Capítulo 30
1783palavras
2022-12-24 14:52
Samuel demorou a responder. Depois de um tempo, disse:
- Como eu posso confiar em você? Eu não a conheço.
- Eu também não conheço você, Samuel Leeter.

- Primeiro você me dá as informações. Depois eu decido se são importantes o bastante para que eu a leve comigo até a Coroa Quebrada.
- Qual seu medo?
- De você ser uma espiã do rei.
Eu ri alto:
- Olhe para mim... Tenho cara de espiã do rei?
- Tem... Por mais rica que você seja, nunca vi uma garota com um segurança pessoal tão empenhado quanto o seu.

- E eu lhe confessar que isso envolve sentimentos por parte dele, o que diria?
Ele riu ironicamente:
- Eu diria que é óbvio que já percebi.
- Ele é só uma pedra no meu sapato.

- E inexperiente... Completamente inexperiente. Se deixou dopar por uma garota...
- Ah, você também poderia ter caído nesta. – brinquei.
- Não... Eu não teria caído nesta. Geralmente sou eu que ofereço a bebida.
- E já usou isso alguma vez para alguma mulher?
- Não... Nunca precisei fazer isso com ninguém.
- Eu não queria fazer aquilo com ele, Samuel... Mas se não fosse assim ele jamais sairia de perto de mim.
- E quais as suas intenções pervertidas que ele não poderia estar presente?
- Acho que você percebeu. – eu sorri enigmaticamente, olhando para o corpo dele.
- Sabe que em alguns momentos eu acho que você está me usando, Satini?
- Acha que eu faria isso?
- Acho... E eu gosto de ser usado por você.
Eu ri:
- Samuel, você é incrível.
- E falta uma pergunta... E depois saímos.
- Outra? – perguntei curiosa.
- A pessoa que estava com você sentada no banco durante a manhã na Travessia.
Senti meu coração bater mais forte quando ele falou em Estevan. O que eu diria?
- O que você quer saber sobre ele?
- De onde vocês se conhecem?
- Ele... Deu-me o brinco que eu usava no meu nariz.
- Vocês... Tem ou tiveram algum envolvimento?
- Não. – confessei.
- Mas parecia haver interesse... Das duas partes.
- Você acha? – perguntei não sabendo se consegui evitar minha felicidade ao ouvir aquilo, ao ver que ele percebeu interesse de Estevan por mim.
- A forma como ele a olhava...
- O que tem?
- Deixa pra lá. Não gostei dele.
Eu ri:
- Acho que ele vai sobreviver a isto.
- Ele também conhece alguém do castelo?
- Eu sinceramente não sei.
- O que você sabe sobre ele então?
- Pouco... Muito pouco, Samuel.
- E por que se encontraram lá?
- Eu... Acho que foi o destino. Ou algo assim.
- Você está me deixando confuso...
- Eu sei... Também sou bem confusa com relação a ele.
- Achei que eu teria respostas mais claras.
- Não posso lhe dar respostas mais claras se nem eu as tenho.
- E Alexander?
- Quer saber se eu tenho interesse nele?
- Sim...
- Nenhum... Pelo contrário. Eu o repudio.
- Falou isso com muita convicção.
- Ele é o tipo de homem que me causa repulsa.
- Então é um a menos para mim. – ele riu.
Eu ri. Samuel Leeter não valia nada.
Ele pegou minha mão e abriu a porta que estava chaveada. Então saímos de volta para a pista de dança. Ele simplesmente me abraçou e deitei minha cabeça no ombro dele e fechei meus olhos, sentindo o cheiro dele entrando dentro de mim. Se eu dissesse que não gostava de Samuel e que ele não fazia meu coração bater descompassadamente eu estaria mentindo.
- Acho que precisamos marcar uma reunião de negócios. – ele disse no meu ouvido.
- Negócios? – perguntei curiosa.
- Os que você acabou de me propor.
- Onde e quando?
- Domingo à noite, no Rock Bar.
- Vai ser difícil convencer Alexander.
- Você sempre diz isso, mas consegue chegar aonde quer.
- E como vamos conversar com ele junto de nós? É quase impossível.
- E se marcarmos durante o dia?
Eu fiquei confusa. Alexander estaria em qualquer lugar e hora que marcássemos. E eu entendia que precisávamos estar sozinhos para falarmos sobre o que queríamos.
- Ok, no Rock Bar, depois de amanhã.
- Às vinte horas.
- Estarei lá. Quer que eu leve a coroa da princesa para provar que não estou mentindo? – ironizei.
- Não precisa. Vou saber se você mente ou não...
Senti um pouco de medo. Eu sabia que Samuel poderia ser tudo, menos idiota. Não era a toa que ele liderava metade de Avalon. Ele conhecia quase todo mundo e dava para perceber que era forte e decidido. Talvez alguma dia estaríamos governando cada um metade de Avalon. E eu não queria que aquilo acontecesse. Eu precisava de uma aliança.
Quando percebi, Alexander me puxou agressivamente.
- Vamos embora.
Ele não estava com Mia e nem com a garota que o acompanhava antes.
- Não me toque. – eu disse quase gritando.
- Acha mesmo que pode fazer isso? Se envolver com alguém que nem conhece?
- O ideal seria se envolver com você, não é mesmo? – falou Samuel ironicamente, se colocando na minha frente.
- Vai mesmo querer brigar comigo, garoto? – perguntou Alexander. – Olha para você.
Em pouco tempo as pessoas se afastaram de nós, prevendo uma briga. Fiquei confusa e sem saber o que fazer. Eu não queria prejudicar Samuel. E sabia o quanto Alexander poderia ser ruim, assim como sabia da arma que ele carregava na cintura e tinha autorização do rei para usar.
Quando vi, os barman’s pularam do bar e se juntaram a Samuel. Alguns outros homens também foram para o lado dele e até mesmo Théo apareceu correndo e se posicionou ao nosso lado. Alexander ficou confuso e amedrontado. Ele viu que estava sozinho.
- Você não pode tratá-la desta forma. É só o segurança pessoal dela... Nada mais. – disse Samuel.
- Ela lhe disse isso? – perguntou Alexander ironicamente.
Mia apareceu e ficou ao lado do irmão, confusa e sabendo que a situação estava bem ruim.
- Alexander, pare, por favor.
- Vai querer brigar ou resolvemos isso de outra forma, Alexander? – perguntou Samuel. – Sinceramente, eu não quero brigar. Eu geralmente evito. Mas quando eu entro numa briga, eu não perco.
- Acha mesmo que eu tenho medo de você, garoto?
- Garoto? Quantos anos você tem a mais do que eu? Se acha mais homem por ser alguns anos mais velho?
Então Alexander, encurralado, apontou a arma para Samuel. E eu me pus na frente dele imediatamente. Olhei nos olhos de Alexander e disse:
- Chega desta palhaçada. Eu não suporto mais o seu ciúme doentio.
Ele me olhou atônito, não esperando que eu me pusesse na frente de Samuel. Então eu fui até ele e peguei a arma de suas mãos, colocando-a dentro da minha bolsa.
- Vamos embora, agora. E porque “eu” decidi que agora é a hora e não porque você me amedrontou.
Segui sem olhar para trás e me encaminhei para a saída mais próxima. Sentia meu coração batendo tão forte que parecia que sairia de dentro do meu peito. Nem sei como eu consegui tirar a arma dele. Foi tão rápido. Não sei se ele foi pego desprevenido ou realmente me entregou porque quis. Enfim, quando passei pela saída, olhei para trás e vi que ele estava distraído enquanto Mia brigava com ele. Abri a bolsa e peguei a arma, jogando-a no canteiro por onde havia a rampa de entrada.
Fui até o subsolo, onde sabia que estava o carro e fique lá aguardando alguns minutos até que eles chegassem. Mia me abraçou e perguntou:
- Você está bem?
- Estou tentando ficar.
- Vou falar com nossa mãe hoje mesmo. Isso não vai ficar assim, eu prometo.
- Estou cansada, Mia... Muito cansada disto tudo.
- E agradeço por tentar suportar em nome de mim e minha mãe. Sei o quanto deve estar difícil para você, princesa.
Abri a porta e sentei no banco traseiro. Ela deu a volta por trás do carro e sentou ao meu lado. Alexander começou a dirigir e Mia puxou meu rosto para perto dela, me acariciando. Fechei meus olhos, aceitando o carinho da minha amiga. Mais uma vez Alexander havia acabado com a noite. E poderia ter sido trágico.
Quando ele estacionou na garagem dentro do castelo, aguardei até que ele abrisse a porta e desci.
- Onde está a arma? – ele perguntou.
- Geralmente você primeiro pede desculpas. – falei sarcasticamente.
- O que você fez com a minha arma?
- Joguei fora. – falei saindo.
Ele veio atrás de mim furioso e eu disse gritando:
- Se encostar em mim, eu acabo com você. Quer pagar para ver?
- A que ponto vocês chegaram. – falou Mia deixando as lágrimas rolarem por suas faces. – Há pouco tempo atrás brincávamos de casinha, de esconde-esconde dentro do castelo. E você sempre gostou dela, Alexander, sempre a protegeu como a mim. Como pode tratar nossa amiga, nossa irmã, nossa futura rainha deste jeito? Por que você tem tanto ódio de Satini desde que voltou para Avalon?
- Eu não odeio ela... – ele disse e eu vi uma lágrima rolando dos seus olhos.
Tarde demais para nós, Alexander. E eu não sou capaz de desperdiçar uma lágrima sequer com você.
- Alteza, está tudo bem? – perguntou um guarda de prontidão ao meu lado.
- Tudo bem, obrigada. Poderia me acompanhar até o meu quarto, por favor? – pedi.
Ele assentiu com a cabeça e o segui, sem olhar para trás. No domingo eu tentaria novamente falar com meu pai. A minha relação com Alexander estava ficando insustentável... Eu não queria que pudesse ficar ainda pior. Não em consideração a ele... Mas por Léia e Mia.
O guarda me deixou na porta do meu quarto. O que estava de prontidão no corredor veio até nós e perguntou:
- Está tudo bem, Alteza?
- Eu não gostaria que ninguém, além de Mia e Léia tivessem acesso ao meu quarto, por favor.
- Sim, Alteza. – ele disse. – Nem mesmo o senhor Alexander?
- Principalmente ele. – eu alertei. – E avise a quem mais ficar neste corredor de prontidão, por favor.
- Não se preocupe, será como Vossa Alteza deseja.
- Obrigada. Estão dispensados.
Os dois curvaram-se e saíram cada um para seu posto.
Entrei no meu quarto e passei a chave na porta. Fui imediatamente à lareira e peguei o diário de minha tia e sentei-me na cama, ansiosa, abrindo a primeira página.