Capítulo 8
1864palavras
2022-04-08 01:14
Deitamos em nossas tradicionais camas no chão. Garanti meu lugar ao lado de Dani. Já estava amanhecendo e não tínhamos a mínima intenção de dormir. Os primeiros questionamentos vieram para mim:
- Quantos anos ele tem? – perguntou Dani.
- 27.
- Ele é quase dez anos mais velho do que você. – observou Alissa.
- Já me apaixonei por um exatamente dez anos mais velho. – as lembrei.
- Eu já fiquei com um homem de 30 uma vez. – disse Dani. – Isso não tem nada a ver, meninas.
- Exceto pelo fato de minha mãe me matar se souber, estou tranquila. Gostei dele. – confessei.
- Hum, gostei desta afirmação. Há tempos você não admitia gostar de alguém a não ser...
- Não falei o nome dele! – gritou Dani. – Não vamos estragar nossa noite.
- Ele não estraga nossa noite, Dani. Vá se acostumando com Cadu. Ele vai frequentar nossas casas ainda. – garanti.
Dani suspirou:
- Depois de ele ter dito que estava bêbado, mas lembrava de ter ficado com você, ele caiu completamente no meu conceito.
- Que parte de “eu gosto dele” vocês não entenderam?
- Que parte de “queremos o seu bem” você não entendeu? – perguntou Dani.
Dani e eu nos dávamos muito bem. Ela era mais conselheira que de Alissa e Valquíria. E eu sabia que ela não tinha papas na língua. Falava o que pensava, doa em quem doesse. Eu tentei relevar o que ela disse. Talvez não tivesse tido uma noite tão boa.
- Estou cansada. – falei.
- Por que você foge? – perguntou Alissa.
- Não estou fugindo...
- Ok, vamos falar do homem que nos trouxe em casa então? – perguntou Val tentando aliviar a tensão.
- O que querem saber sobre ele? – perguntei.
- É um Deus grego, trouxe você em casa... O que mais? – questionou Alissa.
- Ele é perfeito... Um homem, não um garoto. Tem uma vida, é formado e o sonho de genro de toda mãe, eu acho. Não para minha mãe, no caso, que detesta que eu sequer fale com homens mais velhos.
Elas riram.
- Mas eu menti para ele... Tudo bem.
- Como assim? – perguntou Val.
- Se eu dissesse que tinha 18, estava no ensino médio e minha mãe não queria me dar um telefone ele fugiria sem olhar para trás.
- Não acho que ele faria isso. – disse Dani. – Ele pareceu bem interessado em você. Talvez fuja se souber que foi enganado.
- Bem... Eu não vou vê-lo novamente. Então não terei este problema.
- Juliet, acho que vai vê-lo sim, caso continue indo ao Manhattan. Ele sempre está lá. – disse Val, a melhor observadora dentre nós.
- Como eu nunca o vi lá? – me perguntei. – Ele disse que já havia me visto.
- Eu o vejo sempre...
Suspirei:
- Eu não vou continuar com ele, meninas. Não temos nada em comum... A não ser o sangue quente que corre entre nossas veias.
- E Nicolas? – perguntou Alissa.
- Definitivamente não quero mais. – revelou Val.
- Por quê? – questionei curiosa.
- Não gosto dele. Não temos química alguma. Prefiro ficar sozinha.
- Ele beija mal? – perguntou Dani.
- Com minha vasta experiência me limito a não responder. – ela ironizou.
- Ele tem boca de quem beija bem. – observei.
- Não acredito que estou ouvindo isso. – disse Val me encarando. – Faça o teste.
- Eu não... Ele é seu. – aleguei.
- Ele não é meu. Eu não quero ele. Quem quiser, faça bom proveito. Inclusive segunda-feira vou embora mais cedo da aula... Talvez eu nem vá. Não quero correr o risco de ser surpreendida por ele na hora da saída.
- E você disse isso a ele? – perguntou Alissa.
- Eu disse com todas as letras que gosto de outro. Se ele entendeu, eu não sei.
- Enfim... Vocês são complicadas. – disse Dani. – Se já tivessem transado, não ficariam tão obcecadas nestes garotos que só servem para decepcioná-las.
- Eu estou decidida a perder a virgindade com Cadu.
Elas me olharam e começaram a rir. Fiquei brava e fechei meus olhos, fingindo dormir. Elas continuaram a falar de Adriano e Saul e o novo “ficante” de Alissa. Dani contando sobre os dois que havia “pegado” naquela noite. Val comentou sobre a situação com Nadiny no banheiro. E eu fiquei quieta, guardando meu segredo de ter procurado vestígios de sexo de onde ela havia saído. E assim acabei adormecendo.
No domingo, quando cheguei em casa, incrivelmente minha mãe já estava me esperando. E o semblante dela não era nada tranquilo. Dei um beijo nela e ela não correspondeu. Se limitou a dizer:
- Precisamos conversar.
- Posso tomar um banho primeiro? – pedi.
- Pode. Encontro você no seu quarto depois do banho.
Fui para o meu quarto e tomei um banho. Depois coloquei um roupão e fiquei na cama, esperando por ela. Dona Olga era “tiro na queda”. Cobrava muito de mim e nem sempre eu conseguia corresponder às expectativas.
Ela entrou e trancou a porta, sentando ao meu lado na cama.
- O que houve? – perguntei ligando a televisão.
Ela pegou o controle e desligou. A encarei preocupada.
- Há quanto tempo você bebe quando vai ao Manhattan? E quanto exatamente você bebe?
Olhei-a confusa:
- Como... Você sabe? Na verdade... Eu não sei do que você está falando.
- Ah, sabe sim. E eu não vou contar quem foi.
- Mãe, você precisa me contar. Porque esta pessoa é uma mentirosa.
- Sério? Então acho que ela não quererá mais que você frequente a casa dela quando souber que você a chama de mentirosa.
- De quem estamos falando?
- Da mãe de Alissa.
Porra, a mãe de Alissa havia me entregado? Por qual motivo? Ela nunca parecia se importar.
- Por que ela fez isso? Mentiu, no caso.
- Porque ela é adulta, madura e se preocupa com você. Ela dá liberdade a vocês, isso não significa que possam fazer o que bem entender na casa dela.
- Mas eu sempre me comportei na casa de Alissa, mãe. – contestei.
- Ela não disse que você não se comporta. Só que se preocupa porque você sempre chega bêbada.
Eu jamais imaginei que a mãe de Alissa observava isso. Abaixei meu olhos e implorei:
- Mãe, não me deixe de castigo... Por favor.
- Juliet, você sabe o quanto eu me preocupo com isso, não é mesmo?
Não respondi, pois eu sabia que sim.
- Usou drogas?
- Não.
- O que bebe?
- Drinques.
- Algo mais forte?
- Tequila alguma vezes. – confessei sem olhar para ela.
- Por Deus... Seu pai passou anos tentando se recuperar das drogas. Sabe o medo que eu tenho de você fazer isso?
- Eu não uso drogas... Eu bebi, como uma adolescente normal.
- Você já tem 18 anos... Não a considero uma adolescente. Está na hora de tomar responsabilidade.
- Eu sou responsável. E já que não sou mais considerada uma adolescente, posso beber, então? – ironizei.
- Você é filha de um homem dependente químico. Sabe as chances que você tem de fazer o que ele faz?
- Eu não quero saber... Eu não sou dependente química. Eu nunca usei drogas na minha vida. Você me ofende falando isso. – gritei.
- Não grite comigo. Será que nunca podemos conversar como duas adultas?
- Não somos duas adultas. Somos mãe e filha.
- E você me ouve como mãe?
- Sim...
- Se eu souber que você bebeu além da conta novamente, nunca mais a deixarei ir ao Manhattan Bar.
- Eu já tenho 18 anos. Você mesma acabou de admitir que não sou mais adolescente. Então não pode me impedir.
- Não mesmo... Quando você não mais morar na minha casa, nem usar do meu dinheiro, comer da minha comida e dormir na cama que eu arrumo.
- Está insinuando que devo me mudar?
- Não... Mas que enquanto estiver morando aqui, obedecerá as minhas ordens.
- Vou morar com meu pai.
Ela riu ironicamente:
- Seu pai nunca a procurou depois que saiu da reabilitação. Ele já tem dois filhos que você sequer conhece. Acha mesmo que ele a aceitaria, com todos os seus problemas de rebelde sem causa?
- Você é muito má, mãe. – bradei.
- Está na hora de você sair do mundo de contos de fada que vive. Eu criei você sozinha a minha vida inteira. Agora vem dizer que vai morar com ele, que sequer sabe que você existe?
- Ele me ama...
- Espero que sim... Do fundo do meu coração. Torço para que as drogas não tenham apagado a memória dele sobre ter uma filha linda. Aliás, você é a única coisa boa que ele me trouxe.
- Por que você faz questão de me magoar desta forma?
- Se você soubesse o quanto a amo, não diria isso. Mas com o tempo entenderá... Que eu não sou a vilã.
- Não, realmente não é. Otto é pior que você.
- Otto criou-a como filha dele.
- Ele não é meu pai.
- Ele sempre se preocupou como se fosse. Ele só quer o seu bem. Enquanto seu pai estava na reabilitação, foi ele que lhe deu tudo que você queria: roupas, calçados de marca, paga sua escola, a entrada do bar e a bebida que você bebe lá.
- Você trabalha... Não é ele que paga.
- Acha mesmo que com meu salário eu pagaria tudo que você tem? Seu pai jamais ajudou com nada... Absolutamente nada.
- Eu não quero ter esta conversa, mãe. – falei.
- Ok, não teremos. Quando quiser retomar, por favor, me chame. Mas ainda assim não beberá. Você tem um pai ex-usuário de drogas. E tudo que eu puder fazer para protegê-la de seguir qualquer passo dele, farei, acredite. Por mais que você me odeie, ainda assim estarei lá, cuidando de você.
Ela me deu um beijo e saiu. Quando ela abriu a porta, perguntei:
- E o castigo?
- Sem castigo. Posso confiar em você?
- Pode. – falei.
- Eu amo você, Juliet.
Eu não respondi. Ela sorriu e saiu.
Eu não gostava quando ela falava aquelas coisas do meu pai. Eu já sabia toda a história dele, pois não só ela, mas toda a família dela fazia questão de falar aquilo. Eu não tinha contato com meu pai, muito menos com a família dele. No entanto eu gostaria sim de conhecer a esposa dele e meus irmãos. A única coisa que eu sabia era que ele estava bem agora e havia definitivamente largado as drogas. Eu tinha poucas lembranças dele. Mas eu não gostava de Otto, meu padrasto, muito menos da forma como ele tentava tomar um lugar que não era seu: o de pai. Então eu tinha vontade de estar com meu pai verdadeiro e provar para Otto que ele não passava do marido da minha mãe... Nada além disto. Ele não tinha o direito de me castigar, dar conselhos ou tentar conter qualquer atitude minha.