Capítulo 79
1948palavras
2022-07-18 05:25
- O que aconteceu? – Edu me perguntou enquanto nos dirigíamos para o jipe.
- Uma boa conversa sobre o passado. – falei.
- Ele gosta de você.
- Você acha?
Ele me encarou:
- Você sabe disso.
Fiquei calada. Eu não tinha certeza. Até pouco tempo atrás achava que ele só queria me destruir e se vingar. Depois de hoje eu já não tinha mais certeza.
- Edu, me desculpe pelo que houve. – falei.
- Para onde vamos? – ele perguntou.
Suspirei e confessei:
- Sinceramente, perdi a vontade de fazer qualquer coisa hoje. Sinto muito.
- Tudo bem.
Ele ligou o carro enquanto fez o caminho de volta.
- Eu não quero que você se prejudique por minha causa, Edu.
- Eu não estou me importando mais. – ele disse. – Confesso que no início me preocupei um pouco. Agora acho que realmente preciso arriscar mais.
- Como assim?
- Eu nem gosto deste emprego. Se for demitido talvez faça algo que me deixe mais feliz. Gostei de você, Juliet.
- Eu também gostei de você... Mas eu estou tão enrolada, Edu.
- Imagino. Casada com um, apaixonada por outro.
Olhei para ele confusa. Era tão visível assim?
- Não acho mais que os rumores que circulam pelo Paradise sejam tão mentirosos.
- Boa parte são, eu garanto.
- Posso continuar participando disso, mesmo arriscando meu belo pescoço.
- Por que faria isso? Quer dinheiro? – perguntei decepcionada quando ele parou na frente da casa de Nicolas.
- Porque você é linda...
- Isso não me convence, Edu.
- E porque sei que você é muito boa no que faz... Estou falando dos negócios. Minha mãe tem um pequeno restaurante na beira da praia, próximo do resort. Ela tem um sócio. E achamos que ele pode estar roubando ela.
- Onde eu entro nisso tudo?
- Você analisa os documentos e me confirma se ela está sendo roubada ou não. Em troca, me chama para fazer ciúmes ao senhor Welling quando quiser.
Eu ri:
- Você está falando sério?
- Estou. Inicialmente achei que você estava dando em cima de mim...
- Eu estava. – confessei. – E realmente disposta a mudar o rumo de tudo... Mas daí ele começou a ficar muito enciumado. E isso me deu esperanças, entende?
- Ele só tem olhos para você. Duvido seu marido não ter se dado conta disto.
- Tom não observa nada... Só o que ele quer. – falei. – Foi um casamento difícil. Confesso que logo no início, no primeiro ano, não foi tão ruim. Ou talvez eu tenha me deslumbrado tanto com a vida que ele me proporcionava que preferia não ver a verdade. Com o tempo percebi que odiava tudo que Tom fazia. E chegar aqui me fez ver que não importa onde estejamos, ele nunca vai mudar. Eu simplesmente me anulei completamente ao lado dele.
- Não a vejo desta forma.
- É que quando você me conheceu, eu já estava abrindo os olhos... Ou melhor, tomado do meu remédio, ainda em doses homeopáticas. – eu ri.
- Acho que sei qual é o seu remédio. Mas fique esperta... Seu remédio é também o remédio de muitas outras mulheres do Paradise Resort.
- Eu sei disto.
- Ainda assim, ele nunca se envolveu oficialmente com ninguém.
- E Joana?
- Faz anos que ela tenta ser oficialmente a namorada dele.
- De onde ela é? O que ela faz?
- Não sei muito sobre ela. Somente que é uma mulher que sabe o que quer. E que está sempre na cola do senhor Welling. Ela é de Paraíso. Mora próximo do Resort. Comentam que ela ficou rica há pouco tempo. A família mudou de vida do nada.
- Ela entrou na vida de Nicolas depois que já era rica?
- Isso eu não sei...
- Bem, isso não importa. Também não vou abusar da sua generosidade, Edu.
- Quando posso lhe trazer os papéis?
- Qualquer hora que quiser. Sou boa no que faço e prometo dizer a verdade sobre os negócios da sua mãe. Traga-me tudo que conseguir para eu poder analisar.
- Obrigado, Juliet.
- Eu que agradeço. Por tudo... Você foi um ótimo amigo. Se não fosse você, não sei o que teria sido de mim. Aquele dia que passei com você me acordou de um sono profundo, acredite.
- Negócios são negócios. Mas se quiser qualquer coisa de mim, além dos negócios, saiba que estou disponível. – ele sorriu e piscou. – Já ouviu falar em sexo sem compromisso?
- Já. – eu disse.
Eu dei um beijo nos lábios dele, sem abrir minha boca. Fui me afastar e ele me puxou, tentando colocar a língua dentro da minha boca. Inicialmente aceitei, mas logo fugi.
- Não dá. – confessei. – Trair uma pessoa já é difícil, mas trair duas é pedir para ser apedrejada em praça pública.
Ele gargalhou:
- É isto que eu gosto em você. E posso apostar que eles também.
Desci sem entender direito o que ele tentava me dizer. Abri a porta e retirei minha sandália, deitando no sofá e fechando meus olhos, tentando não pensar em Nicolas Welling e em tudo que havia acontecido entre nós dois minutos atrás.
Não levou dez minutos e ouvi a porta se abrindo com risadas alegres de Otto e Nicolas. Não abri os olhos, deixando aquela felicidade me invadir. Era como se eu pudesse voltar a ser feliz de novo, mesmo sem a presença da minha mãe.
- Cara, quem deixou você jogar suas sandálias pela sala e ficar com os pés sujos no meu sofá? – perguntou Nicolas.
Abri os olhos e disse:
- Eu não sou “cara”.
- Juliet, quem deixou você jogar suas sandálias pela sala e ficar os pés sujos no meu sofá?
- Se está achando ruim, encontre uma casa para mim, Nicolas. Enquanto isso, aqui é meu lar. E faço nele o que eu quiser.
- Desculpe os maus modos de minha filha, caro senhor Welling. – disse Otto vindo até mim e me puxando pela mão.
- Eu já estou acostumado, Otto. Aliás, seu encontro com o motorista devia estar péssimo, já que está de volta tão cedo.
- Tive uns probleminhas, confesso. Mas não vão atrapalhar meu relacionamento com o motorista.
- Probleminhas? Eu que tive “probleminhas” e não você.
- Dá para perceber que você teve uns probleminhas, Nicolas. E sinceramente, espero que sua boca esteja assim porque você tenha mordido ela no lugar da comida e não que tenha sido causado por uma mulher, principalmente minha inocente Juliet. – disse Otto.
- Juliet, inocente? – Nicolas riu. – Você só pode estar brincando.
- Ah, Nick, você sabe que sou sim. – falei docemente.
- Quero ver você explicar ao mundo, caro senhor Welling, o que aconteceu com você. Bendita hora que acabei com aquela palhaçada. – disse Otto. – Temo que alguém poderia ter saído machucado e não só emocionalmente.
Eu comecei a gargalhar olhando a boca inchada de Nicolas. Otto me olhou e depois disse para Nicolas:
- Obrigada por trazer nossa Juliet de volta. – ele falou com os olhos cheios de lágrimas. – Ver o sorriso feliz no rosto dela novamente não tem preço.
Sabíamos muito bem do que ele falava, mas ficamos todos em silêncio.
- Vamos... – puxei Otto pela mão, subindo as escadas. – Precisamos conversar seriamente, pai.
- Otto, quanto tempo você vai ficar? – Nicolas perguntou enquanto subíamos.
- O tempo que ela precisar de mim. – ele disse firmemente.
Assim que chegamos no quarto de Otto, que era na frente do meu, eu deitei na cama.
- Você tem algumas coisas bem importantes para me contar, mocinha. –ele disse tirando o calçado e sentando na poltrona de frente para a cama, ao lado da porta da sacada.
- Ainda bem que você está sentado, pai. Porque vou começar lá do começo... Há cinco anos atrás.
E assim lhe contei tudo sobre desde que fui morar com Tom, não ocultando nenhum detalhe que até então ele não sabia. Quando acabei, não sei exatamente quanto tempo se passou, ele me olhou e disse:
- Ligue agora para Tom e acabe isso imediatamente.
- Pai... Eu vou esperar ele voltar.
- Ele não merece nenhum tipo de consideração da sua parte. O que você vai esperar? O dia que ele vai bater em você?
- Pai, se ele realmente fosse me bater, já teria feito. Fiquei com ele cinco anos.
- Minha vontade é dar umas porradas na cara dele. Como você conseguiu se envolver com um homem que usa drogas, Juliet? Sua mãe sempre a alertou, fez todo o possível para proteger você disso. Ela tinha tanto medo que de alguma forma você acabasse conhecendo seu pai e ele lhe levasse para o vício.
- Eu não era tão idiota, pai.
- Tem certeza? – ele perguntou ironicamente.
- Tá bom... Um pouco. Simon realmente me enganou. E eu fui não só idiota, mas também burra.
- Então a primeira vez que você viu Tom usando cocaína, devia ter ido embora. Por que não o fez?
- Eu não sei, pai...
- Me dê os seus cartões.
- Como?
- Seus cartões... Todos. Débito, crédito, qualquer um que tenha sido dado por Tom e que você usa para comprar.
- Mas...
- Agora.
Eu levantei e fui para o meu quarto, pegando a carteira da minha bolsa. Retirei cartão por cartão de dentro dela, fazendo uma fileira na cama.
Otto foi quebrando um por um. No início doeu um pouco o meu coração. Depois percebi que eram só plásticos, que me traziam coisas das quais eu não precisava. Bens materiais já não me satisfaziam. Eu queria viver, sem medo, gritando, dando risada, comendo o que eu queria, bebendo o que eu queria, com amor... E sendo feliz. Comecei a ajudá-lo a quebrar.
- Isso é terapêutico. – falei.
- Imagino... – ele disse sarcástico.
Depois que quebramos todos, ele jogou no lixo.
- Precisamos voltar para casa. Aqui não é seu lar. Seu lar é onde sua família está.
- Pai... Eu não tenho certeza se quero ir... Porque “ele” está aqui. – confessei.
Ele suspirou profundamente:
- Quando vocês dois vão crescer?
- Já crescemos.
- Não... Não cresceram.
- Acha que a gente cresce quando completa trinta anos?
- Acho que seria velha demais para crescer aos trinta. Mas se já está com 26 e ainda está em processo, não duvido que com você aconteça depois... Muito depois do tempo. – ele riu.
- Acha que Nicolas cresceu?
- Acho Nicolas pior que você às vezes.
Deitei na cama e coloquei minha cabeça sobre meus braços cruzados:
- Eu já disse que daqui há quatro anos vou casar com Nicolas?
- Como assim?
- É isso mesmo que você ouviu. – reafirmei.
- E Nicolas sabe disto?
- Claro que ele sabe.
- Meu Deus, vocês dois são completamente loucos. E espero que não me deixem louco também.
- Acha que ele me ama ainda?
Otto gargalhou:
- Se eu acho que Nicolas ama você ainda? Eu acho que ele ama você ainda mais do que quando vocês eram adolescentes.
- É possível amarmos só uma vez na vida? Ou acha que é possível amar duas?
- No meu caso, nunca vou amar alguém mais do que amei sua mãe.
- Eu acho que nunca vou amar alguém como amo Nicolas.
- Mas sua mãe amou seu pai um dia. Mesmo o odiando depois, houve amor antes do ódio. E eu sei que ela me amava também. Então eu posso afirmar que Olga amou duas vezes.