Capítulo 110
2172palavras
2022-12-29 23:53
Estevan me olhou confuso. Eu continuei:
SATINI: Eu lhe entrego Stepjan Beaumont em troca de Isabella. Você o julga em Avalon e eu a julgo em Alpemburg, pelo crime de tentativa de assassinato da princesa de Avalon e por ferir Alexander.
EMY: Isso não é muito justo, Satini D’Auvergne Bretonne. Creio que já possa chamá-la assim, pois toma decisões como rainha de Alpemburg.

SATINI: Pode sim, Emy Beaumont... Acho que como não é minha tia, devo chamá-la assim. Embora eu saiba que ainda não assumiu oficialmente sua coroa e seu trono de direito, tenho certeza de que possa tomar esta decisão em nome de Avalon.
EMY: Embora eu não esteja feliz nem satisfeita com sua proposta, confesso que admiro sua atitude.
SATINI: É só uma conversa extraoficial entre futuras rainhas.
EMY: Decisão difícil.
SATINI: Tenho vontade de julgar Stepjan e falar as verdades tanto quanto você. Ou acha que é fácil não jogar na cara dele que não sou sua filha e que minha mãe amou outro homem a vida inteira? Assim como nunca achei justo Isabella sair impune depois de tudo que aconteceu. Ela tentou me matar por um motivo fútil. E nada foi feito com relação a isso. Pelo contrário, ela ganhou com prêmio morar no castelo de Avalon ao lado de Samuel. Estou fazendo isso para proteger Sam também. Não quero que ela chegue ao ponto de fazer com ele o que tentou fazer comigo ruim. Posso lhe dar um tempo para pensar, sem problemas. Daqui Stepjan não fugirá, eu garanto. Só corre o risco de eu invadir a cela dele e abrir minha boca dizendo algumas verdades entaladas na minha garganta.
EMY: Não preciso de tempo, Satini. Eu aceito a proposta.

Estevan arqueou uma sobrancelha e disse:
- Me lembre de nunca ir contra você em nenhum momento.
Eu sorri:
- Eu só quis ser justa. Eu queria muito mais Stepjan do que ela. Mas sei o quanto é importante para Emy tê-lo sob sua guarda. Então uni o útil ao agradável. Sim, me agrada ter Isabella um tempo como prisioneira em Alpemburg, sozinha, pensando no que poderia ter causado. Acho que eu posso livrar algumas pessoas de um futuro horrível ao lado dela, caso nunca sofra nenhuma consequência por seus atos.

- Satini Beaumont, a mulher mais linda do mundo também é a mais inteligente. E má alguma vezes.
Eu ri novamente e fui até ele, tocando em sua roupa totalmente impecável:
- Falando em beleza, vou vê-lo sempre de terno? – olhei-o divertidamente.
- Sim... – ele fez uma careta. – Embora eu ainda tente manter distância da gravata. – Mas à noite posso ficar como você quiser... Inclusive sem roupa.
- Gosto da forma leve como Estevan Delacroix se vestida.
- Não gosto de Satini vestida como mendiga... Nem prostituta. – ele me abraçou. – Mas gosto desta Satini princesa, futura rainha.
- A terá sempre, pois esta sou eu de verdade.
- Ainda temos muito que nos conhecermos de verdade, não é mesmo?
- Sim... Se nossos corpos deixarem falarmos de vez em quando.
Ele balançou a cabeça ironicamente e perguntou:
- Você deve estar com fome. O que vamos comer?
- Aposto que você já almoçou.
- Eu? – ele riu. - Confesso que sim. Mas posso fazer o esforço de comer com você novamente.
- Lembro que quando eu quis vir com você, na ocasião que intencionava organizar seu exército para lutar em Avalon, você não deixou. Disse que queria me receber e ficar comigo. E foi exatamente o que fez. Estou me sentindo bem de estar aqui Estevan... Como se eu morasse aqui a minha vida inteira.
- Por isso não deixei você vir daquela vez. Você precisa se sentir em casa porque aqui “é a sua casa”. Esperei Satini Beaumont aqui por mais de vinte anos.
- E vai me aturar pelo resto de sua vida.
- Se Deus quiser.
- E meu pai? Onde ele está?
- Neste momento deve estar conhecendo o castelo com o rei Estefano.
- Seu pai já sabe a verdade?
- Não. Eu só disse que Sean era seu único parente vivo. Acho que devemos contar a verdade juntos.
- Também acho.
- Agora vamos. Minha mãe está esperando por você desde que o sol nasceu.
Eu fui com ele. Enquanto Estevan andava na frente, peguei sua mão. Ele virou e me sorriu. Eu mal esperava a hora de ver Deise.
Descemos as mesmas escadas as quais subi para conhecer meu quarto ainda naquela manhã. Depois fomos pelo lado esquerdo, aonde chegamos numa enorme sala com vários sofás brancos distribuídos sobre um enorme tapete cinza claro peludo e alto. Meus saltos quase desapareciam no material do tapete. A janela atrás era ampla e só de vidros, como a do quarto onde eu estava hospedada. E dali se via o lindo jardim, agora mais de perto.
Lá estava Deise, sentada com uma xícara de porcelana, elegantemente vestida. Ao lado dela, uma mulher morena de tailleur escuro. Ela tinha olhos claros expressivos e não vi muita receptividade quanto ela me olhou dos pés a cabeça, me analisando. Deise depositou sua xícara na mesa e levantou-se, me dando um forte abraço quando me aproximei:
- Seja muito bem vinda, minha querida. Fico imensamente feliz em recebê-la no castelo de Avalon, “nossa casa”.
- Obrigada, Deise.
- Esta é Aline D’Auvergne Bretonne, viúva de meu irmão. – apresentou Estevan.
- Prazer em conhecê-la. – falei lhe dando um sorriso tão falso quanto o que ela tentava me dar.
- Sente-se, querida. – convidou Deise. – Quero muito saber tudo que aconteceu em Avalon. Fiquei tão preocupada com o que houve no baile aquela noite...
- Mãe, Satini ainda não comeu nada.
- Deve estar cansada da noite de ontem... Sinto muito, querida. Estevan devia ter sido mais responsável e não deixá-los num hotel. – ela fez cara feia para ele.
- Não... De forma alguma, Deise. Eu pedi que ele fizesse isso. Não queria chegar aqui sem ao menos conhecer um pouco de Alpemburg. E gostaria de fazer isso sem um D’Auvergne Bretonne ao meu lado, se é que me entende.
- Céus, agora entendo porque vocês dois se apaixonaram. – ela riu. – Fez o mesmo que Estevan quando esteve em Avalon. Vocês são iguais.
Olhei para Estevan e o encontrei me fitando ternamente. Sinceramente, eu quase não conseguia ficar longe dele. Perguntava-me se aquilo passaria algum dia. Por enquanto eu sentia tanto amor e carinho dentro de mim que tudo que eu queria era ficar com ele e nada mais... Sentir seu cheiro, sua pele na minha, sua boca no meu corpo... Tentei tirar aqueles pensamentos que começavam a ficar quentes dentro de mim.
- Dormi um pouco e estou descansada, Deise. E também não quero atrapalhar seus compromissos, meu amor. Eu ficarei bem e não morrerei de fome.
- Meu único compromisso é você, Satini.
- Não mesmo... – disse Deise levantando e o empurrando para fora. – Não vou matá-la de fome, não se preocupe. Vá procurar seu pai e resolver o que precisa. Nos veremos todos à noite, no jantar.
Ela fechou a porta, deixando-o do lado de fora.
- Ele consegue ser preocupado até demais às vezes. – ela riu sentando novamente.
Fiquei sem palavras ao imaginá-lo do lado de fora, com semblante triste. Sentei ao lado dela:
- Ele é fofo. – falei quase sem pensar.
Ela sorriu:
- Vocês são fofos juntos. Estou tão feliz. Sei o quanto Estevan gosta de você.
- E eu sou completamente apaixonada por ele. – confessei sem medo.
- Eu mesmo contei a história de vocês para Aline dias atrás. Como sabe, meu outro filho morreu há alguns meses. Passamos por momentos difíceis. Mas Estevan esteve sempre junto de nós, nos apoiando. Foi como se um filho tivesse ido e uma filha tivesse chegado, pois aconteceu quase tudo no mesmo tempo. Estevan voltou de Avalon apaixonado, não querendo mais casar com você. No caso, você princesa. – ela riu confusa. – Acho que você me entendeu, porque no fim a mulher que ele amava era a sua futura esposa.
- Tivemos alguns problemas sérios em Avalon com relação a forma de governo de meu... Pai. Então eu soube que minha tia, Emy Beaumont, estava viva. Eu realmente planejei meu próprio sequestro a fim de ajudar o grupo rebelde a tomar o poder. Neste caso, pertencente a minha tia por direito. E eu não queria casar com o meu pretendente, pois estava completamente apaixonada por Estevan.
- Esta história é totalmente obra destino, não acha, Aline?
- Ainda acho inacreditável você planejar seu próprio sequestro. – ela se limitou a dizer.
- Querida, vou providenciar algo para você comer. – Deise olhou para os lados. – Onde está todo mundo? – ela levantou e abriu a porta. – Já volto, meu bem. Preciso encontrar alguém que traga algo para nós. Se Estevan imaginar que não lhe deu de comer, ficará furioso.
Continuei sentada com Aline. Eu sempre fui muito intuitiva. E aquela mulher não gostava de mim, mesmo sem me conhecer. Ela me olhou e eu segurei firme o olhar.
- Não quero tomar seu lugar. – falei sem me dar conta.
Ela riu ironicamente:
- Já tomou. Será a rainha.
- Pouco me importa a coroa. Eu só quero o príncipe, o rei... Ou seja lá o que Estevan for. Ele é a única coisa que me interessa em Alpemburg.
- Quando ele quis cancelar o casamento com a princesa de Avalon cogitaram que eu pudesse me unir a ele em matrimônio... Poderia ter dado certo.
Servi-me tranquilamente de uma xícara de chá. Eis uma coisa que não se tinha o hábito em Avalon: chá... Muito menos da tarde. Mas acho que eu poderia me acostumar àquilo. Sorvi a bebida extremamente quente, mas saborosa e disse calmamente:
- Aline, você não se casará com Estevan. Nunca. Ele é meu e passo por cima de qualquer pessoa que tentar atrapalhar nossa vida. Eu planejei a invasão do meu próprio castelo, bem como meu sequestro. Eu tirei meu pai do poder, transformando em cinzas o trono onde ele sentou. Eu lutei ao lado de dois exércitos, mas tive um terceiro que entraria na guerra se eu quisesse. Eu sentei numa mesa com três príncipes q ue só tinham um desejo: ajudar-me. Eu nasci sem uma mãe e ao lado de um pai narcisista e hipócrita, que nunca se importou com nada a não ser ele mesmo. Ainda assim sobrevivi sem um pingo de amor. Eu quase fui estuprada e por duas vezes tentaram me estrangular. E ainda assim estou aqui, tomando chá da tarde com você. Então, pense duas vezes antes de tentar puxar o meu tapete. – eu sorri ironicamente. – Esqueci do fato que transei com Estevan desde a primeira vez sem camisinha e não fiquei grávida. Será que isso conta? Eu poderia contar como muita sorte. E se eu já estiver grávida? Acho que tive enjoo dia desses. – coloquei a mão no queixo, pensativa. – Devo contar a rainha Deise? O que você acha? Creio que os D’Auvergne Bretonne parariam o mundo por um neto.
Neste momento a rainha entrou e sentou-se, pegando sua xícara:
- Do que falavam, queridas?
- Eu estava contando à Aline que no dia que conheci Estevan ele me deu um brinco que usava e eu fiz dele um piercing. E que já fiz uma tatuagem da Coroa Quebrada, símbolo oponente de meu próprio pai no poder. – mostrei a tatuagem no meu pescoço para elas.
- Estevan me disse que você era intensa, Satini. E que eu me apaixonaria por você, assim como ele. E tive certeza disto no momento que a vi, descendo as escadas, olhando para meu filho como se ele fosse o que existia de mais importante no mundo.
Peguei as mãos de Deise e disse, encarando-a sinceramente:
- Ele é o que existe de mais importante no meu mundo, Deise.
Vi uma lágrima descendo no rosto dela.
- Satini, estou tão feliz por você estar aqui... E ser a garota que ele sempre quis.
- Estou muito feliz por conhecer vocês, Deise... Depois de 17 anos de espera.
Eu ri e ela também.
- Meu bebê vai casar... – ouvi ela dizendo.
- Eu sempre achei que ele fosse o “bebê da mamãe”. – eu ri. - Mas agora me diga, podemos comer no jardim? Estou louca para conhecer... Não posso só ficar olhando daqui.
Ela ficou empolgada com minha proposta e levantou imediatamente:
- Pelo visto com você os chás da tarde serão mais divertidos.
- Se depender de mim, sua vida nunca mais será monótona ou entediante, Majestade.
Pisquei para Aline e perguntei:
- Você não vem, querida?
- Não. – ela disse com cara de poucos amigos.
- Aline não gosta muito de sair de dentro do castelo.
- Quem, em sã consciência, fica dentro de um castelo com um jardim tão perfeito e uma piscina convidativa como esta?