Capítulo 63
2127palavras
2022-07-15 20:03
Naquela tarde, depois da aula, fui para o Shopping. Comprei o quanto minhas mãos e braços puderam carregar. Depois de lotar o carro, me encaminhei para o apartamento. Pedi para o porteiro me auxiliar a subir com tudo.
- Eu gostaria de saber onde você coloca tudo isso, senhora Juliet. – ele sorriu.
- Estou pensando seriamente em retirar as coisas de Tom do closet. – falei piscando o olho para ele.
Tive um pouco de dificuldade para abrir a porta usando meu polegar. Assim que ela abriu, falei:
- Tom e suas invenções. Nem sempre esta coisa lê minhas digitais.
- O senhor Panetiere sempre foi muito preocupado com questões de segurança.
- Senhor Lou... Seria abusar de sua gentileza pedir que deixasse tudo lá em cima, no meu quarto?
- Claro que não, senhora Juliet. Sou pago para isso.
Ele subiu as escadas atrás de mim e deixou tudo na porta do closet. Deixei que a empregada o conduzisse até a saída e deitei na cama, cansada. Olhei no relógio... Já era tarde.
Tom saiu do banheiro, enrolado na toalha, secando os cabelos. Olhou para mim e depois para as sacolas e disse:
- Mais compras, amor?
- Você em casa? Isso é um milagre. – falei sem me levantar. – Sim, compras... Estou entediada.
Ele se ajoelhou sobre mim, me dando um beijo demorado nos lábios, não usando sua língua:
- Não diga que morar comigo é entediante, minha gatinha.
- Eu não disse isso... – falei puxando o rosto dele para perto de mim e dando um beijo de língua nele.
Tom estava cheiroso... Sabonete misturado com perfume importado. Eu gostava.
- Sentiu saudades? – ele perguntou.
- Sim.
Ele saiu de cima de mim e foi até o closet, quase caindo sobre as minhas sacolas. Voltou com uma caixa enorme, ostentando um laço dourado. Sentei empolgada na cama:
- É para mim?
- Sim... Eu trouxe para você de Barcelona.
Abri a caixa e lá estava uma bolsa que eu queria, que custava uma pequena fortuna.
- Eu adoro ver como seus olhos brilham quando você ganha um presente. – ele disse deitando sobre mim enquanto eu ainda olhava o meu presente perfeito.
- Eu só queria que você ficasse mais tempo comigo, Tom.
- Gatinha, é o meu emprego. Acha que é fácil manter esta vida que você leva? – ele riu e deu um beijo na ponta do meu nariz.
- Ainda assim, eu me sinto sozinha.
- Quando se sentir sozinha, compre tudo que puder.
- Eu quero você... – fiz beicinho. – Não quero mais comprar.
- Por que não viaja comigo?
Suspirei, entediada:
- Não gosto de andar de avião.
- Só viajou comigo uma única vez...
Sim, havia sido uma única viagem naquele ano que estávamos morando juntos. E não era só a questão do avião. Tom ficava realmente trabalhando, em reuniões longas e chatas. E turistar sozinha não era meu forte. Eu sempre odiei ficar sozinha. E por ironia do destino morava com um homem que praticamente viajava mais do que ficava em casa. Mas morar sozinha, na minha cidade natal, com toda minha família por perto era diferente de estar sozinha em qualquer lugar do mundo.
- Prometo ir outra vez... – garanti.
Ele puxou minha camisa com força, arrebentando todos os botões, me deixando só de sutiã.
- Tom...
- Não esbraveje, você tem milhares destas para usar. Eu só quero ver seu corpo... – ele beijou meu pescoço. – Senti saudade do seu cheiro.
- E eu do seu... – falei dando um chupão no pescoço dele.
Tom era muito bom de cama, embora não curtisse muito meus pequenos fetiches. Não gostava de nada muito agressivo. Preferia mais o “sexo normal”, repetidas vezes. Muita quantidade, nem sempre tão boa qualidade. Como nos víamos pouco, era sempre bom transar com ele até cansarmos. Ele era carinhoso e preocupado comigo... Quando estava em casa. O problema é que a maioria do tempo ele não estava.
Amanheci cansada da noite mal dormida, regada a espumante e muito sexo. Fui para o banho. Não tinha pressa. Quando ele estava em casa eu aproveitava ao máximo meu tempo com ele. Assim que saí do Box e peguei a toalha, ele chegou, começando a escovar os dentes.
- Bom dia, gatinha. – falou enquanto escovava.
- Bom dia.
Assim que acabou, ele entrou na hidro:
- Me acompanha?
- Por hora, não. Preciso comer. – falei.
- Gatinha, vou dar uma festa para meus amigos hoje à noite.
Olhei-o insatisfeita:
- Tom, o que falamos sobre isso?
- Meu bem, só esta noite. Enquanto eu ficar na cidade, prometo não encontrá-los novamente.
- Não é o fato de encontrá-los. A maioria das pessoas que vem nem você conhece. Sinto-me invadida dentro da minha própria casa. Mulheres sem nenhum conteúdo, que não dá sequer para manter uma conversa amigável e que ainda passam o tempo todo cobiçando meu namorado.
- Gatinha... Preciso de contatos... Você sabe.
- Tom...
- Diga que concorda.
- E se eu disser que não concordo, Tom?
- Eu não farei.
Como eu poderia dizer que não queria que ele recebesse pessoas para uma festa na própria casa dele? Eu não tinha este direito. Embora eu odiasse estes momentos, não poderia impedir. E ele queria sempre a minha presença ao seu lado, deixando claro para todos que morávamos juntos.
- Pode fazer. – eu disse saindo do banheiro.
As roupas e calçados novos já estavam arrumados no closet. A empregada havia estado ali sem eu sequer perceber. Fiquei olhando para tudo sem a mínima ideia do que usar. Acabei optando por um vestido de marca. Geralmente Tom gostava de sair comigo quando chegava de viagem.
Assim que terminei de me vestir, ele estava saindo do banho.
- Vai organizar tudo para a noite? – perguntei.
- Não... – ele disse entrando no closet. – Pedi para uma pessoa especialista tomar conta de tudo para mim.
- Então será algo grandioso? – perguntei da porta, enquanto ele escolhia uma roupa.
- Gatinha, eu quase não tenho mais espaço para as minhas coisas. – ele disse. – Quer que eu mude meus pertences para o outro quarto? Ou poderíamos iniciar a reforma que planejamos há algum tempo atrás.
- Reforma? – perguntei. – Isso é tão complicado. Vai dar bagunça, sujeira... E nossa privacidade?
- Podemos ficar num hotel enquanto não fica pronto.
- Acho que levamos suas coisas para o outro quarto, por hora.
- Você que sabe.
Sim, em um ano eu tomei conta de todo o espaço dele. Comprava horrores, pois nunca vi tanto dinheiro em toda a minha vida. Eu vivia uma vida de dondoca, com salões, massagens, compras, festas com pessoas importantes e de alto nível social. Tom não reclamava dos meus gastos. Era sempre tranquilo e parecia até gostar. Voltei a estudar, com tudo pago por ele. Saí do meu emprego, que eu ganhava praticamente nada. E quando tinha tempo, ajudava na empresa dele, que ficava em outra cidade. Eu entendia dos negócios, pois estava fazendo faculdade de administração. Tom tinha agências de turismo e era dono de vários hotéis em lugares turísticos do mundo. Eu? Eu era só a garota que gastava o dinheiro dele e ainda assim se lamentava pela vida que levava.
- Aonde você quer ir hoje, gatinha?
Passei meus braços em torno do pescoço dele e disse:
- Quero ver Otto... E minha vó.
Ele suspirou:
- Ok.
- Podemos almoçar lá e depois ir para outro lugar que você queira.
- Ok.
- Ficou bravo?
- Não... É que ir para sua família é ter que dividir você com todo mundo. Poderia fazer isso quando eu não estou...
- E eu faço... Mas quero ir com você. Moramos juntos, esqueceu?
- Eu nunca esqueço, linda. – ele me puxou com força contra ele enquanto eu tentava me desvencilhar.
- Você me irrita às vezes, Tom.
- Quer um carro? Isso facilitaria sua vida.
- Não quero. Não gosto de dirigir e você sabe muito bem disso.
- Eu só perguntei, gatinha. Sem problemas...
- Quando chegarmos em casa tudo estará organizado para receber seus amigos?
- Sim... – ele me deu um beijo no rosto.
- Vamos, Tom. Quero comer no almoço a comida da minha avó.
- Desta parte eu gosto. – ele sorriu.
Quando chegamos na casa da minha avó, toda família estava reunida para o almoço de sábado. Abracei todos carinhosamente. Eu amava minha família. Minha vó e minhas tias estavam cozinhando para todos.
- Como está, filha? – perguntou Otto.
Eu havia visto ele há menos de uma semana, mas parecia uma eternidade.
- Com saudades. – confessei.
- Separei algumas coisas para você. – ele disse.
- Dela?
- Sim...
- Está sendo doloroso fazer isso?
- Muito... Mas necessário. Já faz 2 anos. É preciso superar e retirar os pertences pessoais dela de dentro de casa.
- Quero tudo que você julgar que me fará bem.
Vi Lorraine chegando no portão. E para minha surpresa ela estava de mãos dadas com Felipe. Corri até ela e nos abraçamos pulando feito loucas. Fazia uns bons meses que não nos víamos. Eu envolvida nas minhas coisas e ela nas dela.
- Prima linda... Que saudade. – ela disse.
- Felipe? – perguntei para ter certeza.
- Oi, Juliet.
- Este é Tom... Meu... Namorado. – falei.
- Quase marido. – ele disse apertando a mão de Felipe.
- É no seu casamento vou? – ele perguntou sorrindo. – O que tem data marcada para daqui oito anos?
Tom encarou-o e virou a cabeça um pouco para o lado, confuso:
- Bem, eu não sabia disso. Já organizou nosso casamento, gatinha?
Fiquei sem graça e Lorraine também. E pelo visto Felipe percebeu o erro.
- Estou brincando. – disse Felipe. – Mas...
Eu não ouvi mais o que ele disse. Cada vez que algo me lembrava Nicolas, tudo voltava na minha cabeça e eu saía do mundo real. O casamento foi combinado na nossa primeira noite de amor. Lembrar do quão perfeito foi aquele momento fazia minha pele arrepiar-se. Será que ele ainda lembrava da promessa? Será que eu estaria na frente da minha casa quando eu fizesse trinta anos, esperando por ele para nos casarmos? Eu acho que sim... Que eu estaria. Porque talvez o mundo rodasse e mil anos se passassem... E nosso destino fosse no final, ficarmos juntos. Eu já não passava o tempo inteiro pensando nele. Era só quando alguma coisa o lembrava... Então tudo voltava com força, com as imagens passando na minha mente como se fossem recentes. Eu me desfiz de todos os meus CDs do TNT, porque não havia nenhuma música que não lembrasse ele. Guardei só a capa autografada, sem o cd. Passava longe de escadas de emergência, nunca mais voltei à praia e não saía na balada sem ser de calça.
Eu estaria sendo hipócrita se dissesse que não gostava de Tom, porque eu gostava. Mas amor? Eu jamais sentiria amor novamente. Ao menos não como o que eu senti por ele.
Eu não tinha uma vida perfeita com Tom. Eu ficava muito tempo sozinha e por isso comecei minha compulsão por comprar coisas desnecessárias com o dinheiro que eu não tinha. Ele não se importava... Pelo contrário, me estimulava a gastar o quanto quisesse. Dava-me tudo que eu queria... E eu poderia ser feliz com tudo isso. Mas tinham coisas que eu não suportava: as festas regadas a muita bebida e pessoas que eu não conhecia, sempre na nossa casa. Mulheres dando em cima dele descaradamente. Homens que me olhavam dos pés a cabeça me comendo com os olhos, mesmo na presença dele. Pessoas fúteis... Como eu havia me tornado quando passei a fazer parte da vida dele. E se não bastasse, Tom bebia muito nestas reuniões que gostava de protagonizar. Acabava na cama, sendo carregado por mim, sem saber sequer onde estava. Não era só nestes momentos que ele bebia demasiadamente. Haviam outros... Mas eu não achava que ele era um alcoólatra.
Eu vi sua família uma vez só. Eram pessoas extremamente ricas e desnecessárias para se ter na vida. Fui tratada como se Tom tivesse ido fechar um negócio e eu fosse a companhia dele. A irmã dele foi a única que conversou um pouco comigo. E me disse que eu era a primeira mulher que ele trazia em casa, para conhecer a família e que talvez por isso o pai ficou sem saber como agir na minha presença. Ele não era muito próximo deles e eu não fazia questão também.
- Gatinha? Você está aí?
Em minha mente, eu respondi: “sempre”. Mas não era para ele que eu respondia...