Capítulo 112
2251palavras
2023-02-08 10:44
Assim que entramos no hospital, Melody perguntou:
- A sua amiga está muito doente?
- Um pouquinho. Ela caiu... E bateu a cabeça.

- Deve ter doído.
- Eu creio que sim.
Andei com Melody pelo corredor, de mãos dadas comigo, até encontrarmos o quarto de Rachel. Respirei fundo e bati na porta. A mãe dela atendeu:
- Gui! Que bom que você veio. Eu não avisei ela... Para fazer uma surpresa. – sorriu.
Porra, se ela tivesse avisado seria melhor. Agora eu não sabia como Rachel reagiria a minha presença. Mas precisava ser corajoso e entrar. Se ela quisesse dizer a verdade, foda-se. Eu pagaria pelo meu ato.
A porta foi aberta e a vi deitada na cama, a cabeça levemente levantada.

Ela me encarou e não disse nada. Entrei com Melody, que logo entregou as flores para ela:
- Olá, eu sou Melody. – Sorriu, daquela forma encantadora que conseguia descongelar até o coração mais frio do mundo.
- Oi... – Rachel arqueou a sobrancelha, confusa, enquanto pegava as flores.
- Eu... Vou deixa-los a sós um pouco. – A mãe dela se retirou, para minha sorte.

- O que você faz aqui? – Ela me olhou.
- Eu... Vim pedir desculpas.
- Eu já disse que pode me chamar de Medy, caso queira? – Melody interrompeu a conversa.
- Não... – Rachel ficou confusa.
- Ela é...
- Sim, minha irmã. – Confirmei, já sabendo o que ela perguntaria.
Melody sorriu, olhando para ela, em seguida dizendo:
- Você é bonita!
Ela ficou em silêncio um tempo antes de responder:
- Obrigada... Você também é. – Pude observar um falso sorriso.
- Como você está? – Perguntei.
- Como você acha?
- Eu não pensei direito... Foi instintivo. Não quis ferí-la... Juro. Mas falar sobre meu pai e... – olhei para Melody, que observava tudo com seus grandes olhos verdes atentamente – Bem, foi horrível para mim.
- Eu não pensei direito na hora... – ela disse, com a voz menos firme – Só queria magoá-lo.
- Não acha que já nos magoamos demais?
- Sim. – Concordou.
Ficamos os três em silêncio um tempo. Melody quebrou:
- Você tem irmãos?
- Não. – Respondeu Rachel.
- É bom ter irmãos. Poderiam cuidar de você agora, junto com a sua mamãe. – A voz doce me fazia quase querer esmaga-la e enchê-la de beijos.
- Meus pais... Não quiseram ter outros filhos.
- Minha mamãe e meu papai tiveram eu... E minha irmãzinha, Alice. E meu papai teve o Gui com a mamãe dele. Mas a minha mamãe, não é a mamãe do Gui.
- Eu sei. – Ela afirmou, me olhando.
- Eu vi você na festa – Melody lembrou – Perto do palco. Sabe aquele homem que cantou? É o meu papai.
- Charlie B.
- O nome dele de verdade é Charles Bailey – sussurrou – Mas é um segredo.
Ela riu de verdade agora, de forma espontânea:
- Hum, um segredo que não vou contar para ninguém.
- Se você quiser, eu posso ficar com a sua mamãe para cuidar de você, já que não tem irmãos. O Gui poderia me emprestar... Então eu seria sua irmã emprestada, até você ficar boa. Eu posso trazer jogos de tabuleiro. Você gosta?
- Eu... Não jogo jogos de tabuleiro há uns bons anos.
- Eu tenho vários.
- Quantos anos você tem?
- Seis. A minha festa foi de princesa.
- Qual sua princesa favorita?
- Bela. Você conhece a Bela?
- Da Bela e a fera?
- Isso.
- Por que você gosta da Bela?
- Porque ela usa um lindo vestido amarelo que gira... – sorriu – E gosta de ler.
- Você sabe ler? – Espantou-se Rachel.
- Sim... Um pouco. Mas eu sou uma menina de seis anos, só isso. Não tenho altas habilidades. – Explicou.
Rachel me olhou e confesso que fiquei aturdido com a resposta dela.
- Ela tem mais de seis ou é superdotada? – Rachel me olhou, levantando a sobrancelha, curiosa.
Melody gargalhou:
- Seis anos. É verdade.
- Não parece, garotinha.
- O que houve na sua cabeça? – Melody foi para trás, tentando ver o ferimento.
Rachel mostrou o curativo e explicou:
- Eu... Eu... – me olhou - Eu tropecei... E caí.
Senti meu coração bater tão forte que parecia sair pela boca. Eu não achei que Melody fosse resolver a situação. Mas esperei que ela tivesse no mínimo um pouco de piedade da minha irmã. Porque eu sabia que não merecia.
- Cortaram o seu cabelo? – Melody ficou curiosa.
- Sim... Tiveram que cortar um pedaço para fazer o curativo. Ficou horrível, não é mesmo?
- Eu acho que você poderia cortar pelo ombro. Daí esta parte de trás logo vai crescer e ficar igual. Quer que eu corte para você?
- Não! – Eu e Rachel dissemos ao mesmo tempo, começando a rir logo em seguida.
Melody não entendeu muito bem a graça. Realmente estava disposta a cortar os cabelos de Rachel, a fim de dar um jeito na parte que não estava do mesmo tamanho.
As duas conversaram mais um tempo, embora eu já estivesse louco para sair dali. Para minha surpresa, Rachel dividiu até lanche com Melody. Talvez ela fosse um pouco carente e tudo que precisasse era de atenção. Eu não soube dar... Mas Medy sabia dar atenção a todo mundo.
- Agora nós precisamos ir, Medy. – Avisei, olhando no relógio. Já era quase meio-dia.
- Ah, eu queria ficar mais um pouquinho. – Reclamou.
- Eu vou embora hoje ainda. Que acha de trocarmos telefone e você ir na minha casa um dia destes? Eu tenho uma piscina enorme.
- Eu não tenho piscina. Mas tenho uma praia. Quer conhecer minha praia?
- Você tem uma praia?
- Sim, ela tem o mar no próprio quinta. – Eu ri.
- Gui, você pode pegar o número da Rachel?
- Eu tenho o número dela, não se preocupe.
- Rachel, eu gostei muito de você. – Deu um beijo na enferma.
- Também gostei de você, Medy – Rachel sorriu, lhe dando outro beijo – Se eu tivesse uma irmã, eu gostaria que ela fosse igualzinha a você.
- Obrigada.
Fui até Rachel e peguei sua mão:
- Obrigado. Realmente foi sem querer.
- E a visita acompanhado foi muito bem pensada, não é mesmo?
- Ela não tem culpa... Nem ele. Assumiu por mim.
- Vou desfazer o mal-entendido. Dizer que caí... Algo do tipo.
- Obrigado, mais uma vez. E desculpa.
- Desculpa pelas coisas que eu falei... Com relação a ela, principalmente. – Olhou para Melody, que já se entretia com algo ao lado da porta.
- Acha que a mãe dela deixaria que me visitasse?
- Acho que não. – Sussurrei.
Ela riu:
- Pelo menos quando eu cortar meu cabelo, você pode mostrar a foto para ela?
- Posso.
- Charlie B. fez por você algo que não sei se outra pessoa faria.
- Eu sei.
Me dirigi a porta e ela disse, antes que eu me fosse:
- Gui, eu não estava entendendo o motivo dele ter se acusado... Mas quero que saiba que mesmo que não tivesse vindo aqui, eu jamais teria acusado você... E não é só porque você não teve culpa... Nem pelas coisas horríveis que eu falei. Mas simplesmente porque eu amo você.
Melody olhou para nós dois, imediatamente:
- Ela disse que ama você, Gui.
- Vamos, Medy. – Puxei-a a contragosto, pois ela queria ficar ali, ouvindo o desenrolar da conversa e certamente querendo me jogar para cima de Rachel.
- Mas eu ouvi “amor”... – Insistiu minha irmã... Até que fechei a porta.
Não tenho certeza se era amor ou obsessão que ela sentia por mim. Uma garota que sempre teve tudo na vida e de uma hora para outra quis algo que não podia ter. Então surtou. Ou quem sabe realmente fosse amor. O certo é que eu não voltaria a me relacionar com ela novamente. E por sorte o Ensino Médio tinha acabado e eu morando em Noriah Norte a possibilidade de cruzar com ela novamente era quase zero.
Levei Melody de volta para casa.
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POV CHARLES
- Vamos, Charles. Você está liberado. – Colin disse.
Levantei os olhos na direção dele. Estava cansado. Havia passado a noite sentado naquele banco duro. E pensei a cada minuto. Minha cabeça estava doendo. Peguei o blazer que estava ao lado e finalmente deixei aquele corredor com entra e sai de pessoas.
- O que houve? Pagaram fiança? Havia esta possibilidade? – Perguntei, curioso.
- A garota falou a verdade.
Parei no mesmo instante:
- Como assim? Ela acusou meu filho?
- Não... Disse que caiu. E que provavelmente você só estava passando pelo local e quis ajudar.
- Estranho!
- Talvez... Mas não reclame.
- Reclamar, eu? Nem pensar, meu amigo. – Toquei o ombro dele, feliz.
- Hum, quer dizer que somos amigos agora? – Debochou, enquanto ria.
- Na verdade estou dizendo isso para tentar convencê-lo a não me cobrar a liberdade... Sabe como é... Estou falido, fodido e renascido das cinzas.
- Costumo cobrar meus honorários, “amigo”! Mas posso “pendurar”.
- Eu era mais de você “perdoar” a dívida... Sabe como é, talvez eu precise de novo.
- Que não seja de mim. Nunca vi família tão enrolada. E Sabrina não quis ser advogada. Mal sabia que era a profissão do século para ela. – Ironizou.
- Como não vou convencê-lo a deixar de graça por meus belos olhos verdes, vou ver se alguém me empresta.
- Eu estava brincando, Charles. Claro que não vou cobrar.
- Eu também, amigo... Não ia pagar mesmo.
Começamos a rir. Assim que passei a porta que dava para a rua, vi Sabrina sentada no cordão da calçada, debaixo de uma árvore. E meu filho ao lado dela.
Nossos olhos se encontraram e senti meu coração bater mais forte. Quanto tempo ela havia ficado ali, esperando por mim? Por Deus, eu só fazia aquela mulher se preocupar.
Ela correu na minha direção e abri os braços, amparando-a no meu colo. Logo ela enrolou as pernas nos meus quadris, as mãos na minha nuca, me encarando:
- Você demorou, “el cantante”.
- Eu sei, meu amor. Espero não fazê-la passar por isso de novo.
- Eu tenho orgulho de você... Muito orgulho. – Começou a beijar-me por todo o rosto, enquanto eu sorria.
O cheiro dela me enlouquecia. Sua pele era suficiente para me acender e querer fodê-la sem parar. Era como se a vida inteira eu estivesse esperando por ela. Gostava quando ela dormia nos meus braços, gostava quando ela ficava brava, gostava da forma como ela tratava nossas filhas, gostava da sua força e determinação, gostava da persistência dela em não ter desistido de nós, nunca, gostava até da forma como ela matou os animais de Melody... Fofa e inocentemente.
E claro... Amava seus lábios, sua pele, seus cabelos, seus olhos... Amava a forma como meu pau se encaixava nela, amava os gemidos dela quando gozava e chamava meu nome, amava nossos banhos longos, amava a forma como usávamos o sexo para nos relaxar e fazer esquecer problemas.
Liguei o foda-se para tudo e a beijei, apertando as costas dela contra meu corpo, sentindo seus seios perfeitos encostarem em meu peito. A língua dela era sempre quente e macia. O gosto dela era de quero mais... Mas logo meu pau começou a dar sinais, então retirei as pernas dela envoltas em mim e a pus no chão:
- Me perdoe, mas meu amigo aqui embaixo sentiu muito a sua falta... Então está querendo dar um oi. E não acho muito prudente. – Sussurrei no ouvido dela, olhando para os lados.
Ela riu:
- Diga ao seu amigo que tirando as duas da noite passada, mas as duas que são de praxe, juntando os atrasados, ele vai trabalhar no mínimo umas seis vezes hoje.
- Ele disse que estará pronto. – Confirmei.
Olhei para meu filho, que estava de pé, me encarando.
Respirei fundo. Não sabia o que ele sentia ao me ver com Sabrina e por um momento me senti culpado pela cena que teve que presenciar. Esta parte seria bem difícil... Porque se ele gostasse de Sabrina tanto quanto eu, não sei o que faríamos.
Fui na direção dele, devagar, sem saber ao certo o que dizer. A culpa por ter o amor da minha mulher me afligia.
Quando ficamos frente a frente, eu pensei em explicar:
- Gui, eu queria que...
Ele simplesmente me abraçou, com força, sem dizer nada, interrompendo o que eu nem sabia que falaria.
Demorei a conseguir tocá-lo, porque parecia um sonho. Foram dezesseis anos longe, tentando tê-lo a todo custo. No fim, ele estava ali... Esperando que eu saísse da Delegacia para me ver.
Não contei quanto tempo ficamos ali, tentando resgatar algo que não sei se conseguiríamos, mas da minha parte, faria o possível para conseguir. Eu guardei o amor para ele dentro de um lugar onde jamais tirei.
- Pai, me desculpe... – Ele disse, sem se afastar.
- Vamos esquecer o que passou, meu filho. Eu só quero olhar para frente agora... Porque o meu passado foi uma porra. Mas o futuro... Bem, eu vejo coisa boa vindo por aí.
- “O começo de algo bom”... – Ele riu, enquanto me soltava.
- “O começo de algo bom”. – Confirmei, certo de que sim.