Capítulo 86
2170palavras
2022-12-27 10:53
- Alexander...
Antes que ele dissesse, eu já senti as lágrimas escorrerem pelo meu rosto, já certa da notícia que ele trazia.
- Como ele está? – perguntou Sean.

- Ele não resistiu.
Eu abracei meu pai, que me acolheu carinhosamente. Claro que eu chorava por Alexander estar morto, pelo que Mia e Léia sentiriam ao saber. Mas principalmente pela forma como havia acontecido. Ele tinha me protegido... Com sua própria vida. E isso me trazia uma culpa tão grande que eu não sei quanto tempo duraria. Naquele momento eu achava que seria para sempre que eu carregaria aquele peso dentro de mim.
Sean levantou meu rosto, fazendo- me encará-lo:
- A dor e a culpa irão passar... Não se preocupe. – ele me disse.
- Sei que vocês tiveram uma infância feliz juntos... Mas não o coloque num pedestal ao qual ele não pertence, Satini. – disse Samuel. – Não é porque morreu que ele deixou de ser um canalha.
- Ele morreu por mim...

- Quando ele se jogou na frente da bala, sabia os riscos que corria.
- Ou não... Foi tudo tão rápido. Ele só pensou em me proteger, entende?
- E as coisas ruins que ele fez? – perguntou Sean. – Sei o que você sente, mas tente lembrar também das partes não muito boas que ele marcou na sua lembrança. Talvez o sofrimento diminua.
- Eu acho que sinto mais por Mia e Léia... E quando penso nele, não consigo ver o Alexander de hoje, entendem? Eu ainda choro pelo garotinho de olhos azuis e cabelos loiros encaracolados correndo pelo castelo de Avalon. E ele era gentil e carinhoso. E este Alexander, vocês não tiveram o prazer de conhecer.

- Mas ele cresceu... E se transformou num homem ruim. – lembrou Sean.
- Eu sei... Mas foi um homem ruim que deu a vida por mim.
- Não torne tudo mais difícil, Satini. – disse Sean. – Você vai superar isso. Sua vida era voltada unicamente para Léia, Mia e Alexander. Mas agora você não está mais sozinha, entende?
Limpei as lágrimas que teimavam em cair e sorri:
- Sim... Eu tenho você, Estevan... – olhei para Samuel. – E você, Emília, sua mãe...
- Pessoas que se importam de verdade com você e não lhe fariam nenhum mal. – disse Samuel.
Eu peguei a mão dele e o puxei para perto, lhe dando um abraço carinhoso, que logo foi correspondido.
- Ainda tenho outra notícia. – ele disse no meu ouvido.
O afastei e perguntei:
- O que pode ser pior que a morte do homem que sempre considerei meu irmão?
- Temos um problema... E ele é bem grande. Neste momento minha mãe está se reunindo com a cúpula da Coroa Quebrada e contatando todos nossos apoiadores fora daqui.
Olhei para ele preocupada.
- É sobre o seu namorado, noivo ou seja lá o que for...
- O que houve com Estevan?
- Ele está trazendo suas tropas para Avalon...
- Isso é um problema? – perguntou Sean.
- Se contássemos só com o exército dele, talvez não... Mas ele tem Noriah Sul do seu lado.
- Noriah Sul? Como assim?
- Estevan é primo de Magnus e Dereck. A mãe dele é irmã do rei Alfred Chevalier.
- Estevan é um Chevalier também? – perguntei incrédula.
- Sim...
- Mas... A rainha Anne não apoiaria esta guerra que não tem nada a ver com ela. – disse Sean.
- Claro que a rainha Anne não apoiaria. Mas os filhos sim. Estevan e sua mãe são tudo que resta do pai deles. Temos uma princesa sequestrada e três príncipes loucos por resgatá-la. A Coroa Quebrada não resistirá a isso.
- Eu... Sabia que ele viria me salvar. – falei sorrindo e sentindo meu coração disparando.
- Meu bem, você não quer ser salva, lembra? – disse Sean gentilmente.
- Você só pode estar brincando. – falou Sam bravo. – Satini, você não é uma princesa sequestrada em perigo. Você planejou isso tudo, esqueceu?
- Bem... Ele disse que me encontraria... Onde quer que eu estivesse. E eu pedi para você não me trazer, Sam.
- Se você disser isto a minha mãe, ela lhe dá um tiro na mesma hora. – ele falou seriamente. – Acho melhor se recompor e encontrar uma boa desculpa para isso estar acontecendo. Afinal, você garantiu que tudo daria certo e que o rei Stepjan não moveria um dedo para intervir nisso.
- E ele não moveu, Sam. – falei firmemente.
- Você não pode deixar dois exércitos entrarem em Avalon e destruírem a Coroa Quebrada.
- Eu sei disto... Não se preocupe.
Mas eu sabia que isso poderia lhes trazer sérias consequências.
- Acha que devemos participar da reunião com sua mãe? – perguntei.
- Sim. Vim buscá-la para isso.
Enquanto nos dirigíamos novamente para a área totalmente ocupada da Coroa Quebrada, olhei para Sam e disse:
- Eu preciso ver Léia. E Mia.
- Você não pode sair daqui.
- Se você não me levar, eu vou sozinha, Sam.
Ele balançou a cabeça, preocupado:
- Não é seguro.
- Sei que com você pode ser seguro. – tentei.
- Posso ajudar. – disse Sean.
- Minha mãe não pode saber... De jeito algum.
- Eu prometo que ela não saberá. Mas se eu não falar com Léia... E ouvir o que ela pensa sobre o que aconteceu, eu não vou ficar sossegada. Ela é como uma mãe para mim, entendem?
- Eu acho que entendo. – disse Samuel.
Andamos por uma estrada estreita, seguindo-o por um caminho diferente do que eu havia vindo. Claro que Samuel conhecia tudo ali muito bem. Ele nasceu naquele lugar.
- Sean, você não participará. – avisou Samuel.
- Ok... Mas vou esperar perto de onde a reunião está ocorrendo. – ele disse.
- Certo.
Segui Samuel pelo beco que já estava escuro pela noite que caía. Sean ficou esperando, escorado numa parede descascada de algo que parecia ter sido uma casa um dia. Atualmente o local parecia completamente abandonado.
- É seguro ele ficar aqui sozinho? – perguntei preocupada.
- Mais seguro do que dormir dentro do castelo de Avalon. – ele disse ironicamente.
- E Mia? Eu acho que ela não me perdoará. – lamentei profundamente.
- Se ela for realmente sua amiga, ela vai sim. Se não for, não perdoará mesmo. Dê um tempo para ela.
- Acha que Dara perdoará sua mãe?
- Sinceramente, acho que não.
- Me parece que vocês agiram tão tranquilamente com a morte de Isabella... Como se ela significasse tão pouco para todos vocês. Alexander me fez coisas tão ruins que se eu contasse, você talvez não acreditaria. Ainda assim eu sinto a morte dele... Também pelas pessoas que sofrerão por ele, as quais eu amo muito.
- Não temos uma vida fácil por aqui. – ele alegou. – Nem muito tempo para lamentações.
- Acha que a minha vida foi fácil, Samuel?
- Creio que melhor que a minha.
- Eu duvido...
- Satini, acha que Estevan realmente seria capaz de entrar numa guerra que não tem nada a ver com ele?
Olhei-o seriamente e disse:
- Esta guerra tem a ver com ele, Sam. Nós vamos nos casar. Ele viu vocês me tirando do salão à força, armados... E que não estavam brincando. Isabella me deu um tiro... Ela tentou me matar. Sei que planejamos tudo muito bem. Mas temos uma pessoa morta por um membro da Coroa Quebrada. E tudo isso foi filmado e fotografado.
- Porra, isso vai dar problema.
- Sam, eu posso impedir Estevan. Acho que temos que traçar um plano B.
- Sim, você não pode simplesmente voltar para Avalon e dizer a Estevan que está tudo bem e foi um mal entendido.
- Exato... Ainda assim, Estevan sabe que meu pai não moveu um dedo para me tirar daqui.
Entramos numa sala térrea com amplas janelas, todas fechadas. Havia uma mesa grande com cadeiras de madeira e todos estavam sentados ao redor dela, discutindo fervorosamente. Quando adentramos no local, a conversa cessou e todos os olhares ficaram sobre mim e Sam.
- Satini, seja bem-vinda, minha sobrinha. – disse minha tia me mostrando o lugar ao lado dela para que eu sentasse.
Sentei de um lado e Samuel do outro. Ela ficou no nosso meio.
- Já contei a ela o que houve. – disse Samuel.
- Pois bem, Satini. O que eu mais temia aconteceu. Estevan D’Auvergne Bretonne tomou para si a causa.
- Mas... Ele tem este poder, mãe? – perguntou Samuel.
- As tropas dele, por menores que sejam, são melhores preparadas que as de Stepjan. – disse Emy. – A guarda de Avalon só treina para proteção do castelo e da família real. Não sabem lutar de fato. Já foi um bom exército, hoje não é mais. Por culpa do meu irmão, que só se preocupa com sua proteção e nada mais. Todos viram o que houve quando o salão foi invadido... A guarda inteira se voltou ao rei, protegendo-a com sua própria vida.
- Estevan D’Auvergne Bretonne tem os Chevalier ao lado dele. Isso basta. – disse um homem mais velho que os demais, preocupado.
- Os Chevalier são tão temidos assim? – perguntei.
Eu sempre achei que os príncipes de Noriah Sul apareciam na mídia muito mais pela beleza estonteante do que pela questão política do reino deles de fato.
- A rainha Anne sim treinou seu exército para a guerra... Sempre. Talvez ela tenha o melhor grupo armado dos últimos países com monarquia. – disse Emy.
- Eles lutam pela família Chevalier. – disse outro homem. – Isso vai fazer todo o mundo apoiá-los. Não temos nada a nosso favor. Sequestramos a princesa de Avalon e nossos argumentos não são tão bons quanto o deles.
- Mas isso porque eles não sabem que a verdadeira rainha de Avalon está viva. Precisamos revelar a verdade. – eu disse firmemente. – Antes que seja tarde. Não podemos deixar dois exércitos invadirem a Coroa Quebrada. Talvez três, se Stepjan se unir a eles.
- Querida, Stepjan jamais vai entrar nesta luta. – disse Emy rindo. – Ou você está sendo ingênua, ou não conhece o seu pai.
- Os Chevalier não tem só uma guarda ao lado deles... Pelo que sei eles também dominam boa parte dos rebeldes, que talvez lutem até melhor do que os soldados treinados. – disse o primeiro homem novamente.
- O que tem a rainha Anne de odiada pelo seu reino, tem seus filhos de idolatrados. Não é de agora que Noriah Sul tenta acabar com a monarquia. E o que a sustenta são os príncipes. A guerra interna deles não nos preocupa. Mas a popularidade deles frente a mídia sim... Isso me preocupa muito. – disse Samuel.
- E se não bastasse, seu futuro marido tem a porra da cara de príncipe bondoso de contos de fada. Só falta ele dar entrevista usando uma coroa. Os discursos dele são baseados unicamente no amor pela princesa de Avalon e a coragem de mover dois reinos para salvá-la das mãos dos sequestradores terroristas... E sabe o que é pior ainda? Alpemburg não tem rebeliões desde que o pai dele assumiu o trono. Ou seja, o povo ama os D’Auvergne Bretonne. – disse Emy.
Samuel me encarou. E eu não podia transparecer o que eu sentia, mas fiquei imensamente feliz de saber que Alpemburg era um lugar bem governado e que Estevan era capaz de fazer qualquer coisa por mim.
- Pesquisei sobre Alpemburg, Emy. – disse um mais jovem, com um notebook na mesa. – Um reino singelo, pequeno em extensão, mas com uma das melhores qualidades da vida da região em que se situa. Desemprego quase nulo, distribuição de renda igualitária e...
- Vamos nos mudar para Alpemburg. – ironizou Samuel, colocando as mãos para trás, segurando a cabeça descansadamente enquanto sorria debochado.
- Está falando isso porque o príncipe de lá se popularizou em dias mais que você e sua banda em anos. – disse alguém tentando fazer gracinha.
- Desde quando nossas reuniões se transformaram num circo? – perguntou Emy levantando furiosa.
- Desde que o futuro rei de Avalon, Samuel Leeter Beaumont passou a se preocupar muito mais com suas causas pessoais do que políticas e sociais. – disse um homem seriamente, me encarando.
Emy olhou para Samuel e disse:
- Hora de você liderar esta guerra, meu filho. E mostrar a todos que você pode ser o melhor rei que Avalon já teve.
Um homem bateu na porta e em seguida entrou, dizendo nervosamente:
- Acabei de ver na televisão que Magnus e Dereck Chevalier estão vindo pessoalmente para Avalon. Chegarão num voo pela manhã para se unir a Estevan. Precisamos resolver imediatamente esta situação. Não há como deixar para depois.
- Ainda acham que isso é uma brincadeira? – perguntou Emy. – São nossas vidas que correm perigo. Eles lutam pela família... E nós nos preocupamos com as nossas?