Capítulo 60
2093palavras
2023-02-08 10:14
- Estão falando como se Guilherme fosse um mocinho virgem – me irritei – Meu erro foi ter deixado ele fazer o que fez comigo na sala de aula, dentro da escola. Mas seu filho não é nenhum santo... Ele é culpado – olhei na direção de Guilherme – Assim como eu. Ambos fizemos errado.
- Não é culpa dela... Nunca foi. Eu sempre fui atrás... Encontrei até mesmo a filha dela para me aproximar.
- Como assim? – o olhei – Achei... Que tinha sido coincidência...

- Ele é só um garoto. – Kelly argumentou.
- Um garoto de 18 anos. Guilherme não é criança. – Reiterei.
- Não vamos ter esta conversa aqui, Sabrina, definitivamente – Guilherme disse – E nem em outro lugar. Porque não devo satisfações sobre o que faço ou com quem me envolvo – ele olhou para as duas, mãe e avó.
- Gui... – Rachel se aproximou.
- Fique longe de mim – ele gritou – Você é uma maníaca, uma maluca, doente... Eu não aguento mais suas perseguições. Tem noção do que fez? Destruiu a vida de Sabrina. Nunca vou perdoá-la. Jamais vou sequer olhar na sua direção novamente. Fingirei que nunca passou pela minha vida, Rachel. Você foi um erro... O pior erro de toda a minha história.
- Eu... Não fiz por mal... – Ela tentou se defender.

Eu ri, ironicamente. Ela sabia muito bem o que tinha feito e havia anunciado anteriormente seu plano. Me destruiu, em público, da pior forma possível.
Guilherme ergueu a mão em direção a minha, encarando-me:
- Venha comigo... Você não precisa passar por isso. E me perdoe... Pelo que causei na sua vida.
- Ainda pede desculpas? Isso é um absurdo. O que esta mulher fez o que com você, afinal? – Kelly olhou para o filho, furiosa.

Peguei a mão que Guilherme me estendia, enlaçando meus dedos nos dele. Desci os degraus e não olhei na direção de ninguém.
- Arrume minhas coisas – ele disse para a avó – Eu vou embora daquela casa.
- Não! Não pode fazer isso! – Ela ficou em prantos.
- Eu posso fazer o que quiser.
Ele saiu, me puxando junto dele. Segui, sem olhar para trás, me sentindo segura de alguma forma. Guilherme não me deixou. Encarou tudo comigo, fazendo o que estava ao seu alcance para não me deixar tão mal. O garoto era corajoso e eu começava a acreditar que os sentimentos dele por mim eram reais... Tão reais que estava abrindo mão de tudo, inclusive a própria família por mim.
Eu fiz aquilo um dia... Deixei tudo por “el cantante”. E no fim deu tudo errado. E agora ele estava formando outra família. E eu não estava mais incluída na vida dele.
Por que Charles se metia o tempo todo nos meus pensamentos? Antes eu não tinha mais lembranças dele, porque estavam apagadas. Mas agora ele fez novas. E quanto tempo eu demoraria para apagá-las? Mais cinco anos?
Quando deixamos o Ginásio, ainda de mãos dadas, ouvimos Do-Yoon atrás de nós. Virei na direção dele, que estava com a respiração acelerada. Certamente tinha corrido até ali.
- Eu sabia que isso não daria certo. – Ele me disse.
- Me desculpe, Do-Yoon... Você me indicou e eu fiz besteira, como sempre. Me perdoa. – Larguei a mão de Guilherme e abracei meu amigo.
- Eu não me preocupo por mim, Sabrina... E sim por você. – Ele me afastou, encarando-me.
- Eu... Vou tentar ficar bem. E dar a volta por cima. Sou expert nisso...
- As famílias destes alunos vão destruí-la.
- Eu não vou deixar. – Guilherme afirmou.
- Você não poderá contê-los, Guilherme. Virão para cima dela com tudo.
- Farei o que tiver ao meu alcance.
- Pode manipular a sua família, mas não a dos outros alunos.
Guilherme abaixou a cabeça, pensativo.
- A escola certamente vai demiti-la por justa causa. Vão abrir um processo interno e talvez até mesmo pessoal contra você, fora do âmbito escolar. A família de Guilherme não vai deixar assim.
- Eu sou de maior... Tenho 18.
- A imagem de Sabrina já vai estar destruída, independente da sua idade.
- Eu... Sei... – Balancei a cabeça, aturdida.
- Não será mais professora de Matemática em Noriah Sul... Nunca mais. Sabe disso?
- Eu... Acho que sim.
- E o que vai fazer, Sabrina? E Medy?
- Eu... Eu...
- Nós vamos para Noriah Norte. Ela vai encontrar abrigo em sua família. – Disse Guilherme.
Eu ri:
- Abrigo na minha família? Está brincando!
- Eles a puseram para fora um dia porque estava grávida. Houve arrependimento... Sua mãe mesma disse isso. Eles vão protegê-la, Sabrina. E também à Medy.
- Eu não quero a proteção deles...
- Eu estou com você... E sempre estarei. – Guilherme pegou minhas duas mãos, apertando-as contra as dele.
- Vá... Antes que tudo piore. E talvez Guilherme tenha razão... Não sobre ser acolhida pelos Rockfeller, mas uma viagem neste momento seria conveniente, até todos esquecerem o que houve.
- Eu... Vou ver. Preciso ir.
Virei as costas e segui com Guilherme até o carro. Ele me pôs no banco do motorista e nem me dei em conta, de tão nervosa que estava. Quando percebi, ele estava dirigindo o meu carro.
- Você... Tem habilitação? – Perguntei.
- Claro que sim! – Ele sorriu.
Fiquei em silêncio, olhando a estrada à nossa frente, a lua no céu, as estrelas brilhando de forma tímida. Fazia tempo que eu olhava para as estrelas e que elas não eram mais um momento de diversão ou mesmo de fuga. Era como se elas não mais existissem, tamanha turbulência da minha vida.
- Eu nem sei quando foi a última vez que eu olhei as estrelas do céu... E fazer isso me deixava tão feliz. Eu dormia, quando mais jovem, com as cortinas abertas, só para ficar vendo-as, enquanto imaginava mil coisas... – sorri, lembrando do passado – E agora vejo que elas ainda estão aqui, no mesmo lugar... Não me deixaram... Mas eu as deixei. Eu preciso recuperar meu brilho... Pegá-lo de volta, lá no passado.
- Estou com você, Sabrina. E me desculpe...
- Você não é culpado... Eu sou culpada.
- Não... – ele pôs a mão sobre a minha perna – Você me avisou e eu não quis ouvir. Fui o responsável pela destruição da sua vida.
- Não... – Balancei a cabeça, confusa e não querendo que ele se culpasse – Eu poderia ter dito não... Mas não o fiz. Porque no fundo... Eu queria. – Admiti.
Ele me olhou, tentando desvendar meus pensamentos.
Peguei o meu celular e disquei um número gravado.
- Sabrina?
- Oi, Min-ji. Poderia pedir para minha mãe me ligar, por favor?
- Claro, menina! Imediatamente.
Encerrei a chamada e ele perguntou:
- Vai fazer o que?
- Recomeçar do zero de novo. Sou boa nisso.
- Como assim?
- Vender a casa que comprei aqui... Pedir minha herança judicialmente, antes que a destruam... Fazer um doutorado e dar aulas na faculdade.
Ele riu:
- Bom que você planeja seu futuro em segundos... Simples assim.
- Tudo isso em Noriah Norte. Precisamos partir, Gui. Tenho umas vinganças pendentes.
- Jura?
- E umas ideias loucas na cabeça.
- Tipo?
- Meu pai vai se apaixonar por Melody. Porque minha filha é simplesmente a coisa mais incrível do mundo todo. Eles vão lamber o chão que minha pequena pisar. E quando estiverem dependentes dela, partiremos. E eu vou usar Colin para entrar com uma ação pedindo minha herança, o que é meu por direito. Meu pai vai ficar acabado, destruído, duplamente. E adivinha? Não permitirei que vejam meu docinho... Porque ela é minha, só minha. E o lembrarei que quis que eu a tirasse. Não farei com que ele esqueça um minuto sequer, enquanto viver, tudo que fez de mal para mim.
Meu telefone tocou. Certamente era minha mãe.
- Sabrina, minha filha... Que bom falar com você.
- Oi, mãe. Eu estou com as malas prontas. Quero um jatinho me buscando em Noriah Sul, dentro de no máximo duas horas.
- Como assim?
- Optei por não usar avião comum. Melody nunca voou e pode estranhar.
- É que... Bem... Vendemos o jatinho.
Pensei um pouco e respirei fundo:
- Puxa, que pena! Então não nos espere mais, por favor. Ficaremos por aqui mesmo.
- O que houve? – Ouvi claramente a voz de J.R do outro lado da linha.
Um breve silêncio, certamente enquanto minha mãe fechava o fone e contava o ocorrido:
- Daremos um jeito, filha. Em duas horas, um jatinho estará aí em Noriah Sul, esperando por você e Melody.
- Conte hospedagem para quatro pessoas, por favor, por sete a dez dias. Ainda não temos certeza de quanto tempo iremos ficar.
- Quatro pessoas?
- Sim, Yuna e meu namorado irão juntos.
- O pai de Melody?
- Não... O meu namorado. – Repeti.
- Eu... Vou desligar. Preciso providenciar tudo. Estamos na casa de praia... Um carro buscará vocês o aeroporto e...
- Não... Medy enjoa em viagens longas de carro. Sei que há um heliponto na casa de praia. Mande um helicóptero, por favor, no lugar do carro. É mais rápido e confortável. Meu namorado detesta ficar preso no trânsito e sabe como ficam as estradas em época de festas de final de ano.
Houve um silêncio de uns dois minutos antes que ela dissesse:
- Darei um jeito nisso também. O que importa é que você e Medy estejam conosco no Natal. É só isso que desejamos.
- Eu preciso desligar. Até logo.
- Até logo, minha filha. Estamos esperando ansiosamente por vocês.
Guilherme estacionou em minha casa e perguntou:
- Sua família possui parece muito bem financeiramente. Será que... Os conheço? – Arriscou, curioso.
- Conhece... – sorri – Mas vou lhe fazer uma surpresa, meu caro. – Toquei o rosto dele, carinhosamente.
- Eu... Faço parte do plano de vingança contra seu pai, não é mesmo?
Eu ri:
- O que você acha?
- Eu acho que ele vai ficar puto quando imaginar que estamos juntos, assim como a minha mãe. Prometo fingir muito bem nossa relação... O que não vai ser muito difícil para mim.
- Não vamos fingir, Gui. Nós vamos ser um casal de verdade.
Ele me olhou, seriamente.
- Quer namorar comigo? – Perguntei, sorrindo da forma como ele ficou assustado.
- Isso é brincadeira?
- Não... É sério.
- Eu sou louco por você, Sabrina.
- E eu por você, Gui – o abracei com força, enquanto desafivelava meu cinto – Me faça esquecer “el cantante”, por favor.
- “El cantante”? – A voz dele soou rouca no meu ouvido.
- É... Como eu o chamava... – Fechei os olhos, deitando a cabeça no ombro dele.
- Eu só precisava de uma chance, Sabrina. E você decidiu me dar. Vou fazê-la esquecer ele... Eu prometo.
Ele beijou-me. E desta vez não houve fúria ou loucura. Foi um beijo leve, lento, onde provávamos com calma o sabor um do outro.
Conforme o beijo ficava mais quente, ele desceu a mão, tocando meu seio sob o vestido. Senti dor, mesmo ele não tendo apertado.
Afastei-me e disse, preocupada com o que senti:
- Eu... Não quero que Medy veja isso.
- Mas... Vamos contar à ela, não é mesmo?
- Sim... Mas depois do Natal. Ela fez um pedido ao Papai Noel e eu não quero estragar isso, entende?
- Como você quiser. – Ele deu um beijo no meu rosto.
E foi assim que terminei de fazer as malas, convenci Yuna a ir conosco, depois de muita insistência e partimos, no meu carro, em direção ao aeroporto particular de Noriah Sul, mesmo lugar onde há mais de cinco anos atrás eu pousei naquele país, sem levar bagagem nenhuma, a não ser minha filha no ventre.
Agora eu voltava... Anos depois. Madura, ainda mais forte e decidida a destruir o homem que afastou o amor da minha e quis que eu abortasse. Ele achou que eu não conseguiria e voltaria, destruída e sem saída, disposta a fazer o que ele queria. Mas eu venci. E fiz isso longe dele, sem sua ajuda.
E a bagagem que eu levava comigo era grande... E perturbadora. Ele não seria mais o mesmo depois de mim, Medy, Yuna e Gui.
Passamos na casa de Guilherme antes, que pegou suas coisas e então entramos no avião particular, em direção à casa de Praia dos Rockfeller.