Capítulo 80
2242palavras
2022-07-24 07:54
Quando desci naquela manhã para a empresa, a empregada me parou antes que eu saísse na porta:
- O senhor Welling a espera para o café da manhã, Juliet.
Olhei no relógio e arqueei minha sobrancelha, confusa:
- Você não me disse que ele não costuma tomar café da manhã em casa?
- Não costumava... – ela disse, sorrindo timidamente.
Fui para o cômodo onde eram servidas as refeições. Sentei ao lado dele.
- Está esperando por mim para comer? – perguntei enquanto me servia de leite.
- Claro, sou educado.
- Não deveria. Não costumo comer nada pela manhã. Então, se pretende continuar me assediando desta forma, não vai dar certo.
- Não estou assediando você agora... É só um café da manhã inocente.
- Inocente é quando deitávamos na minha cama e ouvíamos os CDs do TNT. Hoje não existe inocência entre nós.
- Voltou cedo ontem... Do seu encontro.
- Edu não é um homem demorado. – falei tomando o café quente que desceu quase queimando minha garganta.
- Então acha que eu sou?
- Se não fosse não teria deixado ele terminar o serviço que você começou. – falei pegando uma maçã e saindo.
Antes que eu chegasse na porta ele estava na minha frente:
- Não me provoque, rainha do drama.
- Não tenho medo de você. Pelo contrário, estou absolutamente segura. Afinal, você não gosta mais de mim, não me quer e...
Ele me trancou com seus braços no parapeito da porta e senti seu cheiro de shampoo misturado com perfume, que me deixava inebriada de desejo. O cabelo dele ainda estava molhado do banho e aquilo quase me enlouquecia.
- E... – ele disse aproximando o rosto do meu.
- E eu sou uma mulher comprometida... E já tenho um amante. Não preciso de dois.
Ele riu:
- Como você consegue ser tão imatura?
- Me solte.
- Só se você me der um beijo.
- Nem morta.
- Achei que ontem significou algo para você.
- Significou sim... Sexo... Não terminado.
- Quer terminar agora?
- Não... – menti, quase dizendo sim, louca para ele tirar minha roupa ali mesmo.
- Em poucos dias deixou de me amar, Juliet? – ele perguntou ironicamente.
- Nick, alguém mordeu seu lábio. Está bem feio. Se eu fosse você dava um jeito de tapar isso. Não se olhou no espelho hoje?
- Olhei... Não me importo. E você, se olhou? – ele perguntou tocando no meu pescoço.
- Aqui não... – falei confusa.
- Alguém chupou seu pescoço... Está bem feio. Se eu fosse você dava um jeito de tapar isso. E não foi seu novo namorando, amante ou seja lá do que você o chama. – ele disse sarcasticamente.
- Preciso ir... Não quero me atrasar.
- Seu chefe não se importará, eu tenho certeza.
- Você não é o meu chefe.
- Não? – ele riu.
- Não...
- Me responda a pergunta... Deixou de me amar nestes poucos dias?
- Você deixou de me amar estes seis anos, Nicolas? – perguntei olhando nos olhos dele.
Ele descansou a cabeça sobre a minha. Fechei meus olhos, ouvindo o coração dele bater forte. Senti tanta vontade de abraçá-lo, mas resisti, apertando a maçã até quase esmagá-la.
- Eu gosto do seu cheiro. – ele disse, sem se mover.
- Resposta errada, Nick. – falei, me desvencilhando dele.
- Ei, eu posso lhe dar uma carona.
- Não se incomode. Tenho um motorista para me levar. – pisquei meu olho e saí.
Não seria tão fácil assim para ele. Não depois de tudo que ele me fez, tanto agora quanto no passado. Achava o que? Que mandaria investigarem a minha vida, me traria do fim do mundo para perto dele e se vingaria de mim? Eu errei, mas ele também. Deixou-me sozinha quando eu mais precisei dele. E eu não seria tão fácil... Ao menos não confessaria mais meu amor, até saber realmente o que ele sentia.
Se eu faria sexo com ele? Ah, isso era outra coisa. Sexo era sexo, amor era amor. Se eu poderia fazer sexo com qualquer pessoa sem compromisso, por que com ele não?
Além do mais, a noite passada não foi sexo... Foram só preliminares e um sexo começado e não acabado. Mas ele havia dito que poderíamos repetir. Então eu esperaria pelo repeteco... Com final.
Eduardo me esperava no carro. Abriu a porta para eu sentar atrás, mas eu fechei e sentei ao lado dele.
- Você está linda hoje, senhorita... Ou seria senhora? – ele riu confuso.
- Nem eu sei... – revirei meus olhos. – Estou tão confusa... Sei que devo explicações para Tom, mas é como se eu não estivesse mais com ele.
- Se não terminou oficialmente, ainda está.
- Mas eu disse no telefone que não dava mais.
- E ele aceitou terminar um relacionamento de cinco anos por telefone?
- Não... Claro que não.
- Relaxa, Juliet.
- Eu não consigo. Acho que nunca consegui. Sempre fui assim...
Ele riu:
- Tom não sabe o que vai perder.
- Ah, eu aposto que ele sabe sim. E vai tentar de todas as formas mudar o inevitável. Mas desta vez não adianta...
Chegamos no prédio da empresa. Desci e fechei a porta:
- Até daqui a pouco.
- Estarei esperando ansioso.
Nicolas chegou minutos depois de mim. Eu estava conversando com Eliete e nem havia chegado a entrar na minha sala ainda.
- Precisamos de uma reunião urgente. – ele me falou, indo para a sala dele.
Eu o segui e esperei até que ele sentasse em sua cadeira.
- Aconteceu alguma coisa?
- Sim... Temos muitos novos investidores.
- Você não precisa de mim para isso. Achei que era algo importante.
- É importante.
- Pelo que eu sei só você cuida disso pessoalmente.
- Agora quero que você cuide também.
- Não é minha função.
- Pode ser. Posso pagá-la para isso.
- Não quero ser uma empregada sua... Nem por todo dinheiro do mundo.
- Por que, se aceita ser de Tom?
- Não vou ser mais, Nick. Assim que Tom voltar, tudo estará acabado entre nós e eu vou voltar para casa.
- Você não pode fazer isso.
- Está se referindo a eu terminar com Tom ou voltar para casa? – perguntei ironicamente.
- Você sabe sobre o que me refiro.
- Eu vou voltar, Nick. Em breve.
- Por favor, me ajude com o que lhe pedi. Não precisa trabalhar para mim se não quiser. Só preciso mesmo da sua ajuda.
- Ok...
Sim, não me custava ajudá-lo. Fui para minha sala e Eliete me acompanhou. Em menos de cinco minutos ele estava lá, com várias pastas, sentando ao meu lado. Ele começou a me mostrar os documentos e acabei me envolvendo no trabalho com ele. Analisei tudo e perguntei:
- Nick, estas propostas de compra de ações são bem mais altas do que realmente valem. Por que você não quer vender? Sinceramente, não entendo.
- Acho que tenho ciúmes do meu Resort.
- Por que vendeu para Tom?
Ele me olhou e ficou em silêncio.
- Envolveu Tom nisso só para me ferir? Como foi capaz? Não digo por ele, mas por dar parte disso a ele... Sendo que tantas pessoas queriam. Agora eu me vou... E você ficará preso a ele pelo resto da sua vida. – lamentei sua ignorância.
- Eu... Acho melhor sair... – falou Eliete enquanto ele me encarava, sem dizer nada.
- Você fica, Eliete. – eu disse firmemente. – Quanto os outros pequenos acionistas tem, afinal?
- Todos juntos nem 30%.
- Você já pagou todos os investidores?
- Quase todos.
Alguém bateu na porta e Eliete foi abrir enquanto eu continuava concentrada nos lucros absurdos que era aquele resort dele.
- Juliet, são para você. – disse Eliete me entregando um lindo buque de flores.
Olhei para as rosas coloridas: brancas, amarelas, vermelhas e cor de rosa.
- Quem dá um buquê para uma mulher que odeia flores? – Nicolas perguntou olhando eu pegar as flores.
- Eu não sei se odeio tanto assim... – falei pegando o pequeno cartão. – É diferente... Nunca vi um buque de rosas com tão diversas cores.
Ele andou com a cadeira até o meu lado, sem levantar. Abri o cartão com ele ao meu lado. Não me preocupei em ele ler. Pelo contrário, fiquei feliz que ele estivesse ali.
“Rosas coloridas para minha amiga colorida. Edu”.
- Simples e original, como ele. – falei fechando o cartão e olhando admirada para as flores.
- Que ridículo. – ele disse. – Deixe seu marido ver este bilhete.
- Tom não é meu marido.
- Deixe o homem que mora e dorme com você há cinco anos ler este bilhete. – ele disse sarcasticamente. – Aliás, por que não manda uma foto para ele? Aposto que vai gostar de ver o motorista literalmente dando em cima da mulher que diz não ter nada com ele.
- Que parte de “você não tem nada a ver com isso” não entendeu, Nicolas?
Ele levantou:
- Para mim chega desta palhaçada.
Saiu e bateu a porta. Eliete me olhou:
- Acho que o motorista vai ter problemas.
- Vai nada. – falei tranquilamente.
O dia passou e eu fiquei envolvida na análise dos documentos. Meu telefone vibrou e tinha mensagem de Tom:
“Dei um tempo para você se acalmar. Espero que esteja mais tranquila. Estou morrendo de saudades, gatinha. Em breve estou de volta. Levando muitos presentes. Amo você.”
- Eliete, em breve eu não estarei mais aqui. – avisei.
- Achei que você ficaria. – ela disse.
- Não... Tom é o acionista. Eu vim ajudá-lo, organizar tudo e partiria da mesma forma. Mas algumas coisas mudaram no caminho... E no fim, ele ficará responsável por tudo... Porque pertence a ele. E sinceramente, não sei como ele fará, mas tenho certeza que dará um jeito. Creio que logo você trabalhará com outra pessoa.
- Creio que não, Juliet. Quando você não estiver mais aqui, eu volto a trabalhar diretamente com o senhor Welling. Eu sou a secretária dele. Só fiquei emprestada para você.
- Enfim... Você é uma ótima profissional.
- Vou lamentar sua partida. Gosto mais do senhor Welling quando ele está perto de você.
Eu ri:
- Eu também.
- Vai realmente deixá-lo?
- Não é sobre deixá-lo. Eu sabia que era provisório desde o início. Assim que eu e Tom tivermos terminado, eu não terei mais nada a ver com este lugar.
- Poderia trabalhar para o senhor Welling.
- Eu nunca faria isso. Eu e Nick não poderíamos trabalhar juntos... Por vários motivos, eu garanto.
- Mas já estão fazendo isso. E me parece que está dando certo.
- Não trabalho para ele... Trabalho com ele. É diferente.
- Quer que eu mande levar as flores para sua casa? – ela perguntou.
- Não tenho casa... E não gosto de flores. Mande colocar num vaso e deixar aqui mesmo.
Organizei minhas coisas, peguei minha bolsa e saí. Eu sentiria saudade de tudo ali. E do Resort também, embora eu pouco conhecesse. Mas cada vez estava mais próxima a minha partida. Não havia mais sentido em ficar ali quando Tom chegasse. Na verdade, eu poderia partir naquele exato momento se quisesse, que não faria diferença. Eu poderia terminar com Tom na nossa cidade. Mas eu sabia que era difícil... Por Nicolas estar envolvido. A vida dele era ali agora... Ele era muito, mas muito rico. E eu fiquei tão feliz por ele... Nunca pensei que quando conheci o meu Nick, oito anos atrás, ele seria tão bem sucedido. Eu sorri sozinha... O que esperar do senhor perfeito? Nada menos que aquilo. Ele merecia. Sempre foi esforçado. Gostava de estudar, era focado, trabalhou sozinho a vida toda. Nem a moto ele comprou com ajuda do pai. Usava táxi e o carro de Otto emprestado para não ocupar a família. E hoje estava ali, dono da porra toda, fruto do seu trabalho. Eu tive orgulho dele. Diferente de Tom, que nasceu rico e só manteve os negócios da família.
E eu? O que eu fiz da minha vida? Eu era inteligente. Formei-me com menção honrosa, com as melhores notas do meu curso ao longo de todo o período da faculdade. Mas abandonei meus sonhos no meio do caminho. Usei o dinheiro de Tom para estudar. Perdi tudo que me foi dado ao entregar para o ladrão do meu pai. Havia planejado trabalhar e usar do meu próprio dinheiro para me sustentar e pagar meus estudos. No fim, aceitei a vida fácil que Tom me proporcionou. Vendi-me por tão pouco... Por estar completamente dilacerada por dentro. Eu estava tão frágil que ele poderia ter feito qualquer coisa comigo. E foi o que ele fez.
Quando retornasse para minha casa, eu sentaria e pensaria no que fazer da minha vida. Eu só tinha uma certeza: eu queria minha vida de volta. Talvez voltasse a morar com Otto. Já havia passado seis anos. A casa havia mudado... Era hora de superar a morte da minha mãe... E me inocentar da culpa que eu trazia dentro de mim.
Assim que cheguei na frente da empresa procurei por Edu e não encontrei-o.
- Ele não virá mais. – dei um salto ou ouvir Nicolas ao meu ouvido.
- O que... Você fez com ele?
- Demiti.
Olhei para ele furiosa e incrédula.