Capítulo 103
2260palavras
2022-12-29 23:48
Saí atrás de Sam e não o encontrava em lugar algum. Onde ele tinha ido? Não havia guardas para perguntar o paradeiro dele. O castelo de Avalon parecia um ambiente onde ninguém morava. Os corredores frios e escuros estavam completamente vazios. Perguntei-me onde estaria Stepjan? Ele não fugiu sozinho. Certamente teve ajuda. Mas ao mesmo tempo quem, em sã consciência, ajudaria o rei traidor e assassino? Eu não me conformava com isso.
Encontrei Sam num dos corredores do segundo andar, olhando algumas pinturas nas paredes.
- Não sabia que se interessava por arte. – falei parando ao lado dele.

- Você não sabe nada sobre mim. – ele falou bravo.
Toquei no braço dele:
- Sam, eu não quero partir de mal com você.
- Então não parta. – ele virou e olhou nos meus olhos.
- Você sabia que eu iria, mais cedo ou mais tarde.
- E você não queria ir para o reino dele. E agora você pode ficar, entende?

- Eu não queria ir porque não sabia que era Estevan... Eu me sinto segura em partir com ele. Não há mais nada que me prenda em Avalon, entende? Stepjan não é mais meu pai. Mia sequer fala comigo. Alexander está vivo e reorganizando sua vida. E você, Emy e Emília não são mais minha família, porque eu não sou uma Beaumont. Eu só tenho Sean... E ele irá comigo. Léia certamente ficará com Mia também.
Samuel pegou meu rosto entre suas mãos:
- Não somos sua família, mas a amamos como se fosse.
Eu suspirei. Esta história de amores de família que não eram família não davam muito certo para mim. Eu não estava disposta a entrar em outra família de mentirinha. Eu teria minha própria família a partir de agora. E ela seria real e não criada por minha cabeça, acolhida por pena num ambiente familiar.

- Eu amo você. – ele disse com todas as letras.
- Sam... Não torne tudo isso mais difícil. – falei sentindo meu coração batendo descompassadamente. – Eu não posso corresponder ao seu amor.
- Por que não eu? Você sabe que tivemos algo... E eu realmente achei que você estava gostando de mim.
- E eu estava... Mas foi ele... Sempre foi ele. E eu não sei explicar o motivo, acredite. Você vai encontrar alguém que o mereça, acredite.
- Eu não quero outra pessoa além de você.
Ele me abraçou e eu deixei que seus braços me apertassem contra ele. Creio que aquela fosse a parte mais difícil: deixar Sam. Ele era perfeito, me ajudou em tudo, me ensinou muitas coisas. Senti o cheiro bom que ele exalava e deitei minha cabeça no ombro dele, fechando meus olhos e dizendo para mim mesma que eu nunca mais o veria. E não tinha como negar: sentiria saudade.
Depois de um tempo ele soltou-me e me olhou novamente:
- Nunca mais nos veremos?
- Eu... Não sei. – disse tentando não negar.
- Eu quero um último beijo... De despedida.
- Sam, eu não posso...
- Sim, você pode.
- Não...
- Mesmo que Estevan visse, ele não a deixaria. E você sabe disso.
- Não posso me aproveitar disso para traí-lo. Eu amo Estevan. Eu nunca o enganei quanto a isso, Samuel. Sempre deixei claro meus sentimentos.
- É só um beijo... Não estou pedindo para você fazer sexo comigo.
- Sam...
Antes que eu continuasse a tentar dissuadi-lo de sua ideia maluca, ele tomou meus lábios. Eu poderia dizer que não, empurrá-lo ou simplesmente não corresponder ao beijo. Mas simplesmente não consegui. O envolvi com meus braços e aceitei dar-lhe o último beijo, dentro do castelo de Avalon, como um pedido dele. Sam merecia qualquer coisa que estivesse ao meu alcance. E aquilo em nada diminuiria meu amor por Estevan. Sua língua entrou na minha boca e ele me empurrou contra a parede. Senti o frio da parede de pedra nas minhas costas enquanto uma mão desceu até minha nádega e a outra tentou entrar na minha calça.
- Geme para mim como gemeu para ele a noite inteira... – ele pediu num fio de voz.
Eu o empurrei com um pouco de dificuldade, sentindo meu corpo trêmulo:
- Eu não posso... Eu não quero, Sam. Eu não vou trair Estevan.
- Você já traiu.
- Não...
- Você acabou de me beijar.
Coloquei a mão sobre o rosto dele e lhe dei um beijo leve nos lábios:
- Eu não traí... Porque não existe amor, entende?
- Existe... Da minha parte.
- Não torne isso pior do que já é para mim... Por favor. Deixe-me ir com a certeza de que se um dia eu quiser ouvir sua voz, vou poder ligar. Deixe-me partir sabendo que quando eu sentir saudade ou quiser saber sobre Avalon, poderei ser atendida por um Sam feliz, empolgado em contar-me as novidades da sua aventura como príncipe. Deixe-me ir em paz, sabendo que não ficaram mágoas entre nós.
- Ficam lembranças boas, Satini. Tão boas que não sei se sairão algum dia da minha mente e do meu coração.
- Vou levar você para sempre no meu coração... Príncipe da Coroa Quebrada. – eu sorri.
- Sempre que tocar sua tatuagem, lembre que temos algo que nos liga eternamente.
- Eu sei... Jamais esquecerei de tudo que vivemos juntos.
- Vá antes que eu a impeça de partir, Satini. – ele disse virando de costas.
Olhei para ele e dei adeus, mesmo ele não vendo. Segui pelo corredor sem olhar para trás. Eu esperava do fundo do meu coração que Samuel Leeter fosse tão feliz quanto eu com Estevan. E no fundo eu sabia que ele superaria o sentimento por mim em breve. Ele era um príncipe que tinha uma banda de rock e tocava guitarra. Certamente ainda mais mulheres o desejariam e correriam desesperadamente atrás dele. Eu sorri... Sabia que ele gostava da tietagem toda.
Pedi ajuda a uma criada para arrumar meus pertences. Levamos o resto da manhã até o início da tarde. Eu tentei levar somente o essencial. Mas o problema é que quase tudo era essencial. Embora tivessem poucas coisas da minha mãe, eu peguei tudo que encontrei. Duas pinturas escondidas num lugar qualquer, sem atenção alguma. Sequer a tiara dela ficou de lembrança, pois Stepjan levou todas.
Abri meus pertences haviam vindo da Coroa Quebrada e peguei a tiara de Emy Beaumont. Agora ela precisaria daquilo. Fui procurá-la e encontrei-a na biblioteca, com alguns homens de sua confiança. Olhavam livros antigos de Avalon. Assim que me viu ela veio até mim. Há poucos dias de ser coroada a rainha de Avalon, ela ainda usava calças pretas e jaqueta de couro com batom vermelho. Seria uma rainha fora do tradicional, eu tenho certeza disto. E Avalon teria muito orgulho dela.
- Chegou a hora da nossa despedida. – eu disse. – Mas antes quero que aceite isso. – eu lhe entreguei a tiara.
Emy olhou-a e sorriu:
- Lembro como se fosse ontem quando a usei.
- Seu irmão não lhe deixou nenhuma opção, não é mesmo? E sei que a coroação será em breve. E você ficará linda usando-a.
- Eu vou aceitar, Satini. E mais uma vez, agradeço por tudo. Se não fosse suas ideias loucas, não estaríamos dentro do castelo de Avalon hoje.
- Obrigada por acreditar em mim... E me dar um chance.
Nos abraçamos e ela perguntou:
- Tem certeza de que quer ir com ele?
- Sim, eu tenho.
- Sei que será feliz... E qualquer coisa que precisar, é só me chamar. A internet será liberada no castelo de Avalon e algumas mudanças acontecerão em breve.
- Me diga que você vai acabar com a muralha.
- Claro que vou. – ela sorriu.
- Seria a primeira coisa que eu faria quando fosse coroada.
- Eu também... No fim, temos muito em comum, não é mesmo?
Eu sorri:
- Sim.
- Você já deve ter ouvido a frase: “Atrás de um grande homem sempre existe uma grande mulher.”
- Sim...
- Elas não precisam ficar atrás. Elas têm que estar na frente... Sempre.
- Eu sei disto. Ainda me preocupo um pouco com Stepjan...
- Eu não. Sei que em breve ele será encontrado. Não tem para onde ir. A hora dele está chegando.
- Espero. Mas enquanto ele estiver desaparecido, me prometa que vai tomar cuidado.
- Prometo.
A abracei e disse:
- Preciso ir.
- Satini, diga que não partiu o coração de Sam em mil pedaços.
Eu sorri timidamente:
- Acho que parti ao meio... Então ainda pode ser colado novamente e ficar tudo bem.
- Eu espero...
Olhei para a biblioteca e lembrei dos momentos que vivi ali, seja procurando por Emy Beaumont, que estava junto de mim naquele momento, ou ouvindo meu pai falar sobre a intenção de me matar para Beatrice. Eu poderia dizer que doía, mas não. Parecia que a vida que tive dentro do castelo de Avalon foi só uma introdução ao que realmente estava por vir.
Saí dali e encontrei algumas pessoas diferentes, da Coroa Quebrada. Em breve tudo estaria realmente mudado ali. E eu tinha certeza de que seria para melhor. Ficariam lembranças dos bons momentos que vivi com Léia, Alexander e Mia, quando ainda éramos crianças.
Não precisei procurar por Beatrice. Assim que viu, ela veio até mim. Estávamos próximas da escadaria que dava acesso ao terceiro andar e ao primeiro.
- Eu partirei hoje ainda para Alpemburg. – disse a ela. – E gostaria de agradecer a você.
- Eu não fiz nada por você, Alteza. – ela disse humildemente.
- Eu não sou a princesa, Beatrice... Então não precisa me chamar de Alteza. Sou Satini. – sorri.
- Eu realmente queria ter me aproximado de você. – ela disse. – Assim que entrei neste lugar, percebi que você não compactuava com as ideias absurdas de seu pai.
- Eu sempre desconfiei de você, Beatrice. E no fundo eu estava certa... Você era uma infiltrada da Coroa Quebrada, embora não fosse exatamente isso que eu pensava sobre você. Ainda assim sou grata por você ter intervindo a meu favor sempre que conseguiu com Stepjan.
- Entrar aqui foi difícil... Planejamos por anos. E você saiu alguns meses e conseguiu resolver tudo. – ela sorriu. – Parabéns por nos devolver Avalon e unir a coroa novamente.
- Posso lhe fazer uma pergunta?
- Claro, Satini.
- Como conseguiu dormir com Stepjan, ciente de todo o mal que ele lhe causou?
Ela suspirou:
- Você sabe muito bem o que é vingança, Satini. Eu vi você fazendo isso com Alexander inúmeras vezes. A diferença é que eu esperei muito para pôr em prática. Você tinha uma posição privilegiada, então foi mais fácil conseguir em pouco tempo fazer Alexander sofrer algumas vezes.
- Você não respondeu minha pergunta.
- Stepjan é um homem bonito, não podemos negar... Então digamos que a vingança foi um prato frio e ao mesmo tempo quente. – ela riu.
- Ele foi responsável pela morte do seu pai. Como conseguiu dormir com ele?
- Alexander tentou estuprá-la... Como conseguiu lhe dar o perdão?
Olhei para ela perplexa:
- Como... Você sabe?
- Ele me contou.
- Ele contou?
- Admiro você por tê-lo perdoado.
- Tentei pensar nos momentos bons que passamos juntos na nossa infância. E o que ele fez por mim, se jogando na frente da bala.
- Eu não conheci o Alexander que lhe fez mal...
- Não foi isso que me disse naquela vez...
- No fundo eu gostaria que ele deixasse de gostar de você... E que você parasse de provocá-lo da forma como fazia... Usando seu corpo e o amor que ele tinha por você para feri-lo.
- Era o que eu tinha em mãos...
- Não estou criticando. Talvez eu no seu lugar teria feito da mesma forma.
- Eu quero que vocês sejam felizes, Beatrice. Léia e seus filhos foram a única família que eu conheci.
- E eu espero que algum dia ele olhe para mim como olha para você.
- Este dia chegará. Aposto que ele está muito feliz com o bebê.
- Sim... – ela disse alisando a barriga ainda com pouca saliência.
- Eu não entendo como vocês se encontravam dentro do castelo sem chamar a atenção de meu pai, quer dizer, Stepjan. – me corrigi rapidamente.
- Até você alertá-lo foi mais fácil. Depois não tivemos mais chance de nos encontrarmos. Alexander ia atrás de mim quando vocês brigavam...
- E... Você aceitava?
- Eu fiquei muito volúvel aqui dentro. Não foi fácil. Estar com Stepjan era muitas vezes difícil... Alexander me fazia esquecer isso, entende? Eu não era apaixonada por ele, mas o sexo era bom... Escondido, perigoso... Isso me excitava.
Daquela parte sobre sexo escondido eu entendia muito bem.
- E engravidar de Stepjan Beaumont estava nos planos?
- Sim, desde o início. Este plano foi arquitetado por mim, Emy e Samuel.
- Com qual objetivo?
- Usar o bebê para desestabilizá-lo... Mas quando vi a forma como ele a tratava, percebi que não sairia como o esperado. Stepjan não tem amor a ninguém a não ser ele próprio.
- Exatamente.
Ouvi um barulho na parte de cima e vi Isabella nos olhando. Senti tanta raiva dentro de mim. Aquela vagabunda tentava me matar e ganharia como prêmio viver dentro do castelo de Avalon? Ah, não mesmo.
Subi as escadas correndo e ela se afastou. Beatrice veio atrás de mim:
- Satini, onde você vai?
- Acabar com Isabella. – gritei.