Capítulo 20
2057palavras
2022-12-11 07:25
Deitei na cama e peguei o papel praticamente destruído de dentro do bolso da jaqueta:
- Como você pôde ser tão burro, “el cantante”?
Olhei para o lustre pendendo maravilhosamente sobre mim. Retirei o colar dado pela senhora Monaghan cuidadosamente e pus ao lado da cama.

E se Charles tivesse me dado a jaqueta de propósito para não me rever? Talvez não quisesse o meu número e aquilo fosse apenas uma desculpa para isso.
Eu ri dos meus próprios pensamentos. Foi intenso demais... Não foi só sexo... Foi paixão, foi amor. E era para toda vida.
Senti as lágrimas escorrendo novamente, com o simples pensamento de não o encontrar novamente:
- Não fica assim, sua idiota. Sabe muito bem onde achá-lo.
Me dirigi ao banheiro e assim que me deparei com a imagem no espelho fiquei paralisada. Realmente meu pai deve ter ficado preocupado. Meus cabelos estavam deploráveis, enrolados, embaraçados e pareciam sem solução.
As marcas roxas iam do pescoço até o colo. A roupa era ridícula, tirando a parte da jaqueta que eu amava. Na coxa também tinha um chupão e a queimadura estava bem feia, embora eu achasse que estava melhor.

A jaqueta de couro preta sobre a roupa de má qualidade era uma afronta à moda. Meu rosto estava avermelhado da bofetada. Levei à mão a ele e fiquei olhando o que J.R era capaz de fazer com a própria filha. Jamais pensei um dia enfrentar meu pai. Mas acho que por Charles eu era capaz de qualquer coisa.
Retirei minha roupa e fui para o box, ajustando a temperatura da água. Olhava os jatos caindo, sem saber se estava preparada para tirar os vestígios dele do meu corpo.
Passei o dedo pelo meu colo macio, descendo pelo meio dos seios pequenos e rígidos. Conseguia sentir a mão dele me tocando e a pele começou imediatamente a queimar.
Mesmo sozinha, só de pensar em “el cantante”, minha intimidade encharcou e abri as pernas, tocando-me e sentindo ardência da quantidade de vezes que fizemos amor.

De início eu contei... Depois não consegui mais. Foram muitas “fodas” e não pude distinguir qual foi a melhor. Gozei em menos de dois dias mais do que em quatro anos. Realizei todos os meus desejos, até os mais obscuros. Fui tocada de todas as formas possíveis. Provei tudo que o corpo de um homem podia dar.
Quando vi meu shampoo preferido, esqueci tudo e entrei na água. Joguei-o sobre a cabeça sem me preocupar com a quantia, vendo o produto espalhar-se pelo meu corpo, o cheiro bom emanando por todo ambiente.
A espuma branca foi tomando conta do piso, do meu corpo e dos cabelos. Sorri e semicerrei os olhos, vendo um par de olhos verdes estonteantes e um sorriso perfeito na minha direção.
- “El cantante” acho que não consigo sequer respirar sem você... – Sorri.
Depois de quase trinta minutos debaixo do chuveiro, cobri-me com a toalha branca e deitei na cama, sem pressa de sair.
Ouvi batidas na porta e abri. Era Min-Ji. A abracei imediatamente. Ela entrou:
- Como está?
- Bem... Como nunca estive na minha vida inteira.
- Eu vi o que houve... Sinto muito.
- Não sinta. Estou bem.
- Quem é ele? – Ela olhou meu corpo sobre a cama, a toalha cobrindo parte dele.
- Estou apaixonada.
Ela arqueou a sobrancelha:
- Não pode se apaixonar por alguém numa noite.
- Sim, é possível. E eu sou a prova disto.
- É paixão. Vai passar.
- Não é só paixão. É amor.
- Você não o conhece, Sabrina. Amor é um sentimento que leva tempo para se concretizar. É conhecer o outro... Se sentir segura, gostar e aceitá-lo, mesmo com todos os defeitos que ele possa ter.
- Sou a primeira a amar instantaneamente. – Revidei.
- Também amava Colin.
- Nunca foi amor.
- Pode dizer isso deste novo homem daqui a algum tempo.
- Jamais.
- Encontrou-o... Depois que saiu da igreja? Ou já o conhecia?
- Conheci na noite da despedida de solteiro.
- Meu Deus!
- Não trai, Colin. Eu juro.
- Me diga que ele é um bom homem.
- Você... Vai contar ao meu pai ou minha mãe?
- Acha mesmo que eu faria isso, menina? – Ela me encarou.
- Não, não acho. Porque no fundo sei que eu sou a pessoa que você mais ama nesta casa. – Sorri.
- Acertou.
- E eu sou a que mais a ama. E sabe a parte boa disto tudo? Não vou trocar de casa e nem me separar de você.
Ela riu, levantando e buscando minha escova de cabelos:
- Sua bobinha linda.
Sentei sobre o colchão e ela se pôs atrás de mim, tentando desembaraçar os fios escuros e compridos:
- Está pior que quando você se sujava com doces...
- Eu sei... Mar, falta de shampoo... Lavado com sabonete em barra, acredita?
- Onde se meteu, menina? Praia? Sabonete em barra?
- Um cantor... De um bar de beira de estrada.
- Conhecido?
- Quem dera... – sorri – Mas posso apostar minha herança que ele vai ser famoso um dia, porque canta como ninguém. E compõe também, embora eu não tenha visto nada que ele tenha escrito.
- Ele é o dono da jaqueta? – Ela olhou a jaqueta de couro jogada no chão.
- Sim... E do meu coração.
- Não me diga que ele... É pobre.
- O que importa, Min?
- Tudo... E você sabe disto. Seu pai jamais vai aceitar isso. Aliás, se livrar do senhor Monaghan vai ser um problema.
- Colin morreu... Ele não existe mais.
- Tente fazer seu pai se convencer disto. Porque na cabeça dele, você vai voltar atrás e virar uma Rockfeller Monaghan.
- Acho que ele pode convencer Mariane a ser a senhora Monaghan.
- Não acho que sua irmã quereria ser a senhora Monaghan.
- Ai... – Gritei quando ela puxou meus fios com a escova.
- Isso aqui está horrível.
- Ligue para o meu cabelereiro e o mande vir imediatamente.
- Ok. – Ela foi diretamente para o telefone.
Peguei meu celular, que eu não via desde o dia antes do casamento. Estava quase sem bateria. E tinha 102 ligações de Colin. Sim... Ele tentou falar comigo 102 vezes. E acabou com a bateria do meu celular. Imprestável filho da puta e destruidor de baterias.
Cinco ligações da mãe dele e uma do pai. Algumas do meu pai, minha mãe, Mariane. Nenhuma de Tay, Lina, Dill ou Tefy. Acho que no fundo eu sempre soube que elas não eram minhas amigas e estavam ao meu lado simplesmente pelos benefícios que isso trazia.
As conhecia desde o Ensino Médio. Não as procurei e sim o contrário. Sempre que o nome Rockfeller era pronunciado, era como se todas as portas e possibilidades se abrissem. E elas tentaram se aproveitar disso. E usufruíram por um bom tempo de passeios caros, ingressos cortesia, visitas a camarins de artistas internacionalmente conhecidos, bares com open bar às custas de J.R, festas privadas de alto nível, primeira fila nos desfiles dos maiores estilistas... E serem conhecidas como amigas de Sabrina Rockfeller, a caçula de J.R e Calissa.
Enquanto meu cabelereiro não chegava, contei algumas coisas sobre o “el cantante” para Min. Ela deixou o tempo todo bem claro a preocupação que sentia com tudo que estava acontecendo.
- Oh, my god! – disse o cabelereiro quando viu meu estado – Parece que tomou banho no mar, não usou shampoo e sequer penteou estas madeixas, linda. Vou ter que cortar um pouco.
- Sem problemas. – dei de ombros – Só quero poder passar os dedos entre os fios.
Ele abriu a maleta e me pôs sentada de frente para o espelho da penteadeira camarim:
- Eu sinto muito pelo que houve, querida.
- Não sinta... Eu não sinto. – Falei, olhando minha própria imagem refletida no espelho.
- Contaram que você... Tentou se matar depois do que houve!
Eu gargalhei:
- Onde ouviu isso?
- Por aí... Fofoca da alta sociedade.
- Tenho cara de quem tentou se matar? – Encontrei os olhos dele pelo espelho.
- Tem cara de quem tentou suicidar os fios castanhos... Estão quase sem vida. – Ele sorriu discretamente.
Quando levantou os fios, ficou com a mão imóvel, os olhos no meu pescoço:
- Ai, Jesus, você dormiu com um vampiro?
Eu comecei a rir:
- Na verdade foi só um gostoso que encontrei por aí...
- Me dê o endereço, por favor. Quero afogar as mágoas como você.
- Não afoguei as mágoas – olhei-o seriamente – “Eu” não quis casar com Colin.
- Eu ouvi dizer que ele está arrasado. Acha que ele vai ficar com sua irmã?
- Pouco me importa – dei de ombros, sabendo que ele dividiria tudo que falei com a próxima cliente – Minha irmã acha o mesmo que eu de Colin.
- E... O que vocês acham de Colin? – Ele pegou a tesoura, mais preocupado com a resposta do que com salvar meus cabelos.
- Que ele tem um pau pequeno pra caralho.
Passei o dia no quarto e não desci para nada. Minha mãe foi para a gravadora e por sorte não veio fazer perguntas também, nem tentar amenizar os ânimos entre eu e meu pai.
À noite, recusei descer para o jantar. Não queria encontrar todos novamente. E ainda doía a atitude de meu pai, especialmente a bofetada.
Min me trouxe um prato com o que sabia que eu gostava do jantar e de sobremesa brigadeiro de colher.
Comi tudo e quando estava lambendo a colher com a sobremesa, disse:
- Quando tiver um filho, jamais vou proibi-lo de comer doces e chocolates.
Ela riu:
- Vai sim, eu garanto.
- Min, você me ama?
Ela me olhou firmemente:
- Por que a pergunta?
- Porque quando eu lembro da minha infância, não há um momento sequer que você não está lá.
- Sim, eu amo você, querida. – Ela alisou meus cabelos, organizando a bandeja com o prato e talheres vazios.
- Você me ama por que seu coração sente isso ou por que é paga para isso?
- Eu... Não sou paga para amá-la, Sabrina.
- Se meu pai demitisse você e precisasse ir embora, você ainda me amaria, Min?
- Claro que sim. Você está bem?
- Sim, estou. De onde em Noriah Sul você é? Eu soube que lá é dividido em zonas por classes sociais.
- Bem, não é mais assim. Foi, na época da rainha Anne Marie Chevalier. Depois que a monarquia caiu, muita coisa mudou. Dentre elas, as zonas. Mas é uma mudança gradativa... E demorada.
- O que seus filhos fazem lá?
- Do Yoon é professor numa escola de Ensino Médio. Yuna é Pediatra.
- Você sente falta deles?
- Todos os dias. Mas com a tecnologia de hoje, nos vemos sempre.
- Como foi o dia... Fora do meu quarto?
- Tranquilo... Até demais.
- Eu já vi uma foto dos seus filhos... No seu quarto.
- Conversas aleatórias... Uma colher de brigadeiro na boca. O que você quer? – Ela perguntou, me conhecendo melhor do que ninguém.
- Quero que me avise quando meu pai estiver dormindo.
- Eu não posso fazer isso. O que pensa em aprontar?
- Eu preciso ir atrás do “el cantante”?
- E quer que eu a ajude?
- Claro que sim. Você é a única amiga que eu tenho nesta casa.
Ela suspirou e pegou a colher da minha mão:
- O que você não pede chorando que eu não faço sorrindo?
- Neste caso, eu estou sorrindo e você chorando.
- Se eu for demitida, você se culpará eternamente.
- Não se preocupe. Eu e “el cantante” vamos contratar você para trabalhar na nossa casa de praia.
- Você não tem jeito, menina. – Ela foi em direção à porta.
Não demorou cinco minutos e ela voltou. Eu já havia colocado uma roupa rapidamente.
- Incrivelmente a casa está no mais absoluto silêncio. O senhor J.R e sua mãe estão recolhidos em sua suíte.
Comecei a pular e dei um beijo nela, eufórica:
- O Cálice Efervescente será pequeno para mim e Charles esta noite. – Peguei a chave do meu carro e saí pela porta, sem olhar para trás.