Capítulo 38
2144palavras
2022-12-24 14:44
Passava das 10 horas da noite quando a campainha tocou. Salma ainda nem tinha saído para o trabalho e eu e Ben estávamos decidindo o que iríamos jantar.
Ben foi atender e eu segui olhando o cardápio das tele entregas de comida da vida.
- Babi, tem um Anon na nossa porta. – ele gritou, segurando a maçaneta, a porta entreaberta.

Olhei surpresa:
- Anon 1? O que houve? – me encaminhei para a porta. – Quer entrar?
- Não, senhora Bongiove, obrigado. Vim lhe trazer isso... A pedido do senhor Casanova.
- Pai ou filho? – Ben perguntou, curioso.
- Heitor Casanova. – explicou.
Peguei o envelope e abri. Meu coração quase saltou pela boca e comecei a pular.

- O que é? – Salma veio até nós.
- Um ingresso VIP, eu disse “VIP” para o show do Bon Jovi. Primeira fila... Tem noção? – abracei Anon com força e lhe deu um beijo. – Diga ao senhor Casanova que eu amo ele.
- Ok, senhora Bongiove. Boa noite.
Ele se virou em direção a escadaria e eu parei na frente dele, impedindo-o de sair:

- Entendeu que foi uma brincadeira, não é mesmo, Anon 1? Tipo... Eu não amo ele verdade.
- Dizer que você o ama de brincadeira, senhora? – arqueou sobrancelha, seriamente.
- Não... Diga, apenas... “Obrigada”. Você entende tudo muito no sentido literal.
- O quer que eu diga afinal, senhora Bongiove?
- “Obrigada”. – fiquei séria, ainda sentindo meu coração querendo saltar pela boca. – Nada mais que isso.
Entrei e fechei a porta, colocando o ingresso junto do meu peito.
- Caralho, agora você tem dois. E a gente aqui se esforçou bastante para lhe dar um ingresso barato. – Ben ficou me olhando, decepcionado.
- Podemos ir juntos. Tenho dois ingressos agora.
- Eu não gosto do Bon Jovi, “senhora Bongiove”. – Imitou Anon falando.
- É só um show, Ben. Não tem como não gostar.
- Ficaremos separados, Babi. Não teria graça. Acho que deve vender o ingresso que lhe demos.
- Eu não faria isso.
- Não pode usar dois.
- Vou usar o de vocês.
- Só se estiver louca. – Salma falou. – Claro que vai no VIP. Você vai ficar na frente do palco. Venda o outro e está tudo certo. Sem ressentimentos... Pelo menos da minha parte.
- Porra, estou curioso sobre qual será o próximo presente. – Ben bateu palmas. – Já temos uma fachada pintada com flores, joias devolvidas, que na verdade, é um presente... E bem, bem caro. Agora um ingresso que vale quase o valor de um mês de aluguel... Se ganhar um carro, será que pode escolher a marca?
- Você só pode estar louco, Ben.
- Por que tanta gentileza? Você nem é experiente sexualmente, tipo, uma deusa do sexo selvagem.
- Ben, isso é ofensivo.
- Você fez boquete nele?
- Claro que não.
- Então por que está ganhando os presentes?
- Porque ele está gostando dela... Simples assim. – Salma pegou água na geladeira.
- Não... Não é isso. Na verdade, nem sei porque ele está fazendo isso. Eu inclusive nem fui na seleção da North B. hoje.
- Talvez ele queira fazer você mudar de ideia e trabalhar com ele. – Salma continuou.
- Babi, vou ter que lhe ensinar umas táticas infalíveis para você conquistá-lo na primeira vez de vocês. Aposto que ele vai lamber o chão que você pisa. – Ben disse.
- E você acha que ele já não está lambendo? – Salma perguntou ironicamente.
- Decidi que quero pizza... Qualquer sabor. – falei, indo para o meu quarto e fechando a porta.
Deitei na cama e olhei novamente o ingresso. Aquele nervosismo e alegria todo não era pelo ingresso VIP. Era por “ele” ter lembrado de mim e de coisas que eu gostava.
Deus, era Heitor Casanova. Ele tinha empresas pra gerenciar, uma boate que cuidava à noite, mil pessoas ao redor dele, incluindo sua noiva e a amante... E de alguma forma quis me presentear com algo que era importante para mim.
Eu sabia exatamente o que ele queria... Mas não tinha certeza se estava disposta a dar. Corria o risco de transarmos e ele nunca mais me procurar. A questão é: eu queria ser procurada depois?
Ele me fazia arder em fogo com um simples toque. Qual o motivo de não aproveitar aquilo e ser feliz sexualmente? Como dizia Ben, sexo é sexo. E eu nunca tive sexo de boa qualidade. Heitor não tinha jeito de ser ruim de cama... Pelo contrário, parecia um deus do sexo.
Ok, ele estaria traindo a noiva... E a amante, teoricamente. Será que eram só as duas, ou haviam outras? Eu queria fazer parte do harém dele? Eu nem conhecia Milena... E Cindy... Ah, Cindy oxigenada do pau do meio merecia uns bons chifres dados por mim.
Consegui uma sala na Perrone que não era no andar do CEO, embora ele já estivesse me esperando antes de eu chegar na empresa. Não sei se fazia parte do contrato trabalharmos juntos, mas era isso que estava acontecendo.
No fim, eu gostava de Sebastian. E ele era muito inteligente. Eu tinha certeza de que ele iria se sair muito bem seguindo os negócios do pai. E o que admirava nele é que apesar de tudo, era muito profissional. O bom relacionamento que ele tinha comigo era estendido a todos os demais funcionários da empresa. Polido, educado, de bom coração.
Aproveitei-me do bom coração que sabia que ele tinha, e pedi:
- Senhor Perrone, será que... Eu poderia receber um adiantamento?
- No segundo dia de trabalho? – ele arqueou a sobrancelha, enquanto segurava o riso.
- Preciso pagar uma coisa... Tipo... Uma roupa de outra pessoa que eu acabei vendendo. É uma questão de honra devolver o dinheiro, no caso, já que a pessoa comprou o produto novamente.
- Vendeu a roupa de alguém?
Assenti, com a cabeça.
- Por que faria isso?
- Provocação... Acho.
- Casanova?
- Sim.
- O que vendeu dele?
- O casaco.
- O que você fazia com o casaco de Heitor Casanova.
- Bem... Eu gostaria de não falar esta parte.
Ele suspirou:
- Não somos amigos, Babi... Mas certamente seremos um dia. Eu me preocupo com você... E sei o quanto é perigoso se envolver com Heitor Casanova.
- Eu não estou envolvida com ele.
- Heitor não tem coração. Ele é um homem de 30 anos com a cabeça de 20. Imaturo, fora da realidade, egoísta e egocêntrico. E ele não vai mudar... Não aos 30 anos.
- Não acredito em mudanças, Sebastian. Convivi com uma pessoa por oito anos me prometendo mudanças... E isso não ocorreu.
- Então por que está cruzando a linha vermelha?
- Não estou... Na verdade, pagando o blazer eu... Quito minha dívida com ele, definitivamente. Não me sinto bem pelo que eu fiz. Quero... Distância de Heitor Casanova. Para isso... Devo lhe pagar. É o que diz minha consciência.
Ele suspirou novamente. Meu telefone tocou. Atendi:
- Senhorita Novaes?
- Ela.
- Aqui é da Clínica de saúde da mulher. Sou secretária do doutor Telles, que lhe atendeu no hospital, na sua crise aguda de cólica.
- Sim...
- Os exames que ele solicitou e foram feitos no hospital estão todos prontos. O doutor gostaria de vê-la hoje às 17 horas. É possível?
- Sim... Estarei aí.
- Ok, confirmado então. Se puder trazer seus exames anteriores.
- Levarei.
Desliguei o olhei para Sebastian:
- Ok, agora mesmo que eu preciso de um adiantamento. E se não bastasse, eu tenho que sair meia hora antes.
- Sério?
- Sim... Ou prefere que quando eu entrar no período menstrual não venha trabalhar de tão mal que fico?
- Pode ir. O adiantamento é diretamente no setor Financeiro.
- Obrigada, Sebastian. Você é um amor. – Levantei e deu um beijo nele.
- Onde está o senhor Perrone? – ele brincou.
Sai, rindo e me sentindo agradecida pelo rumo que as coisas estavam tomando... Mesmo as que eu sentia que estavam saindo de controle.
Saí praticamente correndo da Perrone as 16 horas e 30 minutos para estar no horário marcado na tal Clínica da Mulher, que eu sabia onde ficava, mas nunca havia ido.
Era um prédio enorme, que só tratava mulheres, com ginecologistas, obstetras, ecografias e tudo que se referia ao atendimento feminino.
Era um lugar caro e frequentado por mulheres de classe mais alta, visto que não atendia convênios. E o que eu faria ali? Falaria com o médico, pagaria com meu adiantamento que fiz nos primeiros dias de trabalho e certamente teria que migrar para um lugar mais barato ou que atendesse pelo meu convênio.
Mas achei o médico bom, que havia me atendido no hospital que Heitor me levou. Fiz vários exames que nunca tinha realizado antes e também foi interessante a forma como ele abordou a endometriose, de forma mais leve e menos assustadora, como o médico anterior, que descobriu a doença.
Andei duas quadras e cansei. Estava de saia, sapatos altos demais e minhas pernas doíam. Peguei um táxi, que me deixou em frente ao prédio moderno e bem-conceituado.
Tinha dois elevadores. Fiquei receosa. Se tinha pessoa azarada para elevadores era eu. Mesmo na Perrone tinha vezes que eu subia ou descia pela escada, para não quebrar os elevadores da empresa. Claro que era quando eu não estava tão cansada.
A porta do elevador se abriu e a mulher que estava atrás de mim entrou, perguntando:
- Você vem ou fica?
- Vou... – falei, aturdida.
Não, eu não poderia ser uma destruidora de elevadores. A questão é que foram duas coincidências... Só isso. E nas duas eu não estava sozinha, então o culpado poderia ser Heitor Casanova. Porque e elevador do meu prédio eu nunca tinha usado e quando entrei nele a primeira vez, Heitor estava comigo.
Cheguei no andar indicado e procurei a sala com a numeração do doutor Telles. O consultório era grande, bonito, decorado de forma moderna. Tinha alguns quadros abstratos na parede em tom pêssego e os móveis combinavam perfeitamente com o lugar.
Duas secretárias atendiam. Assim que cheguei, identifiquei-me e ela pediu que eu aguardasse um minuto. Eu sabia que “um minuto” não significava sessenta segundos na língua de médicos e secretárias.
Claro que cinco minutos depois e meu sapato já tilintava em pés ansiosos, batendo no chão.
Não tinha ninguém ali a não ser eu e as duas secretárias, que não diziam uma palavra, só digitavam no computador.
Assim que minha paciência já havia esgotado, em mais de dez minutos de espera, a Secretária chamou, parecendo adivinhar minha insatisfação com a espera.
Ela abriu a porta e eu entrei, na sala ainda maior que a recepção. E dei de cara com o doutor Telles e ninguém menos que Heitor Casanova sentado numa das cadeiras de frente para ele.
Fiquei parada, incerta sobre entrar ou não.
- Entre, senhorita Novaes. – o doutor Telles falou.
- Você é médico também? – olhei para Heitor.
- Olá, Bárbara. – ele sorriu, fazendo meu coração se derreter, me deixando confusa e com a mente pifada.
O doutor Telles veio até mim e cumprimentou-me, levando-me até a cadeira, que puxou para que eu pudesse sentar. Eu não sabia se olhava para Heitor, se perguntava de vez para o médico o que o CEO estava fazendo ali, na minha consulta... Ou não fazia nada disso e dava atenção ao meu coração, que parecia num início de taquicardia.
- Estou com todos os seus exames aqui. – ele abriu o computador.
- Eu... Vim conversar com o doutor Telles... Para tentar entender um pouco mais sobre a endometriose. – Heitor explicou-se.
O confuso disso tudo é que não havia nenhum tipo de ironia nas palavras dele. Pelo contrário, estava sério e parecendo realmente interessado na minha doença.
- Então ele deve ter explicado que não é nada sério. – olhei para o doutor. – Não vou morrer, senhor Casanova...
- Acho que se não fosse tão sério você não desmaiaria de dor, não é mesmo? Eu creio que isso tenha acontecido várias vezes. E quero que passe, que acabe... Que não sinta mais dores, Bárbara.
- O senhor Casanova parece interessado e consternado com o grau de desenvolvimento da sua doença, senhora Novaes.
Olhei para o médico e depois para Heitor. Será que eu estava tão ruim a ponto de ele ter chamado alguém para me dar a notícia, caso eu tivesse um surto, chorasse ou algo do tipo?
- Bárbara, eu quero custear todo o seu tratamento.
Arqueei a sobrancelha, ainda confusa:
- Por... Qual motivo?
Ok, eu precisava respirar fundo e botar minha cabeça em ordem. O problema é que Heitor estar ali me deixava muito vulnerável e nervosa.
- Algo que eu deva me preocupar, doutor?