Capítulo 8
2562palavras
2022-12-05 11:34
Assim que cheguei na porta da igreja, as madrinhas foram entrando na ordem do ensaio, uma a uma. Mariane era a última da fila. Quando chegou a vez dela, minha irmã me encarou, incerta sobre o que fazer.
- Entre, minha irmã! – Falei, tentando dar um sorriso.
A parte boa de chorar de tristeza e raiva durante uma cerimônia de casamento é que todos achavam que as lágrimas eram de emoção e felicidade.
Mariane tomou seu lugar e entrou por último, seguindo pelo corredor com um belo tapete vermelho, que aguardava meus pés envoltos num lindo sapato rosa pink.
Meu pai deu-me seu braço, no qual segurei com minha mãe direita, aflita. O buquê tremulava na minha outra mão.
O antes emocionante e agora irônico som da orquestra municipal tocando e cantando “Ave Maria” iniciou assim que eu e J.R passamos pela porta principal.
A igreja catedral estava decorada lindamente, se é que precisava de flores para enfeitar um local que já era belo por natureza. Dentre os convidados, bem vestidos, com traje seguindo a risca o solicitado no convite, poucos os que eu conhecia.
Enquanto caminhava a passos lentos, ainda derramando algumas lágrimas por conta da traição do meu noivo e minha irmã horas antes, me perguntava o “porquê”. O que faltou em mim que Colin procurou em minha irmã mais velha? Eu fazia tudo que ele queria... Mesmo quando “eu” não queria. Fui uma namorada divertida, uma noiva perfeita, em todos os sentidos. Jamais ele reclamou de nada sobre meu comportamento ou algo que não gostasse na minha forma de agir. Então, de uma hora para outra, horas antes de nosso casamento, ele simplesmente dormia com outra mulher.
Justo Colin, o homem que não era tão louco por sexo, que não quisera transar na cama dos meus pais...
Me peguei sorrindo tristemente, imaginando que ele tivesse transado tanto com Mariane que não tivera mais tesão por mim naquela manhã.
Desgraçado, traidor, idiota... Lá estava ele, impecável, os cabelos bem penteados, um sorriso no rosto e eu poderia apostar, mesmo de longe, que estava tão emocionado que seus olhos lacrimejavam.
Assim que chegamos ao altar, nos encaramos. E sim, eu o conhecia tão bem que acertei em cheio que ele estava emocionado. E vi uma lágrima escorrer dos olhos dele.
Meu pai deu-me um beijo no rosto e limpou a lágrima teimosa que caía do meu olho esquerdo, creio que a última. Ao me entregar para Colin, disse seriamente:
- Lhe entrego neste momento uma das coisas mais preciosas que tenho na vida, algo que dinheiro nenhum pode comprar. Cuide dela como o diamante que ela é... E trate de me dar logo um neto.
Colin sorriu e respondeu:
- Seu diamante é o que tenho de mais precioso também, J.R. Vivi para este momento – olhou nos meus olhos – O momento de me unir oficialmente com o único e grande amor da minha vida.
Meu pai se afastou e olhei para a fileira de madrinhas, imaginando que naquele momento todas riam por dentro do ocorrido depois que me deixaram em casa, completamente bêbada, voltando para a despedida de solteiro e vendo minha irmã e meu noivo me traírem, me apunhalarem pelas costas. Certamente quem não tinha pensamento de deboche, era o de pena. E eu não sei qual deles era pior.
Colin tomou minha mão enquanto Tay pegou o buquê que eu trazia na outra. Percebi os olhos dela sobre ele, amassado pela força que fiz em torno do caule das flores, colocando ali toda a raiva que eu sentia.
Eu tentei prestar atenção na cerimônia, mas milhares de coisas passavam pela minha cabeça que a fala do padre parecia estar distante, mais parecendo uma música de fundo do que um sermão sobre amor, fidelidade e companheirismo.
Nem vi o tempo passar e do nada apareceu um dos padrinhos, com o par novo de alianças para fazermos a troca perante o padre, que as pegou, colocando sobre uma superfície dourada, dizendo enquanto as benzia com gotículas de água benta:
- Mais do que um adereço, a aliança representa um compromisso público com quem você ama. O anel simboliza o compromisso matrimonial, já que o formato circular, não tendo começo nem fim, representa a eternidade desta união. Usar uma aliança com alguém é como fazer um pacto. Este simples objeto representa um elo emocional forte entre duas pessoas que passam a partir deste momento, a compartilhar uma vida.
Eu e Colin estávamos de mãos dadas neste momento e ele passou o dedo polegar sobre os meus, carinhosamente. Olhei para ele e recebi um sorriso emocionado.
Pensei nas palavras do padre sobre o significado das alianças... Compromisso público, eternidade da união, pacto, elo emocional entre duas pessoas, compartilhar uma vida... Uma vida era muito tempo.
O padre entregou uma das alianças a Colin. Olhei o ouro em formato circular, o qual ensaiamos, dias atrás, usando o anel que ele me dera no noivado. Lembro de ter sonhado com aquelas palavras na noite seguinte, de tanto que as achei importantes.
- Sabrina Rockfeller, prometo ser-te fiel, amar-te e respeitar-te, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, todos os dias das nossas vidas. Receba esta aliança em nome do meu amor.
Quando ele foi colocá-la no meu dedo anelar, afastei a mão e disse, em alto e bom som:
- Eu não posso aceitar, Colin.
O burburinho iniciou imediatamente. E eu sabia que não seria diferente. Mas ainda precisava ser ouvida.
Peguei o microfone das mãos do padre, encarando Colin:
- Não pode me fazer promessas que não é capaz de cumprir, Colin Monaghan. Não pode prometer ser fiel, quando me traiu na noite anterior ao nosso casamento, dormindo com minha própria irmã. Isso não é amor... Tampouco respeito.
Dei um passo para trás, percebendo a confusão dele:
- Eu posso explicar, Sabrina, eu juro.
- Eu não quero explicações, Colin. Esperava mais de você. Se não amor, respeito, no mínimo... – olhei para Mariane e depois novamente para ele – Você poderia ter dormido com qualquer mulher, menos com ela... É a minha irmã. A gente vive na mesma casa, temos os mesmos pais, vocês se encontraram e se encontrariam por toda uma vida... – balancei a cabeça – Talvez tenha sido melhor assim do que eu ser corna a vida inteira, com vocês dois me traindo debaixo dos meus olhos.
Mariane veio até mim:
- Não faça isso, por favor. Eu sei que você ama Colin e ele também a ama.
Minha mãe e meu pai vieram na nossa direção:
- Não pode fazer isso, Sabrina. – Minha mãe falou.
- Sim, eu posso, mamãe.
- Por Deus, que porra você pensa que está fazendo? Acabando com a nossa família perante o país inteiro? É isso que quer? – Meu pai falou entredentes.
- Deveria falar isso para ele... – apontei na direção de Colin – Se eu sou o que você tem de mais precioso, não deveria deixar ele me trair desta forma.
- Sabrina... Por favor, desfaça esta confusão... Agora! – Ordenou J.R.
- Claro... Imediatamente... – falei, deixando o altar – Continuem a cerimônia... Creio que a noiva pode ser substituída facilmente – gritei para ser ouvida por todos – É só substituir uma Rockfeller por outra. Aposto que Colin nem vai reparar a diferença.
Levantei meu vestido e saí apressadamente, evitando despencar no meio do corredor. E então o sapato pink, que sequer seria visto, já marcava presença no tapete vermelho.
Jamais, em toda a minha vida, imaginei deixar o meu noivo no altar. Especialmente pelo fato de ele ter me traído com minha própria irmã.
Naquele momento, tudo que um dia achei sentir por Colin Monaghan se desfez por completo, como se nunca tivesse existido. Se eu queria vingança? Não. O mal já tinha sido feito e por sorte eu fui informada a tempo, antes de dar um dos passos mais importantes da minha vida em direção ao precipício.
Assim que saí na porta principal, por onde havia entrado, alguém segurou com força meu braço, machucando. Olhei para trás e vi meu pai. Senti o coração ficar ainda mais agitado. Pior que deixar Colin Monaghan no altar era enfrentar a fúria de Jordan Rockfeller.
- Papai... – Implorei piedade enquanto olhava nos olhos dele.
Meu pai puxou-me pelos degraus, sem nenhuma delicadeza, abrindo a porta da limusine e me empurrando para dentro, fechando-a em seguida, com toda força, fazendo com que eu desse um sobressalto, assustada.
- Você vai agora mesmo beber uma água, arrumar esta maquiagem horrorosa e voltar lá para aquela igreja e dizer que usou drogas, a fim de justificar o que fez.
- Pai, isso só pode ser brincadeira!
- Somos Rockfeller... Eles são os Monaghan. O pai de Colin é o meu melhor amigo, a única pessoa que confio no mundo sem ser você, sua irmã e sua mãe. Os nomes das nossas famílias estão em jogo neste momento.
- Eu confiava nele... E na minha irmã. Tem noção do que houve, papai? Eles me traíram... Dormiram juntos horas antes de este casamento acontecer. Não sou capaz de perdoá-los. Eu sou uma Rockfeller, mas antes disso eu sou um ser humano. Eu tenho sentimentos.
- Foi só uma traição boba. Ela é sua irmã e nunca vai deixar de ser. Vocês têm o mesmo sangue. E ele? Bem, Colin é homem. Qual homem nunca fez isso? Se você não soubesse, teria casado e ele a teria traído da mesma forma. Que porra passa na sua cabeça de vento?
- Porra? – eu ri ironicamente – Não é correto falar palavrões, “papai”. – Imitei a frase a qual ouvi a vida inteira da boca dele, levantei e abri a porta, saindo da limusine.
Olhei para algumas poucas pessoas saindo pela porta da igreja e a cerimonialista tentando impedi-las, certamente na certeza de que eu voltaria atrás e casaria com Colin Monaghan, conforme o desejo de meu pai, passando por cima da traição em dose dupla.
- O velho discurso “Faça o que eu digo mas não faça o que eu faço”. Estou cheia disso tudo. Eu não aceito a traição de Colin... O fato de ele ser homem em nada lhe dá o direito de fazer isso. Aliás, obrigada por me confessar que traiu minha mãe. Assim eu ponho mais um item na lista de J.R, o homem que julguei perfeito por tanto tempo, e que agora exige que eu case com um homem infiel e sem valores e princípios, que me traiu com a minha própria irmã.
- Sabrina, volte lá agora e case com Colin ou não a perdoarei.
- Neste caso, “eu” vou tentar perdoá-lo um dia por tudo que está me falando, papai.
Levantei a saia do vestido e saí correndo dali, sem saber exatamente o que pensar, mas na certeza de onde ir.
Andei uma quadra, rapidamente, até ver um táxi na rua, andando na direção do fluxo de carros. Ataquei-o e assim que ele parou, embarquei pela porta traseira, puxando-a com força.
O motorista me olhou, surpreso:
- Pelo visto a senhorita não vai para a igreja mais próxima não é mesmo?
- Não... Estou justo fugindo dela. – Confessei, enquanto lhe dava as coordenadas de onde eu queria ser deixada.
Enquanto ele dirigia, eu fechei meus olhos, descansando a cabeça sobre o encosto desconfortável do banco. Parecia um pesadelo... Que eu iria acordar e nada teria acontecido. Ainda assim, quando eu voltasse a mim, não queria estar casada com Colin, o homem que me traiu da pior forma possível.
Não queria mais chorar. Estava farta de derramar lágrimas por alguém que não merecia. Não sei quem era pior: Colin, minha irmã ou meus pais, que queriam que eu fingisse que nada daquilo tinha acontecido e casasse com o meu noivo traidor, em nome da união entre as famílias e evitando assim o escândalo que sucederia o acontecido.
Eu tentava não pensar, mas minha cabeça era um turbilhão naquele momento.
Quando ele estacionou em frente ao bar com letras neon com o nome “Cálice efervescente”, perguntou:
- Tem certeza que é aqui que você fica, senhorita?
- Sim – afirmei - Sem sombra de dúvidas.
Abri a porta e estava saindo quando ele buzinou, para chamar a minha atenção. Olhei na sua direção e ele disse:
- A senhorita precisa pagar a corrida.
O que ele quer dizer com “Pagar a corrida?” Não se deu em conta que eu não carrego dinheiro, visto que sou uma noiva fugida?
- Eu não tenho como pagar... Acabei de sair da igreja, senhor. Acha que eu teria um cartão de crédito comigo para caso precisasse pegar um táxi? Sequer meu celular este em meu poder.
- Sinceramente, pouco me importa. Eu a trouxe até aqui e exijo receber pelo meu trabalho. Se chegou aqui não foi a toa. Certamente alguém ai dentro poderá lhe emprestar o pagamento pelo meu serviço.
Respirei fundo e disse:
- Aguarde um instante. Eu já volto.
Eu não tinha sequer um celular para me comunicar com alguém que pudesse pagar a corrida. E quando embarquei naquele carro, não passou pela minha cabeça que eu teria que pagar.
Fui até a porta do bar, adentrando em seu interior à meia luz e sentindo meu coração bater forte. Não precisou muito para eu identificar a voz do cantor que havia me encantado na noite anterior, ecoando por todo o lugar, num pop rock calmo e bem tocado.
Segui na direção do palco, com todos os olhares na minha direção. Sim, eu era uma noiva passando entre as pessoas, tentando chegar perto da banda e disputar a atenção do vocalista com as outras garotas que ficavam enfileiradas na frente dele, cantando junto, acompanhando seu ritmo perfeito e inebriante.
Não demorou para nossos olhos se encontrarem. Por um minuto, ele perdeu-se no ritmo da música. A jaqueta preta de couro lhe dava um ar despojado e ainda mais perfeito.
Sentir o verde dos seus olhos sobre mim fez meu coração quase explodir dentro do peito e as pernas tremerem. Sim, eu estava ali por causa dele. E naquele momento me senti grata por Colin ter dormido com a minha irmã.
Empurrei as garotas que estavam na minha frente, abrindo passagem em direção ao palco e assim que cheguei ao meu destino, levantei o vestido e tentei subir o degrau, com certa de meio metro de altura. Como não consegui, Charles me deu a mão, ajudando-me a chegar perto dele.
Segui ali, sobre o palco, vestida de noiva, ao lado dele, encarando-o completamente encantada, enquanto ele seguia cantando confuso, fora do tom, sem entender nada.
Eu esperaria ali até a música acabar. Para minha sorte, ele encurtou-a, não cantando grande parte da letra. Assim que acabou, os aplausos vieram, fortes, seguidos de gritos histéricos.
- O que... Você está fazendo aqui? – Ele me olhou, com o microfone ao longo do corpo, na mão direita.
- Eu... Eu... Vim lhe dar o beijo que você pediu ontem.
Ele enrugou a testa, arqueando a sobrancelha, surpreso:
- O quê?
Fui na sua direção e passei os braços em volta do seu pescoço, aproximando meu corpo de dele.
- Garotinha... – Ele falou, semicerrando os olhos, a respiração acelerada.
- Eu não sou uma garotinha... E vou lhe provar isso. – Falei, aproximando meus lábios dos dele.