Capítulo 52
2113palavras
2022-07-15 19:54
Não consegui falar com minha mãe a respeito de eu ter encontrado meu pai, embora eu soubesse que devia. Ela ficaria preocupada, histérica, quereria mil explicações e ainda poderia me impedir de sair de casa temendo que eu o encontrasse novamente. Eu sabia que ela havia passado momentos horríveis ao lado dele, mas ela não entendia que ele era o meu pai e o quanto era importante para mim vê-lo. E ainda mais saber que ele gostava de mim... Eu conseguia sim entender que a vida dele havia mudado. E eu era sim importante, como os outros filhos dele. Senti pena da situação que estavam vivendo em função do pequeno Damon. E eu sabia que podia ajudar. Nós não tínhamos dinheiro sobrando, mas eu lembrei do dinheiro guardado para a faculdade. Era muita grana. E se eu desse para ele, me sentiria bem. Não seria só usado para salvar uma vida... Mas sim a vida do meu irmão. Eu poderia depois trabalhar e pagar aos poucos. Era uma ideia. Eu ainda precisava pensar melhor. Não queria fazer nada errado.
Aposto que Nicolas tentou me ligar, como todos os dias, mas não conseguiria. Eu estava sem telefone.
Dois dias depois cheguei em casa tarde da noite, pois tive aula na faculdade. Minha mãe e Otto já estavam dormindo. Assim que abri a porta do meu quarto, vi Nicolas deitado, dormindo na minha cama. Tomei um banho e procurei não fazer barulho para não acordá-lo. Assim que me cobri, aconcheguei-me ao corpo dele, que despertou num susto.
- Juliet... – ele me chamou enquanto tentava entender porque eu estava deitada no seu braço.
Dei um beijo no rosto dele:
- Você dormiu, Nick.
- Esperei você por uma eternidade. – ele me abraçou com força. – Eu estava morrendo de saudade.
- Eu também. – falei retribuindo o abraço com mais força ainda.
- Por que seu telefone só dá desligado?
- Nick, eu deixei cair... E quebrou.
- Como fez isso?
- Eu... Sou desastrada... Você sabe.
- Sim... Eu sei. Mas poderia tentar tomar mais cuidado. Como vai ser agora?
- Vou ver se minha mãe compra outro. – falei beijando o pescoço dele.
- Não... Eu compro.
- Você não precisa fazer isso. – continuei distribuindo beijos, levantando sua camiseta.
- Acordar assim é perfeito. – ele disse retirando a camiseta.
Sentei sobre ele e disse:
- Nick, eu preciso lhe contar uma coisa.
Ele me fitou preocupado:
- Se você prefere me contar uma coisa a transar comigo é bem sério.
- Acho que preciso contar primeiro. – falei sem sair de cima dele.
- Conte...
- Hoje eu fui fazer algumas coisas e um homem me seguiu...
- Meu Deus... Por que você não me ligou? Por que não ligou para Otto?
- Calma, Nick. Deixa eu terminar...
- Fale logo ou vou morrer de ansiedade, rainha do drama.
- Acabei entrando numa cafeteria para ver o que ele faria e ele entrou também. Eu cheguei a pegar o celular e tentei ligar para você quando ele sentou na minha mesa e se apresentou.
- E...
- Adivinha?
- Não vai me dizer que é o seu pai.
Eu coloquei a mão na boca dele, tentando evitar que ele falasse alto.
- Sim...
Ele sentou na cama, fazendo eu quase cair de cima dele. Segurou-me com seus braços e me deitou no travesseiro, me encarando:
- O que houve?
- Ele... Disse que precisava me ver.
- Depois de 20 anos? Qual a desculpa dele?
- Nick, acalme-se... Você sabe que eu sempre quis encontrá-lo...
- Eu sei... Mas temo esta procura repentina. Ainda mais não sendo na sua casa. Por que segui-la? Por que numa cafeteria? Por que ele não procurou sua mãe, afinal, ela ficou com você por todo este tempo...
- Nick... Inicialmente eu também me fiz todas estas perguntas. E fiquei cheia de questionamentos. Mas ele me explicou que está limpo das drogas. Que desde que partiu daqui nunca mais usou. Ele casou, tem dois filhos... Eu tenho dois irmãos, entende? Embora eu já soubesse disso, parecia muito distante. Mas eu vi a foto deles. São lindos... – falei emocionada.
- Juliet, eu fico feliz por você conhecer esta sua família... Mas quero que tome cuidado. Tenho medo que ele a magoe.
- Nick... Ele disse que me ama. E eu senti isso nos olhos dele.
- Por que ele a procurou só agora? Isso que eu não entendo...
- Porque um dia ele teria que fazer, não é mesmo? Na verdade, Damon, meu irmão mais novo, que tem apenas dois anos, está com uma doença que precisa de uma cirurgia. Eles não tem dinheiro para bancar. Então ele pensou no quanto a vida é curta... E que não queria deixar passar sem me ver. Quer também que eu conheça meu irmão... Antes do pior acontecer.
- Ele quer que você vá para Paraíso com ele ou que lhe dê dinheiro para a cirurgia?
- Nenhum dos dois... – menti. – Mas sim, me convidou para ir visitar o lugar onde ele mora.
- Ele não mencionou a possibilidade de você ajudá-lo na cirurgia?
- Não. – menti.
- É tudo muito estranho. E me desculpe, mas como acreditar numa pessoa que desaparece e depois de quase vinte anos volta do nada dizendo que está com problemas?
- Nick, ele não disse que está com problemas. E não foi assim. Mencionou a doença e a cirurgia porque mostrou a foto. Não foi com intenção de me convencer a nada. Até porque, eu não tenho dinheiro.
- Espero que você não lhe dê nada, Juliet.
- E eu espero que você não se meta na minha vida deste jeito, Nick. É o meu pai... Você não tem este direito.
Ele me olhou com os olhos tempestuosos e escuros... De uma forma que até então eu nunca havia visto antes:
- Eu quero o seu bem... Só isso. Você me tiraria da sua vida por um pai que apareceu depois de tanto tempo... Que você sequer conhece?
- Estou ofendida com seu comentário, Nicolas. Você não tem nada a ver com isso. Eu não devia ter contado nada. – falei virando de costas para ele.
Nicolas alisou meu braço e disse:
- Juliet, não seja inocente. Este homem procurá-la depois de tanto tempo escondido de sua mãe não é normal.
- “Este homem” que você se refere, é meu pai. Sangue do meu sangue... O homem que me deu a vida. Quero que você vá embora, Nick.
- Como assim?
- Eu quero ficar sozinha. Foi um dia cheio.
- Não pode me mandar embora assim...
- Eu posso. Estou na minha casa.
Continuei sem virar para ele. Ouvi a porta bater e tive a certeza que ele se foi. Não consegui segurar as lágrimas. Eu sabia que talvez Nicolas tivesse razão em algumas coisas, mas ele precisava ser, no mínimo, mais tolerante. Estávamos falando do meu pai, que ele sabia que procurei por toda a minha vida. Nicolas parecia ter ciúme do meu pai, assim como minha mãe. Eu só esperava que ele não contasse para ela... Ou eu não o perdoaria. Ele não tinha este direito. Era a minha vida.
No restante da semana não vi Nicolas e como estava sem telefone, não nos falamos. Senti saudade e um pouco de culpa pelo que eu havia feito com ele. Na sexta à noite, minha mãe perguntou, durante o jantar:
- Houve algo que Nicolas não apareceu e eu não ouvi vocês conversando até tarde?
- Meu celular estragou... E nós meio que brigamos. – falei usando o garfo para brincar com a comida, sem nada de fome.
Ficar sem Nicolas não me fazia bem. Eu sentia saudade se não o via um dia, imagina não vê-lo quase uma semana e ainda saber que estávamos brigados.
- Isso acontece. – minha mãe disse.
- Sim, muitas vezes. – Otto falou. – Depois vocês fazem as pazes.
Olhei para Otto e fiquei com um pouco de raiva por ele estar se metendo naquela conversa. Mas não falei nada. Por que aquele sentimento de que ele estava tomando um lugar que não era dele estava voltando? Ao mesmo tempo lembrei que meu pai fazia o papel de Otto com uma garota que não era filha dele, longe dali, longe de mim... Minha cabeça estava confusa...
- Lorraine e sua tia irão para a praia amanhã pela manhã. Por que você não vai? Descanse um pouco. Você está muito atarefada. É a faculdade em turnos alternados, as aulas de direção... Seria bom um tempo longe de tudo. Até mesmo de Nicolas. Você e sua prima se gostam tanto. Acho que seria bom.
Olhei para minha mãe e fiquei animada:
- Achei boa a ideia, mãe. Embora eu ainda fique um pouco apreensiva de deixar Nicolas.
- Ele não vai ficar com outra garota, se é este o seu medo.
- Eu sei... Mas ainda assim. Não gosto de ficar longe dele.
- Então não deveriam ter brigado. – Otto disse. – Sempre achei que vocês se deram tão bem... Estranho uma briga agora, do nada.
- Os casais brigam, Otto. Você mesmo disse, várias vezes. E depois fazem as pazes. – repeti ironicamente as palavras dele.
Ele riu e alisou o braço da minha mãe:
- A parte de fazer as pazes é a melhor parte.
- Ah, me poupem disso. – falei levantando.
- Falo para sua tia reservar lugar para você no carro?
- Sim... Se você me emprestar seu telefone. – chantageei.
- Você pode pegar meu telefone sempre que quiser, Juliet.
Eu sorri e peguei o celular dela. Fui para meu quarto e liguei para Nicolas.
- Oi Rainha do drama.
- Como sabia que era eu?
- Eu sempre sei quando é você.
- Me perdoa? Eu fui rude com você.
- Que bom que admite. Eu não quero brigar por isso, Juliet.
- Eu sei... Eu amo você, Nick e não posso ficar longe.
- Também amo você. Mas não quero que seja leviana.
- Nick... Não quero brigar. – enfatizei.
Ele riu:
- Ok, sem conselhos de amigo.
- Isso mesmo. Você não é mais meu amigo. É meu namorado.
- Perdi o posto de melhor amigo?
- Literalmente... Agora é namorado, amante, qualquer coisa, menos amigo.
- Eu vou ter que ficar em casa neste final de semana. Estou cheio de trabalho da faculdade para fazer. Se sair, não vou conseguir acabar. E levar para fazer aí, não daria certo. Você quer fazer sexo 24 horas por dia.
- Está reclamando da sua namorada, Nicolas?
Ele riu:
- Não, meu amor. Só estou dizendo que não consigo fazer nada ao seu lado a não ser tocá-la.
- Minha mãe sugeriu que eu vá para a praia com Lorraine.
- Acho uma boa ideia. Além de eu conseguir acabar minhas coisas, você fica longe de Simon Dawson.
- Eu não acredito que você está dizendo isso, Nicolas. Eu não quero que fale assim do meu pai.
- Ok... Se não queremos brigar, não vamos mais falar dele.
- Nicolas, é o meu pai. Eu já lhe disse isso. Qual seu problema com família?
- Família? Ele não é sua família, Juliet.
Eu desliguei o telefone. Não queria mais ouvir. Não queria brigar novamente com ele pelo mesmo motivo. Nicolas tinha que compreender que eu estava feliz por meu pai aparecer para me ver depois de 20 anos. O mínimo que ele tinha era que ficar feliz por mim. Eu entendia a preocupação dele. Mas era necessário dar uma chance a Simon Dawson. E eu não era uma criança. Sabia muito bem o que estava fazendo. Eu era adulta. E sabia que todas as escolhas tinham consequências. E estava disposta a enfrentá-las.
No sábado cedo minha tia e Lorraine passaram na minha casa. Eu havia feito uma pequena mochila, afinal, eram apenas dois dias na praia. Mas me faria bem. Fiquei chateada de ter ido brigada com Nicolas novamente. Mas ao mesmo tempo estava tranquila porque ele teria tempo para fazer suas coisas porque justamente eu não estaria por perto. E também tinha medo de meu pai ir embora... E quando eu voltar nunca mais encontrá-lo de novo. Então eu decidi que o procuraria assim que retornasse para minha cidade. Queria ficar um tempo com ele. Conhecê-lo melhor, saber sobre minha família, quem eram, onde moravam. Eu precisava viver aquilo, nem que fosse por algumas horas. Eu esperei a vida toda para aquele homem me procurar. E agora isso aconteceu. Eu não poderia simplesmente virar as costas para o meu sonho da vida inteira.