Capítulo 19
1993palavras
2022-12-11 07:25
Jordan Rockfeller levantou-se, com o olhar frio e incriminador:
- “Porra”? De onde você aprendeu este palavreado? Com quem estava, Sabrina?
Dei um passo para trás, colocando o papel úmido de volta no bolso.

- Não reconheço você com esta roupa... – ele aproximou-se e tocou meus cabelos, colocando para trás – Vou matar quem fez isso com você.
Não precisei perguntar do que se tratava, pois sabia que eram as marcas no meu pescoço.
- Foi com meu consentimento. – Tentei acalmá-lo.
- O que está havendo com você, menina?
Vi minha mãe descendo as escadas rapidamente, quase correndo. Os cabelos estavam soltos e dava para notar que vestiu um robe apressadamente.
- Sabrina...

- Mãe!
Tentei ir em direção a ela, mas meu pai me conteve, pegando-me pelo braço:
- Sua perna, porra! – Esbravejou o homem que odiava que as filhas falassem palavrões.
- Não está doendo. – Garanti.

Enfim minha mãe se aproximou e puxei meu braço com força das mãos dele, abraçando-a e recebendo o aconchego que precisava naquele momento.
- Onde esteve, meu amor? Eu pensei que pudesse... Ter acontecido algo grave.
- Eu estou bem.
- Cheguei a pensar que... Pudesse ter tirado a própria vida depois do ocorrido.
- Tirar minha própria vida? Por Colin? – Quase ri.
- Pelo visto ela estava numa “festinha” depravada, com um idiota que ousou tocá-la. Ele se arrependerá do dia que nasceu, eu juro. O que são estas roupas? E esse linguajar? Eu não criei você para isso.
- Realmente não... Foi Min-ji que me criou.
Ele deu uma bofetada na minha cara. Toquei meu rosto imediatamente, sabendo que a dor física não foi pior do que a emocional. Jamais ele havia tocado em mim durante 18 anos.
- Jordan... Você enlouqueceu? – Minha mãe ficou pasma, dando um passo para trás, aturdida.
Imediatamente ele também afastou-se um pouco, passando os dedos pelos cabelos, nervosamente:
- Olhe como você me fez agir! Sua garota mimada e rebelde.
Senti as lágrimas escorrerem pelo meu rosto. Nunca imaginei que seria fácil voltar para casa. Mas também não me passou pela cabeça que a fúria do meu pai poderia ser tão grande a ponto de me bater.
Minha mãe abraçou-me com força e deitei a cabeça no ombro dela, não tentando evitar o choro compulsivo.
- Vá para o seu quarto... Tome um banho e vista-se adequadamente. Jogue estes trapos que chama de roupa no lixo... Vou chamar o Delegado e vamos fazer um exame de corpo de delito. Vou prender seu estuprador.
- Eu não fui estuprada – falei entredentes – Foi tudo com meu consentimento. E quer saber? Ele ficou muito pior do que eu.
Ele levantou a mão novamente na minha direção e minha mãe gritou:
- Não se atreva, Jordan!
Ele meneou a cabeça, repetidas vezes. Foi até a estante de vidro e retirou de lá uma garrafa de uísque, despejando uma dose num copo. Sim, oito horas da manhã de uma segunda-feira e ele iria beber uísque. Ou seja, eu estava ferrada.
- Precisamos conversar, Sabrina. – Ele disse depois de sorver o primeiro gole, olhando firmemente nos meus olhos.
Eu podia sentir toda a ira e nervosismo nos olhos do meu pai. Um semblante preocupado e carregado que jamais havia visto antes.
- Você não tem o direito de me bater. – Quase gritei.
- Eu tenho direito de fazer qualquer coisa... Estou na “minha casa”.
- Isso quer dizer que não estou na minha?
- Sabrina, por Deus, pare de enfrentar seu pai desta forma. Vocês dois sempre se respeitaram... O que está havendo na droga desta casa?
- Isso tudo porque eu não quis casar com o homem que me traiu na véspera do casamento? – Perguntei, ainda com a mão no rosto, queimando da bofetada.
- Eu achei que você pudesse estar morta, garota. No mínimo deveria ter ligado e dito que estava viva. – Ele gritou.
- Pai, tem noção de tudo que aconteceu comigo? Eu dediquei quatro anos da minha vida a um homem... Que dormiu com a minha irmã... Na noite antes do casamento. Quantas vezes você acha que isso pode ter acontecido? Eu sempre confiei em Mariane... E em Colin.
- Eu garanto que nunca aconteceu antes. – Mariane falou ao pé da escadaria, também recém levantada da cama.
Ver minha irmã depois do que houve foi doloroso. Eu não sabia o que pensar, o que dizer, sequer o que sentir. Imaginei que teria ódio dela... Mas não. Simplesmente não senti nada, absolutamente nada.
Ela foi descendo degrau por degrau, sem pressa.
- Seu pai tem razão. Precisamos todos conversar... Nós quatro. – Minha mãe falou.
Respirei fundo, sabendo que sim, era preciso ter aquela conversa. Mas tudo que eu queria fazer naquele momento era correr para rua, na chuva e ir para estrada, atrás de uma moto, rumo a um lugar que não tinha a mínima noção de onde ficava.
Pus a mão no bolso e apertei o cupom de papel como se fosse a coisa mais importante da minha vida. Era como se tudo estivesse acabado, destruído, amassado para sempre. Só de pensar na possibilidade de não rever Charles era como se meu mundo desabasse.
- Você tem dezoito anos... Faz pouco mais de um mês que completou. Ainda é uma menina! Eu dei tudo para você... Estudou nas melhores escolas, vestiu as melhores roupas, frequentou os lugares mais seguros e caros do país. Conheceu e confraternizou com os artistas que as pessoas pagam para ver. Dormiu nas camas mais confortáveis e comeu do que de melhor o dinheiro pode comprar. Nunca lhe faltou nada. Você é minha responsabilidade, Sabrina. E eu não vou deixar um homem qualquer aparecer do nada e fazer isso com você.
- Pai... Isso foi consensual – eu não tinha certeza do que responder, mas precisava fazer com que ele não chegasse nem perto de conhecer Charles naquele momento – Conheci um homem... E... Bebi...
- Ele a dopou? A roubou? Abusou de você?
- Não... De forma alguma. – Garanti.
- Onde está o vestido de noiva? – Minha mãe perguntou.
- Joguei fora.
- Acha que se alguém quisesse me roubar, eu estaria com este colar no pescoço? – Mostrei a joia dada pela senhora Monaghan, especialmente para o casamento.
- Quer dizer que dormiu com o primeiro desconhecido que encontrou na rua? – Meu pai perguntou, bebendo de uma vez só todo o uísque do copo.
- Sim... – Falei com a voz baixa, tocando meu pescoço, amedrontada.
- O que Colin vai pensar disso? – Ele balançou a cabeça e sentou no sofá, olhando para o nada.
- Foda-se o que Colin vai pensar. – Quase gritei.
Ele riu sarcasticamente:
- Não bastou o tapa... Vou ter que pôr pimenta na sua boca... É isso?
- Jordan... Está parecendo uma criança. – Minha mãe criticou.
- Ela está fora de controle, Calissa... Fora de controle.
- Pai, eu não vou voltar para Colin. Este casamento não vai mais acontecer. – Garanti.
O olhar dele foi cruel.
- Sabrina, eu juro por tudo que é mais sagrado que eu não tive nada com Colin... Nunca. Foi só aquela noite. – Mariane garantiu.
- O que me diz disso, papai? – Perguntei.
- Eu digo que ele não foi tão ruim como você pensa. Volto a dizer que qualquer pessoa pode cometer um deslize vez ou outra.
Eu ri ironicamente:
- Eis meu deslize. – Retirei os cabelos do pescoço, mostrando os chupões.
Ele levantou furioso e minha mãe se pôs entre nós dois:
- Chega! – Ela gritou.
- Saia da minha frente, Sabrina. Agora! – Ele ordenou.
Subi as escadas rapidamente, sem olhar para trás. Quando fui fechar a porta do meu quarto, Mariane pôs o pé, me impedindo:
- Me desculpe.
- Não.
- Irmã, foi um ato impensado. Eu bebi demais...
- Não é desculpa.
- Por Deus, Sabrina. Eu não fiz para magoá-la.
- Fez por que então? Você ama Colin, é isso?
- Não... Eu juro que não.
- Isso torna tudo pior. Se você dissesse que foi por amor, Mariane, eu até compreenderia. Mas não... Diz que não sente nada por Colin. Por que fez isso, então?
Ela empurrou a porta e entrou, fechando-a:
- Encontrar um motivo ou justificativa seria uma mentira... Porque não há. Jamais quis magoá-la. Por isso lhe contei a verdade.
- Com o intuito de mostrar o quanto ele era um filho da puta?
- Meu Deus, de onde você tirou este vocabulário? Palavrões sempre foram proibidos nesta casa.
- E dormir com o noivo alheio não era? – Eu ri, furiosa.
- Sabrina...
- Você é uma hipócrita, Mariane.
- Sabrina, você mesma se interessou pelo cantor brega no bar de beira de estrada. E não dormiu com ele porque não quis... E se tivesse dormido, Colin não teria sabido.
- Eu não dormi com ele naquela noite... Por fidelidade a Colin.
- Eu estou tentando dizer que as pessoas têm desejos incontidos às vezes... Foi só sexo, meu Deus.
Encarei os olhos castanho de minha irmã, não sabendo o que eu sentia ainda. Tentava entender os motivos dela, mas não conseguia.
- Foi sexo com o “meu noivo”, Mariane. Você poderia ter dormido com qualquer homem que estava na Babilônia naquela noite. Mas escolheu Colin, o homem com o qual eu casaria no dia seguinte. – Senti as lágrimas escorrerem novamente.
Ela se aproximou e limpou minhas lágrimas:
- Me perdoe... Eu amo você, Sabrina. E se pudesse voltar no tempo, juro que não teria feito o que fiz.
- Mas não podemos voltar no tempo. O que está feito não tem volta e você sabe disso.
- Eu não queria ter sido a responsável por ter acabado com o seu casamento.
- Por que me contou a verdade antes de entrar na igreja?
- Porque achei que era o certo.
- Eu não vou casar com Colin.
- Meu Deus! – ela suspirou e deu alguns passos nervosos pelo quarto – Você precisa repensar isso. Faz pouco tempo que tudo aconteceu. Precisa de um tempo, Sabrina.
- Por que insiste que eu devo aceitá-lo, depois do que ele fez?
- Porque Colin ama você, irmã. Foi só um deslize. Eu poderia ter ficado com a boca fechada e neste momento você estaria feliz com ele, bem longe daqui. Vocês sempre foram um casal perfeito, feitos um para o outro.
- Se não tivesse contado a verdade, teria sido ainda mais filha da puta comigo.
Ela estreitou os olhos e arqueou a sobrancelha:
- Não sou... Filha... Da puta. Isso é... Baixo... Nojento... Feio.
- Foi exatamente isso que você fez quando dormiu com meu noivo: uma coisa baixa, nojenta e feia.
- Assim é impossível conversar com você, Sabrina.
- Mariane, por favor, me deixe sozinha.
Ela se aproximou e tocou meus cabelos, levando-os para trás dos ombros. Tocou meu pescoço e disse:
- Espero... Que tenha sido bom.
- Mil vezes melhor que o iceberg que era meu noivo.
- Me perdoe... Por favor.
- Talvez... Mas não hoje... Não agora.
Ela me abraçou. Senti o cheiro do seu perfume, que ela usava desde sempre. De alguma forma, me remetia a momentos bons e lembranças doces. No fundo, eu queria odiá-la e também estar furiosa. Mas sabia que aquilo não estava acontecendo. E não era porque eu era uma boa irmã e não podia ficar brava... Era porque no fundo eu não tinha sentimentos por Colin.
Claro que eu não diria a Mariane, mas pensando bem, ela me ajudou. Livrou-me de um casamento fracassado ao lado de um homem cheio de transtornos e compulsões obsessivas.
- Eu amo você. – Ela disse antes de sair.
Assim que ela se foi eu tranquei a porta e me recostei sobre ela:
- Eu não a perdoo, mas não a odeio. – Falei para mim mesma.