Capítulo 12
2282palavras
2022-12-24 14:28
Levantei cedo na manhã seguinte para ir até a Perrone, procurar Sebastian. Precisava do cartão de emprego que ele havia me dado.
Quando cheguei ao banheiro, Salma estava vomitando. Segurei os cabelos dela, tentando ajudar.
Assim que ela colocou tudo para fora, perguntei:
- Vai ao médico hoje, não é mesmo?
- Sim... Eu disse que sim. – Confirmou.
- Estou preocupada com você.
- Está tudo bem... Só uma virose. – Ela voltou para o quarto.
Tomei um banho rápido e peguei um bolsa, só por hábito, porque eu não tinha nada para botar dentro. Tinha sido roubada por um idiota que meus amigos contrataram.
Abri a porta do quarto de Salma e disse:
- Se precisar de algo, não me ligue. Estou sem celular e nem sei quanto terei novamente um. Avise Ben.
- Ok. – Ela voltou a dormir.
Fechei a porta e quando cheguei na sala, Ben estava sentado no sofá, arrumado.
- Onde vai? – perguntei.
- Com você.
- Ben... Não precisa ir comigo.
- Preciso sim. Você está sem celular e não tem a quem recorrer se acontecer algo.
Suspirei:
- Sei... Vou fingir que esta preocupação comigo não tem nome: Tony. Ou que você está se sentindo culpado por eu não ter um celular, afinal, deu dinheiro para alguém roubar a meu.
Ele revirou os olhos.
Saímos descendo quase correndo as escadas. Enquanto caminhávamos até a Perrone, perguntei:
- Ben, você acha que Tony pode ser gay?
- Se não for, vai ser.
- Eu o vi olhando para você... No Hazard.
- É tão complicado, cherry. Depois do lindo da Babilônia, que eu achei que era completamente assumido e de ter me dado uma noite perfeita, pensei que era minha vez de ser feliz. O asqueroso era casado...
- De tudo, o pior foi ele ter lhe oferecido dinheiro para ficar quieto e não contar para a família dele. Covarde... Desclassificado.
- Sim... Eu disse na cara dele o quanto lamentava por ele ser um covarde e viver uma vida de mentiras. Tenho pena de pessoas assim... Sinceramente. Por mais que eu sofra, sou eu mesmo e nunca fingi ser alguém que os outros querem. Sempre fui bem resolvido. Mas encontrar homens que me comem e acordam no outro dia sendo hétero me dá nojo.
- Por isso hoje eu pouco me importo com coisas que antes me incomodavam. Fiquei tanto tempo segurando palavras que fiquei doente. Por que acha que tomo medicamentos para ansiedade? Jardel me deixou doente... E me fez engolir coisas que eu deveria ter dito. Agora falo o que me vem na mente... E até acho que adquiri uma doença por falar demais... Até mesmo o que não devo. – ri.
- Me parece que o tempo que você ficou com Jardel é como um borrão na minha vida. Você estava na nossa casa, mas não era você. Ele roubou sua essência, sua beleza, sua criatividade... E todo seu amor por nós.
- Eu sempre lhes dei amor, Ben.
- E ele não gostava disso.
- Jardel não gostava nem dele mesmo.
- Este sim é o verdadeiro desclassificado, que você tanto fala.
Chegamos na sede da Perrone e pedi para falar com Sebastian. E para minha surpresa, a recepcionista me negou subir até o andar do CEO.
- Moça, eu preciso falar com ele. É muito importante. – Tentei. – Encontrei-o num bar e ele me entregou um cartão com um emprego certo. Acontece que eu saí com um boy que me roubou. E o cartão estava dentro da bolsa.
- Não preciso dos detalhes, senhorita Novaes. A senhora não pode subir e pronto.
Suspirei e olhei para Ben:
- Eu vou ter que mandar aquele nosso amigo esperar ela na saída hoje.
- O nosso amigo é o maior assassino que você já viu. – Ben assustou-a.
Ela sequer olhou na nossa direção. Fingiu que não estávamos ali.
Ben tilintou as unhas no balcão:
- Pode fingir que não me ouve, mas sei que escuta muito bem, “feiosa”. Olha aqui, o senhor Perrone, no caso Sebastian, está louquinho pela minha amiga aqui. Você acha que ele daria um cartão com um emprego garantido para ela se não tivesse a fim de comê-la?
- Ben! – critiquei a atitude dele.
- Prefere dizer que vai mandar matar a moça? – ele falou entredentes, cochichando na minha direção.
- “Você” falou do assassino. Eu só falei do nosso amigo.
- Aie... – ele colocou a mão no peito. – Para tudo e me junta de colherinha.
Segui os olhos dele e vi Tony saindo do elevador.
- Duas, neste caso. – falei. – Este homem é mais lindo de dia do que de noite.
- Minhas pernas viraram gelatina... Eu vou desmaiar, amiga.
- Ben? – ele falou, vindo na nossa direção. – Oi... – enrugou a testa. – Você é...
- Bárbara. – Apertei a mão dele.
- Desculpe minha falta de memória... Sou péssimo em gravar o nome das pessoas. – Olhou pra Ben e deu um sorrisinho engraçado.
- Tudo bem... Sei bem como é... A gente só lembra do que realmente é importante. – Pisquei.
Ele e Ben ficaram se olhando descaradamente.
- Tony, querido. – Ben falou com voz lânguida. – Acredita que a recepcionista não nos deixou subir? Babi quer falar com Sebastian. Aconteceu uma coisa horrível com ela. E só ele pode ajudá-la.
- Eu não tenho autorização para deixar ninguém subir se não tiver horário marcado com o senhor Perrone. – Ela explicou para Tony, simpaticamente, nem parecendo a mesma pessoa que nos atendeu.
- Mas Bárbara e Ben são amigos de Sebastian. Ele que me apresentou os dois. Eu posso apostar que se não deixar eles subirem, terá problemas com o nosso chefe.
- Eu... Não sabia. Me desculpem. – Ela disse, nos entregando dois cartões de visitantes, que pregamos nas roupas.
- Sobe conosco, Tony? - Ben perguntou.
- Não posso. Estou de saída... Mas... Talvez possamos nos encontrar outra hora. – Ele sugeriu.
- Me passa seu número. – Ben pediu e eles trocaram os números de contato.
Estávamos indo em direção ao elevador quando Tony disse:
- Eu não vi Sebastian hoje. Talvez não consigam falar com ele. Deve estar em reunião.
- Ok, obrigada. Mas vamos tentar mesmo assim. – eu disse, apertando o botão para o elevador descer.
Ele olhou mais uma vez para Ben e foi.
- Ele está apaixonado. – falei.
- Eu também... Completamente. Imagina um homem destes na minha vida. Qual será a relação dele com Sebastian e a empresa? Já pensou, Babi, se a gente fica com os dois? Seria divertido... Podemos sair de casal.
- Depende o que significa sair de casal pra você. – falei, rindo. – Eu achei Sebastian lindo... E se não bastasse, gentil, simpático, educado... Nem parece um podre de rico.
- Hum, está interessada em Sebastian Perrone, minha linda.
- E o melhor de tudo é que acho que ele não me roubaria depois de uma transa.
- Acho que não... Só se roubar o seu coração. – Ben riu.
Chegamos ao último andar e nos encaminhamos até a sala principal, do CEO Sebastian Perrone.
- Eu preciso falar com o senhor Perrone. Poderia dizer-lhe que Bárbara Novaes está aqui? – pedi para a recepcionista.
- Sinto muito, senhorita Novaes. O senhor Perrone viajou esta manhã, para o país dele.
- Não acredito... Que azar, porra! – bati o pé no chão, furiosa. – Quando ele volta?
- Lamento, mas não sei.
- Ok, obrigada pela atenção. Igual, quando ele retornar, por favor, diga que estive aqui, procurando por ele.
- Pode deixar.
- Você poderia anotar o nome dela para dar o recado? – Ben pediu, se escorando no balcão e olhando seriamente para a secretária.
- Claro. – Ela pegou um papel e anotou meu nome “Bárbara Novaes pediu para entrar em contato com ela, pelo telefone...” – Seu número, por favor.
Eu falei e ela anotou, sorrindo e esperando que saíssemos dali imediatamente.
Peguei Ben pelo braço e o retirei dali antes que ele arranjasse mais confusão.
- Quando eu casar com Tony vou mandá-lo dispensar todas estas mulheres feiosas e metidas. – Ele disse, ainda enganchado no meu braço, enquanto descíamos de elevador.
- E daí ele contrata mulheres bonitas e simpáticas? Nem pensar. Vou falar com Sebastian que prefiro as feias e metidas.
Começamos a rir com nossas pretensões.
- Babi, imagina você esposa de um CEO.
- Se eu disser que imagino... Estaria sendo muito convencida?
- Claro que não. A gente precisa sempre almejar mais... Muito mais para nossas vidas.
- Encontrar alguém legal como Sebastian já seria como ganhar na loteria. Mas ser rico é um bônus... Um grande bônus. Imagina não ter que contar as moedas para pagar o motorista de aplicativo? Juro que isso é quase um sonho.
- E ter um banheiro no próprio quarto? Sem precisar correr para tomar banho primeiro.
- Sou boa na corrida ao banheiro. – Comecei a rir.
- Aposte corrida com Sebastian Perrone... Até a cama, querida.
- Ele é lindo... Querido... Mas enfim, mal o conheço. Não dá para criar expectativas. Além do mais, sou só Bárbara Novaes, uma desempregada que foi roubada por um prostituto e não tem sequer telefone mais.
- Era garoto de programa. E pagamos caro pelo desgraçado. E... Sebastian vai ligar no meu número, que você deu à recepcionista. Vou fazer propaganda da minha amiga, não se preocupe.
- Não invente, Ben. Não me ofereça para Sebastian. Eu mesma já fiz isso...
- Fez? Deixou-o sentado no Hazard, falando de negócios com meu Tony e saiu com o boy ladrão.
- Ele me dispensou e você viu... Disse que tinha questões a resolver.
- Lembrou de você de uma entrevista. Quantas pessoas você acha que ele entrevista e fala sobre negócios por dia?
- Não quer dizer... Heitor Casanova também lembrou de mim. Devo ter um rosto pouco comum.
- Ou uma boca que fala demais. – Ele gargalhou. – E você é linda demais para ser esquecida, minha amiga. Babi Novaes, conquistando os maiores CEO’s de Noriah Norte.
- Conquistando Heitor Casanova? – gargalhei ironicamente. – Ele me odeia tanto quanto eu odeio ele.
- Ódio é amor enrustido.
- Só na sua terra. Eu não gosto dele de verdade. Ele é a razão por um dia eu ter criado a palavra “desclassificado” antes mesmo de saber que alguém conseguiria ser perfeito para ela.
Fomos para casa de braços dados, olhando vitrines e sonhando com uma vida de luxo que jamais teríamos.
Assim que chegamos no prédio, fui apertar o botão do elevador. Chegou a ligar a luz e tive uma pequena esperança de que estivesse funcionando.
- Acho que arrumaram o elevador. – falei.
- Não, Bárbara. Chegaram a olhar hoje cedo e subiu. Depois não desceu mais. Ou seja, não deu certo. – falou um dos vizinhos, enquanto descia as escadas.
- Acha que um dia vai voltar a funcionar? – questionei.
- Talvez, se comprarem um novo. Ouvi dizer que este é muito antigo e não encontram as peças necessárias.
- É muito azar. – disse Ben. – Bora, Babi. Vamos subir todos os lances de escada. Porque como somos muito sortudos, nosso andar é o último. – Ele me puxou pelo braço.
Assim que chegamos no último andar, comecei a sentir cólicas novamente.
- Iniciando minha dor. – falei, já sabendo o que me esperava.
- Não... Não acredito. Vamos assistir um filme? Eu já vou preparar as bolsas de água quente. Ficamos abraçadinhos...
- Só se for comédia.
- Você escolheu, está escolhido.
- Me diz uma coisa: você não trabalha mais, Ben? – perguntei, curiosa.
- Claro que sim, linda. Mas acontece que pedi uns dias online. De que me adianta ir até lá, gastar meus pés, meu corpinho, se aquela porcaria não muda nunca para melhor. O que faço lá, posso fazer em casa.
- E aceitaram?
- Acha que eles querem me perder? Aceitam tudo que eu proponho.
- Eu queria trabalhar num lugar assim, em que eu fosse indispensável.
- Você é indispensável na vida de todas as pessoas que a conhecem. Assim que tiver um emprego, também será.
- Por que eu te amo tanto, Ben?
- Porque eu amo você tanto também. – Ele sorriu, enrugando o nariz fino, que eu amava.
Ele abriu a porta e eu tirei os sapatos, me jogando no sofá. Salma entrou minutos depois de nós.
- Nossa, como não nos encontramos nas escadas? – perguntei. – Eu e Ben entramos não faz cinco minutos.
Ela sentou ao meu lado, jogando as botas uma para cada lado:
- Virose. E hoje volto ao trabalho. O desgraçado do médico não me deu mais um dia de atestado.
- Por isso odeio médicos.
- Por que nos curam das doenças?
- Não... Porque nos roubam na hora do pagamento da consulta.
Ela começou a rir.
- Eu e Ben vamos assistir um filme para rir.
- Espere que vou tomar um banho antes. Acabei de sair do consultório.
- Ok... Mas não demore.
Liguei a televisão para escolher o filme. Enquanto aguardava o programa de filme carregar, vi a propaganda que me desestabilizou completamente. Meu coração ficou completamente ensandecido e os pedacinhos minúsculos chegaram a se juntar por breves segundos. Minhas pernas ficaram como gelatina que não deu ponto e não consegui fazer outra coisa a não ser dar um grito que poderia ser escutado do primeiro andar.
Salma e Ben vieram correndo, com os olhos arregalados.
- Babi... O que houve? – Ben perguntou nervoso.