Capítulo 24
2263palavras
2022-12-13 11:46
Me dirigi à sala íntima, que ficava no outro lado da residência. Colin me acompanhou em silêncio. Assim que entramos, Min-Ji veio nos oferecer algo para beber.
- Deseja algo, Colin? – Perguntei.
- Não... Obrigado.

- Eu aceito algo, Min. Quero tequila... Com sal e limão.
Min estava saindo e voltou, me encarando:
- Como... Faz isso?
- Eu aposto que alguém nesta casa sabe fazer. – Sorri.
Sim, eu precisava de fogo descendo pela minha garganta para conseguir ter aquela conversa com meu ex.
Sentei no sofá confortavelmente, próxima a ele, que se sentou também, de frente para mim.

- Eu... Lhe trouxe algo. – Ele disse.
- Para mim? – Fiquei surpresa.
- Sim... – Ele sorriu, me entregando uma caixa embalada com veludo preto e laço dourado.
Eu sabia que se tratava de uma joia. Senti minhas mãos trêmulas ao abrir. Deparei-me com um colar de diamante e ouro, com brincos iguais ao pingente que brilhava tanto que chegava a ofuscar minha visão.

- É lindo, Colin. Eu também tenho algo para você.
- Tem algo... Para mim? – Ele ficou surpreso.
- Sim... – Sorri e apertei a campainha.
Min chegou, trazendo a tequila, exatamente como eu havia pedido.
- Min... Há uma caixa sobre a minha cama. Você poderia trazer para mim, por favor?
- Claro... Já estou trazendo. – Ela disse, saindo do recinto.
Ficamos nos olhando. Fechei a caixa e coloquei ao meu lado, no sofá:
- Bem... Acho que você quer falar, estou certa?
- Sim... Está.
- Então fale, Colin. Sou toda ouvidos.
- Sabrina... Eu nem sei por onde começar.
- Que tal pelo começo... Quando você decidiu dormir com a minha irmã?
- Sabrina, eu juro que não sei o que aconteceu. Se eu tivesse um dia sequer sentido desejo por Mariane, talvez conseguisse entender. Mas nunca... Jamais a vi com outros olhos.
- Sentiu desejo só no dia anterior ao casamento?
- Não, eu...
- Dormiu com ela a força, Colin? Minha irmã obrigou-a a transar com ela? Você brochou ou comeu minha irmã?
Ele me encarou, comprimindo os lábios nervosamente antes de dizer:
- “Transou”? “Comeu”?
- Transar... Nome para relação sexual. Comeu... Vulgo “fodeu”, enfiou seu pau nela, fizeram sexo...
Passei o dedo no sal, pus na língua, bebi um grande gole da tequila e espremi o limão na boca, fazendo careta.
- Você... Está bem?
- Por que não estaria, Colin?
- Essa bebida... É... Estranha. E o seu Vueve Chiqcuot?
- Troquei meu gosto... Para várias coisas nos últimos dias. Não só para bebidas, mas também para homens.
- Sabrina, eu sinto muito. Eu peço desculpas... Errei... Fui um idiota, um otário, um imbecil. Mas você já se vingou. Me deixou na igreja, fazendo papel de bobo, expondo minha traição para todo mundo, inclusive nossas famílias. Ainda assim quero passar por cima de tudo que houve. Porque o que sentimos um pelo outro é mais forte que isso, meu amor. Eu não vivo sem você.
- Pensou em mim em algum momento enquanto dormia com minha irmã, Colin?
- O quê?
- Estamos tendo uma conversa sincera, Colin. Eu gostaria de saber, se enquanto você fodia a minha irmã, passava pela sua cabeça qualquer coisa sobre mim.
- Eu... Não sei... Não tenho ideia do que eu pensei, Sabrina. Eu não lembro... E pare de usar este vocabulário ofensivo, obsceno e imoral. Não cai bem estas palavras de baixo calão saindo da sua boca.
- Ofensivo, obsceno e imoral... – levantei, com o copo na mão, seguindo o ritual para beber a tequila – Sabe que sempre achei traição ofensivo, obsceno e imoral? E palavras como “foder” ou “comer” lhe incomodam?
- Sim, me incomodam. Porque sei que você não é assim, Sabrina. Está tentando me impressionar, é isso?
Ouvimos uma batida na porta e Min entrou, colocando a caixa sobre o sofá. Peguei-a e levei na direção dele, colocando no seu colo.
Ele abriu, ficando um tempo com os olhos dentro dela:
- Isso... É tudo que lhe dei... Desde que começamos a namorar. – Observou.
- Não preciso destas joias... – Falei, pegando a caixa que ele havia recém me dado e pondo dentro da grande, junto dos demais itens que eu devolvia.
- Mas... Eu dei de coração. Algumas mandei fazer especialmente para você.
- Mandou fazer especialmente para mim... Do tamanho do amor que sentia, não é mesmo?
- Pode me acusar de infidelidade, de traição, de qualquer coisa. Mas jamais pode me acusar de não a amar. Porque eu a amo, Sabrina... Mais do que qualquer coisa na vida.
Fui até a caixa e peguei o colar de pedras que a senhora Monaghan havia me dado para usar no casamento.
- De tudo que tem na caixa, esta é a única joia que tem importância. Sua mãe me deu para usar no dia do casamento. Quero que devolva e lhe diga que não quis magoá-la. Sempre gostei dos seus pais.
- Eu também gosto dos seus pais... E de você... Muito.
- E da minha irmã? – Eu ri, bebendo o resto da tequila pura, visto que o sal e o limão já tinham acabado.
Ele não respondeu. Me senti incrivelmente mais leve depois da bebida.
- Eu amo você, Sabrina.
Eu não disse nada, fiquei encarando-o, os olhos castanhos dele cansados e confusos.
Quando percebi, Colin estava ajoelhado aos meus pés:
- Se é isso que precisa, eis meu pedido: perdão... Eu juro que não quis magoá-la. Foi um deslize... Nunca a traí antes.
- Eu jamais vou acreditar em você novamente, Colin.
Ele ficou ali, sem dizer nada. Peguei suas mãos e ajudei-o a levantar:
- Colin, acabou. Não precisa mais me ligar. Conversamos e acho que resolvemos nossa situação.
- Como assim resolvemos nossa situação?
- Acabou... Não há mais volta.
- Não vai me perdoar, Sabrina?
- Não é sobre perdão, Colin. É sobre não haver mais casamento... Nunca mais.
- Isso não pode, entende? Eu me arrependi. Eu pedi desculpas... Me diga qualquer coisa que queira que eu faça e juro que farei.
- Quero que pare de me ligar. E me deixe em paz.
- Sabrina...
- Eu estou apaixonada por outra pessoa, Colin. – Me ouvi falando.
- Apaixonada por outra pessoa? Como assim? Isso não é possível.
- Sim, é possível, Colin. Acabou.
Dizendo isso eu deixei a sala, fechando a porta e subindo para o meu quarto.
Sentia-me um pouco tonta e por isso deitei na cama, imediatamente, enquanto via o teto rodar. Não sei porque, mas tinha um sorriso bobo nos meus lábios.
- Ele é um idiota!
Fiquei ali um tempo, esperando que tudo girasse mais devagar para eu conseguir levantar. Ouvi uma batida na porta e vi duas Min-Ji na minha frente.
- Min... Você duplicou?
- Não... Você bebeu algo muito forte. Eu trouxe um chá. – Ela ajudou-me a sentar na cama, recostando-me sobre a cabeceira.
- Não é tontura da bebida... É estranho... Diferente.
Bebi o chá quente, sem açúcar.
- O senhor Monaghan vai ficar para o jantar. – Ela disse.
- Então retire meu lugar à mesa, por favor.
- Já retirei. Imaginei que diria isso. Expliquei que não se sentia bem.
- E... Minha irmã?
- Alegou indisposição e enxaqueca. Sua mãe recebeu uma ligação de uma amiga e saiu. Então será seu pai e seu ex noivo no jantar.
- Posso apostar que minha mãe mandou alguém ligar para ela.
- Eu também. – Min sorriu.
- Pode me dar um analgésico? – pedi.
- Claro. Vou buscar.
Ela foi até o closet e voltou com dois comprimidos. Engoli com o restante do chá.
As próximas quatro semanas que passaram eu fui para a faculdade todos os dias. Porém não assisti as aulas, pois nem matriculada estava mais.
Claro que eu contaria ao meu pai. Isso se não tivesse dado um grande problema com a J.R Recording, onde um grande astro do pop processava meu pai e exigia o rompimento do contrato de gerenciamento de carreira. A questão envolveu também os Monaghan. Isso me deixou um pouco tranquila e me sentindo menos vigiada.
Ao final da quarta semana, J.R precisaria viajar para encontrar o tal artista, a fim de chegarem a uma trégua e os nomes de ambos sairem da imprensa.
Aproveitei a viagem dele e na noite de sexta-feira pedi para o motorista fazer o trajeto do Cálice Efervescente.
Me senti uma prisioneira nas últimas semanas e assim que achei que estava segura, decidi procurar o amigo de Charles e pegar qualquer informação nova. Sabia que certamente ele havia passado pelo bar. O amigo que emprestou a casa para nós deveria ter o número novo dele.
Quando o motorista estacionou na frente do bar, não havia nenhum carro próximo. E as letras em neon estavam apagadas. Desci e ele veio atrás de mim:
- Senhorita, sinceramente, não quero confusão com o seu pai. Eu preciso deste emprego.
- Se precisa deste emprego, venha comigo e seja cego, surdo e mudo. Porque só eu posso mantê-lo nesta função e sabe muito bem disto. – Falei, sem me preocupar muito.
A porta do Cálice Efervescente estava com várias fitas adesivas amarelas coladas.
- Acho que alguém morreu aqui. – Falei, assustada.
- O local está restrito. Não pode ser acessado.
Tentei encontrar alguma placa ou aviso escrito, mas não havia nada.
Me dirigi à lanchonete onde a atendente não costumava ser muito simpática. A parte boa é que tinha mais pessoas frequentando o lugar do que da última vez que estive ali. Talvez isso a deixasse um pouco mais sorridente e feliz.
- Oi... – Falei, vendo o segurança quase grudado do meu lado.
- O que quer? – Ela levantou os olhos do celular, me encarando.
- Quero... – olhei para o cardápio que estava exposto na parede – Quero um milk shake de chocolate com calda dupla...
Ela foi preparar meu pedido, colocando o celular no bolso, sem lavar as mãos.
- Sabe me dizer por que o Cálice Efervescente está fechado... Se hoje é sexta-feira?
- Você não soube?
- Não...
- Ele foi fechado pelos Bombeiros. Não tinha licença de funcionamento.
- Como assim?
- Funcionava ilegalmente. E parece que tinha risco, por não terem plano de prevenção contra incêndios.
- Quando vão reabrir? O que fizeram com os funcionários?
- Acho que não vai reabrir tão cedo. O dono daqui da lanchonete está pensando em comprar o prédio, aliás. Ele ouviu dizer que vai ser vendido. O proprietário levou uma multa impagável.
- E... Os funcionários?
- Coitados... Perderam os empregos.
- E... Sabe para onde foram?
Ela me entregou o milk shake, com a mão sem luvas, a mesma que preparou a bebida e tocou no dinheiro, dando-me o troco, que me recusei a pegar.
- Como eu vou saber para onde foram, dona? Acha que eu cuidava dos funcionários dali? Só via daqui a pouca vergonha que acontecia do lado de fora durante a madrugada.
- Viu... O cantor com alguém?
- Que cantor? Do que está falando?
- Do vocalista da Dreams.
- Não conheço não...
Respirei fundo e tentei me convencer de que ela não sabia nada. Saí de dentro do local e tomei dois goles da bebida e depois entreguei ao motorista.
- Quer... Que eu jogue fora, senhorita?
- Jogue fora, beba... Faça o que quiser com isso.
Fui para o cordão da calçada e sentei, começando a chorar compulsivamente.
- Senhorita Rockfeller... O que houve? Posso ajudá-la de alguma forma?
- Não... Infelizmente não pode. Está tudo perdido... Tudo. Eu nunca mais vou vê-lo de novo, entende? Porque o mundo todo decidiu que tudo, absolutamente tudo daria errado para nós dois.
Doía tanto dentro de mim que não lembro de ter sentido aquilo antes. Tentei tantas vezes ser forte e não desistir, mas agora parece que era o fim da linha.
O motorista sentou ao meu lado e me ofereceu lenços de papel, que aceitei. Fiquei ali, chorando ao lado dele, que ficou em silêncio, só me protegendo da forma que podia, enquanto eu me debulhava em lágrimas.
Depois de chorar tudo que pude, levantei e pedi para ele me levar de volta para casa.
Assim que cheguei, com os olhos inchados e doloridos, louca pela minha cama, vi meu pai sentado na sala principal, bebendo uísque.
- Pai... Boa noite. – Falei, surpresa ao vê-lo àquela hora em casa, sendo que deveria estar viajando.
- Eu estava esperando por você, Sabrina.
- O que eu fiz agora?
Senti meu coração acelerar e uma leve moleza nas pernas.
- Por que você cancelou a matrícula na faculdade?
Respirei fundo e senti um forte enjoo. Me veio à mente o milk shake a as unhas malfeitas da mulher, roídas nas pontas... O dinheiro passando de mão em mão... O chocolate...
- Pai... Eu achei que você estivesse viajando.
- E eu que você estava na faculdade de Direito, a qual eu pago.
- Eu não quero mais fazer Direito.
- E vai fazer o que, afinal?
- Eu... Não sei... Não tenho certeza ainda. Talvez Matemática. Eu só sei que Direito eu não quero. – Enfim, confessei.
- Quem é o homem que está por trás disso tudo? Vai me falar ou me fazer dar-lhe outro castigo, minha filha?
- Estou farta... Cansada... Não aguento mais.
- Quem é ele? – J.R pegou meus pulsos com força e senti tudo girar, meu corpo desabando vagarosamente, sem que eu conseguisse mantê-lo de pé.