Capítulo 17
2269palavras
2022-12-24 14:31
Me colocaram sentada numa cadeira, vigiada por um policial, enquanto o delegado atendia outras pessoas que estavam na minha frente. Percebi claramente que o meu “crime” era o mais leve ali.
Enquanto eu aguardava na fila dos delinquentes, batia meu tênis insistentemente no chão, ansiosa, até que vi Ben e Daniel entrando.
Ben quase atropelou o policial e veio até mim, correndo. Levantei e nos abraçamos.

- O que houve, meu amor? O que fizeram com você?
- Ben, o desgraçado do Casanova me acusou injustamente. – Menti.
- De que?
- Eu... Não sei.
- Babi, me diga que você não se meteu com o CEO da Babilônia, por favor. – Ben olhou nos meus olhos.
- Ele não é só CEO da Babilônia. É CEO da North B. também. – Daniel explicou.

Ben me encarou:
- Você é só uma pedrinha no sapato dele... Sabe disto, não é mesmo?
Assenti, assustada e me dando em conta do que eu tinha feito e o quanto poderia complicar ainda mais a minha vida, que já era mais que difícil.
Antes de eu me arrepender por completo, o Delegado chamou meu nome.

Levantei e Ben e Daniel foram comigo.
O policial abriu a porta e sentei na frente do delegado, amedrontada.
- São seus advogados? – ele perguntou.
- Amigos. E já digo: ela não fez nada. – Ben sentou ao meu lado, cruzando as pernas enquanto Daniel colocou as mãos sobre meus ombros, mostrando que também estava comigo.
Ele leu um papel que tinha em sua frente e disse:
- Quem, em juízo perfeito, provocaria Heitor Casanova? – me encarou.
- Ele me provocou primeiro... E eu posso provar.
- Então prove, senhorita Novaes. – O delegado se recostou na cadeira, espreguiçando-se. – Sinceramente, estou curioso com suas explicações.
- Heitor Casanova me chamou de bêbada, assassina, atrevida e louca.
- E você, então... O que fez?
- Eu fiquei puta e...
- Não use palavras deste tipo aqui, senhorita Novaes. – Ele falou em tom de voz alto.
Me encolhi:
- Eu fiquei... Furiosa e...
- E veio até mim. Consolei-a e disse: vamos embora, minha amiga. – Ben olhou para o delegado. – Então fomos para casa. E Babi precisou sair de novo e então a prenderam, injustamente, confundindo-a com outra pessoa, só pode.
- Hum... – ele olhou novamente para o papel na sua frente. – Como é mesmo o seu nome? – ser referiu a Ben.
- Benício, mas pode me chamar de Ben. Odeio que me chamem de Benício.
- Pois bem, “senhor Benício”. – Ele enfatizou o nome que Ben disse odiar. – Não o vi nas câmeras do prédio da North B., enquanto a senhorita Novaes escrevia “desclassificado”, riscando com uma chave, no Maserati comprado há exatos seis meses pelo senhor Heitor Casanova.
Ben começou a tossir sem parar, quase se afogando, enquanto colocava a mão no peito, parecendo numa crise de ansiedade.
- Ele não estava comigo nesta hora. – falei. – Eu fui culpada. E... Vou ser presa? – fiquei preocupada. – Isso vai ficar escrito em algum lugar para sempre? Tipo... Que eu... Risquei o carro do CEO da North B.
- O senhor Casanova exige que a senhorita pague pelo conserto do automóvel. Pode acertar isso com ele. E caso ele retire a queixa, não ficará registrado “para sempre”.
Fodida! Eu estava mil vezes fodida!
- Eu não tenho dinheiro. – Fui sincera.
- Tenho o número da advogada dele. Quem sabe você faz uma proposta e eu acabo de vez com esta palhaçada, pois tenho coisas mais importantes a resolver do que uma sem noção que risca o carro de um homem que pode simplesmente comprar outro na mesma hora.
De tudo que ele falou só ouvi ADVOGAD”A”. Ah, claro que tinha que ser advogada. Advogado que não seria, não é mesmo? Aposto que recebeu pelo serviço da forma como ele achava que mais valia: “chupando-o”. Afinal, para ele seu pau na boca de uma mulher era um privilégio para a “felizarda”.
Nojento, atrevido, tarado... Desclassificado mor.
- Vou ligar... Depois do almoço. – Estendi a mão, pedindo o número.
- Agora, senhorita Novaes. Ou fica aqui detida.
Respirei fundo e peguei o telefone que ele empurrou na minha direção. Apertei os botões do teclado e ouvi a voz feminina do outro lado.
- Bom dia... Ou tarde. – Fiquei incerta do que dizer, já que passava do meio-dia. – Eu sou Bárbara Novaes. Estou na delegacia... E o delegado aqui pediu para eu lhe oferecer uma proposta com relação ao carro do Senhor Casanova.
- Olá, senhorita Novaes. Um minuto que vou passar para meu cliente. Ele deseja falar pessoalmente com você, a fim de acertarem como farão isso.
Meu Deus, eu não tenho o que oferecer a este homem. Senti meu coração acelerar e tive a impressão que iria morrer quando o ouvi do outro lado da linha:
- Senhora Bongiove... Quanto tempo. – o tom de deboche era visível na voz dele.
- Olha aqui, seu... – percebi que minha voz se alterou e abaixei o tom, tentando ficar calma. – Seu... Casanova. Estou na delegacia e sinto muito pelo ocorrido.
- Sente mesmo? Como pretende me pagar? Só isso me interessa.
Fechei meus olhos e tentei:
- Eu não posso ficar presa. Muito menos com a acusação na minha ficha.
- Não me pareceu preocupada quando mentiu ao segurança e riscou meu carro novo.
- Eu não sabia que era novo.
- Pouco importa. Quero saber como vai me pagar o prejuízo, visto que não trabalha há meses.
- Eu... Tenho algumas propostas para lhe fazer.
- Estou curioso, senhora Bongiove.
Sarcástico como sempre.
- Você aceitaria um ingresso para o Show do Bon Jovi em Noriah Norte?
- Está brincando comigo?
- Pode vender... E ficar com a grana.
- Não paga nem a porta do Maserati.
- Aceita joias antigas, em ouro de verdade? Eu não tenho ideia de onde vender... Mas talvez o senhor saiba. São da minha mãe... A única coisa que restou dela, na verdade. Mas sei que pisei na bola. Então é o preço que tenho que pagar por minha impulsividade.
- Não sou tão ruim a este ponto.
- Senhor Casanova... Aceita um rim em bom estado?
Ele desligou o telefone e fiquei ali, olhando para o nada. De onde eu tiraria a grana?
- Você está fo... – Ben olhou para o delegado. – Ferrada, Babi.
- Vou mesmo ficar presa? – perguntei ao delegado.
- Acho que precisa de um advogado, senhorita Novaes. Algum de vocês dois por acaso é ou pelo menos conhece um? – olhou para Ben e Daniel.
- Sou... Crítico de moda. – Ben explicou.
- E eu barman e motorista de aplicativo. – Daniel abaixou a cabeça.
- Ela precisa de um advogado, porra! – o delegado levantou. – Sinceramente, senhorita Novaes, eu já teria liberado a senhorita, com o que tenho de coisas pra resolver aqui. – Ele passou a mão na cabeça, visivelmente cansado. – Mas os Casanova acabariam com a minha raça.
O telefone na mesa dele tocou. Atendeu imediatamente. Ficou um tempo respondendo em monossílabos e desligou.
- Bem, temos boas notícias. A advogada ligou e disse que o senhor Casanova aceita as joias e retirará a queixa.
Não... Tudo menos isso. Ele disse que não era um homem ruim. E eu tive a capacidade de acreditar.
- Ok... – falei sentindo meu coração se partir.
Não tinha o que fazer. Era a única lembrança da minha mãe ou minha prisão, sem possibilidade de arrumar emprego novamente, pois ficaria marcada para sempre.
- Como ela faz para pagar? Entrega para o senhor Casanova? – Ben perguntou. – Caralho, com todo respeito, seu delegado, mas a porra do homem é um dos mais ricos do país e quer as joias antigas da minha pobre amiga? O que ele vai fazer com isso? Distribuir aos pobres? Adornar os pescoços dos cachorros dele? É tudo que Babi tem de recordação da mãe... E para ele é como se fossem centavos. Certamente vai jogar no lixo.
O delegado sentou:
- Pois bem, senhor Benício. – Ele olhou no relógio. – São exatamente 13 horas e o senhor Casanova está se dando ao trabalho de responder a um delegado do 15º distrito, que tem problemas com drogas, homicídios, latrocínios... Então, literalmente, ele quer “ferrar” com a vida da sua amiga aqui.
Os três me olharam.
- Estou com vontade de chorar. – Confessei.
- A advogada pegará as joias na sua casa amanhã, senhora Novaes. – Ele me deu o cartão. – Combine o melhor horário com ela.
- Posso ir? – perguntei.
- Sim. E ele vai retirar a queixa quando tomar posse das joias.
Assenti tristemente e saí, com Ben me puxando de encontro a ele e Daniel tentando me consolar, enquanto pegava minha mão.
Quando senti o ar livre da rua, comecei a chorar.
- Vai ficar tudo bem, Babi. – Ben limpou as lágrimas.
- Este idiota... Tem noção de que é tudo que eu tenho da minha mãe? Eu preferia ficar sem um rim... Juro.
- Heitor Casanova é um malvado... Mas confesso que é o meu malvado favorito.
- Está falando sério, Ben? – olhei para ele, perplexa.
- Eu não sei exatamente o que aconteceu, mas você foi uma má menina quando riscou o carro dele. Já tem 27 anos. Tem que pensar que todo ato tem consequência.
- Ele foi horrível comigo.
- Fico pensando porque ele está se dando ao trabalho de fazer isso com Babi. – Daniel balançou a cabeça, confuso.
- Acham que eu não me arrependo do que eu fiz? Claro que me arrependo, porra. Mas o que é para ele os riscos no carro?
- Acho que foi a palavra que você escreveu que o enfureceu. – Ben arriscou.
- “Desclassificado”. E eu aposto que ele nem sabe o que exatamente significa. – Daniel arqueou a sobrancelha.
- Vamos lá... Preciso me despedir das joias da minha mãe... E tentar me perdoar por ter feito o que eu fiz. Por ser impulsiva, idiota e azarada.
- Eu preciso trabalhar. Mas se você precisar de alguma coisa, Babi, pode me chamar. – Daniel alisou meu rosto carinhosamente. – Não tenho muita grana, mas posso emprestar para uma eventual emergência.
- E não acha que isso seja uma emergência? – Ben olhou para ele, colocando as mãos na cintura.
- Obrigada, Daniel. Fico feliz de saber que se disporia a me dar seu suado dinheiro. Isso se chama amizade. – Sorri. – Mas eu não posso aceitar.
- Amizade? – ele balançou a cabeça. – Não é amizade, Babi. Eu estou interessado em você... Será que não percebe?
- Caralho, isso é hora de você falar isso? Estamos na frente de uma delegacia. Minha pobre amiga acaba de perder as joias de sua finada mãe. – Ben o criticou.
- Me desculpem. – Daniel disse, envergonhado.
- Desculpado. – Sorri. – Estamos todos muito nervosos.
Daniel nos levou de carro até o apartamento. Nos despedimos e subi com Ben, que me consolava.
Fiquei no meu quarto o restante do sábado. Chorei, me lamentei, me culpei. Mas não tinha mais o que fazer.
Eu fui realmente uma idiota e merecia pagar pelos meus atos infantis e imaturos.
Peguei a caixa de joias e analisei cada peça cuidadosamente. Imaginar minha mãe era sempre fácil. Eu tinha a lembrança dela viva dentro de mim, com um sorriso que era capaz de curar qualquer dor. As mãos macias dela faziam o melhor carinho do mundo e o amor que eu tinha por ela não se comparava a nada do que já senti até hoje.
O pior foi minha avó ter me dado aquilo pensando que poderia resolver meus problemas. Mas de alguma forma resolveu. Eu só não estava presa porque tinha as joias para oferecer. Claro que o CEO mais conhecido de Noriah Norte não quereria um ingresso na fileira do meio do show do Bon Jovi. Tampouco um rim, já que ele mesmo podia comprar no mercado negro... Ou até legalmente, com todo dinheiro e poder que tinha.
Salma veio me consolar depois. Tentou falar sobre o dono da Babilônia e o ocorrido comigo, mas eu pedi que não se mencionasse mais o nome dele dentro da nossa casa.
Alisei a barriga dela e fiquei ali, deitada no colo da minha melhor amiga, que me fez cafuné até eu pegar no sono.
No dia seguinte, exatamente nove horas da manhã, entreguei a caixa com todos os itens da minha mãe para a advogada. Eu poderia sim ficar com alguma coisa de recordação. Ele nem saberia. Mas iria contra os meus princípios. Aliás, nem sei se realmente aquilo pagava o estrago, já que eu estava com tanta raiva na hora, que risquei o carro tão forte que chegou a amassar a lataria.
Fiquei me lamentando por horas. No meio da tarde, Ben me fez tomar um banho e disse:
- Vamos sair. Chega disso.
- Eu não quero, Ben.
- Um sorvete... Só um sorvete. Eu pago.
- Vamos... O bebê quer sorvete. – Salma disse, da porta, sorrindo.
- Isso é jogo sujo, Salma. Sabe que eu vou se você está com desejo.
- Estou. – Ela confirmou.
Levantei e desci as escadas com eles. Quando chegamos do lado de fora fiquei pasma com o que vi. Salma disse:
- Isso não está acontecendo.
- Meu Deus! Respira, Babi... Respira.
- Eu vou matar Heitor Casanova. – gritei enquanto pulava de raiva.