Capítulo 11
2376palavras
2022-12-24 14:27
Sem bolsa, dinheiro, celular, cartão de crédito que nem cheguei a usar e com minha dignidade e auto estima na sola do pé, caminhei por 45 minutos até chegar em casa.
Nem sei como subi as escadas, pois dava um passo para frente e dois para trás, tentando me jogar degrau abaixo, na esperança de morrer numa queda de menos de um metro.
Abri a porta e caí no sofá. Salma ainda estava com uma cara péssima e pálida. Ben não sabia o que era mau humor, tristeza ou depressão. A cara dele era sempre de alegria e mesmo quando o pior acontecia, ele ria de si mesmo e seguia como se nada tivesse acontecido. Quem dera eu tivesse um pingo da autoconfiança dele.
Eles estavam tomando café da manhã. Salma ainda usava roupão, como se o não tivesse passado a noite para ela.
- E então, como foi? Ele fez oral? – Ben perguntou.
- Você gozou? – Salma arregalou os olhos, curiosa.
- Precisou de colherinha? – Ben levantou.
- Gozei... Talvez uma cinco vezes... Gozei como nunca tinha gozado antes. – falei.
- Jura? Ah, estou tão feliz... – Ben bateu palmas e deu pulinhos histéricos.
- Mas isso teve um preço... Bem alto.
Ben e Salma se entreolharam, confusos.
- Como assim? – Salma perguntou. – Você... Teve que pagar o boy?
- Ele não me pediu. Pegou o preço que achava que valia. – expliquei.
- O quê? Não estou entendendo nada. – Ben sentou ao meu lado, trazendo uma xícara de café puro sem açúcar com ele, me dando um gole.
- Eu fui roubada, meus amigos... O desclassificado simplesmente levou a minha bolsa com tudo que tinha dentro. Detalhe: eu sou um pobre coitada que não tem um vintém... Então ele roubou o que minha vó me deixou ontem... Por dó desta pessoa que só sofre ao gastar a sola dos pés atrás de emprego... Eu tenho certeza que quando minha mãe me teve, saiu o pé esquerdo antes do resto tudo... Só pode. Pé esquerdo, cabeça... E o pé direito foi o último.
Ben largou o café e levantou.
- Como assim? O desgraçado recebeu duas vezes? – Salma veio até nós.
- Duas vezes? Não... Eu não paguei. Ele me roubou e ponto.
- Você... Procurou a bolsa por todos os lugares? – Ben perguntou, aturdido.
- Ben, era um motel, não uma casa. Tinha uma cama, duas mesinhas de cada lado, uma TV e um aparador. Procurei até no frigobar... Debaixo da cama. Até que liguei e o recepcionista confirmou que ele foi embora...
- Levando sua bolsa? – ele arqueou a sobrancelha.
- Está brincando comigo! – levantei, furiosa. – Quantas vezes vou ter que repetir que o safado desclassificado me roubou?
- Não pode ser... – Salma balançou a cabeça.
- Nem sei o que faço... Era tudo que eu tinha... E o pior: meu celular e o cartão que Sebastian me deu com um emprego quase certo. Agora digam: Deus existe?
- Eu acho que Deus não se mete em Motel, meu amor. – Ben tentou me abraçar.
- Ah, me erra, Ben. Ele também não se mete com drogados, violentos, que acabam com a vida de mulheres?
- Ele levou Jardel. – Salma levantou os ombros, tentando me consolar.
- Não foi Deus... Foi o próprio diabo que buscou aquele demônio.
- Cara, foi só uma bolsa. – Salma tentou me acalmar.
- Uma bolsa de uma pessoa desempregada... E dentro tinha uma oportunidade de emprego e tudo que eu tinha para sobreviver neste mês. Eu sou uma puta azarada.
- Puta não... Azarada sim. – Ben continuou a me provocar.
- Ben, eu vou matar você!
Corri atrás dele, que pegou uma cadeira e colocou na frente de si, como forma de defesa:
- Babi... Eu aceito que me mate... Mas antes preciso lhe dizer uma coisa...
- O quê? – dei um passo para trás.
- Primeiro diga: você gozou com o sexo oral?
- Sim... Mas o que importa? O desgraçado me roubou. Não sei nem se o nome dele é Tales... Não sei sequer a placa do carro. Mas posso pedir... Na recepção do Motel, claro. – Lembrei.
- O nome dele não é Tales. – disse Salma. – A gente... Digo, eu e Ben... Contratamos ele.
- Como assim?
- Nós... Pagamos ele.
- Ele é um... Prostituto? – perguntei, confusa e completamente desnorteada.
- A gente comprou ele como “garoto de programa”... Sexo seguro e prazer garantido... – ela enrugou os olhos, indo uns passos para trás.
- Pensa... Tudo que você precisava, Babi... Sexo seguro e prazer garantido. – Ben botou a cadeira na frente de si novamente.
- Sexo seguro? Só se for para ele... O desgraçado me roubou... Sabem que eu vou matar vocês, não é mesmo?
- Pense no prazer que você sentiu... E nos perdoe. Pensamos no seu bem... Eu juro.
- Acham que eu não podia arranjar alguém sem pagar? Qual o nível de sedução que eu tenho para vocês? Ou minha capacidade de conquista? Até você, Salma? De Ben eu até poderia esperar isso... Mas você?
- Como assim poderia esperar isso de mim? – Ben perguntou. – É um elogio, não é mesmo? Afinal, você gosta mais de mim do que de Salma.
- Seu idiota, desclassificado. Não acredito que fizeram isso comigo. Ele me roubou... E sequer me comeu.
- Como assim?
- Oral, oral, oral... Nada de pau. Pegaram o anúncio pregado num poste? Só pode... Porque ele era um ladrão.
- Não... Na internet. – Ben confessou.
- E era caro pra cacete. Tive que tirar dinheiro do meu cofrinho. – Salma confessou.
- Seus... Droga! Não vou perdoar vocês. – sai e fui para meu quarto, batendo a porta com força, furiosa e decepcionada.
Eles pagaram um garoto de programa para me roubar? Não... Pagaram para ele me saciar de uma escassez de sexo de dois anos... Sim, eu disse DOIS anos.
Embora eu tremesse de raiva, meu corpo quando lembrava do desclassificado ladrão ficava em fogo novamente. Abri levemente minhas pernas, sentindo ardência novamente. De tanto que ele me chupou e fodeu com a língua.
Agora me restava: cancelar o cartão, descobrir a placa do carro e denunciar o desgraçado. E voltar a sede da Perrone e pedir para Sebastian o telefone de novo. O pior de tudo? Ter que chegar e dizer: “Seu Delegado, eu fui roubada por um prostituto.” Será que isso já aconteceu com alguém ou era a única pessoa a ter tanto azar.
Tomei um banho demorado e quando pensava em Salma e Bem e me tremia de raiva. Coloquei um roupão sem calcinha para minha intimidade respirar e se recuperar da noite que passou.
Liguei para minha avó e expliquei que fui roubada... Na saída do Hazard, é claro. Jamais diria a verdade pra ela. Não tinha coragem dizer que o homem fez sexo comigo, depois levou minha bolsa. Por sorte, ela disse que o cartão estava bloqueado. Então o ladrão sem vergonha não teria como usar. Óbvio que ela me fez prometer que iria até a delegacia fazer uma denúncia.
Mais tranquila por ele não poder gastar o cartão de crédito pelo menos, acabei adormecendo, já que a noite havia sido longa e cansativa.
Acordei sentindo uma dor insuportável na barriga. E já sabia o que era: cólica menstrual. Certamente o sangue desceria em breve.
Tentei levantar e percebi que já estava escuro. Peguei o remédio que estava próximo de mim, numa gaveta e tomei com um gole de água.
Esperei por mais de quinze minutos e tudo que consegui foi ficar contorcida na cama, tentando não gritar.
Eu nunca encontrei um remédio capaz de acabar com a dor daquelas cólicas, que pareciam que iriam me matar. Sem querer, acabei gemendo alto, enquanto apertava o ventre, tentando me conter.
Não levou mais de cinco minutos e a porta se abriu e a luz foi ligada. Ben e Salma chegaram com quatro bolsas de água quente.
- Pazes? – Ben levantou duas bolsas, uma em cada mão.
- Não. – falei.
- Vou levar de volta e você vai ficar aí, morrendo de dor.
- Pode levar... – me contorci de novo.
- Não seja boba... Pode não perdoar a gente, mas vamos ajudar você. – Salma me virou e colocou as bolsas no meu ventre e barriga.
Ela tocou minha testa:
- É só menstrual ou sente outra coisa?
- Só menstrual. Sem febre. Tentei o remédio novo que o ginecologista receitou, mas não houve resultado. Vou ter que voltar lá. – Gemi de novo, colocando a mão sobre a boca, tentando não gritar.
Os dois sentaram na cama, um de cada lado:
- Pega minha mão e aperta. – Ben disse.
- Não... Não sou mais sua amiga. – Fiz birra.
Ele pegou minha mão carinhosamente e eu a apertei, conforme a dor mudava de nível.
- Eu queria tanto que isso acabasse, Babi. – Ele disse com os olhos marejados.
- Minha dor ou minha raiva por você?
Ele suspirou:
- Sua dor, linda... Sei que mesmo que tente, não consegue ter raiva de mim... Eu sou simplesmente imprescindível na sua vida.
- Desclassificado. – Gemi de novo, apertando a mão que ele me dava.
Salma riu:
- Se os homens soubessem o que isso significa para você...
- Se não souberem eu falo... Tales que não é Tales... É um desclassificado. Ben é um desclassificado... E você não é desclassificada porque esta palavra não existe no feminino.
- Ah, existe sim. – Ben olhou para Salma. – A ideia foi dela.
Olhei para minha amiga de infância:
- Você teve a ideia de pagar alguém para me foder?
- Não... Eu só sugeri alguém para foder. Mas foi Ben que deu a ideia de pagarmos alguém. E ele encontrou o boy magia... Na internet.
- Vocês são um pior que o outro. Odeio vocês...
- Vou fazer um chá com tudo que é erva que temos... – Salma levantou. – Você sabe que enquanto não passar, não sairemos daqui. E eu quero dormir esta noite... Estou cansada e ainda não melhorei totalmente.
- Eu... Não quero atrapalhar vocês.
- Atrapalha todo mês, meu amor... E ainda assim a gente ama você. – Ben disse.
Salma saiu e nos encaramos:
- Estou chateada... Mas sei que vai passar. Mas por enquanto, eu olho para você e tenho vontade de bater na sua cara até ficar vermelha.
- Então bate, Babi... Mas não fique de mal comigo.
- Sabe de toda minha insegurança quanto ao sexo e contrata um desconhecido para me comer?
- Eu só queria que você gozasse...
- Por que não me comprou um vibrador?
- Pode me chamar do que você quiser... Até desclassificado. E confesso que chamar disso me magoou profundamente. Foi como uma bola de fogo no meu coração. Mas vou ficar aqui, do seu lado, sofrendo com você a sua dor, como sempre fiz... A vida toda.
Fechei os olhos e Salma voltou com um chá quente. Os dois me ajudaram a levantar e tomei o líquido quase sem sabor.
- Eu já volto. – Ben saiu.
- Como você se sente? – perguntei para Salma. – Continua pálida.
- Eu vou ao médico amanhã. Já marquei.
- Pode ser uma virose...
- Espero que não seja. – Ela sorriu tristemente. – Babi, você acha que terá estas dores para sempre?
- Eu acho que sim... São insuportáveis, mas passam. Sei que no máximo em dois dias, vou voltar a ser eu mesma e conseguir andar sem parecer que fiz uma abdominoplastia recentemente.
- Acho que deveria procurar outro médico. Os remédios não fizeram efeito.
- Ele mandou eu voltar. É só eu dizer que não resolveu. Ele avisou que eu precisava seguir com o tratamento. E se eu levei anos para procurar um ginecologista, imagina dois. – Ri, fechando os olhos e respirando fundo.
Eu sentia como se alguém estivesse cravando uma faca no meu ventre e girando ela vagarosamente. Era simplesmente horrível e insuportável. Os medicamentos conseguiam diminuir um pouco a intensidade da dor, mas não acabar com ela. Só que quando tudo passava, eu voltava a ser eu mesma e esquecia que um dia quase morri de cólica.
Aos poucos fui sentindo um certo alívio nas dores. Eu conseguia pelo menos me mexer um pouquinho, sem parecer que ia morrer.
- Ben está vivo? Nunca mais voltou? – perguntei, com a cabeça apoiada no braço de Salma enquanto ela fazia cafuné em mim.
Eu estava completamente encharcada de suor, não sei se pela dor ou o chá e as bolsas quentes.
- Já me perdoou? – ela perguntou.
- Não. – Menti.
A porta se abriu e vi uma caixa de pizza. O cheiro logo abriu meu apetite.
- Caixas de pizza não entram sozinhas pela porta. Ben? – perguntei, certa de que era ele, pois reconhecia seu anel.
Ele entrou:
- Você pode me perdoar se eu lhe der pizza?
- Você é um desclassificado.
- Não me chame assim, Babi. Dói profundamente...
- Seu... Lindo da minha vida. – Comecei a rir.
- Isso que dizer que estou perdoado?
- Eu posso dizer não para muitas coisas... Mas não para uma pizza. – confessei.
- Eu sei, amor da minha vida. Por isso pedi uma... Sei que qualquer um pega você pelo estômago.
- Mas vocês foram cruéis comigo. – falei enquanto pegava uma fatia de pizza e comida diretamente com a mão.
- Desde quando querer que alguém goze é ser má? – Salma pegou outro pedaço.
- Não quero que mintam para mim... Nunca mais. – Adverti.
- Nunca mais... Prometo. – Ben ergueu a mão, oferecendo o dedo mindinho, que eu e Salma entrelaçamos ao dele.
- Sem mentiras. – Salma confirmou.
- O desgraçado mudou o número. Tentei ligar e dá como inexistente. – Ben lamentou. – Perdoe-nos, amiga.
- Amanhã vou atrás de Sebastian Perrone, pedir o cartão novamente. Preciso daquele emprego.
- E eu vou com você. Preciso saber onde encontrar Tony. – Ben bateu palmas. – Viu? Tudo isso foi meramente planejado para encontramos Perrone e Tony.