Capítulo 38
2350palavras
2022-06-30 01:54
Quando retornei ao meu lugar comecei a conversar com as meninas como se nada tivesse acontecido. Eu precisava aproveitar aquele momento raro entre nós. Nicolas continuou onde estava com Pedro e quando nossos olhos se encontravam sorríamos, tentando não deixar ninguém entender o que se passava entre nós.
Ouvi Valquíria falar sobre Adriano e me senti tão bem com aquilo. Sim, ele era o amor da vida dela. E eu poderia dizer aquilo com toda propriedade, porque fazia anos que ela era apaixonada por ele. Então não havia possibilidade de ela gostar de Nicolas. E eu nunca torci tanto em toda a minha vida para ela e Adriano se resolverem logo. Isso tiraria um peso de mim. Eu não sabia se algum dia teria coragem de contar a verdade a ela. Então eu seria uma mentirosa a vida inteira. A menina que quebrou o pacto e não disse a verdade. Olhei para ele, conversando animadamente com Pedro. E pensei que não importava. Contanto que eu tivesse ele no fim, nada mais importava.
Voltei para casa e naquela noite Otto fez lasanha. Eu amava lasanha. E a sobremesa foi torta de sorvete, que minha mãe passou o dia anterior fazendo.
Quando acabei o segundo pedaço de torta eu disse:
- Eu tenho sorte de ter nascido nesta família.
- Sim... Pela comida você faz qualquer coisa. – disse Otto rindo.
- Digamos que cinquenta por cento é pela comida. Mas o restante não. – confessei.
- Estou vendo uma Juliet amadurecendo? Achei que isso nunca aconteceria. – disse minha mãe.
- E ela ainda sabe ser grata. Isso ainda é um milagre maior. – ironizou Otto.
Levantei e disse:
- Não amadureci... Só abri os meus olhos para algumas coisas que antes eu não conseguia. – falei um pouco envergonhada.
Eu não conseguia dizer que eu gostava de Otto, embora eu sentisse carinho por ele. E não sei como o ódio por ele passou a se transformar em afeto de uma hora para outra. Eu comecei a entender que ele fazia tudo por mim. E que no fim, nunca quis tomar o lugar do meu pai. Mas acho que nunca na minha vida eu seria capaz de dizer isso a ele.
Assim como nunca conseguiria admitir para mim mesma que eu não ficaria satisfeita até encontrar meu pai e saber porque ele nunca se preocupou comigo, nunca me procurou... E me abandonou sem nenhum tipo de culpa. Eu falava cada vez menos nele, porque sabia que isso incomodava minha mãe e lhe trazia lembranças ruins. E tinha medo que ele desaparecesse dentro de mim.
Na terça-feira, enquanto saía da escola e me dirigia para o ponto de ônibus com Val, um carro parou ao nosso lado. Olhamos e fiquei tensa ao ver Tom.
- Oi, gatinha. – ele disse virando a cabeça para me ver, retirando os óculos escuros.
- Tom?
- Eu vou indo... – disse Val.
- Não! – eu quase gritei.
- Calma, Juliet. Eu não vou lhe fazer nada de mal... – ele falou confuso e sério.
Eu estava mesmo sendo ridícula. Era Tom. E não havia nenhum mal em conversarmos. Ao menos eu acho. E eu precisava de uma vez por todas acabar com todas as esperanças dele de termos algo. Eu não tinha espaço para mais ninguém... Só para o meu melhor amigo/ficante.
- Acho mesmo que precisamos conversar. – falei.
Val me deu um beijo e partiu. Tom abriu a porta do carro.
- Agora você tem medo de mim?
- Não...
- Não pensei que algo mudasse no tempo que passei fora. Você... Está com alguém?
- Mais ou menos. – confessei.
- O que é estar mais ou menos com alguém?
- Vamos ficar conversando aqui? – perguntei confusa.
- Tem razão.
Ele colocou os óculos novamente e voltou para a estrada. Olhei os braços fortes dele no volante. Tom era absolutamente lindo. E Nicolas também era lindo. Mas eles eram completamente diferentes. E se eu fosse colocar Cadu para comparar, pareceria que os três não saíram do mesmo mundo. Como era possível eu me envolver com eles em tão pouco tempo e não terem absolutamente nada em comum?
Eu já achava que Cadu foi uma das minhas paixões impossíveis, que eu criava para impedir a aproximação de alguém real. Foi assim com meu surfista tatuado. Isso fazia com que eu não me envolvesse seriamente com um ninguém. Acho que Dani tinha razão: eu tinha medo. De que terminassem comigo e eu sofresse. Eu fui rejeitada a vida inteira por meu pai e toda a família dele. Acho que aquilo me trouxe traumas para toda a vida.
Fomos ao Shopping da cidade vizinha. Eu pedi o telefone dele emprestado e avisei minha mãe que chegaria um pouco mais tarde. Fomos até a praça de alimentação.
- O que quer comer, gatinha?
- Nada.
- Não aceito esta resposta. – ele disse.
- Realmente estou bem, Tom.
Ele pediu uma água para mim e um suco para ele. Depois colocou os braços em cima da mesa e apoiou o rosto no cotovelo enquanto me olhava:
- Quem é o sortudo?
- Ninguém que você conheça. – menti.
- Eu deveria ter assumido meus sentimentos antes de partir. E resolvido isso com você. Então não teria acontecido o que aconteceu.
- Acho que teria acontecido da mesma forma, Tom.
- Não imagino o Manhattan com você sempre acompanhada da mesma pessoa.
Eu ri:
- Acho que é possível que me veja menos por lá.
- Sim... Todo mundo que começa a namorar simplesmente para de sair à noite. Por isso eu evitei muito tempo um compromisso sério com alguém. Nunca quis esta vidinha pacata e sem graça.
- Eu também pensava assim há um tempo atrás. Até que chega a pessoa certa e você não se importa mais com isso.
- Exatamente. Isso aconteceu quando eu encontrei você.
- Tom... Não brinque. Você sabe que não tivemos nada sério.
- Talvez não para você. Mas para mim foi intenso... E tentei dizer para mim mesmo que não gostava de você. Isso por causa da sua idade. Confesso que fui um pouco preconceituoso.
- Entendo... E por este motivo teríamos problemas com minha mãe e meu padrasto.
- Diga olhando nos meus olhos que eu não tenho nenhuma chance. – ele disse pegando minha mão e me encarando.
- Não tem. – falei firmemente.
Olhar para Tom e dizer para mim mesma que não o desejava era uma completa mentira. Mas o fato de eu desejá-lo não significava que ficaria com ele. Tom era lindo, inteligente, tinha uma vida estável, era gentil, carinhoso. Eu poderia sim ficar com ele e ser feliz. Mas eu tinha encontrado um homem simplesmente perfeito na minha vida. E ninguém tinha chance de competir com ele. Minha escolha sempre seria Nick.
- Porra, lamento não ter chegado antes dele.
- Podemos ficar amigos. – eu sorri.
- Amigos? Você sabe que isso não existe, não é mesmo?
- Podemos ao menos não ficar inimigos?
- Acho que sim, gatinha.
- Você chama todas de gatinha? – perguntei curiosa.
- Como eu poderia chamar todas se só você é a minha única gatinha?
Eu ri:
- Ok, vou fingir que acredito.
- Você sequer me conheceu, Juliet. Não tivemos tempo. E eu realmente precisei fazer aquela viagem. Expandi meus negócios e estou feliz com os resultados.
- Está tudo bem, Tom. E fico feliz por ter dado certo seus planos de negócios.
- Sabe uma coisa que eu aprendi?
- O que?
- Que nada nesta vida é certo... Tudo é incerto. Então eu não perco minhas esperanças nunca... Com relação a nada. O mundo gira e dá voltas... E talvez você caia novamente nos meus braços. E se isso acontecer, gatinha... Você está ferrada... Porque eu não vou soltá-la nunca mais.
Eu ri. Poderia apostar que a vida não nos colocaria novamente juntos. E eu não acreditava em destino.
- Poderia me levar de volta? – pedi um pouco receosa.
- Posso, mas com meu coração partido. – ele disse sorrindo.
Andamos vagarosamente até o carro. Conversamos sobre assuntos sem importância. Tom era legal. E foi um encontro agradável. Ele me levou em casa e por sorte minha mãe e Otto não estavam. Eu não queria dar explicações e muito menos que minha mãe contasse a Nicolas e ele pensasse algo errado sobre o que realmente aconteceu.
Na quarta-feira Nicolas me ligou à noite. Quando vi o número dele senti meu coração dar saltos dentro de mim.
- Nick...
- Não vai perguntar, é você?
Eu ri:
- É você?
- Sempre. Isso virou nossa marca registrada. Adoro quando você pergunta se eu estou aqui... Porque responder sempre para você é o que eu mais quero.
Senti um frio percorrer minha espinha e a barriga arder.
- Quer que eu pergunte se você ainda está aí, Juliet? Por que ficou muda?
- Sempre, Nick. Sempre vou estar aqui para você. – eu falei sem medo. – Mas realmente fiquei muda porque suas palavras me surpreenderam.
- Juliet se surpreendendo com algo... Estamos evoluindo.
- Você sempre me surpreendeu.
- Pois bem, então vou continuar surpreendendo. Que tal irmos na inauguração da nova casa noturna da cidade no sábado?
Alissa e Val já haviam combinado que iriam. E eu não estava preparada para assumir nosso relacionamento para elas.
- Eu acho que não estou com muita vontade. Por que não fazemos outra coisa?
- É que vai ser a festa da minha turma lá. Estamos nos despedindo do ano... E nos preparando para a formatura. Queria você comigo.
- Nick, eu ainda não estou preparada para isso.
- Não está preparada para que? Para nos verem juntos? Não estamos fazendo nada de errado, Juliet. A menos que seus motivos não sejam os que eu imagino.
- Não sei o que você imagina. Mas eu estou falando com relação a Val. Eu não quero que ela me veja com você antes de eu contar.
- Então conte antes de sábado.
- Eu não vou conseguir.
- Por quê? Ela está gostando de mim?
Eu fiquei muda. Será que ele se importava com aquela resposta.
- Juliet, você está aí?
- Sempre, Nick.
Ele riu:
- O que houve, meu bem?
- Você se importa com o que ela sente com relação a você?
- Claro que não, Juliet. Por que me importaria?
- Me diga você.
- Quando você vai entender que eu não gosto de Val? Se eu gostasse dela, estaria com ela.
- Sabe que não estaria.
Ele riu:
- Eu estaria, Juliet. Eu que não quis. Porque eu queria você. E desde o início.
- Então por que ficou com ela?
- Eu nunca vou poder lhe dar esta resposta... Porque eu não sei. Mas no fim, era para ser assim. Eu gostei da forma como tudo aconteceu. Teria sido uma noite e nada mais e você sabe disto.
- Talvez você tenha razão.
- Não quero que se sinta insegura com relação a ela, Juliet. Nunca.
- Mas você ficou bravo quando eu lhe contei sobre Tom.
- Você me contou que beijou Tom. Queria que eu dissesse que achei bom? Fiquei louco de ciúmes.
- Eu encontrei ele ontem.
Ele não falou nada.
- Nick?
Continuou sem resposta.
- Nick, você está aí... Por favor, diga que sempre. Eu quero lhe contar o que aconteceu. – implorei, sentindo medo do que ele estaria pensando.
- Sempre... – ele falou pausadamente.
- Ele estava na saída do Instituto. Não tenho certeza se foi coincidência ou não... Mas enfim, ele demonstrou interesse em mim. Então eu achei que era hora de cortar relações definitivamente com ele.
- Havia relações?
Eu ri:
- Não... Acabei algo que nem começou. Falei a verdade para ele.
- Que verdade, Juliet?
- Que eu estava com outra pessoa... Quer dizer... Estou? – perguntei confusa.
- Não sei, me diga você.
- Por que eu?
- Porque a insegura é você neste relacionamento. Eu não tenho medo de mostrar ao mundo que estamos juntos. Aliás, é o que eu mais quero.
- Eu quero ficar com você. – confessei sentindo meu coração bater mais forte que o normal.
Confessar que o queria era tão difícil quanto assumir para mim mesma que eu estava completamente apaixonada por ele e o medo que eu tinha de perdê-lo.
- Então fale para ela, Juliet... Por favor. Se isso é importante para você, resolva logo de uma vez.
- Mas nesta semana eu não consigo, Nick. Preciso de mais tempo.
Ele suspirou:
- Ok. Vou lhe dar o tempo que precisa para resolver sua situação com Val, mesmo não entendendo isso. É como se precisássemos da aprovação dela. E não precisamos.
- Você não entende... Somos amigas desde a infância.
- Você não roubou o amor da vida dela. – ele disse sarcasticamente.
- Você vai no sábado então?
- Preciso ir.
- E quando vem aqui me ver?
- Está me convidando para vê-la na sua casa? Seria um pedido de namoro?
- Claro que não, bobo.
- Nesta semana eu não consigo. Talvez no domingo.
- Vai me ligar?
- Estou saindo muito tarde da empresa. Não quero atrapalhá-la. Você precisa do seu sono para encarar o seu estágio que se aproxima.
- Então nunca mais vamos nos ver nem nos falar? – perguntei confusa.
- Quero que você me ligue quando quiser ouvir minha voz e falar comigo. Não quero ser um namorado chato que tira sua privacidade e incomoda você o tempo inteiro. Eu sei que você não gosta disto. E não quero perdê-la por fazer tudo que os outros fizeram e depois foram colocados de escanteio.
Mas com você é diferente, Nick. Eu não consigo me enjoar de você nunca. Eu quero estar contigo o tempo todo. Você me faz bem, você acalma a Juliet ansiosa e impulsiva que mora dentro de mim.
No entanto eu disse:
- Ok, Nicolas. Farei como você preferir.
- Boa noite, rainha do drama.
- Boa noite.