Capítulo 77
1886palavras
2023-02-08 10:23
Olhei para o meu menino, que virou os olhos em outra direção quando percebeu que eu o observava. Suspirei, temeroso. Não tinha certeza se algum dia ele deixaria aproximar-me.
Os Rockfeller decidiram que os presentes seriam entregues antes do jantar, devido à ansiedade de Melody.
Enquanto ela abria os vários embrulhos, cheguei perto, sorrindo enquanto minha filha falava sem parar, agradecendo cada presente e dizendo o que faria com eles. Foram muitos brinquedos, todos dados pelos avós.
Eu não gostava de J.R. E o sentimento era recíproco. Embora fizesse parte da J.R Recording e talvez o artista atualmente que mais lhe rendia, ele não parecia se agradar com minha presença, nem mesmo na gravadora. E nunca fez muita questão de esconder. Claro que até então eu não me preocupava tanto porque não sabia da relação dele com Sabrina. Agora a antipatia dele me intrigava.
Mariane também nunca fez questão de me levar à casa dela quando começamos a nos envolver. Eu fazia menos questão ainda.
- Agora me diga, Papai Noel trouxe tudo que você pediu? – Calissa perguntou, enquanto a ajudava a retirar as bonecas das caixas.
- Na verdade, eu só pedi uma coisa... – ela não conseguiu evitar me olhar – E eu ganhei. – Sorriu.
Calissa me olhou. Tenho certeza que não conseguia esconder o quanto eu amava aquela menina.
- Eu... Tenho um presente para você. – Avisei-a.
Ela levantou imediatamente e veio na minha direção:
- Este presente é bem pessoal... Só entre eu e minha pequena fã. – Sorri, pegando-a no colo e indo para rua, em direção à piscina.
- Você comprou um presente para mim, papai? – Ela perguntou ansiosa, o cheiro doce de perfume de bebê vindo na minha narina, dando vontade de apertá-la entre meus braços com tanta força até cansar.
- Papai Noel trouxe o que você pediu, não é mesmo?
- Sim... Você! – ela levantou os braços para cima, demonstrando felicidade – Medy pediu papai na noite de Natal.
A desci do meu colo e retirei o colar do meu pescoço. Ela me olhava sem piscar. Entreguei-o a ela, que imediatamente virou-o, para certificar-se se eu havia colocado a letra do seu nome ali.
Tocou o M em ouro, junto do C e do S, que eu mandei fazer, pondo sobre a letra que no passado fiz com uma faca.
- Eu amei. – Ela me olhou, sorrindo.
Fechei-o ao redor do pescoço dela:
- Este é o original... O primeiro colar de conchas da nossa família. E será seu.
- Obrigada, papai. – Me abraçou com força.
Enquanto ela ainda estava com o corpinho gelado junto do meu, falei no seu ouvido:
- Você está preparada para ser a irmã do meio?
Ela se afastou, enrugando a testa, confusa.
- Sabe que Guilherme é seu irmão, não é mesmo? Você é uma menina esperta e aposto que ouviu todas as conversas que aconteceram por aqui desde a sua chegada.
- Sim... Eu sei. Não quero que ele seja o namorado da mamãe.
- Papai é o namorado da mamãe... O resto é só fingimento. Lembra do nosso combinado, não é mesmo?
- Eu lembro.
- Se Gui é o irmão mais velho e Medy vai ser a irmão do meio... O que será que vai acontecer?
- Mamãe vai ter outro bebê?
- Sim... Mamãe vai ter outro bebê – impressionei-me com a esperteza dela – E papai está muito feliz.
Ela me abraçou novamente:
- Medy está feliz... Muito feliz. Eu vou ajudar a cuidar dele?
- Claro que sim.
- Não podemos contar a ninguém que vamos ter um bebê?
Eu ri, suspirando:
- Acha que consegue guardar este segredo só mais um pouquinho?
- Claro que sim... Medy é muito esperta. – Vangloriou-se.
- Se é... Não tenho certeza se seu irmãozinho ou irmãzinha vai se assim... E se for... Vai ser complicado. Papai vai se sentir muito burro.
Peguei a mão dela e voltamos para dentro da casa. Todos já estavam abrindo os presentes.
- Eis meu presente. – Mariane gritou, levantando a sacola da joalheria, contendo um laço vermelho enorme.
Claro que todas as atenções se voltaram para ela, como gostava que fosse. Percebi Sabrina desconfortável com a situação, mas seguia ali, firme e forte.
Peguei uma taça com Champagne e fui me aproximando deles, até conseguir ficar ao lado da minha garotinha. Enquanto Mariane abria a sacola e retirava de dentro a caixa envolta em courino preto, toquei a mão de Sabrina levemente, sentindo-a gelada.
Porra, fui tomado de um intenso frio na barriga com o toque escondido. O dedo dela passou pelo meu, alisando de leve, fazendo meu coração acelerar.
Fiquei cego e surdo por alguns minutos, completamente concentrado no toque dos nossos dedos. Olhei-a e ela sorria, enquanto seguia com os olhos na irmã.
Não pude evitar o riso quando apertei os dedos dela dentro da minha mão, mesmo que rapidamente, tentando mostrar-lhe que eu estava ali, ao lado dela, para qualquer situação.
Ficou óbvia a decepção nos olhos de Mariane quando olhou o bracelete.
- Obrigada, amor. – O sorriso ia se desfazendo nos lábios dela.
Me dirigi até ela, dando-lhe um beijo no rosto:
- Fico feliz que tenha gostado, querida!
Ao ver os olhinhos de Melody sobre mim, rapidamente me afastei um passo.
- Charlie B., você comprou um presente para mim? – Sabrina perguntou – Minha filha é sua fã... Mereço, não acha? Jamais encontrará uma fã tão fiel e carinhosa quanto ela.
- Claro, cunhada! Não deixaria de lhe comprar uma lembrança – fui até o pinheiro e retirei a sacola pequena, dando-lhe em mãos – Espero que goste. Embora singelo, é de coração.
Ela abriu a sacola e retirou a barra de chocolate artesanal de dentro, observando atentamente:
- Obrigada... Não há nada que eu goste mais do mundo do que chocolates.
Fui até ela e a abracei com força:
- Feliz Natal.
- Para você também, Charlie B.
Guilherme aproximou-se e pôs o braço sobre os ombros delicados dela, me encarando.
- Há um presente para você debaixo do pinheiro. – Falei.
- Não me interesso por nada que venha de você.
Aquilo me feriu profundamente. Mas estava calejado. Respirei fundo e segui:
- Não quer nem saber o que é?
- Não.
- E se for o dinheiro que quer tirar de mim, todo numa caixa?
- Não quero numa caixa. Quero todo o processo judicial junto.
- Não me importo... Não é minha intenção fazer o processo se prolongar. Darei o que for determinado pelo juiz.
Ele me olhou, silenciosamente, talvez não esperando por aquilo. Eu mal começava a ganhar dinheiro com minha música e Kelly já queria tudo que achava que fosse de direito do filho. E sim, ele tinha a parte dele. Por que eu diria não? Já sofri coisas muito piores do que perder grana.
Para mim, que nunca tive nada, qualquer pouco era muito. Não me importava com a pouca quantia que me sobraria.
- Qual é o presente? – Sabrina perguntou, indo ao pinheiro.
Entreguei a ela, que tentou adivinhar:
- Acho que é um skate, Gui... – Sorriu.
- Não quero nada dele. – O garoto reforçou.
- Gui, você ama andar de skate. Seu pai se preocupou em dar-lhe algo do seu gosto... Aposto que é de boa qualidade, como você sempre faz questão das suas coisas... Pelo menos abra, por favor. – Ela entregou na mão dele.
Guilherme pegou o pacote e foi até a porta, colocando do lado de fora, o semblante sério enquanto me encarava.
- Tudo bem... Você não é obrigado a aceitar – falei – Mas posso lhe pedir um presente de Natal?
Ele me olhou, surpreso:
- Como assim?
- Eu... Gostaria de neste Natal, receber um abraço do meu filho.
POV SABRINA
O pedido de Charles doeu dentro de mim. E a negativa de Guilherme me fez segurar as lágrimas.
Charles saiu e olhei para o filho dele:
- Você é um garoto mimado... E mau. – Me ouvi dizendo.
- Agora é isso que pensa de mim?
- Você sabe o que é realmente não ser amado pelo pai? Não, você não sabe – olhei para J.R, que conversava com os empregados, orientando o jantar – Jordan Rockfeller sempre foi um homem interesseiro e pôs os negócios acima da família. Pouco se importa com sentimentos... Por Deus, você tem um pai que se importa com você. Que abriu mão de toda sua juventude para criar um menino de dois anos, enquanto sua mãe foi estudar fora do país, deixando-o sem se preocupar em como você ficaria. Eu disse “dois anos”, Guilherme. Na minha opinião, um bebê...
- Sabrina, você não vai me convencer a perdoar este homem que se diz meu pai.
- Você é um ingrato.
- E você uma mentirosa e dissimulada... – Ele se afastou, fingindo que estava tudo bem, como se nada o abalasse.
Porra, como fui me interessar um dia por aquele menino mimado e imaturo?
Eu até poderia tentar entender o lado dele naquela história. Mas não deixar sequer o pai lhe explicar sua versão era muito ridículo. Uma total falta de empatia.
- O jantar está servido, família! – A empregada veio avisar.
- Por favor, vamos cear. – Minha mãe convidou, sorrindo.
Calissa usava um vestido preto com alguns detalhes em dourado. Seu corpo continuava escultural e a pele como se não tivesse passados dos trinta anos. Eu a achava linda. E apesar de tudo, uma mulher forte. Pois se sua decisão na vida foi aturar tudo que a vida lhe ofereceu, inclusive J.R, sem lutar para mudar absolutamente nada, ela tinha se saído muito bem.
Enquanto eu me dirigia para a sala de jantar, Mariane me puxou pelo braço, levemente.
- Que achou do meu bracelete? – Mostrou-me o braço com a joia reluzente.
Toquei o bracelete em ouro liso, com uma pedrinha em forma de pingente pendurada.
- É bonito.
Ela olhou para minha sacola, ainda na mão:
- Um chocolate? É isso que você vale para ele?
Eu ri, balançando a cabeça:
- Não é sobre o quanto ele pagou... E sim sobre o que significa para ele cada presente.
- Você significa comida?
Suspirei:
- Talvez...
Ela seguiu na minha frente, talvez percebendo que não me abalou.
- Ei, Mariane?
Minha irmã virou-se na minha direção:
- Que horas será que você receberá sua aliança com o pedido de noivado?
Ela me encarou, sem responder nada. Esperei um tempo pela explicação, mas não veio. Virou as costas e se foi, certamente furiosa.
Antes de pôr a sacola sobre a mesa dos presentes, retirei o chocolate para dar uma pequena mordida. Simplesmente porque minha boca salivou só de saber que tinha um chocolate caseiro ali dentro.
Seria só um pedacinho... Ninguém ia ver para me criticar.
Assim que abri a embalagem, tinha escrito com letras em chocolate branco, sobre o preto: Para minha garotinha, com amor: “El cantante”.
Eu sorri, desistindo de devorar a barra ou sequer dar uma mordida. Embalei novamente e a pus junto dos outros presentes recebidos por todos. Olhei para o pinheiro e agradeci mentalmente ao Papai Noel por realizar o desejo da minha filha e ao mesmo tempo o meu: só queríamos Charles.