Capítulo 30
2442palavras
2022-12-24 14:40
- Pense pelo lado positivo, Bárbara. Se eu não estivesse em posse das suas joias, teria que vendê-las para pagar a conta agora. Ou seja, de uma forma ou de outra, teria se livrado delas para sair de uma de suas encrencas.
- Você pensa em devolvê-las para mim um dia? – virei minha cabeça na direção dele.
- Sim... Da mesma forma como você pensa em devolver meu blazer. – falou seriamente.
Virei a cabeça de novo, olhando para o teto. Senti meu coração acelerar. Ok, eu vendi o blazer dele. Então jamais veria as joias da minha mãe de volta. A não ser que... Comprasse o blazer de volta. Ou quem sabe lhe dava a roupa que eu usava, que foi o que fiz com o dinheiro. Fora a noitada no Hazard.
- Vou devolver o blazer. – falei, sem olhar para ele.
- Como faria isso?
- Entregando nas suas mãos. Acha mesmo que eu ficaria com algo que não me pertence?
- Não acho que ficaria. Talvez... Vendesse?
- É isso que pensa de mim, senhor Casanova? – me fingi de chateada.
- O blazer está comigo, Bárbara.
Sentei novamente, confusa e aturdida:
- Não pode...
- Ele foi feito especialmente para mim... Tem as minhas iniciais.
- Seu casaco é rastreável? – arqueei a sobrancelha.
- Claro que não. – Ele riu. – O lugar para onde você vendeu me ligou.
- Porra, que desonestos. Você teve que comprar seu blazer de volta?
- Sim.
- Então eles receberam duas vezes?
- Sim.
- Mas... Você precisava tanto assim do casaco? Por que me deu então, se era tão valioso?
- Não era... Mas eu queria saber até onde você iria.
- Ok, eu vendi. Foi um caso de emergência.
- O que fez com o dinheiro?
- Comprei esta roupa para a entrevista. – Confessei. – E bebi um pouco dele... No Hazard, um bar perto da minha casa.
- Sem problema, Bárbara.
- Sem problemas? Mas eu não tenho como devolvê-lo agora... Ou melhor, não preciso devolver mais, afinal, está com você, não é mesmo? – tentei.
- Me entrega sua roupa e me leva para beber e devolvo suas joias. – Fechou os olhos de novo, sem se preocupar muito com tudo que eu sentia com a possibilidade de recuperar as joias que foram da minha mãe.
Deitei de novo, colocando as mãos sob a cabeça e olhei para o teto, sendo firme:
- Não vou chupá-lo para reaver minhas joias. – falei, ao mesmo tempo que o médico entrou no quarto, parando na porta ao escutar a frase.
Senti meu rosto enrubescer.
- Acho que ela pode estar delirando, doutor. – Heitor falou, levantando. – Eu estava mesmo indo chamar alguém para verificar a febre dela.
- Eu... Não ouvi nada, senhor Casanova. – O médico foi até ele, apertando sua mão. – É um prazer conhecê-lo pessoalmente.
- Quero que foque em Bárbara Novaes, por favor. – Ele foi direto.
- Claro, claro... Estou a par de tudo. Olá, senhorita Novaes. Faremos alguns exames e em breve terá seu diagnóstico preciso, junto do tratamento eficaz para endometriose.
- Eu não vou passar a noite aqui. – Olhei pela janela, enquanto o sol ia embora.
- Claro que não. Faremos os exames e depois estará liberada. Retornará quando os resultados estiverem todos nas minhas mãos.
- Então nem se dê ao trabalho, doutor. Não posso voltar, pois não terei dinheiro para pagar.
Ele olhou para Heitor Casanova, que estava no celular e respondeu, sem largar o aparelho:
- Não dê ouvidos à Bárbara, doutor. Sou eu quem está pagando tudo. Faça o que precisa ser feito.
- Ele nem sabe o que está falando, doutor.
- Bárbara, venha comigo, por favor. – pediu o médico.
Levantei, sentindo as dores bem mais fracas.
- Vamos começar os exames, ok?
- Vou aguardá-la aqui, doutor. Ou prefere que a acompanhe? – Heitor perguntou, ainda no celular.
- Pode aguardar, senhor Casanova. Mas talvez ela demore um pouco para ser liberada.
- Não tem problema. Resolvo minhas questões por telefone. É tranquilo trabalhar por aqui.
- Senhor Casanova, eu quero deixar claro que aquele desclassificado roubou a minha ideia. – falei.
Ele deixou os braços caírem ao longo do corpo, deixando alguém falando sozinho ou sozinha ao celular e disse:
- Do que você está falando?
- Do ladrão de projetos... Da North B.
Ele balançou a cabeça e voltou ao telefone:
- Depois, Bárbara... Depois.
Fui liberada já era mais de onze horas da noite. Mas o médico, embora ainda sem todos os exames concluídos, confirmou que a endometriose estava num estágio bem avançado, o que me preocupou ainda mais.
Recebi também uma injeção para dor, que ele garantiu que me deixaria bem por no mínimo algumas horas. Também receitou outro medicamento, trocando os do meu médico. E mandou seguir com os anticoncepcionais.
Heitor Casanova acertou a conta de hospital e fomos juntos até a saída.
- Obrigada, Senhor Casanova. – falei, já do lado de fora da porta do Hospital.
- Este é um exemplo de como sou um bom chefe e me preocupo com meus funcionários. – falou.
- Eu ainda não sou sua funcionária. E certamente não serei...
- Certamente não. Você tentou agredir fisicamente um candidato que era seu concorrente.
- Ele roubou minha ideia. – Comecei a me alterar.
O carro dele parou e eu repeti, desistindo de me defender:
- Boa noite, senhor Casanova. E obrigada mais uma vez pela gentileza.
- Por que está se despedindo antes de chegarmos na sua casa? – arqueou a sobrancelha.
- Porque eu vou embora.
O motorista abriu a porta:
- Fico feliz que esteja bem, senhora Bongiove.
- Anon 1, eu estava bem antes. Não vou deixar você me levar em casa, Senhor Casanova.
- Já sabemos o caminho, senhora Bongiove. – disse Anon.
- Claro que sabem... Porque estragaram a fachada do meu apartamento, não é mesmo? – falei, furiosa.
- Não... Peguei seus dados na ficha que preencheu na empresa, Bárbara. – Heitor disse, me empurrando para dentro do carro.
- E foi desta forma também que mandou um delinquente escrever no meu prédio?
- Nada a declarar, senhorita Bongiove. – Ele debochou.
- Anon 1, pare o carro. – falei.
- Eu não posso, senhora. Só obedeço ao senhor Casanova.
Me recostei no acento do banco, fechando os olhos. Estava cansada. Anon me entregou uma embalagem com comida. Estava quente ainda. Senti o cheiro antes mesmo de abrir.
- Eu não acredito, Anon 1. Você é muito gentil. – Abri rapidamente.
- Pediu comida. Já é a segunda vez que ele compra, já que a primeira foi para o lixo porque você demorou demais para concluir os exames. – Heitor explicou.
- Posso... Comer no carro? – perguntei, incerta.
- Sim. – Ele confirmou.
- Não se põe comida no lixo. É até crime quando tantas pessoas não tem o que comer. – falei, enquanto saboreava a primeira garfada.
Não nos falamos durante o restante do trajeto. Acabei a comida quando chegamos em frente ao meu apartamento.
- Bem, deve ser aqui mesmo. Olhem, o que tem escrito ali? Deixe-me ver se consigo ler, afinal, é só toda a fachada do prédio. Hum... “Louca Desclassificada”... Vou parar por aqui mesmo, gente. É meu nome ali. – Ironizei.
- Me impressiono com a criatividade destes pichadores. – Ele disse, parecendo pouco se importar com minha raiva repentina ao me deparar com aquela frase.
- Boa noite, senhor Casanova. Boa noite, Anon. Afinal, você não ia querer entrar para tomar uma xícara de café, não é mesmo? – olhei sarcasticamente, enquanto descia do carro.
- Já que insiste, vou querer um café. – Ele desceu do carro.
Fiquei olhando para ele perplexa, vendo o sorriso sarcástico no canto dos lábios dele.
- Eu... Não posso convidá-lo.
- Posso saber por que?
- Não moro sozinha e... Não tenho pó de café.
- Seus amigos são assassinos? Loucos como você? Você é casada e tem filhos? Anon, compre pó de café... Você usa pó no café? – perguntou, confuso.
- É só a minha casa... Não tem nada de especial ou que seja curioso.
- Você visitou a casa do meu pai. Foi até lá atrás de mim. Por que não posso conhecer a sua? Assim como você é curiosa, eu também sou.
- Eu não fui atrás de você. Fui devolver a carteira do senhor Allan. Casualmente você morava lá.
- Eu não moro lá.
- Onde você mora?
Ele riu:
- Por que quer saber agora? Não quer nem me deixar entrar no seu prédio. O que esconde mim, Bárbara?
- Eu? Nada... Eu sou exatamente como sou, Casanova.
- Hum, já retiramos o senhor? Parece que a estamos ficando íntimos, não acha?
- Intimidade com você? Só se eu ficar completamente louca. Venha. – Abri a porta. – Quer entrar, Anon?
- Não. Obrigado, senhora Bongiove.
- Eu tenho a leve impressão que aconteceu alguma coisa no elevador do meu pai na segunda. – Ele disse, enquanto me seguia até a escada. – Não seria intimidade?
Eu teria respondido, não fosse a faixa enorme na escada, escrito: ELEVADOR FUNCIONANDO.
- Eu não acredito. O elevador está funcionando! – falei, sorrindo feito boba.
- E não deveria?
- Eu moro aqui há anos... E nunca funcionou. Isso é surreal. – falei, indo em direção a ele.
- Pelo visto você é uma mulher que adora elevadores, não é mesmo, Bárbara?
- Confesso que sim... Especialmente este, que nunca entrei.
Apertei o botão vermelho, do elevador antigo que agora funcionava. Um barulho ensurdecedor soou quando a porta se abriu.
Entrei. Heitor ficou do lado de fora:
- Não parece muito seguro.
- Está com medo de ficar comigo no elevador, Casanova? – falei sarcástica.
- Claro que não. – Ele entrou. – A questão é que não quero ficar preso no elevador de novo... Sóbrio. – Cruzou os braços.
Apertei o botão 4 e começamos a subir, enquanto as engrenagens pareciam querer nos ensurdecer.
- Eu duvido que isso chegue ao quarto andar. – Ele disse, arqueando a sobrancelha.
Ele estava enganado. Sim, chegamos ao quarto andar. A questão é que a porta não abriu.
Heitor suspirou:
- E desta vez não temos espumante. Me lembre de nunca mais entrar num elevador com você, Bárbara.
- Eu juro que era para funcionar. Você não viu a faixa?
- Acho que você mandou fazer... Pra eu pensar que isso não foi planejado.
Coloquei a mão na cintura, furiosa:
- Acha que também fingi a dor? O desmaio?
- Tudo meramente planejado para você ficar sozinha comigo, aqui, no elevador.
Fui na direção dele com os punhos fechados e ele segurou meus pulsos, rindo:
- Foi só uma brincadeira, Bárbara.
- Não foi... Acha mesmo que eu estou perseguindo você... E estou interessada no seu... No seu...
- No meu? - Arqueou a sobrancelha, ainda me encarando.
Me veio a mente o que houve no outro elevador. Parecendo pensar a mesma coisa, ele perguntou:
- Bárbara, eu estava bêbado naquela noite... Tenho alguns flashes do que houve... Mas não lembro exatamente de tudo.
- Eu também não. – Menti, enquanto ele ainda segurava meus pulsos, recostado na parede em aço.
- Ambos estávamos muito, muito bêbados. – Ele disse.
O encarei, não tendo certeza até que ponto ele realmente lembrava ou não do que aconteceu. Mas eu lembrava de tudo, pois estava sóbria, embora preferisse estar bêbada.
- Sim... – confirmei. – Muito bêbados.
- Nós... Transamos?
- Eu acho que sim. – Me fiz de louca. – Loucamente... Em diversas posições. – Comecei a rir.
- E por que... Você não me procurou depois?
- Porque... Eu não gostei. Não quero repetir.
Ele ficou me olhando, sem dizer nada. Então puxou minhas mãos para trás de seu corpo, segurando-as e fazendo-me ficar tão próxima que sentia sua respiração rápida e acelerada. Talvez ele conseguisse ouvir o meu coração, querendo explodir dentro de mim.
- Lembro da sua pele quente e macia... Da tatuagem... Do quanto eu apreciei seu corpo, Bárbara.
- Então lembra de tudo, Casanova.
- Eu achei que não... Que não tinha passado disso. Mas depois... Voltei a beber e quando acordei... Havia usado o preservativo que estava comigo.
- Não foi comigo. –Desvencilhei-me dele com força. – Não transamos e você sabe disto. Seu fingido, desclassificado. Está me testando.
Comecei a bater na porta e gritar por ajuda. Ele continuou onde estava, tranquilo, como sempre se mostrou desde que saímos da North B.
- Desculpe pelo que escrevi no seu prédio, Bárbara. – Ele disse, enquanto eu ainda gritava em vão, batendo com força na porta.
Parei e olhei-o, incrédula:
- Você está admitindo que mandou pichar meu prédio e se desculpando por isso?
- Sim... Me desculpe. – Ele confirmou.
Deixei meus braços caírem ao longo do corpo.
- Me desculpe pelo carro, Casanova.
Ele veio rapidamente na minha direção, colocando-me contra a parede de aço gelada. As mãos encontraram minha cintura e sua boca veio em direção a minha.
Deus, eu posso impedir isso. Eu “devo” impedir isso. Eu nem gosto dele... E sei que não vai dar certo.
Quando vi, sua boca estava na minha. Os lábios encostaram nos meus e ele puxou o inferior, vagarosamente. Senti seus dentes brincando, enquanto ele deixava escapar a pele sensível do meu lábio.
Depois ele sugou-o, ainda de forma lenta. As mãos foram para minhas costas e eu não resisti mais. Deixei minhas mãos geladas envolverem seu pescoço e nossas línguas se encontraram, sem pressa, se conhecendo, se contorcendo, enquanto nossos corpos de apertaram instantaneamente, formando um só.
Meu corpo não era mais meu... Era só dele... Eu sentia cada gotícula do meu sangue se movendo. Aquilo não era um beijo... Era uma tormenta, um desejo... Inimaginável... De querer mais e mais...
Envolvi os lábios dele nos meus, me entregando por completo, sentindo seu gosto, admitindo que minha intimidade queria ele mais que qualquer coisa. Ele tinha a capacidade de fazer alguém gozar com um simples beijo... Porque era o que eu sentia naquele momento: prazer, vontade de tirar minha roupa e fazê-lo me foder ali mesmo.
Heitor Casanova... Me beije pelo resto da sua vida, sem nunca parar. Sinto que jamais vou esquecer sua boca.
A porta do elevador se abriu do nada e Ben estava parado, com o dedo no botão. Ficou nos olhando, enquanto sua sobrancelha se erguia instantaneamente.
Me soltei imediatamente dos braços de Heitor Casanova e dei-lhe uma bofetada:
- Seu tarado, desclassificado.