Capítulo 27
1556palavras
2023-10-08 18:55
Clarice era tão importante para Justin quanto Allison para Norton.
— Não posso negar que ele talvez fosse um bom pai, mas ele definitivamente não era uma boa pessoa. Debaixo daquela pele hipócrita, se escondia um coração maligno. Ally, chegou a hora de eu não esconder mais isso de você.
Justin ajoelhou-se com o joelho no chão, segurando o rosto de Allison com as duas mãos, um sorriso doentio e obsessivo passou pelo seu rosto. Ele disse com escárnio:
— Eu já te considerei minha vida, amei você de uma maneira maneira incontrolável, mas quem mandou você ser a única filha de Northon? O quanto eu te amava, é o mesmo tanto que te odeio agora.
Embora tivesse sorrindo, Allison sentiu um arrepio percorrer sua espinha.
— No dia em que eu e Brenda caímos na água juntas, você salvou ela de propósito primeiro, não foi? Você queria que o nosso filho pagasse pelo filho da sua irmã?
— Sim, um olho por outro olho.
Allison agarrou a gola da camisa dele com as duas mãos e, lágrimas escorrendo por suas bochechas:
— Como você pôde? Era nosso filho! Ele nem teve a chance de ver o mundo ainda. O que ele fez de errado? Ele era inocente!!!
Justin inclinou a cabeça, sorrindo maliciosamente:
— E o que fez de errado a minha irmã? O filho dela não era inocente também?
— Uma vida não se paga com outra vida. Você poderia se vingar de mim o quanto quisesse, eu não iria me importar. Mas você tirou a chance dele vir ao mundo! Essa sua obsessão por vingar a morte da sua irmã te tornou um cara doente! Você não é humano!!
Allison olhou para Justin, que parecia ter se transformado em algo mais sombrio, e percebeu que aquele era um dilema que nunca teria uma solução.
— Justin, eu entendo a sua dor por perder a sua irmã...
A expressão de Justin mudou repentinamente, e ele gritou em voz alta:
— Você não entende!!! Neste mundo, quem é que realmente compreende o que alguém passa? A minha irmã era prematura, desde pequena com problema de saúde e um problema cardíaco. Ela era o nosso tesouro, amada por toda a família. A forma como ela faleceu foi terrível!! Aquela garotinha tão vaidosa... ela ficaria triste por dias até se eu pisasse sem querer, em um de seus grampos de cabelo e o sujasse. E no final, ela partiu desse mundo de uma maneira tão indigna.
Justin estendeu a mão lentamente e acariciou o rosto de Allison, continuando:
— Você nunca vai entender o que senti quando fui identificar o corpo, a sensação de desespero ao levantar aquele lençol branco. Eu preferia nunca tê-la encontrado novamente na minha vida do que vê-la a partir deste mundo para sempre.
Allison abriu a boca para falar, mas não conseguiu encontrar as palavras. A posição dela, mesmo que tivesse pensando em apenas perdir desculpas às vítimas, eram uma afronta.
Agora ela entendia porque Justin tinha sido tão emocional naquele período, porque ele olhava com aqueles olhos suplicantes.
Ele devia ter feito inúmeros esforços para provar que não era Norton.
Essas evidências chocantes não eram nada além de provas do amor que um dia ele tinha sentido por si mesmo. Ele estava tentando desmontar a suposição, buscando reabilitar o caso de Norton, mas a verdade dos fatos era que mais evidências tinham surgido, todas elas sendo o algoz que os separava ainda mais.
Ele lutou, mas no fim, não conseguiu superar o que estava em seu coração. Ele não conseguia simplesmente seguir em frente e viver pacificamente com ela. Ele já a odiava naquele tempo.
Mesmo que a pessoa já estivesse morta, ele ainda queria vingar Clarice.
Allison ajoelhou-se no chão, segurando firmemente a gola da camisa de Justin e apoiando a testa na dele. Ela sussurrou:
— Timo, naquela época você deve ter sofrido muito. A família Sulliver já faliu, eu também perdi nosso filho, meu pai está inconsciente na cama. Não vamos continuar nos atormentando, o que acha?
Fazia um tempo desde a última vez que ela usou esse apelido carinhoso. Justin começou a tremer levemente, uma Miríade de emoções fugindo dentro dele. Allison não sabia o que ele estava pensando.
Ela esperava ansiosamente por uma resposta, esperando que ele pudesse parar de se atormentar todos os dias.
Será que eles poderiam se reconciliar?
Depois de um longo momento, Justin ergueu novamente a cabeça que estava baixada. O canto dos olhos do homem estavam ligeiramente avermelhado, ele lutou para não derramar nenhuma lágrima.
As pontas dos dedos ásperos trançaram suavemente o contorno do rosto dela, os longos cílios negros escondendo os seus olhos vermelhos. Ele disse:
— Allison, a dívida que o seu pai tinha comigo... vai ser você que vai pagar agora.
As lágrimas escorriam pelas bochechas de Allison. Ela sabia que nunca mais poderia voltar ao passado com Justin.
Ele a traiu e mexeu com a família Sulliver, que por sua vez, também devia a vida da irmã dele.
Aquelas contas eram algo que não se podia calcular direito, como um emaranhado de fios enrolados, quanto mais se tentava desembaraçar, mais apertado ficava, um sentimento de aprisionamento que fazia sufocar, chegando a um desfecho fatal.
Justin segurou o rosto dela, o polegar acariciou as marcas das lágrimas em seu rosto:
— Ally, não me ame, me odeie. Eu te traí, prejudiquei nosso filho, não posso voltar atrás e não vou. E a partir de hoje, só vai piorar para você!
Allison sentiu a hesitação interior de Justin, uma rara ternura nele, como um vislumbre de verde entre as geleiras.
No entanto, rapidamente aquele verde foi destruído por outra rodada de tempestades.
Justin saiu do quarto em desordem, deixando visão das costas para Allison.
Allison sabia que com essa virada de costas, seria a ruptura definitiva.
Não havia mais retorno entre eles.
Quando Allison saiu, não havia mais vestígios de Branca no quarto. A bondosa Branca pensava que eles estavam apenas discutindo, e ela fazia de tudo, sempre tentando aproximar os dois.
Aos olhos de Branca, Allison era a única Sra. Howard, sem perceber que havia cometido um grande erro.
Allison riu de si mesma. Antes, a presença de Branca a acompanhava, e a casa espaçosa não a fazia sentir solidão. Mas foi só quando Branca partiu que Allison percebeu que uma casa vazia, assim como a vida era insípida e sem sabor.
Ela foi até na cozinha onde havia a moqueca de peixe feita por Branca, da qual Allison se serviu um pouco.
O vapor suave subia, envolvendo seu rosto em um véu etéreo.
Allison mantinha uma expressão tranquila, comendo uma colherada após a outra.
Ela tinha encontrado uma maneira de desvendar o jogo que havia desgastado ela até o limite.
"Justin, meu pai te deve, e eu vou pagar a você", Allison pensou consigo mesma.
Ela decidiu abandonar a quimioterapia e aproveitar ao máximo seus últimos dias de vida.
Ela via a dor e o conflito de Justin. Entretanto, uma vez que ela partisse, ele não precisaria mais lutar contra suas próprias contradições e ressentimentos o tempo todo.
Ela percebeu que para quebrar esse impasse, só precisava partir. A partir de agora Justin teria uma vida melhor.. só que sem ela.
Teria sua própria pessoa amada e finalmente teria o filho que sempre desejou.
Ele continuaria sendo a lenda inalcançável da cidade.
Tudo seria bom, exceto por sua própria ausência.
Que bom.
Allison teve um Insight, sentindo de repente as correntes que a prendiam desaparecerem.
Naquela noite, Justin não voltou para casa, e um silêncio pesado pairava sobre a residência, como se fosse um lugar de luto.
Após passar dias trancada em seu quarto, Allison finalmente decidiu acordar cedo.
O descanso dos últimos dias havia revitalizado sua energia consideravelmente, sendo Branca uma figura crucial nesse processo. Com suas atenções carinhosas e comidas maravilhosas, Allison tinha uma coloração mais saudável nas bochechas.
Parecia que a medicação da quimioterapia vinha surtindo efeito, já que seu estômago Não havia mais sentido desconforto nos últimos dias e seu cabelo deixou de cair.
Ela trocou de roupa, vestindo algo apropriado para a ocasião, e estava prestes a sair quando desceu as escadas em aspiral e seu celular tocou.
— Senhorita Sulliver?
— Sim. Quem fala?
— Aqui é do hospital A, a senhorita poderia vir depressa?
O coração de Allison acelerou.
— O que aconteceu? - Ela teve um mau pressentimento.
— O senhor Northon Sulliver, abriu os olhos, mas teve uma parada e isso requer a sua presença. Poderia vir agora?
— Sim, estou indo.
Allison sabia que seu pai não merecia pena alguma depois de tudo o que ela descobriu. Mas ele era seu pai, no final das contas. E como ela, ele só tinha a si mesmo.
Ela saiu depressa da mansão, chamou um táxi e foi para o hospital. Seu coração havia um turbilhão de sentimentos.
Como ela olharia agora para o monstro que era seu pai?
Ela poderia confrontá-lo?
Ou ele era inocente?
Ele merecia a sua piedade?
Ou ela queria arranjar um motivo para Justin estar errado?
Ela não iria julgar seu pai, não antes de saber a verdade através das palavras dele. Uma investigação não iria provar o que houve naquela noite fatídica.
Pai, espero descobrir a verdadeira verdade por trás de tudo isso.