Capítulo 35
1975palavras
2022-06-30 01:52
Esperei pela ligação de Nicolas naquela noite, mas não aconteceu. Nem na terça. Na quarta eu já estava completamente impaciente. Havia tomado banho e estava pronta para dormir olhando para o telefone. Passava das onze horas. Pensei em ligar, mas já era tarde.
Fechei meus olhos, inquieta. Droga, eu precisava ouvir a voz dele ou morreria. Então peguei o celular. Mas quando fui apertar o botão, ele ligou. Fiquei olhando, atônita. Será que ele também estava sentindo o mesmo que eu?
- Oi, Nick.
Houve um silêncio que pareceu uma eternidade da parte dele. Ouvia somente a sua respiração. Perguntei:
- Nick, você está aí?
- Sempre.
- Por que não fala comigo?
- Por que você não fala comigo? Por que não me liga?
- Eu... Confesso que estava com o telefone na mão para ligar.
- Sim, mas não ligou.
- Nicolas, o que você quer, afinal?
- Prefiro não dizer o que eu quero.
Respirei fundo. Como estava ficando complicado... Parece que a ligação não resolvia o meu problema. Eu precisava vê-lo. Era como se uma eternidade nos separasse. A voz dele me deixava inebriada. E eu queria estar ao lado dele, sentir seu cheiro, seu toque, suas palavras, seu olho no meu olho...
- Juliet, você está aí?
- Sempre.
- Por que você não foi no sábado?
- Eu estava pronta para ir. Mas Otto fez um bolo de chocolate com cobertura de brigadeiro e pegou algumas fotos antigas. E eu acabei optando por ficar em casa... Com eles.
- Me trocou por um bolo de chocolate?
- Nick, tinha cobertura de brigadeiro. – brinquei.
Ele começou a rir:
- Bem, acho que está desculpada. Eu esperava qualquer pretexto, menos esse... Que não é um pretexto. É tanta sinceridade que não resisto.
- Eu sou do signo de lanches com ascendente em doces.
- Garota, de que mundo você saiu?
- Mas me conte, Nick, como estava o sábado?
- Eu poderia dizer normal. Mas como o amor da sua vida apareceu por lá, então eu posso mudar para “anormal”.
- O amor da minha vida esteve lá? – ironizei. – Eu não acredito.
- E aposto que ele esperou por você. Não ficou com ninguém a noite inteira. Eu fiquei de olho nele.
Eu sabia que ele se referia a Cadu. Então provoquei:
- Não sei... Diga-me, Nick... Ele esperou por mim a noite inteira? Só você pode ter esta resposta.
Novamente um longo silêncio do outro lado.
- Nicolas, você está aí?
- Sempre...
Eu ri. Ele começava a me imitar no “sempre”, depois das nossas longas pausas no telefone.
- Eu preciso lhe contar uma coisa.
- Esta frase vinda de você me assusta.
- Eu vi Tom hoje.
- Tom? Onde?
- Na rua... À tarde.
- O que você fazia na rua à tarde? Não tinha que estar na aula?
- Tinha, mas... Ora, eu não devo satisfações a você.
- Sobre Tom ou sobre a aula?
- A aula... – me ouvi dizendo.
- Achei até que Tom tinha se mudado para outro país... Ou morrido.
- Eu também...
- Mas pelo visto ainda vivo... E atrás de você.
- Sim.
- Sim?
- Ele me disse que viajou a negócios. Mas estava de volta. E... Até me ofereceu para fazer estágio na empresa dele.
- Ele tem uma empresa?
- Algumas, segundo ele.
- Que convencido. Querendo comprar você. Eu lhe dei um celular.
- Então estava tentando me comprar, Nicolas Welling?
- E ele não?
Eu ri:
- Está com ciúme, Nicolas? – não me controlei.
- E não deveria estar?
- Não sei... Me diga você.
- Sim, Juliet, eu estou morrendo de ciúme. – ele falou pausadamente.
Senti o sangue ferver dentro de mim e parece que ele poderia ver minha bochecha corada e minha mão trêmula segurando o celular.
- Eu vou iniciar meu estágio em breve. – falei.
- Juliet, eu quero saber qualquer coisa, menos do seu estágio.
Fiquei sem palavras.
- Você beijou ele?
Travei. Não sabia o que responder. Eu sabia que eu e Nicolas não tínhamos absolutamente nenhum compromisso. Então por que eu sentia que de alguma forma havia traído ele?
- Eu não beijei ele... Mas ele me beijou.
- Na boca?
- Sim... Mas não significou nada.
- Um beijo não significa nada para você?
- Significa muito... Quando vem da pessoa certa. Mas às vezes me parece que nem todo mundo está certo de que quer fazer isso. – me atrevi. – Ele estava.
- Bem, eu liguei para convidar você e Lorraine para irmos ao Lounge 191 no sábado, o que acha?
Como assim ele estava mudando de assunto, me convidando para sair como se eu não tivesse dito nada? “Nicolas, eu dei um beijo no Tom, você não entendeu?”
- Eu acho que sim... – respondi.
- Estou com saudade da sua prima.
- Que ótimo. – ironizei. – Aposto que ela também está com saudade de você.
- A propósito, pode convidar Tom.
- Não, ele não gosta do Lounge, esqueceu? – falei brava.
- Então convide Val. Vou adorar vê-la lá.
- Farei isso com certeza. Levarei Lorraine e Val no sábado. E você em troca leva Cadu.
Desliguei o telefone e fechei meus olhos, sentindo meu coração disparado. Nossa primeira briga séria. Achei que isso nunca aconteceria. Mas eu tinha que falar a verdade. Me sentiria péssima se escondesse isso dele, mesmo nós não tendo nada um com o outro. Eram tantos sentimentos dentro de mim... Nicolas me deixava doida. Eu precisava que ele me dissesse com palavras o que ele sentia... Que me desse segurança. Pela primeira vez na minha vida eu queria isso: segurança. Eu era honesta com ele... E me parecia que ele não era comigo alguma vezes. O que o amedrontava de assumir o que sentia? Seria Val? E se ele realmente gostasse dela e eu fosse só sua válvula de escape?
O certo era que eu poderia sair magoada, mas se isso acontecesse, me vingaria dele. Eu já disse que eu sou muito vingativa?
Se eu convidei Val? Óbvio que não. Eu não era louca nem nada. Avisei só Lorraine.
E como demorou para chegar o sábado! Acho que foram os dias mais demorados a passar na minha vida. Eu finalmente o veria. Foi mais de uma semana sem nos tocarmos e falamos só uma vez por telefone e ainda acabou numa briga. Não coloquei vestido, pois não sabia como acabaria a noite: bêbada sendo carregada por Nicolas, sóbria sendo carregada por Nicolas, bêbada dormindo com Nicolas ou sóbria dormindo com Nicolas. Não importava como terminaria a noite... Contanto que fosse com ele.
Meu look foi calça jeans, blusa com decote e sem mangas com um casaco fino por cima, pois geralmente ficava friozinho à noite. E uma bota cano curto. Sim, porque eu era a louca das botas. Tinha de todas as cores e modelos.
Lorraine apareceu com uma mini saia jeans e uma blusa que praticamente não tapava nada do seu corpo. E sua pequena bolsa que além do cigarro sempre continha outras coisas que eu sequer podia imaginar.
Era a primeira vez que Otto nos levaria. Eu nunca deixei ele participar muito das coisas que eu fazia. Mas desta vez eu pedi. E por incrível que pareça, ele ficou feliz com o pedido.
Claro que minha mãe decidiu ir junto. Fiquei com um pouco de medo de ela tentar descer e entrar no Lounge conosco. Por sorte ela se comportou.
Procurei por Nicolas nas proximidades, mas não o vi. Tentei ir para a fila, mas Lorraine me puxou de volta:
- Não... Eu preciso sair uns cinco minutos. Já volto.
- Não... Não pode me deixar aqui sozinha, Lorraine.
- Seu amor já deve estar chegando... Eu volto logo. – ela piscou. – Ou prefere vir comigo?
- Não. – fui enfática.
A fila estava pequena e não havia ninguém que eu conhecesse. O vento estava gelado e meu casaco fino não resolvia de nada. Me escorei na parede, próxima da porta, olhando na direção para onde Lorraine havia ido, na esperança de que ela voltasse logo.
Senti duas mãos no meu rosto, tapando meus olhos. Eu sentia o cheiro dele... Acho que reconhecia até sua pele, que não tinha nem graça a tentativa:
- Nick, é você? – coloquei as mãos sobre as dele.
- Sempre. – ele disse me virando para ele.
Eu não dei um beijo no rosto dele. Não resisti e o abracei. Claro que eu não alcançava seus ombros, então envolvi meus braços na altura do peito dele. Ele se abaixou um pouco e consegui alcançar seu pescoço, sentindo o corpo dele acolher o meu num abraço apertado. Acho que a saudade era recíproca. Eu poderia ficar ali sem soltá-lo nunca mais. Não tenho certeza de quanto tempo ficamos daquele jeito. Mas eu sentia meu coração bater tão forte que tenho absoluta certeza de que aquilo nunca aconteceu antes em toda a minha vida.
- Eu estava com saudade. – falei sem soltá-lo.
- Eu também. – ele admitiu.
Quando nos soltamos nossos olhos se encontraram e eu tive certeza de que estávamos completamente perdidos e fodidos. Ao menos eu.
- Lorraine foi buscar baseados? – ele perguntou rindo.
- Eu creio que sim... E me deixou sozinha.
- Ainda bem que sempre tem eu para salvá-la, não é mesmo, Juliet?
- Eu não sei o que seria de mim sem você, Nicolas.
Ele riu e pegou minha mão, girando meu corpo:
- Você está linda.
- Linda? Estou até de calça jeans.
- Fico feliz que tenha me ouvido. Detesto ficar mostrando sua calcinha para os outros.
- Isso nunca aconteceu. Pelo que lembro eu só estava de vestido da vez que fui para sua casa. E você não me levou no colo.
Ele riu:
- Se estou dizendo que mostrou a calcinha é porque mostrou, menina.
Duvido que lembre o que houve.
Eu falei no ouvido dele:
- Não teve vontade de bater na minha bunda nesta hora?
Ele me encarou. Abriu a boca para responder quando Lorraine gritou:
- Primo... Eu estava com saudade de você.
Ela o abraçou.
- Eu também estava com saudade, prima.
- Vocês dois devem estar querendo me matar, não é mesmo? Vamos lá.
Ela foi para a fila e nós dois a seguimos. Ela ficou na frente e ele um pouco atrás de mim. Me encolhi, segurando meus braços. Eu realmente estava com frio.
Nicolas, como que adivinhando, me abraçou por trás. Eu não sei qual foi a minha cara naquele momento. Só sei que eu fiquei completamente muda e sem me mover um centímetro.
- Eu já disse que vocês ficam muito fofos juntos? – falou Lorraine.
Continuei feito uma estátua, com medo de ele se afastar. Eu tinha receio até de respirar.
- Acho que você já falou isso. – Nicolas respondeu. – Aliás, ela já te contou que deu um beijo em Tom nesta semana?
Lorraine me olhou e riu:
- Ela não me contou... Mas estou pensando: por que ela contou para você? Afinal, ela não precisaria ter feito isso, não é mesmo?
Ah, Lorraine! Já disse que você é minha prima preferida? Porque é a única, claro.
- É que eu sou uma pessoa muito sincera. – eu disse colocando as minhas mãos sobre as dele, que descansavam abaixo do meu peito.
- Sincera e que gosta de sair beijando todo mundo por aí. – ele falou no meu ouvido, fazendo com que eu me arrepiasse com sua respiração quente.
Eu não sei qual era o jogo que Nicolas queria fazer comigo, mas eu não tinha certeza de quanto tempo suportaria. Eu estava prestes a agarrá-lo a qualquer minuto.
E nem por um segundo eu lembrei que Valquíria existia.