Capítulo 23
1912palavras
2022-06-18 03:50
- Se eu não falei sobre a festa, como você sabe que é o aniversário dela? Claro que eu falei.
- Não, não falou. Eu sei do aniversário porque ela me contou.
- Devo ter esquecido, Nick. Achei realmente que tinha contado.
- Sim... Se fosse eu que tivesse esquecido e se fosse importante para você eu já teria ganhado uma coleção de palavras agressivas.
- Palavras agressivas? Quando eu fiz isso com você?
Ele me olhou sarcasticamente. Eu levantei:
- Ok, vou embora.
Fui saindo e ele perguntou:
- Vai mesmo deixar o celular? Se fizer isso, eu não vou lhe dar novamente.
Virei para frente e segui meu caminho. Antes que desse dois passos ele estava na minha frente, impedindo minha passagem:
- Você sempre tem que ser assim tão explosiva?
- Me deixe passar. – falei furiosa.
- Sua mochila fica também? Ou é pretexto para eu levar na sua casa?
- Abusado.
Voltei e peguei minha mochila, colocando nas costas. Ele continuava me impedindo a passagem:
- Não sai sem o presente. – ele avisou.
Tentei pegar a sacola e ele levantou. Claro que eu não conseguia alcançar. Ele era muito mais alto do que eu. Comecei a ficar furiosa porque ele ria de mim. Depois ele colocou os braços para trás, segurando firme. Conforme eu ia me virando ele girava o corpo para eu não pegar. Comecei a rir. Ele era ágil.
- Tente baixinha...
- Isso me deixa ainda mais furiosa.
- Hum... Fico feliz de saber.
Passei meus braços em torno do corpo dele, pegando sua mão com a sacola. Era quase como um abraço. E nossos corpos ficaram tão colados que eu cheguei a sentir um frio na minha espinha. Olhei para cima e o sorriso se desfez nos lábios dele. Nossos olhos se encontraram e eu conseguia ver algo diferente entre nós. Pela primeira vez eu senti vontade de beijar Nick. E me senti extremamente culpada pelo que passou na minha cabeça. Juliet: isso não pode acontecer! Você não pode ficar com ele. Nick é seu amigo. E ele gosta de Val.
Larguei-o e me afastei. Ele me entregou a sacola, também espantado com o ocorrido.
- Obrigada pelo presente, Nick. Eu preciso ir. – falei saindo.
Ele foi atrás de mim:
- Espere. Eu não vou deixar você ficar sozinha esperando o ônibus. Já é tarde.
- Não é tarde não. Não se preocupe comigo. – continuei andando, tentando apressar o passo.
- Como se fosse possível não me preocupar com você! – ele disse.
Não houve jeito. Ele foi comigo. E por incrível que pareça, eu, uma pessoa que fala mais do que a boca pode suportar, fiz o trajeto em silêncio. Ele também.
Assim que chegamos ao ponto de ônibus, não havia ninguém ali. Só nós dois.
- Sabe se demorará muito para o seu ônibus vir?
- Vem logo. – tranquilizei-o sem olhar para ele.
- Juliet, se eu fizer um pedido, você poderia dizer que sim?
- Depende do que você pedir. – eu disse seriamente, ainda evitando olhar nos olhos dele.
- Promete que sempre será sincera comigo?
Levantei meu rosto, encontrando os olhos azuis cintilantes que não escondiam o brilho mesmo na escuridão:
- Não prometo. – falei.
- Será que nunca dá para falar sério com você?
- Não. – eu disse. – Sou hipócrita, dissimulada e mentirosa, esqueceu? Como pode pedir sinceridade de mim?
Ele passou o dedo polegar na minha bochecha. Caralho, eu senti como um botão ligando cada pedaço do meu corpo. Um frio percorreu meu estômago indo diretamente para minha vagina. Que porra era essa? Nicolas estava tentando me seduzir? Com qual objetivo? Ciúme para Val? Eu poderia fazer isso, sem problemas... Mas bastava ele pedir. Não precisávamos simular enquanto estivéssemos sozinhos. Por sorte vi meu ônibus apontando ao longe. E nunca me senti tão feliz na minha vida ao poder ir para casa e fugir dele.
Afastei-me rapidamente e disse:
- Minha hora chegou.
- Meu número está gravado no seu celular. Vou esperar você fazer a primeira ligação.
- Por que eu?
Ele não respondeu. Assim que o ônibus parou ele disse:
- Porque sei que você gosta de tomar a iniciativa.
Fiquei olhando para ele incrédula, sem saber se subia ou o beijava ali mesmo, fingindo que estava bêbada. Não... Eu não podia fingir, porque não bebi. Para eu dar um beijo em Nick eu precisava fingir que estava completamente bêbada. Só assim eu teria justificativa.
Entrei no ônibus e sentei do lado oposto de onde ele estava. Não queria ter que olhar para ele. Ao mesmo tempo que me via interessada por ele, tinha tanto medo e receio. Não queria perder a amizade dele. Nick era divertido, amigo, carinhoso, bom conselheiro. Eu não queria ficar sem aquilo de forma alguma. E sabia que me envolver com ele era perder o amigo e nunca mais recuperar. E eu não estava preparada para um relacionamento sério... Ao menos não com ele. E ficar por ficar nos separaria para sempre.
Na verdade eu nem sabia se não estava inventando coisas da minha cabeça. Talvez Nick não tivesse nenhum interesse em mim. Afinal, ele acabara de pedir o endereço de Val para mandar flores para ela. “Deixa de ser idiota, Juliet. É Val que ele quer. E Cadu que você quer. Tente ser amiga de um homem e não querer ficar com ele pelo menos uma vez na sua vida. Nick é especial. Você não pode perder a amizade dele”. Tentei colocar isso na minha mente e fui repetindo para mim mesma até chegar em casa.
Assim que cheguei, chamei minha mãe no quarto e mostrei o celular e expliquei o que havia acontecido. Ela foi taxativa:
- Você precisa devolver.
- Acha que eu não tentei, mãe?
- Você não pode aceitar.
- Ele não me deixou sair sem o telefone. Eu juro.
- Isso é muito caro. Ele é rico, por acaso?
- Eu... Não sei. Acho que não.
- Então dê um jeito de devolver.
- Vou tentar.
- Não vai tentar, vai devolver. – ela foi enfática.
- Tudo bem.
- Nicolas está gostando de você.
- Não... – falei já sem muita certeza.
- E você está gostando dele.
- Não. – quase gritei.
Ela sorriu:
- Eu tinha certeza que isso iria acontecer.
- Eu gosto de Cadu... E de Tom...
- E de qualquer um a não ser ele? – ela perguntou sarcasticamente.
- Gosto muito dele... Mas como amigo. Só isso.
- Um amigo não presenteia alguém com algo tão caro.
- Você conheceu Nick. Viu que ele é bastante gentil e...
Eu não consegui prosseguir com as qualidades de Nick. Fiquei travada.
Fui tomar um banho e deixei o celular carregando. Depois coloquei uma calcinha e deitei na cama. Eu costumava dormir assim quando estava em casa. Gostava de ficar nua e confortável na minha cama. Fui ler um livro, tentando me livrar da doideira que foi meu dia.
Vi a claridade no visor e o toque que eu havia escolhido no celular. A primeira ligação do meu celular provisório. Sim, porque logo eu teria que devolver para Nick. Mas qual minha surpresa quando vejo o número que ele gravou: Senhor Perfeito. Era muita audácia, pensei rindo.
JULIET: Você não consegue ficar longe de mim um minuto, Nick? – perguntei ironicamente.
NICOLAS: Agora você adivinha coisas? – ele brincou.
JULIET: O que você quer?
NICOLAS: Só ouvir sua voz.
JULIET: Ouvir minha voz? Lembro quando você falou que eu era desafinada.
NICOLAS: E eu não expliquei que era só para cantar?
JULIET: Não lembro de ter dito isso não... Mas fala logo, Senhor Perfeito, o que quer?
NICOLAS: Tudo certo para amanhã à noite?
JULIET: Achei que eu já havia dito que sim.
NICOLAS: Você sequer havia me dito que iria ao Lounge 191 comemorar o aniversário de Val.
JULIET: Nick, mudando de assunto, eu não vou poder ficar com o telefone.
NICOLAS: Como assim?
JULIET: Minha mãe... Exige que eu devolva.
NICOLAS: Não aceito devolução.
JULIET: Não quero problemas com ela.
NICOLAS: Me mande o número da sua mãe depois por SMS. Vou falar com ela.
JULIET: Como assim?
NICOLAS: Vou botar o Senhor Perfeito em ação. Ela não vai conseguir me dizer não.
JULIET: Você não vale nada, Nicolas Welling.
NICOLAS: Vai ser bom poder lhe dar boa noite diariamente.
Eu não soube o que dizer. Ele continuava me deixando confusa. Caralho, ele me deu um celular. Era quase inacreditável.
JULIET: Achei ter ouvido que eu devia fazer a primeira ligação. – mudei de assunto.
NICOLAS: Quero que você entenda que não é preciso tomar a iniciativa e correr atrás sempre.
JULIET: Boa noite. – desliguei imediatamente.
Fiquei olhando para o teto. Literalmente não era coisa da minha cabeça. Estava rolando um clima diferente entre nós dois. E por incrível que pareça, não pensei em Cadu depois de ter me deparado com a ideia de eu e Nicolas como um casal.
E assim, pensando em meus sentimentos por Nicolas, Cadu e Tom eu acabei adormecendo.
No dia seguinte, Lorraine foi até minha casa e disse que gostaria de sair comigo à noite, pois estava sem suas amigas, que haviam ido para o litoral. Eu avisei do aniversário de Valquíria no Lounge 191 e ela ficou feliz em me acompanhar.
Naquela noite escolhi um vestido novo preto, cheio de paetês e um enorme decote que deixava à mostra meus seios fartos. Um sapato alto completou o look e uma maquiagem bem feita. Lorraine era perfeita em fazer maquiagens. E não, ela não era uma maquiadora. Mas era como se tivesse nascido para aquilo. Não era de hoje que ela costumava maquiar toda a família para eventos como casamentos, aniversários e outros tipos de festas. Só que ela não conseguia fazer nada “mais ou menos”. Ela que decidia como fazer. E sempre ousava nos tons pesados e marcantes. Eu? Adorava. Se era para causar, que fosse. Eu não gostava de “mais ou menos” e nunca fui fã do “menos”. Eu gostava sempre de “mais”. Sabe aquele ditado: “Mais é menos”? Nunca se aplicou a mim.
Valquíria iria sair diretamente de sua casa naquela noite, pois era aniversário dela. Alissa e Dani também iriam sozinhas. O pai de Lorraine nos levou de carro até o Lounge 191.
Assim que chegamos na fila, Lorraine disse:
- Me espera só um minuto. Eu já volto.
Caralho, ela saiu e me deixou sozinha. Lorraine sempre fazia aquilo. Não encontrei ninguém conhecido na fila. Quando chegou minha vez de entrar, saí da fila e fiquei como uma idiota esperando por ela. E lá se foram vinte minutos sozinha do lado de fora.
Recostei-me na parede externa, que dividia o bar e o outro ponto comercial. O Lounge 191 era um bar que atendia interna e externamente. À noite, fechava a parte externa e só funcionava internamente, também com bandas tocando ao vivo. A diferença é que não tinha duas pistas. Só tocava pop rock e rock. Nada além disso. Isso por si só já me agradava. Ele só tinha uma porta de entrada vermelha em madeira e duas janelas somente de vidro, quadriculadas, imitando madeira antiga. A fachada era de tijolos vermelhos desgastados. E o nome “Lounge 191”, era em letras cursivas neon rosas e vermelhas. Era minha primeira vez naquele lugar.
- Veio para matar alguém do coração com esta roupa?
Virei e lá estava ele...