Capítulo 30
2398palavras
2022-12-13 11:52
Seguimos em silêncio até a cafeteria do Hospital. O local era no terceiro andar e tinha um teto em vidro, de onde podia-se ver a luz do sol e o tempo lá fora. Claro que escolhi sentar sob a luminosidade, sabendo o calor que fazia na rua, com a temperatura ambiente ali dentro.
A atendente veio trazer o menu e enquanto eu escolhia, Colin disse:
- Para mim café expresso, sem açúcar. Para ela chocolate quente e panquecas de chocolate com calda.

- Eu não quero chocolate quente... Tampouco panquecas com calda. – Levantei os olhos na direção dele, o rosto escondido atrás do cardápio que mais parecia um livro de tantas páginas.
- Mas... Você sempre gostou.
- Quero um café com leite. Creio que eu deva começar a beber bastante leite... – falei mais para mim mesma – Um croissant com creme de baunilha... E outro de queijo.
- Não temos croissant com creme de baunilha, senhorita.
- Providencie imediatamente o que ela pediu. – Colin sequer olhou na direção da mulher – Dê um jeito.
- Mas...

- Encontre um creme de baunilha e faça o que minha noiva pediu. – Ele se alterou.
- Eu não sou sua noiva. – Falei imediatamente.
Ela ficou nos olhando, confusa.
- Se não tem creme de baunilha, pode ser qualquer outra coisa... – Dei de ombros, mesmo minha vontade sendo o creme de baunilha.

- Goiabada, doce de leite... – Ela começou a listar.
- Ok, pode ser os dois.
Ela saiu e Colin fez a observação:
- Atendente incompetente.
Enruguei a testa, sabendo que se ainda estivéssemos noivos, talvez eu nem me preocupasse com a forma como ele tratou a atendente. Estava acostumada com ele ditando regras e querendo que se jogassem aos seus pés. Mas naquele momento percebi que a vida era tão difícil para preocupar-se com um simples creme de baunilha.
Olhei para a atendente preparando os cafés e fiquei me perguntando qual a história dela. Porque sim, ela era um ser humano e estava ali por algum motivo. E ela não sabia que eu estava grávida, que Colin era meu ex-noivo e que dormiu com minha irmã... E que eu esperava um filho de um homem que mal conhecia e pelo estava completamente apaixonada.
E se ela também estivesse grávida? E se trabalhasse para sustentar o filho? E se fosse mais de um? O que era um creme de baunilha frente à tudo?
- Seu pai me falou que você está grávida. E acha que o filho é meu.
Respirei fundo e disse:
- Não, ele não acha mais que o filho é seu. Eu contei a verdade.
- Meu Deus, Sabrina, este filho não é meu?
O encarei e ri, debochadamente:
- Como eu teria um filho seu se jamais transamos sem preservativo?
- Mas...
- Não é seu. – Garanti.
- Isso que dizer que você dormiu com outro homem... Sem preservativo? Que tipo de mulher você é?
- O tipo que transa sem camisinha, mas não trai ninguém.
- Este seu papinho está ficando chato.
- Jura? – Estreitei os olhos na direção dele.
A atendente trouxe nossos pedidos e vi os três croissants à minha frente. não pensei duas vezes e comecei pelo doce, de goiabada.
- Quem me garante que você não estava com este homem antes de tudo acontecer?
- Antes de você me trair? – Questionei, mastigando de boca aberta, sabendo que aquilo o irritava profundamente.
Ele me entregou um guardanapo:
- Sim.
- Bem, eu não lhe devo satisfações sobre isso. Não somos um casal e nem seremos mais. – Pus tudo na boca, quase empurrando para caber.
- Você... Está com a boca suja. – Ele apontou para mim.
Passei a mão sobre o açúcar, provocante. Se tinha uma coisa que deixava Colin completamente desnorteado era qualquer falta de higiene.
- Sabrina, me perdoa.
Peguei o outro croissant, de doce de leite. Assim que mordi, o doce se espalhou pela minha boca, quente, cremoso.
- Eu nunca tinha visto croissant de doce de leite. Confesso que acho que é meu preferido a partir de agora. – Falei.
- Você... Ouviu o que eu disse?
- Ouvi... E não acho que precise responder.
- Sabrina, você vai precisar de um pai para o seu filho.
Eu gargalhei, de boca aberta, divertidamente:
- Está falando sério? Eu não preciso de um pai para a minha filha... Ela já tem um, ele existe.
- Você sabe que se não for eu, seu pai jamais aceitará.
- Eu pouco me importo.
Ele tocou minha mão com a ponta dos dedos, certamente receoso de encostar no açúcar:
- Eu estou disposto a passar por cima de tudo e assumir a criança.
Levantei rapidamente, sem querer derrubando a cadeira para trás, chamando a atenção de todos. Ele abaixou o corpo levemente, tentando não ser o centro das atenções.
- Nunca mais repita isso na sua vida. A minha filha tem um pai e ele não é você. E quer saber? Não, eu não o conheci antes. Mas serei eternamente grata por ele ter cruzado meu caminho na noite anterior ao casamento. E não, eu não dormi com ele na despedida de solteiro. Porque eu era uma idiota e tinha consideração por você. Mas assim que saí da igreja, foi para os braços dele que eu fugi. Foram horas que valeram mais que os quatro anos ao seu lado. E sei exatamente como fizemos nosso filho: quando ele gozou dentro de mim – fiz cara de espanto e pus a mão na boca – E só pra constar: ele não faz sexo... Ele fode. Ele não se cansa disso... Eu perdi as contas de quantas vezes gozei, em diferentes posições.
- Quem é ele? – Colin levantou, pouco se importando com a cena que estávamos fazendo.
Peguei o último croissant que estava no prato e disse, antes de sair:
- Você nunca saberá.
Sai sem olhar para trás, saboreando o croissant de queijo, que também estava maravilhoso.
E o encontro com Colin saiu melhor do que o esperado, afinal, eu nem queria falar sobre o passado, só precisava que ele me pagasse algo para comer, pois estava morrendo de fome.
Cantarolei “Star me Up”, enquanto sorria alegremente. Agora iria para a praia, encontrar Charles e...
- Quanta demora! – Disse meu pai, do lado de fora da porta do hospital.
Eu não falei nada. Simplesmente a minha voz não saiu.
- Venha! – Ele me pegou pelo braço, sem muita gentileza, encaminhando-me para o carro, onde estavam minha mãe e Mariane esperando.
O ar condicionado estava ligado e cheguei a arrepiar quando entrei na temperatura gelada, que contrastava com o calor da rua.
- Para casa. – Meu pai falou ao motorista.
Seguimos para casa, em silêncio. J.R sequer olhou na minha direção. Mariane ficou compenetrada no celular e minha mãe vez ou outra me olhava, com o rosto baixo.
Assim que chegamos em casa e descemos, meu pai retirou um lenço de pano do bolso e disse autoritariamente:
- Limpe seu rosto.
Limpei o rosto e estava subindo as escadas quando ele falou, em tom de voz alto:
- Onde você vai?
- Eu... Vou tomar um banho e sair.
- Sair? Onde?
- Eu... Vou contar a “ele”. Preciso dizer que vai ser pai.
Mariane sentou no sofá da sala principal, me olhando confusa.
- Me diga o nome dele. – J.R foi enfático.
Dizer o nome de Charles era acabar com a vida de “el cantante”. Eu poderia morrer, mas jamais entregaria ele ao meu pai. Sabia que a possibilidade de J.R aceitar nosso relacionamento era nula, ainda mais agora com a gravidez. Ele iria encontrar Charles onde quer que fosse e acabaria com sua possível carreira, com a chance de ele ver o filho e destruiria até a possibilidade de ele ser um barman.
Porque eu conhecia Jordan Rockfeller e sabia que ele já havia destruído pessoas ricas, famosas e bem amparadas financeira e emocionalmente por motivos fúteis. Charles era simplesmente um nada para ele.
- Não. – Fui firme.
- Se não quer dizer, é porque ele não é como nós. Você me conhece e sabe que eu não aceitaria uma de minhas filhas com um ninguém. Sempre deixei isso bem claro para vocês, desde que nasceram. Jamais permitirei que um homem entre na minha família para tomar conta do que é nosso, brincar com os sentimentos de quem eu mais amo...
- Pai, Colin brincou com os meus sentimentos. Ele me traiu... – E desta vez eu nem olhei na direção de Mariane, porque não precisava.
- Sabrina, você é jovem. Tem certas situações que ainda não entende... Mas o tempo fará com que mude seus pensamentos com relação a muitas coisas.
- Pai, eu não sei como será o dia de amanhã ao lado do pai da minha filha. E sinceramente, eu não quero saber. Porque planejei uma vida inteira ao lado de Colin e ela não se concretizou. Eu só tenho 18 anos... Me deixei viver o restante da minha vida da forma que eu quero.
- E o que você quer?
- Quero encontrar o pai da minha filha e contar a verdade. Ele precisa saber... Ele merece saber. E isso não foi acaso ou leviandade. Eu me apaixonei.
- Não! Você está proibida de sair desta casa.
- Vai me prender agora, pai? Já não basta todos os castigos? Sabe que não pode me impedir para sempre de sair.
- Eu lhe dou uma escolha, Sabrina. Tira esta criança e fica nesta casa, vivendo a vida que sempre levou. Ou se quiser seguir adiante com esta gravidez, terá que deixar este lugar.
Encarei-o e senti as lágrimas me traírem:
- Isso não pode ser verdade... Porque... Você é meu pai. Não teria coragem de me obrigar a fazer esta escolha.
- Jordan, isso não... Por favor. Não vou aceitar que mande minha filha embora deste jeito.
- Pai, ela está grávida! – Mariane interviu.
- Vocês podem ir com ela se quiserem... Mas terão que abrir mão do seu nome, da herança e tudo que tem, assim como Sabrina.
- Mãe... – Pedi ajuda dela.
- Jordan, não...
- Falei com o médico. A gravidez é recente. O aborto oferece pouco risco para ela. Conforme o feto vai crescendo, se torna mais perigoso. Sem contar o fato de ela poder se apegar à criança.
- Eu já me apeguei... Ela tem um coração... Que bate forte, como uma melodia... Única. Eu ouvi. Ela cabe... Na palma da minha mão. Ela é uma Rockfeller, tem seu sangue.
- Ela? Como sabe que é uma menina? – Ele perguntou, confuso.
- Eu sei... Eu sinto.
- Você tem cinco minutos para fazer sua escolha, Sabrina. – Ele olhou no relógio.
Eu já havia escolhido, creio que na hora que decidi contar a verdade e não fingir que Colin era o pai.
- Deixe-me falar com “ele”... Eu o trago aqui e... Você pode conhecê-lo. Ele é uma boa pessoa... – Era minha última tentativa, em sinal de desespero.
- Não quero um neto bastardo, Sabrina. Todo mundo vai falar... Não basta a porra do casamento que você destruiu. Este homem vai usar você... E a criança para conseguir a única coisa que quer de nós: dinheiro.
- Pai, nem tudo é dinheiro...
- Quatro minutos. – Ele contava o tempo.
- Eu... Escolho minha filha. – Limpei as lágrimas.
- Achei que você pudesse ser mais inteligente.
- E eu que você pudesse ser mais humano. Como pude me enganar tanto com você? Foi bom para mim enquanto eu fazia o que você queria...
- Eu também me enganei com você... Muito.
Fui em direção à escadaria e ele perguntou:
- Onde vai?
- Buscar minhas coisas.
- Não... Não vai levar nada daqui.
- Como assim? – Mariane levantou.
- Sua escolha é deixar tudo em nome desta criança. Irá sem levar nada desta casa. Quando sair por esta porta, deixará de ser uma Rockfeller. A proíbo de usar o sobrenome da nossa família. Destruirei qualquer vestígio seu desta casa. Será como se você nunca tivesse existido. E então eu só terei uma filha: Mariane Rockfeller. Direi ao mundo todo que você morreu, Sabrina.
- Não, Jordan... Eu imploro. – Minha mãe se pôs na frente dele, os olhos marejados de lágrimas.
- Pai... Não... – Mariane veio até mim e me abraçou.
Respirei fundo e disse:
- Ok, eu ainda escolho ser Sabrina... Sabrina mãe.
Olhei no relógio. Eu tinha tempo para chegar até a casa de praia ainda. Charles havia dito até o pôr do sol.
- Não... Você está cego de raiva... – Minha mãe ainda tentou, inutilmente.
- Mãe, eu vou ficar bem. Não se preocupe.
- Quero o cordão de ouro que está no seu pescoço.
Toquei o colar com a concha que adornava meu pescoço:
- Isso é meu.
- A concha sim, o cordão não. Comprou com o meu dinheiro.
Eu ri, com escárnio. Abri o fecho e retirei a concha, jogando o cordão na direção dele, que não pegou. Caiu no chão e ele olhou.
- Quer que eu retire a roupa também? Afinal, comprei com o seu dinheiro.
- Não... Mas quero o celular.
- O celular? Mas... Eu vou ficar incomunicável.
- Sabe onde é sua casa. Se decidir tirar esta criança, poderá voltar e será bem recebida. Caso contrário, esqueça que um dia morou neste lugar ou conheceu esta família.
Dei um abraço na minha mãe, que chorava compulsivamente. Limpei as lágrimas dela e garanti:
- Eu vou ficar bem.
Apertei a concha que estava na minha mão, tentando ser forte. Mariane parou na minha frente e pude perceber a confusão e tristeza em seu semblante.
- Me desculpe...
- Você não tem culpa. – Garanti.
Ela me abraçou e disse no meu ouvido:
- Eu posso ajudar você.
- Eu posso viver sozinha.
- Por favor... Não saia das nossas vidas deste jeito. Tire o bebê... Faça o que ele pede. – Implorou, a voz baixinha.
Pus o cabelo dela para o lado e disse no seu ouvido, firmemente:
- Eu sou a “garotinha”. Estou indo atrás de “el cantante”. Não estou sozinha...
Assim que me afastei, percebi um sorriso no rosto dela:
- Fica bem, Sabrina. Eu amo você.