Capítulo 79
1789palavras
2022-12-27 10:49
- Desistir? – ele falou no meu ouvido. – Acha que isso é uma brincadeira, princesa? – ele foi irônico. – Eu sabia que você mentia, mas não pensei que chegasse a tanto.
- Você também me mentiu.
- Enfim, prazer conhecê-la, “prima”.
- Sei que você não tem coragem de me matar. – arrisquei.
- Pode tentar fugir e tirar a prova, priminha. Mas antes de você dar dois passos eu atiro em Estevan.
Olhei para Estevan, que me encarava apavorado com tudo.
- Atenção todos! – disse a voz feminina do topo da escada, conseguindo todos os olhares para si, enquanto a banda abandonava os instrumentos. – Não faremos mal a ninguém. Só queremos a princesa de Avalon... Nada mais.
- Não podem levá-la. – gritou Estevan. – Eu a encontrarei para onde quer que a levem.
- Posso tentar uma troca, Alteza. – ela disse.
Eu tinha certeza de que era Emy. Ela usava uma calça preta justa e camiseta da mesma cor. Seus cabelos escuros caíam sob os ombros e a touca preta cobria parte seu rosto. Ela usava duas armas, uma em cada mão.
- Aceito a troca. – disse Estevan. – Eu fico no lugar de Satini Beaumont.
- Não... – eu falei.
Jamais eu aceitaria aquela troca. Deus, o que eu havia feito. Já estava completamente arrependida do que havia proposto. Era para tudo dar certo, exceto o fato de que meu futuro marido era Estevan Delacroix. E eu sabia que ele faria qualquer coisa por mim.
- Obrigada, Alteza. – disse Emy. – Mas dou ao rei Stepjan a decisão de dar sua vida pela da sua filha.
Nenhum rebelde conseguiria chegar ao rei Stepjan, pois ele tinha praticamente toda a guarda o protegendo com suas vidas. Eu só tinha Alexander, que no momento estava tão em apuros quanto eu.
Todos os olhares se voltaram para Stepjan Beaumont, e a esta altura ninguém continha os repórteres, que filmavam, talvez até transmitindo ao vivo, tudo que acontecia no baile real de Avalon.
- Eu pago o que for preciso por minha filha. – disse Stepjan.
- Não é questão de dinheiro, Majestade. No caso a troca é a seguinte: ela fica e você vai conosco.
Ele não respondeu. Acho que Emy lhe deu um tempo. Eu tinha certeza de que se realmente minha vida dependesse da decisão dele, eu já estaria morta.
- Pode responder agora, Majestade. – disse Emy. – Afinal, todos de Avalon e talvez de algumas partes do mundo aguardam a sua decisão. – ela disse ironicamente.
- Podem levar a princesa. – ele falou em alto e bom tom. – Eu a resgatarei em horas, talvez minutos.
- Pode ser tarde demais... Ela pode estar morta. – disse Estevan. – Você... Não pode fazer isso.
- Decisão tomada, Majestade. – gritou Emy. – Vejam bem, povo de Avalon: o rei escolhe sua vida e não a da filha. Sinceramente, eu não esperava nada diferente de Vossa Majestade.
- Como eu disse, a resgatarei. – ele disse tranquilamente.
- Espero que tenha certeza de que ela não será morta assim que deixarmos o castelo.
- Vocês não tem como deixar o castelo. – ele garantiu.
- Tragam a princesa. – gritou Emy. – Que o mundo saiba quem é Stepjan Beaumont, um rei que entrega a filha aos rebeldes, enquanto se mantém seguro.
Samuel andou para trás, indo até a escadaria, me levando de costas, com meu corpo grudado ao dele enquanto um braço me segurava pelo peito. A arma ainda era apontada para minha cabeça e eu senti medo. Sabia que ele estava com raiva, se sentindo traído não só por eu ser a princesa de Avalon, mas por ver Estevan ali.
- Eu vou resgatá-la, onde quer que você esteja. – li os lábios de Estevan tentando me tranquilizar.
Tentei seguir tranquila, embora meu corpo estivesse tremendo. Os guardas reais se atentaram em proteger o rei e alguns poucos tentaram sacar suas armas, mas foram rendidos. Parece-me que todos sabiam que a única função era proteger Stepjan.
Subimos o primeiro degrau, eu ainda de costas para a escada, quando alguém começou a gritar, com a arma em punho, atravessando o salão no corredor que as pessoas abriram espaço no centro da pista de dança.
Conforme ela ia chegando mais perto, eu identifiquei Isabella. Não havia como não reconhecê-la pelos seus olhos. E não era pela cor... Era pela fúria. Ela apontou a arma na minha direção:
- Sua mentirosa. Como conseguiu ser tão fria para planejar tudo isso?
- Isabella, não! – advertiu Emy.
- Ela mente... Não podemos levá-la. Enganou a todos nós. É mais fácil levarmos o amante dela se quisermos algo... A família real dele talvez faça algo para salvá-lo. Mas perceberam que nem o próprio pai a quer viva? Ela não vale nada... Como vocês puderam ser tão manipulados por ela?
- Jogue a arma, Isabella. – gritou Emy. – No chão, agora!
- Nem pensar. Vou livrar Avalon de ter uma rainha mentirosa e promíscua como Satini Beaumont. Ou seria Satini Kane?
- Pare agora, Isabella. – gritou Sam e eu senti o coração dele batendo forte nas minhas costas e seu braço tremeu enquanto me segurava.
- Não vou fazer nada com você, meu amor. – ela disse e percebi na voz que ela chorava. – Mas não posso deixá-la roubá-lo de mim...
Antes que qualquer um pudesse agir, ela atirou. Naquele segundo, Samuel me largou. Mas embora eu soubesse que tinha que fugir, fiquei imóvel. Tudo foi tão rápido... Mais parecia um filme de terror passando lentamente na minha cabeça. Então o que eu vi foi Alexander se jogando sobre mim. Eu caí sobre os degraus acarpetados sentindo o peso do corpo dele. Samuel me puxou pelos braços, fazendo com que eu saísse debaixo dele, enquanto via o sangue no corpo de Alexander, que não se moveu. As lágrimas embaçaram minha visão a partir daquele momento. Senti os braços de Samuel me envolverem enquanto ele me colocava sobre seus ombros.
- Me largue... Ele está morto... – eu gritei desesperadamente. – Vocês o mataram.
Samuel andou rapidamente, segurando-me enquanto eu tentava me soltar com toda minha força. Vi soldados reais adentrarem pela porta lateral, com escudos protetores à prova de balas, todos envolvendo os reis, protegendo-os ainda mais. O mesmo fizeram os membros da Coroa Quebrada, todos montando um escudo com o próprio corpo para proteger a futura rainha e príncipe de Avalon. Assim que todos passaram pela porta, ela foi trancada imediatamente pelo lado de fora, com grandes barras de ferro.
O que eu havia feito? Eu era a culpada por toda aquela tragédia... E por ter perdido Estevan.
- E Isabella? – perguntou Samuel.
- Isabella fica. – disse Emy firmemente. – Ela não seguiu o plano. E nos traiu.
Dizendo isso ela andou pelo corredor, sabendo exatamente para onde ir dentro do castelo de Avalon, que um dia foi seu lar.
E eu desisti de tentar fugir dos braços fortes e firmes de Samuel. Eles seguiram rapidamente pelo caminho que eu bem conhecia: a Biblioteca. E então Emy Beaumont seguiu pelo primeiro corredor de livros, onde arredou uma das estantes e lá estava ela: a porta secreta.
Todos foram entrando de forma alternada e rápida. Assim que entramos no túnel, Samuel me largou no chão e eu olhei para trás. Não tinha mais como voltar. Eu estava fodida.
Ele me empurrou levemente para que eu andasse. Segui à frente, descendo as escadas íngremes de pedras. O túnel era iluminado com lâmpadas no teto e tinha espaço para uma pessoa passar com folga. Não chegava a ser apertado, mas pelo número de pessoas que estavam ali naquele momento havia muitos ecos e os sons incomodavam um pouco e me deixavam zonza. Ouvi a porta ser trancada e olhei para trás, onde a biblioteca deixava a minha visão.
- Como sabem que não descobrirão por onde viemos? – perguntei para Samuel.
- A estante de livros está junto da porta. Não há vestígios de onde entramos ou saímos.
- Sam, eu acho que Alexander morreu...
- Quem teve a ideia de invadir o castelo de Avalon? – ele perguntou enquanto seguia atrás de mim.
Eu não conseguia evitar as lágrimas. Culpa... Era só isso que eu sentia.
- Como você pode ser tão mentirosa? E enganar todos nós desta forma?
- Eu não enganei todos vocês...
Emy sabia a verdade. Mas ela havia pedido que eu não contasse a Samuel. E eu cumpriria o acordo, até porque eu vi muito bem o que ela fazia com quem não obedecesse a suas ordens. Então eu não falaria a verdade. Deixaria que a mãe dele fizesse isso quando achasse que fosse a hora.
Depois de um tempo paramos de descer os degraus e o corredor ficou em nível reto, o que me deixou mais tranquila para continuar o caminho. Minhas pernas já doíam e eu sentia meu corpo pesado. Estava cansada e com medo e ainda sentia o olhar de raiva de Samuel sobre mim.
Não vi mais Emy. Imaginava que ela estivesse lá na frente, liderando o grupo. Eu tinha tantas perguntas, mas Samuel não estava nada disposto a conversar comigo. Então preferi ficar calada e seguir as ordens. Eu já nem tinha certeza se eu fazia parte do plano ou se realmente estava sendo prisioneira.
Agora eu só pensava em Estevan. Ele estava na minha casa, enquanto eu cada vez mais longe. Por que o destino fez aquilo conosco? Por que não conversamos mais? Teria sido tão fácil se descobríssemos tudo desde o início. Quanto sofrimento poderia ter sido evitado... Quantas lágrimas eu derramei por ele. Estávamos juntos sem saber que o destino havia decidido que seríamos marido e mulher antes mesmo de nascermos. Ele tentou me contar... E eu decidi que não queria saber. Fui imatura. Pensei só em mim mesma. Deveria ter ouvido o que ele tinha a me dizer. Deveria ter falado a verdade sobre mim. Mas não... Preferi ficar fazendo sexo do que falar. E agora sofria as consequências das minhas decisões.
E Alexander? Meu coração estava destruído por ele. Vi ele se jogar sobre mim, para me proteger. Sim, ele sempre disse que sua função era me proteger... Ele foi designado para aquilo. E assim o fez. Mas jamais pensei que fosse levar um tiro por mim. Ele me salvou. Eu só estava ali, viva, andando por aquele túnel que tanto desejei descobrir, por ele. Como eu saberia se ele havia sido socorrido, se estava bem, se não estava? Meu Deus, eu precisava de ajuda. Eu mal conhecia aquelas pessoas. Havia estado com Samuel algumas poucas vezes.
Se Alexander morresse eu nunca me perdoaria.