Capítulo 31
1995palavras
2022-12-13 11:53
- Eu preciso pegar uma coisa... E não foi você quem me deu. – Falei.
- Diga o que é e Min-ji buscará para você.
Olhei-o firmemente, as lágrimas contidas, a dor queimando meu peito, extravasando na minha alma.
Me dei em conta de que Min-ji estava próxima, as mãos para frente, entrelaçadas, observando tudo. Sorri na direção dela, sabendo que a dor que a governanta sentia era talvez a mesma da minha mãe.
- O que quer que eu pegue, senhorita Sabrina? – Ela perguntou com a voz baixa.
- A jaqueta preta de couro.
- Sei qual é. – Ela disse subindo imediatamente.
Fiquei ali, parada. Minha mãe aproximou-se e deu-me um beijo. Olhei o cordão no chão, sabendo que certamente ninguém juntaria. Iria para o lixo, junto com todas as minhas coisas. Ninguém precisava de nada meu... Tudo era para me ferir, me magoar, acabar comigo.
Ainda assim, eu não tiraria a minha filha. Toquei meu ventre e sorri, tentando não passar a dor que sentia naquele momento para ela.
Min-ji desceu com a jaqueta nas mãos e meu pai disse:
- Acompanhe-a até a porta, Min-ji.
- Sim... Senhor... – A voz dela falhou e pude ver os olhos marejados.
- Eu vou ficar bem... – Garanti, olhando para minha mãe.
Virei as costas, na certeza de que jamais seria capaz de perdoar Jordan Rockfeller, meu pai, pelo que estava fazendo para mim e minha filha.
Quando cheguei na porta, Min-ji entregou-me a jaqueta e abraçou-me com força:
- Pus dinheiro no bolso da jaqueta... – Cochichou no meu ouvido.
Tentei contestar, mas ela pôs o dedo na minha boca:
- Não diga nada...
- Obrigada por tudo, Min-ji.
- Tem... O endereço dos meus filhos em Noriah Sul. Está no bolso. Compre uma passagem e vá para lá. Eles poderão ajudá-la.
- Obrigada. – Falei novamente, certa de que não precisaria da ajuda dos filhos dela, que moravam em outro país.
Fui andando pela estrada que levava até a o portão principal, que era uma das entradas da propriedade. Eu nunca havia pisado os pés ali. Só havia passado de carro. Nunca me dei em conta do tamanho das árvores e das flores silvestres que nasciam sem serem plantadas. A natureza era perfeita... E a vida também. Eu ficaria bem, assim como minha filha. Encontraríamos Charles e tudo daria certo.
Assim que passei o portão de ferro, me deparei com a estrada quase deserta. O sol estava quente e minha pele começou a arder. Não havia sequer protetor para passar. Nos mais de trinta graus, pus a jaqueta, para proteger meus ombros e braços dos raios solares.
Fui andando sem rumo, sem saber o que fazer exatamente. A única certeza que eu tinha era de que precisava chegar na praia.
Não tinha um celular para chamar um táxi. Andava pela lateral, esperando um carro passar para pedir uma carona.
Pus a mão no bolso e tinha um maço de dinheiro enrolado. Não era muito, mas para quem não tinha nada, quase um tesouro. Min-ji era inteligente, gentil e bondosa. E me amava, assim como eu a estimava. Junto havia um bilhete escrito às pressas, com um número de telefone e endereço dos filhos.
Não, eu não iria para Noriah Sul. Meu destino era partir com Charles, para qualquer lugar. Ele me protegeria... E também à nossa filha.
- Eu sei que você é uma menina. – Toquei minha barriga, sorrindo em meio à decepção e tristeza de tudo que estava acontecendo.
Eu não estava sozinha. Tinha aquela pessoinha se formando e crescendo dentro de mim. Não importava o que acontecesse, eu jamais ficaria sozinha novamente.
Andei por não sei quanto tempo e cheguei a uma rótula. Próximo tinha um posto de gasolina e para minha sorte, um táxi abastecendo.
Apressei o passo e consegui chegar antes de ele partir. Pus a cabeça para dentro do veículo e perguntei ao motorista, um senhor grisalho, que olhava no celular:
- Pode me levar num lugar?
Ele me olhou:
- Só se não for muito longe. Meu carro não está bom.
- Litoral. Uma das primeiras praias.
- É muito longe. – Ele voltou a olhar no celular.
- Por favor... Eu sei que seu carro chega até lá.
Ele pensou um pouco:
- Ok, entre.
Sentei no banco de trás e consegui enfim respirar aliviada. Conseguiria chegar ao meu destino, finalmente.
O automóvel foi ligado e partimos, em direção ao litoral.
Olhei-me no espelho retrovisor central do carro e percebi que meus olhos estavam vermelhos e inchados. Parecia que aquele dia não acabava nunca. E quanto mais rodávamos, mas ansiosa eu ficava.
Talvez aquele fosse um dos dias que não deveria sequer levantar da cama. Sim, era definitivamente o meu dia de azar. E eu só não definiria como o pior da minha vida, porque eu soube que estava grávida.
O carro parou de funcionar, parando no meio da estrada.
- Senhor, eu preciso chegar ao meu destino. – Falei.
- Eu avisei que o carro estava ruim.
- Mas... Eu tenho que chegar na praia... É urgente. Chame outro táxi para mim, por favor.
- Precisa me ajudar a tirar o carro do meio da pista. Vamos empurrá-lo para a lateral.
Arqueei a sobrancelha, confusa:
- Isso... É brincadeira?
- Claro que não. Eu não consigo sozinho.
- Eu... Não posso. Estou grávida.
Ele respirou fundo, bravo, pouco se importando:
- Então pegue o volante. Vou empurrar e você põe o carro no acostamento.
Aquela proposta era melhor do que eu empurrar o carro. Aquele homem devia ser louco. Ninguém conseguia mover um carro estragado do lugar, a não ser um caminhão guincho.
Abri a porta e me dirigi para o banco do motorista. Girei a chave e o carro não ligou. Olhei para o lado e percebi que tinha marchas manuais e três pedais. Para que servia o terceiro pedal? Como fazer?
Antes que eu perguntasse, um carro parou e dois homens desceram, ajudando o motorista a empurrar. Não sei se eles eram muito fortes, mas conseguiram fazer aquela coisa andar, movendo toneladas de ferro com seus próprios corpos. Só que rápido demais. Fiquei nervosa e em vez de pôr para o lado, como o homem havia pedido, segui reto e o carro começou a ir rápido demais.
Oscilava entre ligar o motor e parar e eu pisei no pedal do meio, que achei que era o freio, mas não funcionou. Comecei a gritar, não tendo ideia de como parar aquela coisa.
Do retrovisor do lado de fora eu os via gritando enquanto eu gritava mais alto, não conseguindo ouvir nada do que eles tentavam gritar. O motorista tentava me alcançar pela lateral.
Olhei para o lado direito e me dei em conta de que podia puxar o freio de mão. E assim o fiz. O carro parou. E ouvi o estrondo dos dois homens batendo na lataria.
- Sua louca. – O motorista abriu a porta e me puxou para o lado de fora, de forma agressiva.
Fui até os outros homens, para me certificar de que estavam bem.
- Você... Não sabe dirigir? Por que não avisou? – Um deles perguntou, tocando o peito, com o semblante de dor.
O outro me fuzilou com o olhar. Ambos entraram no carro no qual estavam e foram embora.
- Eu preciso do seu celular. – Falei para o motorista.
Ele nem olhou na minha direção. Fez uma ligação e parecia ter entrado em contato com algum guincho.
- Senhor, eu preciso mesmo do celular.
- Estou com pouca bateria e o guincho vai demorar. Não vou deixar você usar.
Eu ri, incrédula:
- Eu não tenho que ficar aqui com o senhor. Me deve a corrida. Encontre outro taxista agora.
- Você é uma atrevida. Eu lhe fiz um favor vindo até aqui. Avisei que o carro estava ruim.
- Poderia não ter aceitado a corrida. É seu dever me fazer chegar no destino.
- Sim, se você não tivesse quase ido embora com o meu carro e não fosse tão arrogante.
- Arrogante, eu? Onde estão meus direitos?
- Direitos? – ele gargalhou, indo para dentro do carro e fingindo que eu não estava ali – Em que mundo você vive?
- Eu sou advogada.
- Só se for na sua terra, porque você tem no máximo dezoito anos, menina.
- Sou filha de J.Rockfeller.
Ele riu:
- Jura? Por isso está num táxi, no meio do nada, usando estas roupas? Use seu celular então, madame. Se não bastasse ser louca, ainda é mentirosa.
Naquele momento eu percebi que meu pai havia me deixado exatamente como planejou: sem nada, nem a possibilidade de poder usar meu nome, pois não tinha nada que comprovasse quem eu era.
Não me achei arrogante. Mas se o motorista mencionou aquilo, eu tinha que mudar a tática. Eu dependia daquele homem. Quase que minha vida dependia do celular dele.
Peguei o bolo de dinheiro de bolso e mostrei para ele, que arregalou os olhos:
- Eu preciso chegar na praia...
Ele pegou o dinheiro e fez uma ligação. Não estávamos nem no meio do caminho. Então eu levaria no mínimo mais de uma hora para chegar ao meu destino. E já era quase cinco da tarde.
Meia hora depois e outro táxi chegou. Eu sabia que havia dado dinheiro demais ao motorista, mas foi num ato de desespero. Esperava que Charles tivesse dinheiro para pagar a próxima corrida.
Já no caminho, eu via o sol se pondo e meu coração entrando em desespero. Ele estaria lá... Eu sabia que sim. Sentia que ele não partiria sem mim.
Quando vi a casa ao longe, meu coração quase explodiu dentro de mim. Estava ansiosa, inquieta e mil sensações perpassavam meu corpo e mente, entre alívio, medo e tensão.
O sol ainda não tinha ido embora, então eu tinha chegado a tempo.
Quando o homem estacionou em frente à casa, sai correndo, sem pensar duas vezes. Subi o caminho íngreme, sentindo o cheiro do mar nas narinas, o vento balançando meus cabelos, os fios entrando na boca.
Cheguei à porta, já na varanda, e respirei fundo, tentando recuperar o ar, que começava a faltar nos meus pulmões.
Embora eu não visse vestígio de alguém ali, bati na porta, inúmeras vezes, sem parar, na esperança de que ele estivesse ali dentro.
Meus dedos começaram a doer
- Circulei pela varanda, tentando encontrar alguma janela aberta.
- Charles! Sou eu... Estou aqui. – Gritei.
Quando cheguei na porta dos fundos, percebi que não tinha mais ninguém ali. Ele tinha ido... E não esperou o sol se pôr, como prometeu.
Toquei meu ventre, olhei para o mar e me senti realmente sozinha naquele momento. Não passou pela minha cabeça que ele pudesse não estar ali. Se Charles soubesse tudo que fiz para chegar naquele lugar.
Senti as lágrimas ardendo no meu rosto e sentei no chão, incapaz de pensar ou falar. A dor era tão grande que eu não raciocinava.
Ouvi um som e virei, esperançosa. Era o motorista do táxi.
- A senhora... Precisa de ajuda? – Ele perguntou.
Assenti, com a cabeça.
Ele pegou minha mão e ajudou-me a levantar:
- Não sei o que houve, mas...
- Pode me emprestar seu celular, por favor?
- A senhora... Tem dinheiro para pagar a corrida?
- Não... – confessei – Mas eu vou pedir ajuda. E vou pagar... Prometo.
Ele retirou o celular do bolso e me entregou. Respirei fundo, pois parecia um sonho. A questão é que eu não sabia números de telefone de cor. A pessoa que fazia contas com facilidade, transformava dias em horas, minutos e segundos, não decorava o celular dos familiares.
Eu não tinha mais dinheiro, família, os amigos nunca foram verdadeiros. E além do número do meu pai, só havia outro que decorei, de tanto ligar.
- Alô? – Ele atendeu no segundo toque.
- Colin, sou eu. Preciso de ajuda.
- Sabrina?