamente ele diria que me avisou. Mas eu não era alguém que sabia ouvir as pessoas. Eu só ouvia a mim mesma.
- Você acha que eu seria capaz de me apaixonar por Heitor Casanova? – me ouvi perguntando, ainda com os olhos voltados para último andar da North B.
- Não acho que ele mereça o seu amor. Mas acho que Heitor Casanova poderia se apaixonar por você. Porque Bárbara Novaes é diferente de todas as mulheres que ele encontrou pelo caminho até hoje... Disso eu tenho certeza. – Ele riu.
- Eu preciso ir, Sebastian. – Olhei no relógio e me dei em conta de que já estava falando demais e o tempo passava.
- Aguardo você em uma semana. É tempo suficiente para resolver seus problemas com sua avó.
- O que o faz ter tanta certeza de que vou voltar?
- Não tenho certeza. Só estou contando com meus instintos... E com Heitor Casanova.
- Como assim?
- Se não voltar por mim e pela Perrone, você voltará por ele.
Olhei uma última vez pela janela. Dei um beijo em Sebastian e o abracei:
- Lhe dou um retorno em uma semana. Preciso ver como Mandy vai ficar e o que nós duas vamos decidir.
- Combinado. Estarei esperando. Temos um projeto para botar em ação.
- Você poderia já começar, Sebastian. Não podemos esperar ainda mais.
- Eu quero você ao meu lado no lançamento dos novos rótulos.
- Obrigada. – Pisquei e saí.
Olhei para as duas secretárias, que estavam no computador. Nem perceberam que eu havia saído da sala.
Andei até a sala de Tony e bati na porta. Demorou até alguém abrir a porta. Entrei e vi Ben completamente descabelado e Tony com a roupa amassada. Certamente estavam transando ali. E eu aposto que estava bom demais, pelos rostos vermelhos dos dois. Eles nem falar foram capazes, pegos de surpresa por mim.
- Eu... Vou até a North B. – avisei Ben.
- Eu vou junto. – Ele veio na minha direção, tentando se recompor.
- Não. Isso é uma coisa que eu preciso fazer sozinha. – Fui firme, ou ele realmente me acompanharia.
- Eu... Sinto muito pela sua avó, Babi. – Tony disse.
- Obrigada, Tony. Agora, por favor, trate de segurar seu companheiro porque eu preciso ir sozinha até a North B.
- Pode deixar que Ben vai fazer o que você está pedindo. – Ele garantiu.
- Vou? – Ben o olhou, confuso.
- Vai. – Ele foi firme.
Até porque Ben sempre precisava de alguém que falasse com firmeza com ele, ou tomava conta da situação.
Respirei fundo e segui meu caminho, atravessando a rua em direção à North B., sentindo meu coração já batendo mais forte assim que avistei Anon, mexendo no celular, próximo da porta de vidro, que era a entrada para a empresa.
Toquei no ombro dele:
- Oi, Anon 1.
Ele deu um largo sorriso. Eu estava evoluindo... Dois sorrisos em menos de uma semana. Uma pena que agora certamente não nos cruzaríamos mais.
- Senhora Bongiove. Quanto tempo!
- Nem inventa, Anon 1. Foram só alguns dias... Dois, na verdade.
- Dois que eu fui até o seu apartamento, buscá-la...
- Sim... E eu não estava lá. – Comprimi os lábios.
- A senhora pode entrar. – Ele apontou para a porta.
- No sábado você foi me buscar... E eu não estava. Então... O que o seu chefe falou?
- O senhor Casanova?
- Sim... Será que você pode me contar exatamente cada frase que falou com ele? – sorri, esperançosa.
- Liguei e avisei que ninguém atendia a campainha. O senhor Casanova disse que o telefone da senhora dava desligado. Depois de um tempo ele mandou que eu voltasse.
- E tipo... De que forma ele mandou você voltar? De forma calma e tranquila... – sorri docemente. – Ou bravo, furioso, querendo me matar? – enruguei a testa, fazendo cara de brava.
- Ele disse: “Esta mulher está brincando comigo!”
- Olha só, eu não estava. Minha avó ficou doente, teve um infarto na verdade e foi parar no hospital. Ela mora longe e eu sou a única pessoa que ela tem. Claro que tive que ir, entende? Você também não faria isso no meu lugar, Anon 1?
- Sim, senhora Bongiove.
- Eu vou lá... Dar-lhe a chance de se explicar comigo.
- Vai dar tudo certo, senhora Bongiove.
- Cruze os dedos por mim. Porque das duas uma: ou fazemos as pazes ou quebro a cara dele.
- Acho melhor que façam as pazes, senhora Bongiove. Seria melhor... Para os dois.
- Eu adoro você, Anon 1. – Dei um abraço nele. – Sempre gostei mais de você do que do Anon 2. Mas não conte para ele, tá bom? Sabe como é... Pode rolar um ciúme. – Pisquei.
Sim, eu realmente gostava mais de Anon 1. Acho que até já éramos amigos. Na verdade, eu tinha certeza.
Bem, agora não adiantava mais tentar matar tempo. Era hora de entrar na North B. e enfrentar Heitor Casanova, o desclassificado Mor dono não só da porra toda, mas do meu coração inteirinho.