Capítulo 19
1832palavras
2024-11-12 05:13
Tinha acordado em cima da hora, o que em São Paulo com aquele trânsito infernal queria dizer muito atrasada, percebi tarde de mais que não tinha enviado mensagem para Miguel. Noite passada depois que ele saiu eu tomei um longo banho e dei um jeito na bagunça que tínhamos deixado e capotei, esqueci completamente de dizer qualquer coisa a ele.
Assim que me sentei no carro comprovei que estava deliciosamente dolorida, vocês sabem do que estou falando, aquela sensação de quem foi fodida como merecemos, até gozar gostoso revirando os olhos, foi tão incrível que quando você se senta e sua intimidade pulsa em resposta como um lembrete do que fez pouco tempo atrás.
Foi com isso em mente que abri o celular, com a ideia maldosa querendo provocar aquele tatuado safado, mas fui bombardeada por mensagem de Debora e de Alice. As duas malucas tinham feito um grupo para me questionar, querendo saber o que tinha rolado entre Miguel e eu.
Bem, eu que nunca fui tímida nem nada, bati o histórico sem nenhum pudor. Porque pudor é pra quem já passou dessa pra melhor.
E então depois enquanto fazia meu caminho até o restaurante, enviei uma mensagem pra ele.
"Ainda te sentindo dentro de mim" junto com um emoji dando uma piscadela. Eu conseguia até imaginar a cara dele quando lesse aquilo.
Sextas-feiras não eram dias tranquilos, mas nos deixava mais perto do fim de semana, então podia ficar feliz como todos e eu estava precisando de um descanso depois do dia de ontem.
Quando cheguei Eric estava lindamente comandando a cozinha, já seguindo o cardápio pré-estabelecido para o dia. Eu nem precisei pedir, ele era ótimo!
Repassamos mais alguns itens e deixei que ele delegasse as tarefas, era minha cozinha como todos gostavam de falar, mas eu adorava ver a dedicação dele, me lembrava muito de mim mesma quando era criança e ficava sempre atrás da minha avó querendo uma oportunidade que fosse de provar que sabia fazer.
Assim que abrimos o movimento parecia típico de sexta, muita gente com pressa, sempre correndo precisando pegar um pedido e sair, ou sentar na mesa que acabava de vagar e comer rápido o que tinha pedido antes de continuar seu dia corrido.
Mas não demorou para que eu percebesse uma movimentação maluca, o aumento de pedidos era inesperado. Não tínhamos nenhuma data comemorativa na cidade ou feriado para que uma quantidade insana de pessoas lotasse o lugar.
— Eu queria saber o que diabos deu em todo mundo hoje. Parece que metade da cidade decidiu aparecer. — Eric resmungou do outro lado da cozinha enquanto ele colocava os pratos prontos de forma ordenada em sua bandeja. Crispei meus olhos em sua direção o repreendendo, não forçava meus funcionários a trabalhar felizes, mas era sempre bom que estivessem com uma cara amigável. — Não que eu esteja reclamando. — ele emendou rapidamente me lançando um sorriso.
Ele estava exagerando com a ideia de metade da cidade, meu restaurante não comportaria nenhum terço disso, mas não podia culpá-lo até eu estava estranhando aquele movimento todo.
— O vídeo da briga viralizou na internet, as pessoas ficaram curiosas com o lugar e você sabe como é. — Lucas tratou de esclarecer o motivo mais plausível — Podem apostar que amanhã não vai estar nenhum pouco diferente. — completou enquanto sacudiu de forma experiente a frigideira cheia.
Eu o encare surpresa, nunca imaginei que um barraco renderia isso. Não me importei com a gravação da discussão de ontem, era ótimo mesmo que alguém estivesse com o celular em mãos registrando aquilo, tanto para minha segurança e como prova futura do acontecido.
A primeira coisa que pensei quando vi o número de visualizações foi: isso pode ajudar outras pessoas a entenderem que não devemos baixar nossas cabeças para racistas, que não deveríamos nos abater e exigir o que é nosso de direito.
Mas pensar que ele repercutiria desse jeito não passou pela minha cabeça.
— Vai lá pra fora. — murmurei para Eric. — Vai cumprimentar os clientes e ver o que acharam da comida, você foi o chefe hoje.
— Mas você é a celebridade aqui.
— Muito engraçadinho. Sai da minha cozinha agora! — ele riu, mas assim que jogou o avental na mesa segurou minha mão me arrastando para fora.
Eu sabia lidar com a pressão de uma cozinha lotada de pedidos e exigências. Estava acostumada a encarar festas lotadas da família, shows e baladas por aí. Mas encarar tantas pessoas com a atenção voltada para mim era novidade.
Sorri e acenei de forma discreta como sempre costumava fazer, apenas cumprimentando aqueles que sorriam em minha direção. Mas então um pedido de selfie surgiu vindo do nada e eu me peguei aceitando. O que podia fazer afinal?
Abri os dentes sorrindo para uma dúzia de fotos com pessoas que nunca tinha visto na vida, mas que de alguma forma simpatizaram comigo depois da cena de ontem, eram em maioria pessoas pretas como eu, que erguiam a bandeira contra racistas e eu adorei me sentir abraçada daquela forma.
Mesmo que o episódio de ontem não tivesse me deixado tão abalada quanto por exemplo a primeira vez que passei por isso. A primeira vez que me olharam diferente ou que usaram a palavra "negrinha" como tentativa de te diminuir doeu muito, me machucou de mais, mas eu fui criada no centro de uma família acolhedora e amável que me ensinou a ser forte e ter orgulho de quem eu era.
Alice aproveitou o momento para aumentar a popularidade do restaurante e espalhar o nome por toda a cidade, incentivando as pessoas a tirarem fotos e marcarem o restaurante nas redes. Eu não era ligada nessa parte, tinha duas profissões cozinheira e contadora e nenhuma das duas envolvia marketing e redes sociais. Graças aos céus! Deixei que ela fizesse o trabalho e conversasse animadamente com as pessoas ali.
— Aiiiii meu Deus, você viu só quanta gente? E eles adoraram tudo, tudo! — ela gritou empolgada quando voltamos a cozinha, o sorriso ia de orelha a orelha.
— Se o movimento continuar assim logo logo podemos abrir uma filial! — comentei, já fazia um tempo que estava maquinando essa ideia, as contas e planilhas estavam prontas, as economias vinham sendo feitas há bastante tempo. Talvez fosse mesmo a hora de contar para eles meus planos, em especial para Eric, então aproveitei a empolgação e a surpresa em me ouvir falar sobre expandir e contei. — E você vai ser o chefe!
A boca dele caiu aberta, novamente por mais novo que fosse ele sempre me mostrava que podia mais, era sempre capaz. Mesmo quando eu bancava a chefe vaca tocando o inferno dentro da cozinha, ele era educado, profissional, não reclamava, fazia seu trabalho e ainda guiava os outros. Era isso o que eu precisa, um chefe de pulso para colocar ordem no meu restaurante e comandar a cozinha!
— Eu nem... Porra, não sei o que dizer!
— Ainda falta um pouco, mas os planos já estão a todo vapor... Aaaa — gritei quando ele me pegou pela cintura e me rodopiou na cozinha.
Eric era muito maior do que eu, o que não era muito difícil com a minha altura, me senti como uma boneca sendo sacudida por uma criança descontrolada. Mas ri de sua emoção e empolgação genuína, ele não era dado a abraços e carinho, então aquilo significava muito para ele.
— Obrigada, obrigada, obrigada. — Eric repetiu incansável contra meu ouvido depois de me colocar no chão, mas sem me soltar.
Ele estava radiante e isso era mais um motivo para continuar com meus investimentos nesse projeto.
— Maria, tem alguém aqui querendo te ver. — a voz de Alice soou me trazendo de volta e quebrando nossa comemoração.
Mas assim que me virei e vi Miguel bem no meio da cozinha, com as mãos enfiadas nos bolsos do jeans rasgado, a mesma jaqueta de couro cobrindo seu peito que eu lutava em decorar todas as tatuagens, a barba mal cobrindo o sorriso que ele me lançou e os olhos azuis afiados concentrados em minha reação.
Por algum motivo estúpido meu sorriso se abriu ainda mais por vê-lo ali e depois da minha análise descarada por seu corpo eu estava quente. Céus, como eu queria aquele homem! O queria mais do que já quis qualquer outro.
— Vem cá. — segurei sua mão com pressa o puxando pra dentro do meu escritório nos fundos do restaurante.
O lugar era minúsculo e eu tinha escolhido assim para deixar mais espaço para a cozinha. Não cabia mais do que a mesa e a cadeira onde eu organizava a maior parte das coisas do restaurante. E com Miguel ali dentro, com todo o seu tamanho e presença, o lugar parecia ainda menor, sem falar no calor que tomou o lugar. Ou era apenas eu?
— Passei pra te dar bom dia. — ele se aproximou a passos lentos quando fechei a porta atrás de mim. — E dizer que você é uma garota má. Muito má! — o sorriso endiabrado agora estava estampado nos lábios. Mas preferi me fazer de inocente.
Seu rosto se aproximou do meu enquanto ele se curvava até sua boca estar na altura do meu pescoço.
— Não sei do que está falando. — sussurrei tentando conter minha voz quando ele abriu os lábios sugando minha pele.
O homem tinha o maldito dom de me fazer ficar necessitada apenas com a aproximação. Isso não parecia normal.
— Você me disse que estava me sentindo dentro de você. — a boca traçou um caminho até estar sobre o lóbulo da minha orelha. — Me fala como está se sentindo?
Eu não respondi, não tinha a capacidade de fazê-lo. Então fiz a única coisa que podia nesse momento, agarrei seus cabelos e o puxei para um beijo feroz, cheio de fogo e promessas. Minha língua buscou a sua com desespero e eu gemi quando ele me segurou firme na cintura, me erguendo poucos centímetros do chão para conseguir me levar até a mesa.
A atração entre nós não era brincadeira, parecia um fogo em brasa, calma se ninguém provocasse, mas o calor ainda era presente. E quando se atiçava ela voltava a consumir tudo em volta como se nunca queimasse o suficiente.
Ele escapou do meu beijo com um barulho ruidoso enquanto buscava meus olhos e suas mãos deslizavam por meu corpo até o botão da minha calça.
— Miguel. — aquilo foi um aviso, ele agora sabia bem do que eu falava sobre fazer escândalos, a última coisa que queria era que meus funcionários ouvissem alguma coisa.
— Eu sei rainha, mas vai ter que se segurar dessa vez porque eu quero fazer você se sentir bem, hã? — eu arfei em expectativa quando sua mão adentrou minha calcinha. — Prometo que vai poder gritar o quanto quiser mais tarde, agora eu quero que essa boceta dolorida fique molhada e relaxada.