Capítulo 55
2007palavras
2022-12-27 10:34
- Pois então... Quem sou eu para tentar acabar com todos os problemas de Avalon, não é mesmo?
- Não estou falando que Vossa Alteza não consegue... Mas estou tentando fazê-la entender que não pode carregar esta responsabilidade nas suas costas. É muito jovem para isso.
Antes que eu pudesse responder, apareceu Alexander. Ele ainda estava mancando de uma perna e com hematomas no pescoço e um corte na testa.

- Vai sair, Alteza? – perguntou parando ao meu lado.
- Não.
- Então... Por que está aqui?
- Vim combinar a próxima saída com Sean.
Percebi o olhar de desconfiança dele, que continuou:
- Estou aguardando seu chamado para a noite do final de semana.

- Creio que eu não vá chamá-lo, Alexander. Não vou sair.
- Não vai sair? - ele perguntou surpreso. – Isso seria... Por minha causa ou por que enjoou da noite de Avalon?
- Sua causa? Não entendi esta parte.
- No caso, me refiro a eu estar dirigindo o seu carro.

Eu ri:
- Eu diria que este poderia sim ser o motivo principal.
- Posso prometer me comportar.
- Não acho que você seja capaz disto.
- Mas foi me ver naquele dia.
- Eu? Não sei do que você está falando...
- Quando entrou na sala da minha mãe.
- Eu não fui ver você, Alexander.
- Acho que só não quer admitir isso para mim. Sei que se preocupou comigo. Vi o ciúme nos seus olhos quando percebeu que Beatrice estava junto de mim.
Eu o olhei perplexa. Ele realmente achava aquilo ou estava tentando me irritar? Eu poderia tentar dizer que não, que ele estava louco e que eu não tinha interesse algum nele e jamais teria. Limitei-me a dizer:
- Pense o que quiser.
Eu subi a escada que dava acesso ao primeiro andar e ele veio atrás de mim:
- Nunca será capaz de perdoar, Satini?
- Eu não sou Satini para você. Exijo que me chame de Alteza ou vou puni-lo por isso. Sabe de seu dever e respeito para comigo enquanto princesa deste reino e futura rainha. Ainda mais pelo cargo que ocupará no dia em que eu for coroada.
- Desculpe, Alteza.
Eu continuei andando e ele me seguindo:
- Poderá me perdoar algum dia?
- Não. – eu disse secamente.
Ele me puxou pelo braço, me fazendo parar. Eu poderia dizer que foi com violência, mas por incrível que pareça, daquela vez não foi. Senti os olhos azuis claros dele dentro dos meus.
- Alteza... Eu sou completamente apaixonado por você.
Se fosse há um tempo atrás eu poderia ter dó dele. Mas agora eu não sentia nada, embora não duvidasse dos sentimentos dele por mim. Eu juro que tentava entender a forma violenta dele de me amar, mas não conseguia. Porque para mim aquele tipo de amor não existia... Era o pior sentimento que poderia haver: possessão, obsessão, agressão.
Olhei para os lados e vi que o quase escuro corredor estava vazio e não vi nenhum guarda de prontidão. O empurrei até a parede, onde ele ficou escorado. Coloquei meus braços sobre ela, prendendo-o. Aproximei meu rosto do dele e deixei que ele sentisse o cheiro do meu perfume. Ele fechou os olhos e eu sabia que ele estava completamente entregue a mim naquele momento. Cheguei meus lábios tão próximos dos dele que quase se tocavam e disse:
- Eu não sinto absolutamente nada por você. Nunca, em toda minha vida, você irá me tocar.
Dizendo isso eu saí. Ele tentou ir atrás, mas ouvimos Sean atrás de nós:
- Alteza, quer que eu deixe o carro pronto para amanhã?
Eu sabia que ele não veio ali fazer aquela pergunta. Ele sabia que eu corria perigo com Alexander. Sean era esperto e tinha um instinto protetor comigo.
- Não, deixe pronto no domingo, Sean. Vou ver Sam.
- Sim, Alteza. Estarei pronto no domingo, no horário que quiser.
- Obrigada, Sean.
Eu saí e sabia que ele seguia meus passos enquanto Alexander ficou parado.
Limitei-me a ficar dentro do castelo por toda a semana. Encontrei Mia no sábado. Ela estava bem estranha. Falou pouco e perguntou menos ainda, sendo que eu sabia que ela não se calava nunca. Tentei puxar conversa sobre Théo para tentar entender o que realmente estava acontecendo, mas não obtive sucesso. O certo era que alguma coisa não estava certo com ela.
Senti-me um pouco culpada. Nos últimos tempos passei preocupada comigo mesma e acabei deixando minha amiga de lado. Até meus segredos eu passei a não mais dividir com ela, por medo e para tentar protegê-la. Eu não fui uma boa amiga desde que passamos a não viver mais trancafiadas no castelo de Avalon. Eu a compensaria na semana seguinte. Tentaria descobrir o que ela queria fazer para nos distrairmos juntas com algo. Os homens que havíamos conhecido nas nossas aventuras em Avalon estavam nos tirando do sério e nos afastando. Parecia que estávamos focadas só nisso. No meu caso ainda havia a rede de segredos e mistérios que ficava cada vez maior ao meu redor.
No domingo acordei tarde e fiz meu desjejum uma hora antes do almoço com meu pai. Geralmente não era servido nas refeições “em família” nada que me agradasse, então era melhor eu estar com o estômago cheio para não passar fome.
Coloquei uma roupa elegante, como uma futura princesa coroada deveria se vestir. E exatamente ao meio dia adentrei na sala de jantar real.
Meu pai já estava sentado em seu tradicional lugar, como se fosse um trono. Sentei-me e o cumprimentei cordialmente. Ele fez um aceno com a cabeça.
- Estamos esperando por Beatrice? – perguntei curiosa ao perceber que ela não estava ali.
- Não... Ela está com um mal estar e não nos acompanhará no almoço hoje.
Beatrice novamente me surpreendendo. Ou ela estava com medo de eu falar sobre o encontro entre ela e Alexander ou talvez quisesse realmente me ajudar de alguma forma. Mas por que ela quereria me ajudar? Beatrice não me conhecia. E eu vi ela transando com meu pai na parede da biblioteca e falando do quanto queria a coroa. E não ouvi ela dizendo que não queria dar um filho homem para ele. Então entre pensar que ela estava sendo fiel a mim, o que não teria motivos, ou a meu pai, optei pela segunda opção.
Parecia que a sorte estava a meu favor. Não havia ninguém presenciando nosso almoço naquele dia: nem Léia, nem Mia.
- Por que Léia não está aqui. – perguntei.
- Pediu para fazer algumas coisas pessoais hoje.
- Mia?
- Não sei... Acho que ela é sua dama de companhia e não minha. – ele jogou na minha cara.
Respirei fundo. Ature tudo quieta. Seja forte. Pense que a vingança contra Alexander vale qualquer sofrimento.
- Ainda neste mês seu futuro marido será coroado rei.
Olhei-o surpresa. Tão rápido assim? Ele nem teve tempo para sofrer a morte do irmão e já lhe jogariam esta responsabilidade nas costas?
- Tão cedo?
- O rei não está bem de saúde.
Nossa, quanta tristeza na família deste pobre jovem. Perdera o irmão há poucos dias e agora o pai doente. Tive pena dele, mas ao mesmo tempo sabia que eu não poderia fazer nada para ajudá-lo. Não casar comigo seria na verdade a melhor coisa que poderia acontecer a ele. Eu nunca seria capaz de fazê-lo feliz, pois eu procuraria Estevan por toda a minha vida.
- Em dois meses você se casará.
Eu o encarei e senti meu coração batendo desesperadamente dentro do meu peito. Senti uma sensação horrível tomando conta de mim, como se eu fosse desmaiar a qualquer momento.
- Dois meses? Mas isso é praticamente dois meses antes do combinado.
- Quatro meses são suficientes para você explorar Avalon com suas aventuras levianas e imprudentes.
- Como assim?
- Acha mesmo que não fico a par do que você faz ou deixa de fazer? Este reino me pertence.
- Achei que o senhor somente o governava. Avalon não pertence a uma pessoa em específico. O reino é do povo... A monarquia é só a forma de governo.
- Irá embora quando casar.
- Por que me quer longe?
- Não a quero longe. Ele é rei e não poderá ficar fora da sua nação.
- Por que eu devo ficar fora da minha? Também sou da realeza.
- Você só será rainha no dia que eu morrer. O fato de casar e ir embora não tira seu lugar na linha de sucessão.
- Será... Que eu poderia fazer um pedido?
Ele me olhou curioso:
- Como o de sair pelas ruas de Avalon como uma garota inconsequente, insensata e impulsiva?
- Eu... Gostaria de lembrá-lo que tenho apenas dezessete anos.
- E toda a responsabilidade de um reino nas costas. Se acha capaz de ser a rainha de Avalon quando tudo que a preocupa é o homem com quem estará na noite seguinte?
Engoli em seco. Parecia que Alexander fez um bom trabalho... Ou Sean. A estas alturas eu não sabia mais em quem realmente confiar. Eu estava num ninho de cobras e completamente sem saída.
- Eu gostaria que fosse apresentada ao príncipe com o qual irei me casar de uma forma menos tradicional.
- Como assim?
- Talvez um baile... Onde pudéssemos nos conhecer antes de nos vermos na igreja. Merecemos isso... Somos jovens. Não quero encontrá-lo somente na noite em que me casarei.
Ele pensou um pouco, por minutos que pareceram horas e disse:
- Podemos fazer isso. Talvez seja melhor para ele também. O rapaz está tão inseguro quanto você.
Senti meu coração batendo mais forte. Meu futuro marido tinha coração... E inseguranças como eu. Talvez ele não fosse uma pessoa tão horrível. Na verdade eu nunca pensei que ele pudesse ser um homem horrível. Eu sempre imaginei que ele era bondoso, principalmente depois que soube o quanto ele sofreu com a morte do irmão. Mas ele tinha um único defeito: ele não era Estevan. Só isso.
- O baile será dentro de um mês.
- Um mês? – perguntei atônita. – Mas o casamento será em dois...
- O casamento não é o baile, não é mesmo?
- Mas... Nos conheceremos um mês antes do casamento?
- Que diferença isso faz? Entendi que você queria conhecê-lo antes... Não era isso? Ou entendi errado?
- Sim, meu pai... Era exatamente isso. Só fiquei um pouco surpresa por conhecer meu futuro marido dentro de um mês. Eu não esperava... O tempo passou rápido, na verdade.
- Você sabia que seria assim... Desde que era ainda criança.
Eu ainda não me sinto uma mulher com todas as responsabilidades que quer que eu assuma neste momento meu pai, pensei.
- E... Quando poderei começar a organizar o baile?
- Pode começar quando quiser. Beatrice cuidará de tudo com você.
- Posso me retirar?
- Sim.
Quando passe por ele, voltei e disse:
- Meu pai, falando em Beatrice... Acho correto lhe contar que vi ela e Alexander numa situação um tanto quanto embaraçosa nesta semana.
- O que seria uma situação um tanto quanto embaraçosa? – ele perguntou me dando toda a atenção.
- Eu... Não me sinto muito a vontade para lhe dizer... Mas sugiro que abra seus olhos com relação a Alexander, ou poderá ficar sem Beatrice.
- O que você está tentando dizer? Seja clara, por favor.
- Ouvi de fonte segura que Alexander está interessado em Beatrice. E sei o quanto ele pode ser insistente e inconveniente, acredite.
- Dispensada.
Eu poderia ficar magoada pelo “dispensada”, como se eu fosse uma simples criada dele. Mas eu saí pela porta com um sorriso que quase não cabia no meu pequeno rosto. Eu acabaria com Alexander lentamente, um passo de cada vez... Até ele ficar completamente destruído. Matá-lo era pouco para o que ele havia feito. Ele sofreria como eu sofri, cada minuto, desde que ele passou a me guiar pelas ruas de Avalon, se achando meu dono.