Capítulo 27
2093palavras
2022-12-24 14:37
- Este chove não molha entre você e Tony está me dando nos nervos. – falei, enquanto colocava a chave na porta. – Quero ver um beijo, daqueles de cinema.
- E eu então? Quero beijá-lo como no cinema, Babi.
Assim que a porta se abriu, Salma e Daniel se afastaram rapidamente. Ficamos nós quatro nos olhando, confusos.

- Daniel me deu uma carona. – Salma disse, rapidamente.
- Legal! – sorri, já imaginando que aquilo poderia acontecer.
- Hoje nem é dia de foda, baby. – Ben falou, fechando a porta.
- Ben... Não tem nada a ver. Não é o que vocês estão pensando. – Daniel disse.
- Não? – Salma olhou para ele. – Achei que era. – Ela levantou do sofá, ainda com a roupa que havia saído de casa.
Salma saiu, reclamando. Ben deu de ombros, pegou um suco na geladeira e sumiu no corredor.

Fiquei olhando para Daniel.
- Tudo certo? – ele levantou, botando as mãos no bolso e não pude deixar de notar a ereção sob sua calça.
Os olhos dele seguiram os meus:
- Me... Desculpe. – Colocou a almofada no sofá na frente.

- Tudo bem, somos adultos, Daniel.
- Onde você estava? – perguntou.
- Fui ao Hazard.
- Ficou lá até esta hora? Não costuma fechar tão tarde.
- Realmente fechou... Mas eu, Ben, Tony e Sebastian ficamos depois.
- Sebastian?
- Sim.
- O que você quer, Babi?
Arqueei a sobrancelha:
- Do que exatamente você está falando, Daniel?
- Que... Eu sou pobre para você, é isso? Por este motivo me ignora.
- Cara, você está de pau duro por causa da minha amiga e vem me cobrar alguma coisa? Eu nunca disse que queria algo com você. – Alterei a voz. – Sebastian é meu amigo.
- Seus amiguinhos precisam de posição social, não é mesmo?
- Eu bebi e você que ficou bêbado? É isso?
Fui até a porta e abri-a completamente:
- Fora da minha casa.
Ele ficou me olhando, surpreso.
- Sujeitos como você não pisam aqui... E não tem possibilidade de fazerem parte da minha vida. Nem da vida dos meus amigos.
Ele largou a almofada e foi andando, enquanto em encarava, confuso. Assim que chegou do lado de fora, disse:
- Eu gosto de você, Babi.
- Daniel, eu já disse que não gosto de você da maneira como quer. O que acha que vai ganhar se envolvendo com a minha amiga? Se fizer ela sofrer, eu nunca mais vou olhar na sua cara, entendeu?
- Salma fica com todo mundo.
- Ela nunca trouxe alguém para dentro de casa. Então você significa algo pra ela.
- Eu...
- Você é igual a todos os outros: um desclassificado.
Fechei a porta e passei a chave.
Fui diretamente para o quarto de Salma. Ela estava trocando de roupa.
- Tudo bem? – perguntei.
- Sim...
- Vocês... Ficaram juntos?
- Sim... Mas não rolou sexo.
- Você... Contou a ele sobre o bebê?
- Não... E não vou contar.
- Salma, se você está interessada nele, precisa contar.
- Não posso me interessar por alguém antes de fazer sexo. – Ela deu de ombros, colocando a camiseta e deitando na cama.
- Daniel é um bom homem. – falei, tentando me convencer de que realmente era.
- Se não for bom de cama, não serve para mim.
- Cara, você vai transar com ele grávida de outro?
- Que mal tem, Babi? Não se faça de santa, que você não é. Não estou cometendo um crime. Sexo não é proibido durante a gestação. E meus hormônios estão me deixando a subir pelas paredes.
- Mas... O bebê é de outro. – Fiquei confusa, tentando abrir a mente como ela queria, mas não conseguindo.
- Não gosto do pai de Maria Lua. Mas se ele quiser ficar comigo depois do nascimento dela, eu vou aceitar. Talvez seja melhor criarmos ela juntos, no luxo e no conforto que merecemos. E eu vou levar você e Ben para morar conosco. Você só não pode roubar meu boy.
- O quê? Você está bem?
- Estou. – Ela se cobriu até a cabeça. – Já vai amanhecer. Estou cansada e quero dormir. Bom dia.
- Bom dia...
Fechei a porta e fui para o banheiro. Tirei a roupa e esperei o chuveiro esquentar bem, virando uma sauna. Então entrei.
Estava lavando meus cabelos quando Ben entrou.
- Não se tem mais privacidade neste lugar?
- Estou fazendo xixi na calça, amiga.
Ele tirou a roupa e sentou no vaso. Comecei a gargalhar.
- Ei, qual a graça?
- Imaginei... Heitor Casanova... Fazendo xixi sentado.
- Jura? – ele levantou do vaso e me encarou no box. – Não acha que está dispensando tempo demais para ele?
- Eu... Foi só uma lembrança... Engraçada.
- Engraçado é você cheia de chupões, dando em cima de um CEO e começando a gostar de outro.
Peguei meu dedo indicador e escrevi letra por letra no vidro embaçado: “V-á-s-e-f-o-d-e-r”
- É tudo que quero, linda. – Ele disse, piscando um olho e fechando a porta enquanto saía.
Acordei oito horas da manhã com o celular tocando. Não conhecia o número.
- Alô... – falei com voz sonolenta. Nem sei se dormi duas horas.
- Gostaria de falar com Bárbara Novaes. – disse a voz feminina do outro lado da linha.
- É ela.
- Aqui é a secretária do RH da North B. Estou ligando para saber se você gostaria de participar da fase de testes para as vagas de Marketing.
Levantei rapidamente, sentindo meu coração bater mais forte:
- Sim, eu tenho interesse. Mas achei que não tinha passado na entrevista. – falei.
- Amanhã oito horas, no sétimo andar. – Ela disse.
- Estarei aí.
Certamente tinha dedo de Allan Casanova. Porque eu acabei com o carro novo de Heitor Casanova. Não tinha como eu ter passado na entrevista.
Levantei, abri a janela e vi o sol brilhando lá fora:
- Oi vida... Oi sorte... Você enfim está sorrindo para mim. E não vou desperdiçar a chance.
Peguei o restante da grana do blazer de Casanova e comprei um vestido novo, sapatos novos e um perfume mais caro. E não sobrou mais nada.
Eu precisava investir em mim mesma. E parecer uma mulher séria. Aquele emprego era o sonho da vida de qualquer pessoa.
Me olhei no espelho e me impressionei com o resultado. Faltava uma hora para oito, mas já saí de casa, para evitar qualquer possibilidade de atraso.
Cheguei na seleção com meia hora de antecedência. Mas pelo visto não foi só eu que tive a mesma ideia. Mais quatro pessoas já esperavam.
Sentei e aguardei. Já era oito e trinta e meus pés começaram a estrear os sapatos novos e seu som ao bater no piso extremamente limpo e brilhante. Eu não sabia o motivo, mas de alguma forma era visível que aquilo irritava as pessoas. Não que eu quisesse ser irritante, mas era uma seleção... E o próprio Allan Casanova, que não era do RH, mas também contratava, me disse que aquilo prejudicava o candidato.
Então eu não faria na hora que me chamassem... Mas poderia desestabilizar os concorrentes.
Segui com minha sinfonia de sola de scarpin, atraindo todos os olhares para meus pés por mais vinte minutos. Sorria quando me olhavam de cara feia. Eles precisavam ter paciência e se mostrarem tolerantes. Trabalhariam na maior empresa do país. Que encarassem como um teste de paciência.
Quase nove horas, um homem e quatro mulheres, incluindo eu, fomos chamados pela secretária. Entramos numa sala gigantesca, de onde podia se ver pelos vidros bem limpos toda a rua e o último andar da Perrone.
Tinham mesas, computadores e um telão.
- Sentem-se, por favor. – Ela disse.
Sentamos, afastados, nas cadeiras que estavam viradas de frente para o telão. Uma segunda mulher entrou e disse:
- A fase dois inicia agora. Vocês passaram na primeira entrevista...
Levantei o dedo, curiosa.
Ela me olhou surpresa, enrugou a testa e disse:
- Qual sua dúvida?
- Esta vaga é para trabalhar exatamente no quê?
Os outros candidatos riram da minha pergunta.
- Não acho graça. Fiz uma entrevista para trabalhar diretamente com CEO e não recebi retorno se tinha sido aprovada ou não.
- Não é para trabalhar com o CEO da empresa, senhorita. – Ela disse. – Esta vaga a que se refere já foi preenchida.
- Por uma mulher? – fiquei ainda mais curiosa.
- Qual exatamente é sua dúvida, afinal? Não estou entendendo onde quer chegar.
- Eu... Nada. Só quero a vaga, independente de para qual cargo seja.
- Que bom que não tem restrições... E tem mais alguma dúvida, ou posso falar? Afinal, foi para isso que vim aqui.
- Pode falar.
- Mais alguém não sabe por qual motivo está aqui? – ela foi irônica.
Os demais sorriram, me olhando, negando com a cabeça.
- Nós vamos trabalhar da seguinte forma: vou lhes dar uma situação hipotética. Vocês farão de conta que a North B. vai fabricar vinhos. E a primeira produção já entrará no mercado. Temos uma empresa especializada nisso na frente da nossa sede. Somos iniciantes neste novo ramo de bebida. Queremos uma ideia que diferencie o nosso produto do concorrente.
A North B. faria concorrência com a Perrone? Não... Aquilo não era uma simples suposição. Pelo visto a antipatia entre Sebastian e Heitor ia além do que eu imaginava.
Pobre Sebastian. Heitor passaria por cima dele como um rolo compressor. E talvez eu fizesse parte daquilo.
- Vocês têm computador e tudo mais a sua disposição. Precisam criar o que tem em mente. Exatamente 13 horas em ponto o CEO da empresa virá para esta sala e vocês farão uma apresentação para ele, breve, de no máximo dez minutos.
Heitor Casanova vai me avaliar? Estou fodida! Nem sei se vale a pena botar minha mente a pensar e criar.
- Vocês podem trocar ideias... Ou não. Porque só saberão se a apresentação será individual ou em duplas na hora em que ela ocorrer.
Olhei para os demais, que já montaram duplas, me deixando de fora. Suspirei... Maldita hora que abri minha boca e decidi importuná-los com meus sapatos novos. E eles ainda tinham a vantagem de não ter riscado o carro do CEO.
Sentei na frente do computador e peguei um papel, começando a rabiscar. Um produto novo... Na verdade já existia, só queriam ver o que poderia diferenciá-lo. As pessoas gostavam do sabor do vinho, mas se dependesse disso, tomariam o da Perrone: tradicional, de boa qualidade, há anos no mercado, antes importado e agora podendo ser comprado no próprio país. Eram caros, mas quem comprava não se importava com o preço e sim com a qualidade oferecida. Eu mesma provei um vinho Perrone uma única vez na vida, devido ao preço. E daria um rim por outro.
O homem, com cara de no máximo 23 anos, sentou-se ao meu lado. Olhei-o de relance, enquanto continuava a rabiscar linhas sem sentido no papel.
- Acho que vai ser em dupla. Posso fazer com você?
- Trocou de ideia por qual motivo? Sua outra dupla não era muito pensante?
- Você é mais desafiadora. Gosto disso...
- Nunca trabalhei em dupla... E se fizermos juntos e no fim for individual?
- Então nós trabalhamos em dupla, mas deixamos dois projetos engajados. Se for individual, cada um tem o seu. Se for em dupla, escolhemos na hora o melhor.
- Estanho... Porque vou defender o meu, mesmo que seja para apresentar em dupla.
- A minha ideia pode ser melhor. – Ele sorriu.
- Qual é a sua ideia? – perguntei.
- Qual a sua? – ele revidou.
- E se eu falo primeiro e você rouba a minha ideia?
- Na empresa seremos colegas e então teremos que trabalhar juntos, em equipe. Minha ideia, sua ideia... Tanto faz. Precisamos é vender o produto novo e trazer lucro para empresa, consequentemente para nós também.
- Foda-se. – Virei para ele. – Vamos fazer juntos.
Mas como nem tudo podia ser flores e aquela quarta-feira amanheceu com um lindo sol brilhando no céu, me dizendo que era meu dia de sorte, a endometriose decidiu que era hora de mostrar que eu precisava procurar o médico mais uma vez e talvez fazer os exames que ele deixou prescritos.
Era meu período menstrual, mas estava tomando os anticoncepcionais, para não descer o sangramento. Mas acho que as drágeas não conseguiram enganar o meu sistema reprodutor.