Capítulo 99
2370palavras
2023-02-08 10:35
Chegamos em casa já era quase meia noite. Assim que abri a porta, deparei-me com Min-ji e Yuna sentadas no sofá.
- Min-ji? – Fiquei surpresa com a presença dela.
Vi as malas ao lado do sofá e não consegui disfarçar:

- Você... Veio para ficar?
- Temporariamente... Se me deixar.
- Mas... Yuna tentou convencê-la a deixar a mansão dos Rockfeller e você havia dito que não... – Sentei-me ao lado dela no sofá, pegando sua mão, que estava gelada.
Charles entrou e fechou a porta, nos olhando, confuso.
- Seu pai está possesso com o que houve, Sabrina.
- Está falando da entrevista?

- Sim. Você sabe que isso vai destruí-lo, não é mesmo?
- Min-ji, este foi o objetivo. – Confessei.
- Eu... Não sabia de nada. – Yuna disse, me encarando.
- Que bom, Yuna! Fiquei com medo que Medy pudesse ter visto qualquer coisa.

- Você sabe que não costumo assistir TV.
- Torci para que não mudasse de ideia justo hoje.
- Jogamos alguns jogos de tabuleiros e depois pus Medy na cama. Mamãe chegou não faz muito tempo.
- Peguei um táxi... E só me restou vir para cá. Mas creio que eu vá para Noriah Sul em seguida. – Disse Min-ji.
- Não, Min-ji. Você pode ficar aqui o tempo que precisar. E se não quiser ir embora, também não precisa. É muito bem-vinda nesta casa e sempre será. – Falei sinceramente.
- Preciso pensar com calma... Sinceramente, estou perdida. Vivi grande parte na minha vida naquela casa. – Ela disse, pesarosa.
- O que houve, afinal? – perguntei – O que tem a ver e entrevista que eu Charles demos com a sua presença aqui, esta hora da noite?
- Eu fui demitida.
- Demitida? Mas como assim? Você trabalha lá a sua vida inteira. Ele... Não pode fazer isso. – Fiquei incrédula.
- Meu salário começou a atrasar nos últimos meses...
- Atrasar? Por que você não me disse nada? – Yuna olhou-a seriamente.
- Não queria preocupá-la, minha filha. Sem contar que você já estava querendo que eu saísse de lá.
- Yuna só estava preocupada com você, Min-ji. Meu pai é o tipo de homem que não tem escrúpulos. Não consigo entender o que a fez ficar lá por tanto tempo.
- Você... E Calissa.
- Como minha mãe reagiu frente a tudo: o programa de TV, sua demissão... Ou melhor, minha mãe “reagiu” ou simplesmente ignorou a verdade?
- Calissa é uma boa pessoa, Sabrina.
- Não consigo aceitar a passividade dela frente a tudo que meu pai faz.
- Ela tentou contestar minha saída.
- Mas preferiu ficar lá, com ele... Como sempre.
- Não julgue, querida... Não é fácil para ela, também.
- Como não julgar, Min? É inaceitável a forma como ela age, como se nada a abalasse.
- Tenho medo do que seu pai pode fazer com você. – Ela olhou para mim e depois para Charles.
- Pior do que ele já fez, só matar a um de nós. – Charles disse, indignado.
- Qual o motivo da demissão? O que ele alegou? – Yuna perguntou.
- Falta de dinheiro para me manter na mansão.
- Isso deve ser verdade – falei – Eu não sei como ele conseguiu manter os empregados, ou pelo menos boa parte deles, por tanto tempo, sendo que a empresa já não gera mais lucros.
- Só você foi demitida? Ou mais alguém? – Yuna quis saber.
- Eu era uma das últimas funcionárias da casa.
- Min, por que não nos disse isso antes? – Fiquei confusa.
- Eu... Não queria incomodar. Vocês já têm seus próprios problemas.
- Min-ji, você não é um problema, nem nada que acontece com você, entende? Faz parte da nossa família, porque Yuna é minha família, assim como Do-Yoon. Além do mais, certamente já pode aposentar-se. Já tem tempo para isso, não é mesmo?
- Sim... Poderia. Mas ficar sem fazer nada não está nos meus planos. Eu não conseguiria.
- Eu gostaria muito de contratá-la, mas sinceramente, não tenho poder aquisitivo para isso. Também estamos passando por uma fase financeira ruim. – Expliquei.
- Mas isso não significa que não possa ficar aqui conosco, Min-ji – Charles deixou claro – Até porque a situação caótica é provisória.
- Quando você acha que voltará a fazer shows? – Yuna perguntou.
- Não vou voltar – ele olhou-a seriamente – Meu plano agora é comprar o Cálice Efervescente.
- Mas... Vai abrir mão de tudo? – Min-ji impressionou-se.
- Não é sobre abrir mão... É sobre prioridades. – Explicou ele.
- Bem... – levantei – Eu preciso deitar e tentar descansar. Foi um longo dia... E cheio de surpresas. E espero que amanhã comecemos a colher os frutos do que plantamos: provar que Charles é inocente e virar o jogo contra Mariane e Jordan Rockfeller.
- Sabrina... Você tem intenção de acabar com a J.R Recording? – Min-ji perguntou – Mas... A empresa pertence a você e sua filha também.
- Mariane está a desviar dinheiro, Min-ji. Eu só não tenho provas disso. Ainda. Não voltei à empresa, mas pretendo. Só tenho medo de ser barrada, o que me faria ter que entrar novamente na Justiça. Isso demandaria tempo. E me atrasaria um bocado.
Min-ji me olhou e não disse nada, abaixando os olhos.
- Sabe, Min... O que me deixa mais curiosa é: por que Mariane está tentando roubar do nosso pai, sendo que o dinheiro é dela também? Eu, no caso, tenho motivos para querer o fim de Jordan Rockefeller. Mas ela não.
- É claro que ela tem. – Min-ji disse imediatamente.
- Tem? – Questionei, arqueando a sobrancelha, confusa.
- Bem, eu quis dizer... Que deve ter, assim como você... E sua mãe.
- Não... Você disse “tem”. Eu ouvi claramente.
Charles levantou e me puxou pelo braço:
- Venha, vamos dormir. Já está tarde e você e o bebê precisam descansar.
- Min-ji, o que você sabe? Me conte, por favor.
- Sabrina, está tarde. Deixei Min-ji descansar.
- Sabrina, ela precisa descansar... Está abatida. – Yuna me olhou.
Dei um beijo em cada uma delas e subi, junto de Charles. Antes de entrar no nosso quarto, fui ver Melody, que dormir feito um anjo em sua cama.
Charles me abraçou por trás, contemplando junto de mim a visão do nosso bem mais preciso.
- Não é a coisa mais linda do mundo? – Perguntei-lhe, enquanto envolvia as mãos dele nas minhas.
- Sem dúvida... A coisa mais linda que já fiz na vida. – Sorriu.
Dei um beijo no rostinho dela e me vi abrindo a porta do quarto do bebê.
- Já imagino nosso bebê aqui... Chorando no meio da noite – ri – Esta é a pior parte.
- Não será mais, porque estarei junto de você. Dividiremos cada tarefa, então não haverá pior parte.
- Eu tenho uma ecografia marcada para esta semana. Gostaria que você e Melody fossem junto.
- Claro que sim, meu amor.
- Charles... Você também acha que Min sabe mais do que deveria?
- Eu acho que sim, ela sabe algo que você não. Mas deixe-a descansar, Sabrina. Dê tempo ao tempo. Até porque, se ela guardou um segredo por tantos anos, não revelará de uma hora para outra. Você precisa ter paciência, meu amor.
- Paciência: eis uma coisa que não tenho tido nos últimos tempos. – Confessei.
- As coisas aos poucos estão se esclarecendo. Não podemos pôr tudo a perder.
- Eu sei... – virei-me para ele e segurei seu rosto entre minhas mãos – Estou orgulhosa de você, Charles. E do que fez hoje, expondo sua história para o mundo.
- Acha que Guilherme pode ter visto?
- Se ele não assistiu, alguém próximo dele certamente viu. E Gui saberá tudo que você disse, não se preocupe. E entenderá o quanto de amor você tem guardado para ele.
- Às vezes acho que este garoto não vai me aceitar nunca.
- Vai sim, Charles. Eu sei que vai.
Voltamos para o nosso quarto e depois do banho, deitamos na cama, exaustos. Sim, havia sido um dia cheio. Mas também de esperanças. A hora estava chegando, só precisávamos esperar.
No dia seguinte, não fui à J.R Recording porque amanheci com cólicas. Passei o dia em casa, tomando os chás de Min-ji, que faziam um bem enorme para qualquer coisa. Aliás, eles curavam qualquer dor, exceto de amor.
Charles levou Melody para seu primeiro dia na escola. Nossa menina voltou completamente encantada com os novos amigos, a professora e o espaço que faria parte da sua vida dali para frente.
À noite, na cama, perguntei a Charles:
- Como foi na escola de Melody?
- Ela adorou.
- Me refiro a você? Como foi tratado?
Ele suspirou:
- Digamos que eu esperava que fosse pior.
- Pior? Como assim?
- As pessoas estão divididas. Teve quem me olhou desconfiado, quem sequer ergueu a cabeça na minha direção e até quem veio cumprimentar-me e dizer que estava do meu lado. Sinceramente, eu esperava mais repúdio.
- Devo entender que foi tudo bem?
- Sim... – Ele sorriu.
Deitei no seu peito e senti seu abraço apertado. Era assim que eu dormia todas as noites, paparicada e mimada, como jamais imaginei acontecer um dia.
Quando levantei na manhã seguinte, Charles já havia ido levar Melody para a escola. Dormi demais. E tinha intenção de ir à J.R Recording naquele dia e ter a certeza se meu pai havia ou não impedido minha entrada na gravadora.
Ao final da escada, deparei-me com Colin e Yuna na porta, para o lado de dentro, dando um beijo de língua. Quer dizer, ao menos eu imaginava que sim.
Era um beijo pela manhã. Será que haviam mudado de opinião quanto ao beijo matinal ou...
Os dois encerraram o beijo e me viram ali, observando-os. Corei imediatamente:
- Eu... Me desculpem. Fiquei incerta de descer ou não e atrapalhar vocês.
- Então optou por nos observar. – Yuna ficou séria.
- Eu... Já estou indo preparar o café. – Tentei consertar.
- Quem quer café? Está prontinho, do jeito que cada um gosta. – Min-ji disse, da cozinha.
Ok, salva por Min-ji. Dei um sorriso e me dirigi à cozinha:
- Venham, vamos tomar café juntos. Não vão me deixar sozinha à mesa, não é mesmo? – Convidei.
Para minha surpresa, eles me acompanharam. Chocolate quente preparado por Min-ji era oficialmente o melhor de todos.
Bebi lentamente, gole a gole, saboreando cada gota da minha bebida favorita.
- Será que ainda sei fazer o chocolate quente do seu gosto? – Min-ji perguntou.
- Perfeito... Esta é a palavra. – Confessei.
Colin serviu-se de uma xícara de café puro e Yuna com leite.
- Min, sente-se conosco, por favor. Não faça cerimônia.
- Eu já tomei café da manhã, querida. Com Charles e Melody.
- Dormi tanto que nem dei um beijo em Medy antes de ela sair para escola. Amanhã vou tentar levá-la.
- Ela vai ficar feliz. – Yuna disse.
- Hoje pretendo ir à J.R Recording. – Olhei para Colin e em seguida para Yuna.
- Eu estou aqui cedo porque vou falar com J.R. – Disse Colin.
- Com meu pai?
- Exatamente. Eu, Yuna e Min-ji.
- O que houve? – Olhei para Min-ji.
- Descobri que ele não tem dinheiro para me pagar. Foram anos da minha vida prestando serviços para Jordan Rockfeller. E ele me demite, sem ter dinheiro para pagar meus direitos, sequer o salário do mês.
- Meu Deus! – Exclamei, incrédula.
- Vou tentar uma conversa amigável com ele, mas como advogado. Ou ele paga Min-ji ou tirarei até a sede da gravadora dele. Quero cada centavo que pertence a ela na sua conta, até o final da semana.
- São anos de trabalho... – olhei para Min-ji – Como ele deixou chegar a tal ponto? É um absurdo.
- São direitos trabalhistas... Seu pai não se importa com porra nenhuma?
Olhei para Colin. Ele disse “porra”? Com quem aprendeu aquele linguajar “horrendo”?
- Sinto muito, Min... Eu não tenho dinheiro para lhe pagar. – Falei.
- Mas você não me deve, querida.
- Mas... Você trabalhava para minha família... Me ajudou tanto. E agora que precisa de mim, não posso retribuir. – Lamentei.
- Eu não preciso do dinheiro, Sabrina. Mas acho um desaforo ele não me pagar. Por isso aceitei que Colin me represente, pois sabe como sou coração mole. Se J.R insistir, é capaz de eu passar por cima da dívida.
- Não... Não pode passar por cima da dívida. Ele precisa pagá-la.
Colin terminou o café e olhou no relógio:
- Min-ji, será que posso tirar algumas dúvidas com você com relação ao contrato de trabalho, antes de irmos?
- Claro! Sabrina, podemos usar sua sala de estar para isso?
- Claro que sim, Min. Minha casa é sua casa.
Os dois se foram. Olhei para Yuna, que continuava cabisbaixa.
- Você ficou tão brava assim comigo por que fiquei observando vocês? – Perguntei.
- Não... Não é isso.
- O que é, então?
- Bem... Ontem Colin me pediu em namoro.
- Pediu em namoro? Ainda existe isso de “pedir”?
- Para ele, sim.
- Como se vocês dois fossem adolescentes? – Arqueei a sobrancelha.
- Eu gosto dele, Sabrina. E também da forma como age comigo.
Toquei a mão dela e disse, olhando em seus olhos:
- Fico feliz por vocês.
- Eu... Não me sinto à vontade com isso.
- Por quê?
- Ele foi seu noivo. E somos amigas.
- Já falamos sobre isso, Yuna.
- Ainda assim, eu acho estranho.
- Vai passar... Eu sei que vai. Gosto muito de Colin, mas como amigo. Ele realmente é um amor. E mesmo que eu ainda tenha dúvidas sobre ele ter ou não dormido com Mariane naquela noite, nada vai mudar entre nós, entende? Você sabe que eu sou doente por Charles.
- Sim, eu sei.
- Você e Colin formam um belo casal. E ele, inclusive, já está ajudando a sogra – sorri – Não é um amor?
- Sim. – Ela admitiu, sorrindo, rendida.