Capítulo 115
2054palavras
2023-02-08 10:46
Levei as meninas na casa da minha mãe, que ficava próxima da nossa e depois dirigi para o Cálice Efervescente. A inauguração seria às 22 horas e eu já estava atrasada. Não entendo porque minha mãe fazia mil perguntas sobre as netas mesmo sabendo tudo sobre elas.
Na metade do caminho, Charles ligou:
- Meu amor, preciso de um favor.
- Eu já estou atrasada.
- Não haverá inauguração antes de você chegar. Sabe disto, não é mesmo?
- Mas eu queria ajudar.
- Eu e Gui estamos dando conta de tudo. Não se preocupe.
- O que você precisa?
- Um sapato rosa pink.
- O quê? – Quase gritei.
Ele riu:
- Isso mesmo. Estou pensando em usar na decoração algo só nosso, para quando olharmos, sabermos que estamos ali.
- E tem que ser o sapato? Não pode ser qualquer outra coisa?
- Não... Faça questão do sapato.
- E não podia ter falado ontem?
- Ah, vai, Sabrina. É só um sapato.
- Ninguém vai quere ver um sapato rosa num bar de rock.
- Eu vou.
Revirei os olhos, suspirando:
- Você é um chato.
- Um chato que te ama.
- Eu tenho uma surpresa para você.
- Jura? Eu também tenho uma para você.
- Eu aposto que a minha é maior. – Ri.
- Eu duvido.
- Ok, vou atrás do seu sapato rosa... “el cantante”. E corre o risco de eu obriga-lo a usar.
- Não... Tem que ser o seu número.
- Mais isso?
- Sim. – Confirmou.
Lá fui eu passar numa loja de sapatos para comprar um scarpin rosa pink, que era difícil demais de achar.
Lembro que para o casamento eu havia mandado trazer o par de sapatos do exterior, porque não havia encontrado na capital.
Minha saga iniciou nas lojas mais baratas, porque agora eu era uma pessoa que economizava. Depois de gastar os pés e as lojas começarem a fechar as portas em função do horário, passei em frente de uma boutique maravilhosa.
E parecia mentira... Ou pura sorte. Mas tinha um sapato rosa do jeito que Charles pediu na vitrine. E sim, era meu número.
Caro? Por Deus, muito caro para uma pessoa desempregada e que contou cada vintém para comprar o bar ao homem que amava.
Mas então lembrei que eu ganharia o dinheiro do edifício da J.R Recording que seria vendido ao senhor Chambal... Não lembrava o resto. Eita sobrenome difícil.
- Vou levar os sapatos. – Falei para a atendente.
Enquanto ela pegava na vitrine, avistei um vestido bege perfeito, midi, em tricô fino. Os dois lados tinham fendas profundas e o decote era comportado, embora as tiras fossem finas nos ombros.
Estava tão atarefada com as meninas que esqueci de comprar algo novo e bonito para usar na inauguração do Cálice Efervescente. Me olhei no espelho e estava de calça jeans e camiseta. Nos pés um scarpin para dar um ar mais “chique”, tentando fugir do estilo “saí de casa às pressas”.
Ri da minha imagem, tipicamente “saí de casa às presas e sou mãe de duas”.
- Vou levar o vestido também.
Eu estaria linda na inauguração do Cálice Efervescente. A minha jaqueta de couro estava no carro. Colocaria por cima, fazendo um estilo diferente, meio rock in roll com patricinha.
Na hora de pagar quase desisti. Era muita grana. Mas eu tinha um cartão de crédito. Ou seja, poderia pagar parcelado.
- Vou fazer em cinco vezes. – Garanti à atendente, que me olhou com cara de desdém.
Ok, eu já havia sido a pessoa que olhou com cara de desdém para quem parcelava a compra no cartão de crédito. E quase disse para mim mesma: Você vai pagar um vestido e um sapato por cinco meses?
Respirei fundo: melhor passar cartão do que passar vontade.
Peguei a sacola e fui para o carro. Já estava próxima do bar. Dirigi até lá ouvindo as músicas do meu cantor preferido, aquele que compunha suas músicas para mim, que me enlouquecia quando tocava-me e fazia meus dias serem sempre perfeitos.
Cheguei mais de uma hora depois do previsto, tudo por conta dos sapatos rosas que Charles pediu. Estacionei o carro na frente do bar e desci, com as sacolas nas mãos. Abri a porta e Yuna estava à minha frente.
- Me esperando? – Arqueei a sobrancelha, ironicamente.
- Sim. – Ela confirmou.
- Sim? Eu estava brincando.
- Mas eu não. Estou mesmo esperando por você. Onde estão os sapatos?
- Aqui... – Mostrei a sacola, que ela pegou.
- Não sabia que os sapatos eram tão importantes para esta noite.
- São... Bem importantes. Coloque-os nos pés.
- Como assim?
- Quero ver se cabem.
Retirei meu calçado e pus os novos, que sim, serviram perfeitamente, visto que Charles havia pedido que fossem do meu número. Ela pegou a outra sacola da minha mão, onde estava o vestido e pôs de lado.
- A jaqueta?
- A jaqueta de Charles?
- Que é sua agora.
- Ficou no carro.
- Pegue.
- Está acontecendo alguma coisa?
- Sim... Pegue a jaqueta.
Fui até o carro e peguei a jaqueta. Quando entrei de volta ela já disse, em tom de ordem:
- Vista também.
Pus a jaqueta, sem contestar. A cara dela não estava muito boa. E quando isto acontecia, eu tinha um pouco de medo de Yuna.
- Mais alguma coisa? – Debochei.
- Sim... – Ela mordeu levemente a unha do dedo indicador, antes de retirar do bolso um tule branco, pondo na minha cabeça.
Assim que ela retirou as mãos de mim, senti a tiara que formava um véu com o tule. Ela me deu a mão e claro que minhas lágrimas já começaram a escorrer, embora eu nem soubesse ao certo o que aconteceria.
Segui de mãos dadas com ela quando Melody veio na minha direção, com um lindo vestido branco cheio de babados. E que rodava, da forma como ela amava.
Ela me abraçou pela cintura e ficou à minha frente. As lágrimas grossas embaçavam minha visão, mas Yuna me segurava firmemente.
Finalmente avistei o palco... E nele o amor da minha vida, tocando “Começo de Algo bom”, em um violão.
Na pista de dança minha mãe, com Alice no colo. Ao lado dela Min-ji. Do outro lado Do-Yoon e Lianna, junto de Guilherme e Colin. O homem perto de Charles, vestido de terno certamente era o juiz de paz.
Meu Deus, eu havia comprado um vestido... Mas não tinha vestido ele. Estava de jeans, camiseta, jaqueta de couro e um sapato rosa pink nos pés.
Ri quando Charles começou a fazer caretas para mim, tentando causar o fim do meu choro.
Limpei as lágrimas e não as deixei mais tomar conta dos meus olhos. Era um momento de alegria. Creio que os dias de tristeza e escuridão haviam encerrado.
Charles largou e violão e recebeu Melody, dando um beijo na bochecha dela:
- Papai ama você. Obrigado por ter ajudado a trazer a mamãe.
- De nada... Eu também amo você, papai. – Deu-lhe um forte abraço.
- Cuide bem da minha amiga – Avisou Yuna – Só eu sei o quanto ela esperou por você.
Recebi um beijo no rosto dela, que foi para o lado de Colin.
Meus olhos se encontraram com os de “el cantante”. Eu lembrava como se fosse ontem do que vivemos ali, naquele mesmo lugar, anos atrás. E jamais imaginei que um dia estaria ali, casando com ele, junto das pessoas que eu tanto amava.
- Quer ser oficialmente a senhora Bailey, garotinha? – Ele perguntou no meu ouvido, o hálito quente fazendo minha pele arrepiar-se.
- Quero muito. – Confessei.
Ele me encarou, em seguida limpando os vestígios das lágrimas que eu havia derramado:
- Não quero mais que chore.
- É de felicidade.
- Eu amo você.
- Amo você. – O abracei com força, quebrando o restante dos protocolos.
O juiz de paz falou algumas palavras e em minutos estávamos oficialmente casados.
- Alianças? – O homem olhou para Charles.
- Bem, como nada aqui é tradicional, assim como tudo que vivi ao lado desta garotinha – sorriu na minha direção – Não temos alianças.
Enruguei a testa, surpresa.
- Mas terá outro elo que os unirá. – Guilherme entregou para Charles uma pequena caixa preta em couro.
Charles abriu a caixa e lá estavam duas gargantilhas com conchas naturais, recolhidas da praia. Ele retirou uma e entregou a caixa para Guilherme novamente, pegando meus cabelos e pondo para o lado, e depois fechando o colar.
Toquei a concha e vi as iniciais gravadas dentro: C+S=MA
Respirei fundo para evitar que as lágrimas me traíssem. Gui segurou a caixa na minha frente e peguei o outro cordão, fechando no pescoço de meu marido.
- Estes cordões significam muito para nós. – Ele me olhou.
- Sim... – olhei para Melody, lembrando da primeira concha que ele me deu.
- Amo você, Sabrina Rockfeller Bailey.
- Amo você, “el cantante”... E vou amar para sempre.
Minhas mãos encontraram sua nuca quente e não consegui ficar longe de seus lábios. Não me importava que todos estivessem observando. Eu precisava da boca do meu amor, da sua língua na minha, provando que era verdade. E assim o senti, quente, envolvente, dentro da minha boca. O apertei com força contra mim, enquanto minhas mãos passearam pelos cabelos lisos e sedosos, a barba pinicando minha pele levemente.
- Ei, o beijo não dura para sempre. – Ouvi Yuna.
Nos soltamos, rindo. Eu o beijava todos os dias. Ainda assim parecia pouco.
- Casados! – disse minha mãe – Enfim!
Melody correu na minha direção e peguei-a no colo, sentindo seu abraço apertado e quente, o perfume mais maravilhoso do mundo invadindo minhas narinas:
- Você é a esposa do papai! – falou no meu ouvido – E eu amo você!
- Também amo você... Do tamanho do mundo. – Sussurrei no ouvido dela enquanto Charles recebia cumprimentos dos presentes.
- Você sempre disse que nós encontraríamos o papai... E seríamos felizes. Como sabia que isso ia acontecer, mamãe?
- Meu coração sempre disse que era o que sentíamos era forte demais para ter acabado daquela forma.
Charles se aproximou e envolveu nós duas com seus braços.
- E ele deixou uma sementinha plantada dentro de mim... Que eu deveria cultivar até o retorno dele. – Sorri, admirando os grandes olhinhos verdes me encarando.
- Eu era a sementinha? – Perguntou, sorridente.
- Sim, você foi a sementinha.
- Nossa Melodia. – Charles sorriu.
Calissa me entregou Alice, que logo começou a rir para irmã.
- Sei que todos aqui fazem parte disso... Mas Gui – Charles olhou para o filho – Este abraço em família precisa de você.
Guilherme sorriu e veio na nossa direção, envolvendo-nos com seus braços longos e finos. Claro que aos poucos os demais também foram vindo. Ao fim, éramos todos nós, unidos num grande agraço coletivo no centro da pista de dança do Cálice Efervescente.
Éramos família. Nem todos família de sangue. Grande parte era a família que nós escolhemos para compartilhar nossas vidas, alegrias, tristezas, superações e derrotas.
Passado o casamento relâmpago mais fofo da história (pelo menos da minha), consegui finalmente colocar meu vestido novo, minutos antes de as portas do Cálice Efervescente reabrirem sob uma nova gestão. Uma administração totalmente familiar. E que cuidou de cada detalhe com amor e dedicação.
As bebidas ganharam um toque mais refinado. Mas não faltava tequila José Cuervo. Nem Vueve Cliqcuot. Do mais simples, ao mais caro. Para todos os gostos e bolsos.
As portas se abriram e havia fila para entrar. Enquanto eu observava tudo atentamente, a voz conhecida sussurrou no meu ouvido:
- Eu planejei a lua de mel também.
- Hoje? Aqui? – Sorri, sem olhar na direção dele.
- Sim. Num corredor, onde providenciei caixas de bebidas de ambos os lados, onde pretendo coloca-la sobre elas.
- Sabe que posso gozar só de você falar isso, não é mesmo?
Charles me envolveu em seus braços e senti seu pau duro:
- Você não consegue se controlar?
- Não... Você goza com palavras, eu fico duro com elas.
- Somos uma boa dupla.
- A melhor de todas.
- “El cantante e garotinha”.
- Para sempre.